segunda-feira, 20 de setembro de 2010

DEBAIXO DE PRAGA

Então lá vamos nós em Praga. Estou desmoronando, mas arrasto meus pedacinhos enquanto dá. Primeiro que a Praga dos meus sonhos era muito mais oriente. Muito mais fascinante. Aqui o comunismo acabou e não deixou saudades. Mal sobrou a arquitetura. Tem umas regiões devastadas, umas ruas feias com cara de Brás. Mas o centro que interessa é fabuloso. Lógico que já foi tudo tomado. Cada esquina, cada bueiro, cada pedacinho de parede faz merchandising. Cadeias de fast-food, uma rua inteira de Gucci, Dior, Armani, Bottega, Prada (Ai, eu sou tão boba... Não consegui deixar de rir quando vi Prada em Praga..... Eu sei. Boba.). As tchecas carregam as inevitáveis LV, usam Adidas e Puma, e os rapazes se deleitam ouvindo Jay Z bem alto pelos fones de ouvido do Ipod no metrô. Parei em frente de uma banca de revistas hoje. Cosmopolitan, Elle, Vogue, e mais uma penca. Todas versão tcheca. Julia Roberts está na capa de metade delas. Na outra metade Jessica Alba, Gwyneth Paltrow, Kate Hudson. Nas de fofoca Mary-Kate Olsen e Lindsay Lohan contam os dramas de suas vidas. Maravilhosas, muito bem penteadas e maquiadas, mas vivem um drama danado. Daí que de Leste Europeu fica a língua, os nomes de ruas indecifráveis, e a moeda que até agora me estapeio para entender o câmbio. No final de semana andei muito. Queria me jogar na cidade e deixar ela se revelar. Ir para onde ela me levasse, sentir, viver. Mas Praga é uma cidade misteriosa, que não se revela assim sem ser convidada pelo menos para jantar antes. Andei, andei, andei, mas não conseguia entender essa cidade. Afundava no pântano de gafanhotos que existe para todos os lados e não entendia. Até achei uma ferinha de rua virando uma ou outra esquina. Fui em um concerto revigorante no Municipal Hall com as peças mais alegrinhas de Vivaldi, Brahms e Strauss. Tudo muito facinho e com cara de desenho do Pica-Pau. Então hoje, desisti de esperrar que a cidade se revele para mim. Resolvi fazer turismo, porque Praga é enigmática, mas é maravilhosa e dá dó de perder. Abri o Lonely Planet e fui seguindo à risca. Arrisquei explorar o Bairro Judeu e me arrependi. Paguei uma grana pelo ticket para o museu, as sinagogas, o cemitério e a sala cerimonial e foi tão frustrante. O cemitério é meio cenário. Um monte de lápides de antigos cemitérios da região que foram empilhadas em um jardim. As sinagogas são muito mais interessantes por fora (A Jerusalém é divina!), mas isso dá para ver de graça. E o museu... Bem. Tive a impressão que as casas de alguns rabinos podem ser mais enriquecedoras. Então você ainda precisa pagar uma taxa para tirar fotos, e taxa para kippah (no caso dos homens), eles pedem doação, e mais taxa disso e daquilo. Depois de meia hora eu estava achando tudo aquilo um grande circo para tirar dinheiro dos turistas. Claro que essa é só minha impressão, mas foi o que ficou. Depois fiz um walking tour. Até que interessante. O problema desse walking tours é quando eles colocam uma guia adolescente meio inexperiente que não sabe nem disfarçar que decorou as piadas. Mas andar pelas galerias subterrâneas da cidade que foi soterrada para se livrar das enchentes é bem empolgante. Praga é uma cidade que cresceu a beira de um rio. Para resolver as enchentes anuais um rei resolveu subir o nível da rua colocando toneladas de terra e soterrando andares de casas, ruas e comércios no século XVI. O fascinante é que hoje existe uma Praga subterrânea que você pode descobrir sem querer entrando em alguma galeria, ou algum restaurante desavisado. Clubes, casas noturnas. Você nunca sabe em qual estabelecimento alguma escadinha vai te levar para salões no subsolo cobertos de pedras de 500-600 anos. Então eu comecei a entender um pouco porque é tão difícil para Praga se revelar. É preciso afundar, descer. Gelar em porões. Depois fui prestar minhas homenagens ao túmulo de Kafka e voltei chutando pedrinhas, pensativa e meditabunda, como diria Caio Fernando de Abreu. Eu ainda tenho a impressão de estar dentro de um cartão postal. De ficar esticando meus braços por algo inalcançável. Parece que Praga de verdade está acontecendo em algum outro lugar que eu não sei onde é. Andei no centro, no castelo, na periferia, nos bairros industriais. Nada. Eu vou ter de me contentar com a vista turística de bairros, monumentos, museus e igrejas. Sempre acho que a gente precisa viver e aceitar os lugares como eles são. De repente é bom para me ajudar a aliviar.

Um comentário:

Anônimo disse...

'Então eu comecei a entender um pouco porque é tão difícil para Praga se revelar. É preciso afundar, descer. Gelar em porões. Depois fui prestar minhas homenagens ao túmulo de Kafka e voltei chutando pedrinhas, pensativa e meditabunda, como diria Caio Fernando de Abreu. Eu ainda tenho a impressão de estar dentro de um cartão postal. De ficar esticando meus braços por algo inalcançável. Parece que Praga de verdade está acontecendo em algum outro lugar que eu não sei onde é.' LINDO