terça-feira, 30 de março de 2010

DUBLIN



Zero graus agora em Dublin. A sensação térmica é de menos 6. Eu que nasci para ser nordestina me escondo embaixo do edredon e tento imaginar uma boa razão para sair lá fora. Cheguei ontem no final da tarde. Visibilidade quase zero. Vim de Londres com uma companhia aérea irlandesa chamada Aer Lingus. O logotipo deles, um óbvio trevo de três folhas e verde para todo lado. O avião ficou 40 minutos sobrevoando o aeroporto, quase arremeteu. Acabou pousando por instrumentos. Um pouco de tensão nas poltronas. Eu só dormia. (A hora que for a hora, foi. O que se pode fazer?) Na alfândega o oficial me pergunta: "What brings you to Ireland?" Sem pestanejar, abri um sorrrisão (também porque sorrisos são as coisas mais poderosas quando estamos viajando), olhei bem nos olhos dele e respondi apenas: "Beer!!!" E o oficial soltou uma bela gargalhada "That´s a really good answer!" Então conversamos sobre Joyce, sobre Oscar Wilde, ele carimbou meu passaporte e disse "Please, be very wellcome to Ireland!" E eu entrei em Dublin com as portas escancaradas. Os irlandeses são como aquele tio bonachão que enche a cara no almoço de domingo. Só que aqui, todo dia é domingo. Ontem conheci duas garotas e um garoto brasileiros. Estudam hotelaria na Suiça e estão viajando no Mid-Break. Fomos jantar na região de Temple Bar e depois tomar pints de Guinness. Para sorte nossa o barman era brasileiro também (e a coisinha mais fofa do mundo...) e cobrava metado do valor da gente. O bar cheio de gente, com música irlandesa. As pessoas cantando, batendo palmas e sapateando. Nós éramos as únicas três almas ali ainda sóbrias. Então aparece Fred, um verdadeiro Leprechaun Irlandês tamanho família, enorme, ruivo, com uma barba que ia até o meio do peito; e que arranha meia dúzia de palavras em português, é corintiano e começou a se contorcer (no que ele chamou de Samba) como um louco quando soube que a gente era brasileiro. Ele sapateava, tocava um tambor maluco e ainda me agarrou pelas pernas, me jogou em cima dos ombros e rodou comigo no meio do bar. Eu só fiquei esperando aquele irlandês louco (eu ia dizer irlandês bêbado, mas é pleonasmo.) me derrubar no chão e eu precisar usar meu seguro saúde. Mas o cara era enorme, e me botou de volta ao chão como se eu fosse uma folhinha de uva. Andamos de volta para o hostel no meio da garôa. Totalmente surpeendida pela cidade. Zero graus agora em Dublin. E caem alguns floquinhos de neve lá fora, que derretem antes de chegar no chão. Eu que nasci para ser nordestina, sempre fugi do frio e nunca vi neve na vida, consigo pensar em um único motivo para levantar da cama agora. Eu estou viva.

segunda-feira, 29 de março de 2010

QUEM TEM AMIGO, NUNCA FICA NA ROUBADA

Eu fui para Londres sem muitos planos. Graças à hospitalidade da Isa pude ficar e aproveitar muito mais a cidade (e nunca vou poder ser suficientemente grata à ela, que foi uma fofa em tudo.). Então comprei passagem pra Dublin, planejei voltar para passar um último final de semana com ela e ir na segunda que vem para Lisboa. Só que rolou um contratempo e a Isa me falou na sexta à noite que não poderia me hospedar no próximo findi. Coisas que acontecem. Primeira coisa que fiz foi rastrear as opções de hostels, afinal comigo não tem tempo ruim. Só que a pessoa aqui (que já foi loira e é lerda até hoje) esqueceu completamente que o próximo final de semana é Páscoa. Resultado: TOOODOS os hostels, possíveis e imagináveis, estavam lotados para as únicas três noites que eu vou passar em Londres. As únicas opções de hotel que estavam disponíveis iam custar-me uma indecência em pounds que eu não disponho. Mas eu acredito em um anjo protetor dos viajantes. Acredito nos laços de amor que me unem com as pessoas que fazem parte da minha vida. Então, antes de me desesperar e procurar um banquinho no Hyde Park pra dormir com a minha mochila, mandei alguns pedidos de socorro por email. Nem foram tantos na verdade, só uma meia dúzia. E quando eu digo que o amor é uma força poderosa e multiplicadora, eu falo com propriedade. Em menos de 48 horas eu tenho 10 (DEZ!!!) opções diferentes de estadia para o final de semana, de todas as formas e jeitos, em todas as áreas de Londres. Pessoas que são amigos de amigos, pessoas que nunca me viram mais magra, mas que fizeram questão de me hospedar. Emails garantindo "sem casa você não fica!!!". Até opções de flatmates caso eu quisesse morar em Londres. Olha só!
A vida me inunda de generosidade e eu só tenho de agradecer. Agradecer, agradecer, agradecer. Sei que muita gente que também gostaria de me ajudar vai saber disso por aqui (e sou muito grata também por não ter precisado acionar toda minha rede de proteção). Aos meu amigos que me ajudaram a criar essa corrente linda de solidariedade, agradeço de todo coração. Amo muito vocês. É muito bom saber que minha rede de proteção abrange o mundo todo.

sábado, 27 de março de 2010

TRÊS LOJINHAS PARA AMAR EM LONDRES

Shake Gallery
26, Chapel Market em Islington
http://www.shakegallery.co.uk/

É um café. Mas é uma lojinha também. O café é especializado em milk shakes e smoothies e bolinhos lindos com cara de arruinarem sua bunda para sempre. Enquanto a gente faz uma orgia de carbs, dá para passear pelas prateleiras repletas de coisas fofas como molduras com arzinho vintage, valises, caixas para chapéus, malas quadradinhas, material para desenho e um moulage de tecido feito à mão, já vestido de bailarina, de "tutu" e tudo. Um desbunde!

Highland Store
66, Great Russell Street
http://www.highlandstore.com/

Fica do outro lado da rua do British Museum. Uma lojinha delícia só com artigos das "terras altas" da Escócia. Cobertores, casacos, cachecóis, boinas, kilts, blasers em tweed, chapéus, bolsas (Meu Deus! As bolsas!!!), muita lã de carneiro e uma coleção em cashemere que me deu vontade de dormir em cima das blusas e cardigãs. As mais diversas padronagens de xadrez, das diferentes famílias tradicionais escocesas, e um xadrez especial feito em tons de rosa e azul pastel, criado especialmente para o memorial de Lady Di. Parte da renda desses produtos é doada a Fundação dela. Luxoooo!

Stanfords
12-14, Long Acre
Covent Garden
http://www.stanfords.co.uk/

Essa não é achado nenhum, é de fato bem famosa. A maior livraria de mapas e guias de viagem do mundo. Dá para encontrar desde os básicos "Lonely Planet", até guias específicos como por exemplo "Cemitérios de Londres" ou "Geologia na Svalbarda" (algum lugar no Ártico Norueguês). Ainda tem vários artigos gracinha com o mapa do metrô de Londres (como toalhas de prato, jogo americano e cortinas de banheiro) e toda uma sessão de artigos para facilitar a vida de mochileiros e viajantes em geral. Bolsas reserva super-hiper compactas, kits de emergência temáticos para diversas situações (adorei o "Kit Festival de Rock" com barra de cereais, escova de dentes, repelente, protetor, solar, camisinha e aspirina), uma infinidade de adaptadores de tomada universais, mini-secador de cabelo, mini-ferro de passar e até uma mini-jarra elétrica para ferver água. Dá vontade de morar na mochila forever!

SOMERSET HOUSE

A Somerset House é um mega espaço em Covent Garden, à beira do Thames, com várias salas de exposição e museus. No centro do prédio (que é super imponente) tem uma praça super agradável, a courtyard, onde no verão rolam festivais e projeções de filmes; e no inverno eles congelam toda a praça e as pessoas vêm de todos os bairros para patinar no gelo. O que quase ninguém visita é a Courtauld Gallery que fica em um dos pavilhões do prédio. A Família Courtauld era uma família de aristrocratas britânicos no ramo da prataria e da indústria têxtil. O negócio foi fundado pelo pai, mas era dirigido pela esposa, uma coisa muito incomum na época. Ela certamente era uma mulher incrível, e criou seus filhos de maneira a manterem uma linhagem próspera durante décadas e décadas. E acumularam uma impressionante coleção de arte ao longo de todas essas gerações. A galeria expõe esse acervo absurdo, incluindo linhas das pratarias produzidas pelos Courtaulds (baixelas, jogos de café e chá, bandejas; de uma riqueza e uma delicadeza sublimes) e mobiliários raros adquiridos pela família. Os Courtaulds foram, provavelmente, um dos maiores colecionadores de arte particulares, e o "singelo" acervo que está exposto nessa galeria inclui expressivas obras dos principais nomes das artes plásticas desde a Renascência até o Séc. XX. Tudo em um estado de conservação como se tivessem sido produzidos na semana passada. Organizados de forma cronológica e divididos dentro de suas escolas particulares, a gente vai transitando pelas salas e se deparando com Botticelli, Tiepolo, Rubens, diversos Bruegel (que eu particularmene amo). Estão lá "A Bar at the Folies-Bergère" de Manet (que de tão complexo acredito ser possível defender uma tese sobre ele, sobre a composição de cores, o desenho da luz, e as intrigantes relações de seus personagens), "Auto-retrato com a Atadura na Orelha" de Van Gogh (Totally Breathtaking!!!), o caríssimo "La Loge" de Renoir, algumas esculturas de Degas de estudos de suas bailarinas, os boêmios nas portas dos bordéis parisienses de Toulouse-Lautrec, a "Mulher de Kimono" de Matisse e uma sala quase inteira de Gauguin. Especialmente interessante olhar Gauguin, depois de ter visto o auto-retrato de Van Gogh com a evidência da briga dos dois. Ainda Monet, Kandinsky, Seurat, Mondigliani e uma exposição temporária de gravuras de Michelangelo. Eu não gosto de gravuras, mas Michelangelo é Michelangelo. A Courtauld Gallery é tão aconchegante, um museu pequeno, com uma coleção incrível, e, exatamente por não ser tão popular, nenhum gafanhoto (que preferem ficar todos tirando fotos no courtyard da Somerset House).

WHAT WOULD AUDREY DO?


Nem sempre eu sei o que Audrey faria, mas eu sei o que eu fiz. O que eu fiz foi agarrar como se fosse o último cantil de água no deserto um exemplar desse livro assim que vi na prateleira da Urban Outfitters ontem. Sim. Agora estamos falando de uma literatura realmente importante para a humanidade. Essa, Senhoras e Senhores, é a minha Bíblia. Um livro fofo, direto, simples e bem-humorado de comportamento, etiqueta e estilo para as mais variadas situações cotidianas, baseado no estilo e comportamento do (meu, pelo menos) maior ícone fashion de todos os tempos. Sim, nós tivemos Channel também (e Mademoiselle que me perdou, mas sou uma Audrey girl), mas acho que podemos achar milhões de paralelos entre essas duas mulheres fantáticas que acabam sendo diretrizes seguidas por todas as mulheres com elegância e estilo que já passaram por esse planeta. O básico, o clássico, o ponderado. E saber usar a seu favor suas próprias particularidades físicas. A maioria das regras de etiqueta nada mais são do que maneiras de se portar respeitosamente em sociedade. E nesse sentido, como já dizia Glorinha Kallil, "chic é ser civilizado".
Ah, sim! A capa do livro é maravilhosamente rosa!
Me like it!

quinta-feira, 25 de março de 2010

Um dos milhões de motivos que me fizeram começar essa viagem foi que eu queria me apaixonar. Acho que amor é uma coisa contagiosa. Quanto mais se sente, mais se atrai. E eu quero uma vida cheia de amor. Só não sabia que eu podia me apaixonar tão rápido. Sem nenhum propósito. Posso dizer com completa convicção que estou completamente apaixonada por Londres. Cada esquina, o cheiro, as cores. As pessoas! As pessoas são o que mais me comove. Existe um misto de individualismo e gentileza que me faz sentir mais humana do que em qualquer outro lugar que estive. Ontem eu tive uma noite muito triste. Chorei. Gritei pelo Kallel no MSN só porque eu precisava ouvir que alguém me amava. As vezes a gente não se sente digna de amor. (eu sei, eu sei, essa história denovo. Mas é assim. Dói. E quando dói eu choro.) Mas assim que pisei na rua, que comecei a fazer parte do cotidiano de todas as pessoas apetando o passo na calçada, abrindo guarda-chuvas, paradas na estação lotada da Bank. Assim que me senti parte de algo muito maior e coletivo, me veio a razão e a certeza de que não existe a menor possibilidade de eu não ser digna de amor, sem que todas as pessoas no mundo também não fossem dignas. Nesse quesito, eu prefiro votar no copo meio cheio. Prefiro olhar o belo. Eu gosto de acreditar no bem, e estou fazendo um esforço sobre-humano para não deixar o cinismo me corroer a alma. Eu escolho sorrir. Eu escolho o benefício da dúvida ao julgamento. Eu escolho a verdade, a entrega, o genuíno. Eu sei que às vezes vai doer, mas eu escolho saber que sempre haverá quem me lamba as feridas.

Hoje pela manhã fui na National Gallery. Bem em frente a maior concentração de gafanhotos do universo. Eles chegam aos bandos, embaixo de chuva mesmo, descem de ônibus, surgem dos bueiros. E tiram fotos. Tiram fotos de tudo o tempo todo. Falam alto. Francês, espanhol, alemão, italiano, chinês, coreano, japonês e algumas línguas nórdicas de que não sou capaz de identificar. Apesar da abundância de turistas, a National Gallery é certamente um lugar que eu vou precisar voltar mais um milhão de vezes. Me deparar com "Os Girassóis" de Van Gogh a um palmo de distância foi uma das emoções masi fortes que senti nessa viagem. Vieram-me lágrimas sem que eu pudesse me esconder. Klimt, Pissarro, Monet. As bailarinas de Degas. Todo mundo lá. E eu não consegui ver um terço. Sou mesmo uma pessoa de museus. As coisas me fazem sentido com uma curadoria pro trás. Depois encontrei Florence, e andamos por todo o centro, Covent Garden, Westminster, Soho. Parávamos nos mercados para tomar chai e comer pudim de pão com passas, ou para ouvir uma espanhola cantando no salão do National Theater. Vimos o início de uma cerimônia em St.Pauls, o Globe, o Tate. Corremos da chuva na beira do Thames e em Trafalgar Square (à noite, quando as centenas de milhares de gafanhotos já foram para outro lugar). Então jantamos em Chinatown e comemos um bolinho engraçado em uma barraquinha de rua. Saímos pelos bares e pubs, entrando em alguns só para sentir a atmosfera. A maravilha é que tudo acontece em tempo de se pegar o Tube e chegar em casa ainda no mesmo dia. Uma cidade diurna, para mim que peguei um bode imenso de ouvir os passarinhos cantarem pela manhã. Florence foi um anjo, fazia questão de me contar tudo, me mostrar tudo. E pensar que somos praticamente estranhas. Conheci Florence por acaso no Carnaval na Ilha do Cardoso. Ela estava perdida e mais ninguém dominava o inglês na vila de pescadores. (tanto que a primeira coisa que dissemos uma para a outra hoje foi "Ei, First time we see each other without bikinis!!!") Tentei ser o mais gentil que pude, e ganhei uma amiga e uma anfitriã maravilhosa nessa cidade. Acho mesmo que o amor, a gentileza, sejam contagiantes. Estou apaixonada. Estar apaixonada é algo muito revigorante. Ainda quero mais. Quero todas as paixões a que eu for capaz.

terça-feira, 23 de março de 2010

LONDON

Tem um filme que eu amo, não apenas pela história mas por tudo o que ele me causou, o que ele representou na minha vida. E isso é uma coisa completamente particular. Não pela obra cinematográfica em si, mas por tudo que ele me disse no momento em que me disse. O filme é uma brincadeira com a vida e uma das melhores obras da minha escritora favorita: Virginia Woolf. Foi por ela que me descobri escritora de verdade. Como eu disse é uma coisa totalmente particular. Existe uma cena nesse filme em que ela pede para o marido para voltar para Londres. Pois, apesar de prejudicial para a saúde dela, era onde ela se sentia inteira, era onde ela era escritora. Assim que pisei em Londres eu entendi porque meus livros favoritos foram escritos nessa cidade. Não vou dizer que vi muito mais da cidade, mas a energia me impregnou todos os poros. Aqui a gentileza e a brutalidade convivem heterogeneamente. Para mim a essência de qualquer ser humano. Londres é humana até dizer chega, um caldeirão de tipos, histórias, personagens. Tenho vontade de chorar pelas esquinas. Sem nenhum motivo. Passo o tempo todo com vontade de escrever, e as palavras fluem, descarregam. Faz tudo parecer realmente fácil. Como se a humanidade finalmente fizesse sentido pela sua completa falta de sentido. Isa tem sido a melhor companhia que eu poderia pedir. Posso absorver o cotidiano sem que alguém fique berrando nos meus ouvidos “você precisa ir tal lugar”, ou “você precisa comer tal coisa”, ou “não acredito que você ainda não fez isso”. Logo no sábado ela me levou em um jantar na casa de um amigo dela. Um brasileiro que já está aqui há 10 anos, e haviam outros brasileiro com tanto tempo de estrada, um neo-zelandês e uma autralia-colombiana. Foi uma dessas noites mágicas em que há vinho, conversas maravilhosas, fotografias roubadas, comida incrível e madrugadas inesperadas. No dia seguinte ainda andamos por Camden que me pareceu meu novo lugar favorito para passeios aos domingos. Ontem aproveitamos a libra deliciosamente baixa e enlouquecemos na Primark da Oxford Street, mas depois entramos na Selfridges para ver de pertinho, babar e por a mão nas criações dos maiores artistas da atualidade (estou falando de Galliano, Marc Jacobs, Lagerfeld, Alexander McQueen… a turma toda!). Depois saímos de lá imaginando como seria legal ser milionária e ter um dia de Pretty Woman naquelas escadas rolantes e fomos comer um dos cookies mais indecentes que já tive a oportunidade de colocar na boca. Hoje me enfiei pela Chapel Market, descobrindo lojinhas, olhando as barracas da feira. Pessoas de todas as raças, todas misturadas. Grupos de adolescentes mulçumanas com a cabeça coberta. Indianos, paquistaneses, japoneses, negros. Ainda me surpreendo com a gentileza autêntica das pessoas. Aliás com a autenticidade toda das pessoas. É a palavra que mais me ocorre. Autenticidade. Londres é uma cidade de verdade. E quando eu já sorria para a garoa, já me mimetizava como quem nem mais sente o frio, a realidade veio correndo em minha direção e foi derrubada bem aos meus pés. Na verdade a razão de eu estar tão feliz com o meu cartão de crédito e aproveitando tanto a capacidade dos meus reais comprarem libras, é a mesma que fez aquele homem sair correndo de dentro do supermercado cheio de sacolas sem pagar. Eu só vi o homem correndo na minha direção. Típico biótipo inglês, branquelão, quase vermelho de tão loiro. Atrás dele um negão corpulento, pula e o agarra. Os dois caem bem aos meus pés. Bandejinhas de carne caem da sacola e são recolhidas por um ajudante latino com o uniforme do supermercado. O negão corpulento olha aflito para o homem, quase como quem implora ele mesmo por uma chance, e diz “What were you doing, man? You were trying to rob the market. Don´t do that. They will call the police. You will get in trouble. Why, man?” O homem foi levado para dentro do supermercado. Então por um instante todas as pessoas naquela quadra tiveram a crise estampada na cara. Por um rápido segundo. O cobertor é muito curto. Cobre-se a cabeça, mas expõe-se os pés. E todos voltaram para suas vidas individuais. Voltaram para seus milhões de rituais de gentilezas diárias. Andando pelo lado direito das escadas rolantes, dando passagem na porta do metro, se desculpando por esbarrarem em você nas calçadas. Um mundo de gentilezas que me faz pensar que talvez a Babel fosse antes de tudo uma civilização.

sábado, 20 de março de 2010

BANAL

Se me perguntarem porque eu resolvi ir para Viseu, eu só tenho uma resposta. Li em algum lugar que era uma ótima cidade para comer. Então fui a Viseu para comer. A cidade em si é um charme também, e essa coisa de conhecer cidades charmosas já está ficando entediante. Eu fico um pouco irritada comigo mesma quando me pego ansiosa, desesperada para ver tudo “o que deve ser visto” como a maioria dos turistas. Não sou uma turista. Acho que não nasci com o gene. Realmente me aborrece a estrutura contemporânea de turismo, de ver tudo pela janela, ouvir os guias, tirar fotos, comprar souvenirs. O que me motiva são coisas diferentes. Vou deixar de ver e fazer muitas coisas “obrigatórias”, porque meu olhar busca outro tipo de coisa. O que me encanta muitas vezes é a fragilidade de um velho passeando com seu cão. É a massa da população esperando um trem na plataforma. O comerciante abrindo a porta da sua loja. O cotidiano, o comum, o banal. Então eu fechei o Lonely Planet, sentei na praça do Rossio e fiquei muito tempo olhando a vida passar. Toda cercada de esqueletos de árvores que vão florecer (mais algumas semanas só, e vai estar tudo verde), tranquilizada pelo som da água na fonte ao lado. Ouvindo as conversas, assistindo duas mulheres do leste europeu mendigarem. Crianças caçando pombas, e para sorte das pombas as perninhas delas ainda são muito curtas para isso. Não consegui nem abrir um livro. A vida que me rodeava já era interessante demais. Tenho pensado no sentido de ler e escrever tantas histórias, quando existem tantas acontecendo ao vivo. E pensando nisso também me dei conta que já faz mais de um mês que não escrevo uma linha. Fui consumida pelo carnaval, a mudança, a viagem, a chegada, a virose, a estrada, e quando dei por mim muitas semanas já se passavam sem que eu escrevesse uma linha. E eu tenho um livro que falta isso para ser terminado. Ele é minha única pendência agora. Preciso voar. Terminar. Porque um novo já se aponta. Depois fui ao Museu Grão Vasco, considerado o maior pintor português da história. A sensação de ficar sentada em frente ao seu quadro “São Pedro” me valeu o ingresso, a viagem até Viseu e toda o dia. Uma daquelas obras que realmente te tiram as palavras. Pena que qualquer reprodução em livro não consegue causar o mesmo impacto de ver a obra ao vivo. Mas em Viseu eu comi. Alguns doces (e esses doces portugueses, vou te falar!) na melhor “pastelaria” da cidade, que depois fui descobrir era de um carioca da Ilha do Governador. Viriato brincou depois que todos os padeiros em Portugal são brasileiros. E desbravei uma ruelinha toda minúscula, cheia de opções de restaurantes e bares. Fiz uni, duni, te e entrei no “O Cortiço”. Bem tradicional, com pernas de presunto penduradas no teto. Vinho de primeira (da região do Dão que rodeia a cidade) servido em jarra de madeira. Morcela, linguiça, Parma e queijo de aperitivo. Pedi uma sopa de legumes de entrada. Um coelho cozido em vinho com batatas como prato. Então o coelho veio acompanhado de uma verdura maravilhosa que eu não conseguia distinguir pelo sabor. Verde escura, pouco folhosa. Na aparência me lembrava um brócolis picado com os talos, mas o sabor não era tão doce. Finalizava um certo amargo de chicória, só que bem mais saborosa. Perguntei para o garçom o nome da verdura. “Ah! Estás a comer grelos.” Corei! Quase me matei para segurar a gargalhada e dei um belo gole de vinho para conseguir repetir o tal nome. Acho o máximo essas peculiaridades da língua, que podem transformar algo tão vulgar em uma verdura saborosa e excelente para acompanhar um coelho cozido. Depois de tanta comida, não cabia mais nada de sobremesa, mas não dispensei o licor. Sai rolando pelas ruas de pedras até o albergue, onde (bem embaixo da minha janela) Joelma me aguardava com os maiores sucessos da Banda Calipso.


Agora estou em Londres. Cheguei ontem à noite, chovendo. Uma jornada para vir de Gatwick até a Old Street Station. Mais uma jornada para conseguir um táxi. Eu e Isa só fizemos uma pizza e tomamos uma cerveja, para desmaiar em seguida. Em Londres quero dar um tempo. Nada de maratona para ver tudo. Pode ser que eu saia daqui sem ter visto a Abadia de Westminster, sem ter passeado pelo Hyde Park. Sem nem uma foto do Big Ben. Não importa. É minha Londres, minha jornada. Vou fazer só o que realmente tiver vontade de fazer.

quinta-feira, 18 de março de 2010

terça-feira, 16 de março de 2010

SOLIDÃO

Eu gosto muito de viajar sozinha. Gosto mesmo. Não que eu não aprecie a companhia de amigos, também adoro. Mas acho que viajando sozinha têm-se uma experiência muito mais autêntica. Só sua. Sem influências de ninguém. É mais fácil mimetizar. A única coisa chata é não sair em nenhuma das fotos (detesto auto-retrato!!!), mas o que se ganha em auto-conhecimento compensa tudo.
Bom, estou eu hoje, sentada em um café na Rua Quebra-Costas, tomando minha sopinha, esperando o Núcleo da Cidade Muralhada abrir após o horário de almoço, quando passa pelas mesas um senhor morador de rua. Ele para na minha frente e grita: "A solidão é uma benção!!! Faz bem para a saúde!".
Como ele deve estar pelas ruas há muito tempo, imagino que ele saiba o que diz!

COIMBRA


Eu vou tentar ser sintética sobre Coimbra, porque para falar tudo o que eu vi lá precisaria de uns cinco posts (e eu estou bem cansada hoje e duvido que alguém tenha muito saco de ler tudo). Quando cheguei em Coimbra ontem não botei muita fé. A cidade não é muito grande. Gira em volta da universidade, que é uma coisa bem imponente mesmo. O conjunto de prédios fica na região central e mais alta da cidade, então a impressão que se tem é de que o tempo todo damos de cara com ela. Mas não é qualquer universidade. Foi a primeira universidade de Portugal e uma das primeiras da Europa. Até hoje carrega um dos mais conceituados nomes no meio acadêmico mundial. A Universidade foi na verdade fundada em Lisboa a princípio por Dom Dinis em 1290 (o mesmo que deu Óbidos para a esposa. Ele era um rei bastante empreendedor.) e só foi transferida definitivamente para Coimbra uns 250 anos depois, vivendo um período de grande efervescência durante a Renascença, com docentes que vinham de toda Europa. Histórinha geral. Coimbra foi fundada por romanos, mas cresceu na época da dominação moura por ser um excelente ponto estratégico. Nessa época também os mouros muraram toda a cidade (como gostavam de um muro esses mouros…) e construíram torres de vigilância que ainda podem ser encontradas misturadas à arquitetura atual da cidade. Coimbra foi também capital de Portugal por mais de um século. E tudo isso para entender que a história da cidade se funde e confunde com a história da universidade. Assim como os resquícios da muralha estão perdidos entre prédios renascentistas por todos os lados. Coimbra é uma cidade que se reciclou, mas mantém viva e palpitante uma série sem fim de rituais académicos que fazem qualquer visitante querer defender tese de doutorado. Apaixonante mesmo são os uniformes dos universitários. Não é obrigatório, mas é um desbunde por si. Trata-se de um terno (calça para os homens, saia para as mulheres), camisa branca, gravata, paletó e uma capa incrível por cima que faz parecer que todos eles estão no horário do recreio de Hogwarts. Dentro das capas os estudantes costuram insígnias dos cursos que frequentam, fraternidades, cidades de origem, países, etc. Quanto mais insígnias, maior é a vida académica do estudante. Eles também possuem fitas coloridas que representam o curso que estudam. Vermelha é Direito. Amarela, Medicina; e assim por diante. Em Maio acontece um ritual centenário em que os alunos formandos queimam as fitas em uma grande pira, e há festa por 10 dias, com música ao vivo e cerveja mais barata para todo mundo. Existem documentações fotográficas do ritual da Queima das Fitas, algumas impressionantes feitas um dia antes da tomada do poder da ditadura de Salazar. O prédio central da universidade, onde fica o curso de Direito, já foi o palácio real e sede do governo. As cerimônias anuais de abertura do ano letivo acontecem na Sala do Exame Privado, que já foi a câmara real, o local onde o rei dormia. Imagina então defender tese de doutorado na Sala dos Capelos, o local que foi a Sala do Trono de todos os reis da primeira dinastia portuguesa. São milhões de detalhes assim que fazem da visita a Coimbra uma jornada repleta de simbolismo, rituais, e um olhar completamente a educação e a vida acadêmica. Há ainda a impressionante Biblioteca Joanina. Uma pena não poder fotografar lá dentro, proibido para preservar os livros antiquíssimos da luz. A primeira sensação que se tem ao entra na biblioteca é algo indescritível. Tive a sensação de entrar em uma pintua. Juro! Descobri também que dentro da biblioteca mora uma colônia de morcegos. Sério. Os bichinhos. De verdade. A administração mantém a colônia na biblioteca porque os animais ajudam a comer os insetos e preservar os livros. Bem bizarro. Andar pelas ruelinhas medievais que parecem um labirinto ao redor da universidade também é uma delícia. Descobre-se lojinhas, casas fofas e algumas repúblicas estudantis que são identificadas com bandeiras ou grafittis nas paredes. Parece uma salada muito grande, mas te garanto que tudo é harmônico e faz muito sentido. Gostoso também é descobrir um dos cafés e pastelarias na Rua Quebra-Costas (a rua na verdade é uma grande escadaria que deslancha até a Torre Almedina e é o lugar mais charmoso de Coimbra), sentar em uma mesinha, pedir um café e uma nata (nata é um doce típico feito de massa folhada e creme de ovos. Muito parecido com o Pastel de Belém), e ficar apreciando as pessoas passando, os estudantes conversando, indo e vindo. Uma vida que palpita, revigora, faz muito bem.

segunda-feira, 15 de março de 2010

O PRIMEIRO CASTELO A GENTE NUNCA ESQUECE!!!



Que soutien que nada. Inesquecível mesmo é o primeiro castelo. Ainda mais para uma brasileira nata, que a coisa mais antiga que foi acostumada a ver tem um par de séculos. Carol, como uma boa historiadora medieval, queria muito me levar para Óbidos. Uma cidade ao norte de Lisboa, mas como tudo é perto em Portugal, fica apenas há algumas horas do Porto. Lisa nos acompanhou, o que deixou tudo ainda mais divertido. Lisa é uma alemã que caiu de paraquedas em Portugal e acabou ficando para fazer um mestrado, agora um doutorado… Ela é hilária e repete “Fixe!” um milhão de vezes por dia. (Obs.: Fixe, é a gíria portuguesa para dizer que alguma coisa é legal. Hoje é mais usada como uma expressão orgânica na comunicação do dia a dia, do que como uma gíria em si.) Pois bem, Óbidos é uma cidadezinha de 3.000 habitantes, toda preservada exatamente como era no período medieval. As casas, ruas, tabernas. A região caiu nas graças da rainha Dona Isabel e Dom Diniz, rei de Portugal na época, construiu o castelo e deu a cidade de presente para a esposa em 1228. Não é legal? Uma cidade inteira de presente? A gente é tudo um bando de idiota, se derretendo toda com bombons e flores. Eu também quero presente grandioso de namorado! Uma cidade com castelo... O Taj Mahal… Bom, que seja. Na época da dominação moura, Óbidos serviu de ponto estratégico e foi toda murada. Então as construções da cidade são da época de Dom Diniz, mas o muro que a rodeia é mourístico. Eu fiquei extasiada! É como participar de um filme de verdade. Tudo tem cara de cenário, e despertava em mim uma vontade de ser menininha. Virar donzela. Gritar por causa de dragões e feiticeiras. Todas minhas memórias de heroína de infância afloraram. Eu sai pulando (e tropeçando) pela ruelas, descobrindo portas, janelas, floreiras, jardins. Imaginando como era viver naquelas ruas há quase 800 anos. E o mais incrível é que a cidade tem aqueles muros quadradinhos, igual playmobil!!! É uma visita de um dia, não há muito mais o que fazer, mas o Lonely Planet aconselha para quem tiver tempo dormir na cidade e sentir o clima mais forte das tabernas e da típica vida noturna. Nesse final de semana estava tendo um Festival de Chocolate na cidade, então todas as lojas vendiam bombons, nuts cobertos, sorvetes com caldas e copinhos de chocolate para tomar licor de ginja (OBS.: Ginja é uma fruta típica daqui, da família das berries, e produz esse licor delicioso bem doce e frutado que se acha em todos os cantos). Tinha muitos gafanhotos pelas ruas por causa do festival, de várias nacionalidades, o que costuma me deixar irritada. Mas a multidão acabava dando um ar de feira medieval. Como se a qualquer momento algum cavaleiro em armadura fosse passar correndo entre nós para um torneio de lança… voltar, me oferecer uma flor e pedir um cacho do meu cabelo para dar sorte...

Dicas
- em Junho rola meeesmo uma Feira Medieval em Óbidos, com simulação de lutas, pessoas vestidas a caráter, tendas e tudo o mais.
- eu aconselho calçar sapatos baixos e confortáveis para visitar Óbidos. O calçamento também é medieval e anda-se bastante. Assisti algumas adolescentes destruindo o bico de scarpins nas pedras.

A SAGA DE DEPORTAÇÃO DO VAIO COR DE ROSA


Fui obrigada a deportar meu Vaio rosa. Começou assim. Logo na primeira semana Carol e Viriato receberam alguns amigos em casa para me “introduzir”. Lá pelas tantas, depois de tantas garrafas de vinho, eu pego meu lindo bebê para googlar nem me lembro mais o que e ele está chiando com um som horrível. Imaginei que era ele também embriagado pelas altas horas, encerrei e fui dormir. No dia seguinte novamente meu bebê chorando. Comecei a ficar preocupada. O barulho era como se alguma pecinha estivesse deslocada e ficasse esbarrando na ventoinha toda vez que ela era ativada. Me doía o coração ficar ouvindo aquele som, (mas eu não tinha como deixar minha fazendinha do Farmville apodrecer de maus tratos!). Na segunda-feira compartilhei meus temores com quem quisesse ouvir (e com quem não quisesse também). Acho que de tão chorosa que eu fiquei, Hugo (meu anjo da guarda português) se ofereceu para me levar até a assistência técnica no final da tarde. “Vai ser algo rápido. Sim ou não.” E realmente foi. Chegamos na assistência técnica da Sony em um shopping em Matosinhos e a garota nem olhou direito para o meu bebê e disse “Não!”. Não podiam consertar. Tentei murmurar algumas argumentações, mas em se tratando de hardware os atendentes olhavam para o meu bebê como se ele fosse leproso. Ainda assim ela me deu um papel com os números de telefone da central de assistência técnica da Sony em Portugal e me garantiu que eles retirariam o PC para conserto na casa da Carol e devolveriam depois de pronto sem custos. Fiquei bem impressionada com a eficiência naquele ponto. No dia seguinte amanheci com febre alta, dores no corpo e aquela virose milagrosa que me ajudou a afinar alguns kilos (e deixou minhas calças muito mais lindas no meu corpo). Ainda assim arrisquei dar um pulo em um shopping perto e, me arrastando no balcão de uma assistência técnica genérica, ouvi novamente um sonoro “Não”. “Mas, moço! Dá só uma olhadinha. Eu tenho certeza de que é algo simples, deve ser só um parafusinho, uma coisa boba que está fazendo barulhinho.” Nada de conversa. “Desculpe-me senhora. O aparelho possui mecanismos de segurança para identificar se for aberto e a senhora perderia a garantia.” Senhora! Humpf!!! Voltei para meu intensivo de recuperação de virose e, assim que melhorei, liguei para a central da Sony. Bom, aqui vai o grande momento em que me senti inútil por estar fora do meu país. Primeiro que o atendimento da central era todo eletrônico, e esse sotaque lusitano, juro por Deus!, às vezes me parece aramaico e não português que eu possa entender. Então a gravação pedia para eu entrar com o número de série do produto, O QUE EU NÃO CONSEGUIA DE JEITO NENHUM! Porque o aparelho foi comprado no Brasil e, obviamente, possui um número de série brasileiro e assim que eu o digitava o sistema não reconhecia porque estava programado para aceitar apenas números de série portugueses. Para ajudar não havia nenhuma opção do tipo “Para falar com um de nossos atendentes, disque 0, ou 9, ou 6, ou *, ou o que quer que seja”. Depois de meia hora ligando e religando para a central consegui traduzir uma indicação da gravação para computadores adquiridos em outros países. Entrei no site com o meu bebê grunhindo, e novamente o sistema não aceitava o número de série. Mais meia hora me debatendo e encontro o link “Para assistência técnica de computadores adquiridos em outros países click aqui”. Aleluia!!! Clico. “Insira país de origem do aparelho”. Vamos lá: Brasil. E me aparece tchantchantchan??? Um número de telefone para contato EM SÃO PAULO!!! Entrei no Skype, telefonei para o número e expliquei para o atendente com todo o meu bom português brasileiro (que ele entendia perfeitamente!!!) a situação em que eu estava. “Olha só! Tá ouvindo? Ele faz esse barulhinho, ó.” Hum! Ele digitou, conversou com alguns superiores e me retorna “A senhora vai precisar enviar o PC para conserto no Brasil”. Como assim? “A senhora nos envia por correio, nós efetuamos o reparo, e reenviamos para o endereço que a senhora quiser em qualquer lugar do mundo.” Senhora! Humpf!!! Completamente desiludida, imaginando o terror e a solidão que o meu bebê teria de enfrentar sozinho, viajando de volta por correio para o Brasil, ainda fui abatida por um pânico avassalador de ficar sabe-se lá quanto tempo sem computador. Então tentei ainda uma última chance. Voltei ao shopping e à assistência técnica da Sony e praticamente implorei para que eles abrissem meu bebê e dessem um jeito nele ali mesmo. “Dane-se a garantia! Se você quiser eu mesma abro, eu desatarraxo os parafusinhos, eu tenho certeza de que é algo bastante simples que a gente conserta em uma hora!!!” Em vão. “Desculpe-me senhora.” Derrotada, completamente perdida, fui obrigada a ir até a Fnac e comprar um netbook (que era mais acessível, mas ainda assim: OUCH!!!). Pior! Nada de netbooks rosas!!! Fiquei horas infernizando o vendedor por um desconto, parcelamento, qualquer coisa que me fizesse sentir menos a perda dos meus euros (meus míseros euros…. Ai, ai!), mas eles são irredutíveis. Acho que no final ele se compadeceu com o meu sofrimento e me deu de presente uma capa rosa da vaio e um mouse cor de rosa também. Carol me disse que isso era bem raro por aqui, ganhar qualquer coisa que seja de uma loja. Ainda fiz o vendedor corar profundamente quando perguntei para ele onde poderia conseguir uma versão pirata do pacote Office (Bill Gates que me perdoe, ele já tem dinheiro demais!), mas no final tudo está se acertando. Hoje de manhã fui até os correios e gastei mais um tanto de preciosos euros para mandar meu bebê de volta para casa. Talvez seja melhor. A viagem seria dura demais para ele. E esse netbook tem o teclado minúsculo, é branco e não rosa, mas se adapta muito melhor a minha mochila. O Vaio Rosa vai ser cuidado, alimentado, protegido e, quando eu voltar (se eu voltar) vai estar bonitinho me esperando na casa da minha mãe.

domingo, 14 de março de 2010

OS CASAIS DO PALÁCIO DE CRISTAL

Passei a tarde de sexta passeando pelos jardins do Palácio de Cristal. Não é incrível esse nome? Parece conto de fadas. Palácio de Cristal. Como se eu fosse encontrar a Barbie dançando "O Quebra-Nozes" em alguma alameda. Acho que esse é o lugar mais romântico do Porto. Eu poderia escrever um livro inteiro naqueles jardins. Histórias de mulheres arrebatadas pelos próprios sentimentos, e a concretude de uma tarde de outono. É um lugar que desperta o meu lado mais "menininha". Fiquei com uma vontade tão grande de me apaixonar. De me enrroscar com alguém só meu em algum daqueles bancos. O lugar inteiro transborda romance. Cada cantinho, cada esquina, você tropeça em um casal apaixonado. Existe um sossego, uma paz onde só os verdadeiros amantes podem viver. E ainda avista-se o Douro se perdendo entre as árvores até o mar. É, de longe, meu lugar favorito no Porto até agora.
A oferta de tipos de casais era tão grande que instigou minha veia voyerística mais profunda. Fiz uma série toda especial deles:

Casais vindo...


...indo...


...clássico "enamorados"...


...companheiros...


...cúmplices...


...paparazzis...


...circenses...


...intelectuais...


...primeiro encontro...


...segundo encontro...


...terceiro encontro (e quase às vias de fato!!!)...


...gays...


...no armário...


...fora do armário...


...em dúvidas...


...mas assumidos!

Me diz? Não dá vontade de se apaixonar?
:-)

sexta-feira, 12 de março de 2010

SAUDADES...


Primeira saudades que estou sentindo aqui. Dessas que deixam o coração pequenininho e dá vontade de chorar. Carol me deu uma bolsa de água quente para colocar embaixo dos cobertores durante a noite. Para ajudar a esquentar. A bolsa tem uma capinha de pelúcia e enquanto eu escrevo, me pego acariciando a bolsinha térmica com os pés achando que era Julie. É bem onde ela costumava ficar.

quinta-feira, 11 de março de 2010

CHOQUE TÉRMICO

Foi um grande choque térmico minha primeira semana em Portugal. Passei muito frio. Um susto por não haver calefação em todo lugar como em NY. Susto de pensar vinte vezes por dia “Eu não tenho mais casa”. Eu tenho andado muito confusa. Agora já vai mais de um ano, bem confusa. E sempre que eu penso que estou começando a entender alguma coisa, tudo desmorona e me fundi a cabecinha novamente. Então estou chegando à conclusão que não é para ser. É para deixar tudo confuso mesmo. Então melhor assim. Tive muita dificuldade para entrar no horário. São poucas horas de diferença, mas foi muito difícil para mim. O sono regularizou, então foi meu computador que quebrou. E computador legal, é aquele que quebra de verdade. Ele não dá pau no software, não senhor! Ele pifa bem em alguma pecinha (que até deve ser muito simples), mas que ninguém quer por a mão porque é hardware, e hardware é uma coisa quem na linguagem de assistência técnica significa enviar meu computador para o mundo de Nárnia. Eu conto a saga do computador em outro post, que até acabou tendo um final feliz (não para os meus Euros… meus míseros Euros…). Então com o meu computador chiando feito cuica em carnaval, eu conheci pessoas muito interessantes. Patrícia e João, um casal encantador e lindo. (Meu Deus! Eles vão ter filhos lindos!) E João é um artista realmente intrigante. Passei a noite pensando nas telas dele. Hugo está virando um anjo da guarda. Ele é tão gentil comigo que eu até me sinto constrangida. Me dá bom dia todas as manhãs pelo FB, me enche de dicas de passeios (que eu preguiçosa ainda não fiz nenhum), e ainda me carregou até Matosinhos na saga da assitência técnica da Sony. Para piorar, ele ainda ouve todas as besteiras que eu digo e acha graça. Achei que teria alguma vantagem na mesa de poker que carol e viriato frequentam. O poker que eles jogam não é o mesmo que eu jogava lá. Eles excluem as cartas baixas como no truco e até aceitam um jogo com 4 cartas (!!!). Não saí da mesa nem empatada com o buy in. Uma verdeira vergonha para uma aspirante a profissional. Humpf! Então fiz planos. Porque eu sou uma pessoa que adora fazer planos. Ia viajar para Braga, Guimarães, talvez Coimbra essa semana. Ia à Ópera na terça. Começar de vez a minha exploração. Mas na segunda-feira à noite deito estranha com dor no corpo. Acordei nocauteada por uma virose completamente inexplicável. E me senti péssima. Não apenas porque 38º de febre é uma coisa que me deixa bem derrubada, mas também porque meu intestino se liquifez por 3 dias. Dizem que esse é o tempo padrão de qualquer virose. 3 dias. A minha foi bem padrão também. Eu não tinha diarráeia desde o tempo que eu precisava de ajuda da minha mãe para esse tipo de coisa, mas como eu acredito que em tudo na vida a gente pode escolher ser uma boa experiência ou uma má experiência (Tudo! Tudo mesmo!!!), eu escolho tranformar 3 dias de diarréia em uma experiência incrível e agradeço aos céus pelos kilos que eu finalmente consegui eliminar e que nem a pholia magra deu jeito! Os planos de começar a explorar foram adiados. Fico tensa pela Carol, que além de receber uma maluca que ela não via há 16 anos, ainda tem que aguentar a garota passando mal na sala deles. Então hoje eu saí para um dia lindo de Sol. Sem me sentir tão afetada pelo clima. Aceitando o frio. Eu ainda tenho dificuldade com o sotaque lusitano. Tenho sempre a sensação de que vou ser mal-compreendida. Ainda não entendo o que estou fazendo aqui. Ainda não entendo o que estou fazendo do outro lado do Atlântico. O que vim buscar. Mas olhando a estranheza da cidade hoje pela janela do autocarro cheguei a conclusão de que eu não tenho de entender. Que meu corpo purgou tudo que eu fiz em um susto em fevereiro. E que agora eu posso realmente começar a viagem. Estou em uma crise que não vai passar tão cedo. Me entregar a ela pode ser a coisa mais libertadora que eu possa fazer. Talvez também a única coisa de que eu sou capaz. Tudo daqui para frente será estranheza. Eu tenho sempre a opção de me maravilhar com o estranho. Tenho milhões de conselhos queridos de para onde eu devo ir. Todos eles eu sei que feitos com amor e certa nostalgia. São pessoas que querem compartilhar comigo experiências que foram incríveis para elas. Eu sou muito grata por ser rodeada de tanto amor. Mas eu acho que agora se inicia uma época de incerteza. De não fazer planos. De maravilhamento com a estranheza. Acho que agora, finalmente, cheguei ao ponto de partida.

quarta-feira, 3 de março de 2010

CORAGEM

Coisas que só aprendo com o meu amigo, irmão, amado Kallel.

CORAGEM = CUORE + AGEM
Agir com o coração.
Coisa para poucos.

PRIMEIRAS IMPRESSÕES

Segunda-feira comecei a me localizar no Porto. Viriato foi muito gentil e me levou para um tour a pé. A cidade toda é muito agradável para se passear a pé. Eu tenho a sensação de estar em um filme de época. O tempo todo. A arquitetura, as paisagens, os figurinos. O Porto é uma cidade extremamente charmosa. As esquinas se desdobram revelando cafés, padarias, lojinhas irresistíveis. O frio dá um tom mais especial, deixa o passeio mais agradável. Tem feito cerca de 10 graus durante o dia, mas as caminhadas ajudam a esquentar. Geralmente só sinto quando sento em algum lugar ao ar livre e o corpo esfria. A população portuguesa é bastante envelhecida. Por todas as ruas há velhinhos passeando, tomando chá, conversando em bancos de praças. Como a locomoção é muito fácil, tenho a impressão de ser uma ótima cidade para se envelhecer. Engraçado que o Porto é uma cidade litorânea e rodeada pelo Rio Douro. Então ouve-se gaivotas e uma abundância de ofertas marinhas nos restaurantes, embora a paisagem seja muito diferente da minha referência de cidade litorânea. Fui com Viriato até Vila Nova de Gaia, onde fica o galpão de seu grupo de teatro. Vila Nova de Gaia é uma das inúmeras cidadezinhas que rodeiam o Porto de forma cornubada. Tão próxima que fomos andando do centro até lá. Fica do outro lado do Rio Douro e é onde estão as vinículas do famoso Vinho do Porto. Todas à beira rio, possuem tours de degustação que vou fazer mais para frente. (Confesso que só liguei os pontos de que o “vinho do porto” é feito na “cidade do Porto” quando já estava aqui. A loirice é uma coisa que fica impregnada no cérebro pelo resto da vida!) O cenário teatral me pareceu muito próximo ao paulista, com as mesmas dificuldades. A diferença é que o universo em que eles estão inseridos é bem menor, então é possível uma expressividade maior. É bem diferente se destacar em uma cidade de 250 mil habitantes, e em uma de 18 milhões. Ainda assim a conclusão é a mesma. Um dos motivos de haverem tantos cafés, restaurantes e lugarzinhos para comer é que, apesar de o número da população oficial ser modesta, todas as pessoas dessas cidades vizinhas trabalham aqui e contruibuem para que o número de pessoas no centro durante o dia suba para perto dos 2 milhões de habitantes. Conheci o lugar onde Carol trabalha. Um clube privado muito antigo (e não o antigo a que temos referência no Brasil, mas antigo de verdade). Ela é a responsável pela biblioteca do lugar, que tem, entre outras raridades, a primeira edição de “Os Lusíadas” de Camões. (eu que sempre considerei a primeira edição de “Dom Casmurro” algo antigo...). À noite fomos ao supermercado e eu protagonizei uma cena de gargalhadas e saltinhos entre os corredores quando vi o preço do vinho. Basicamente E$3 pela mesma garrafa que no Brasil me custava R$65. Decidi que não me hidrato mais com água e estou convencida de que essas pessoas não são todas alcoólatras por uma mera predisposição genética. Em compensação um mamão papaya sai pela bagatela de R$12, mais ou menos. (E quem precisa de mamão papaya, quando pode-se entrar em coma alcoólica por tão pouco?)

Hoje sai pela cidade sozinha. Parando em alguns pontos, tirando fotos, ouvindo o sotaque. Atrás da reitoria da Universidade do Porto (que é um prédio que ocupa um quarteirão) achei um albergue incrível. O Poets Hostel. Me deu uma bela idéia da categoria dos hostels que vou encontrar por aí, e me deixou bastante tranqüila. Eu sei que não vou ficar tão bem instalada como estou no Porto, mas é muito bom saber que as opções de estadia barata são tão fofas. O Porto é uma cidade universitária, então na hora do almoço as ruas se enchem de estudantes que andam aos bandos, conversam, riem. É um contraste interessante com a comunidade de velhinhos que transborda dos bueiros. Na Praça dos Leões eu tentava me localizar para chegar até a Rua Santa Catarina, e um senhor se ofereceu para me indicar o caminho. Ao ouvir meu sotaque brasileiro ficou todo feliz, me deu dicas de todas as paradas que eu deveria fazer, explicou, rexplicou e me abraçou, me encheu de beijos e falava “Oh! Uma moça brasileira, tão boazinha, Oh! Que boazinha você é!”, e me apertava. Eu fiquei lá, no meio da praça, sendo agarrada por um velhinho que estava todo emocionado de me ajudar. Dizia “Obrigada. Muito obrigada.” e tentava delicadamente me desvencilhar dos braços do senhor. Não sei se isso é pela imagem afetuosa que nós precisamos carregar mundo a fora, ou pela fama duvidosa que as brasileiras têm por aqui. Justo eu que detesto contato físico. De qualquer forma, foi a primeira manifestação positiva que recebi por ser brasileira. O portugueses não morrem de amores pelo Brasil, e tem seus motivos para isso. Fiquei algum tempo dentro da Livraria Lello. Uma livraria super tradicional e famosa daqui, tem uma arquitetura toda preservada e os livros dormindo nas enormes prateleiras de madeira. Uma escadaria grande no centro do salão que leva para o segundo pavimento, um café, e a sensação de que eu deveria usar algum tipo de figurino por estar lá dentro. Linda! Um pouco mais abaixo entrei em uma loja fofa, cheia de coisinhas de decoração. Antigamente (antigamente de verdade) era uma loja de tecidos, e os balcões, os caixas, a estrutura toda está preservada. Isso é muito comum por aqui. Difícil descobrir ao certo se uma loja é ou não tradicional, pois os prédios são tão conservados, as estruturas mantidas, que por mais que a loja possa ter sido aberta semana passada, ela tem cara de existir há dois séculos. Atravessei a Praça da Liberdade, subi até o Coliseu para ver a programação. Coliseu é a principal casa de shows e concertos daqui. Com uma estrutura interna bem parecida com a do Teatro Municipal de São Paulo. Perdi uma apresentação de ballet de “A Bela Adormecida” com uma Cia. Russa que foi ontem, mas ainda tinha a opção de assistir uma montagem de “La Traviata” na terça que vem. Agora estou escrevendo no salão do Majestic Café. Fica na Rua Santa Catarina, bem próximo à Fnac. Outro lugar que sinto como se precisasse de figurino de época para estar mais adequada. Não é dos lugares mais baratos dentro dos padrões do Porto, mas nada assustador para uma paulistana. Pedi um “Chá da Tarde”, composto de sanduiches, pãozinhos, geléias e vários doces deliciosos e custa a mesma coisa que um Buffet de café-da-manhã em uma padaria comum em São Paulo. O salão de mármore tem o teto todo desenhado. O encosto do sofá é feito de um couro trabalhado e desgastado. Provavelmente por décadas de pessoas sentando para seus chás. As paredes de madeira emolduram espelhos manchados de tempo. Turistas entram pela porta o tempo todo, disparam flashs. Do outro lado do salão um grupo de quatro senhoras entre os 70 e os 80 anos toma chá e come bolos, conversando muito próximas. Imagino que fazem isso religiosamente, todas as semanas, nos últimos 30 anos. Ao meu lado dois senhores discutem sobre o que fizeram na última semana e olham de tempos em tempos para o meu laptop profanando a atmosfera do café. Um homem acabou de chegar, está se preparando para tocar o piano de calda no fundo do salão. Existe uma melancolia no ar o tempo todo na cidade. No rosto das pessoas, no tom de voz. Mesmo dos mais novos. Não sei se são as máculas de uma crise que não atravessou o Atlântico. Não sei se é uma característica de um povo espremido em uma tirinha de terra na ponta da Europa por 900 anos. Sei que minhas primeiras impressões de Portugal são de saudades de algo que não se sabe bem o que. Começo a entender um pouco de Portugal, e do porque do fado não ser um canto, mas um choro.

terça-feira, 2 de março de 2010

E FARMVILLE DEU O GOLPE


Eu adoro minha fazendinha do Farmville. Acho uma grande higiene mental. Mas também acho uma grande estupidez gastar dinheiro, qualquer quantia que seja, com joguinhos virtuais. Então, obviamente, me rolei de rir quando li isso: http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u700872.shtml

PLEASE ROB ME

Pensando em "público e privado", achei genial esse site. Um grupo de moleques alemães fizeram na brincadeira. Ele coleta dados automaticamente do Twitter, e outros sites de relacionamentos, e divulga uma lista de pessoas que não estão em casa naquele momento. A idéia era mostrar a fragilidade em se expor tantas informações pessoais na promiscuidade do mundo virtual, mas agora tem gente querendo processar os moços.
Sempre acho engraçado a lógica do comportamento humano.

http://pleaserobme.com/

segunda-feira, 1 de março de 2010

POR MARES NUNCA DANTES NAVEGADOS

As armas e os barões assinalados
Que da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;

Acho que todo mundo lembra quando leu esses versos pela primeira vez. Eu tive uma professora de literatura incrível. Embora eu a tenha amaldiçoado secretamente por ter me obrigado a ler “Os Lusíadas”, hoje sou muito grata por ela me ter introduzido a grandiosidade dos poetas portugueses. Lembro de estar de férias, na praia, com aquele livro no colo que parecia uma bíblia. Eu lia e relia os versos sem entender nada, até que a poesia se revelou para mim. E eu tive certeza de que jamais escreveria com essa grandeza. Que aquilo era uma obra única no mundo. Engraçado que nossa educação possui muitos elementos da cultura portuguesa, mas a Portugal que eu conhecia como brasileira tem se mostrado um engodo perto da Portugal que estou entrando em contato. Cheguei já no fim de tarde no Porto. O avião patinava no ar para pousar. Uma chinesa na minha frente até vomitou (eu achei hilário! Sabem que sou terrível...). Fui parada pela alfândega. O cara olhou minha quantidade de malas e deve ter tido certeza de que eu era uma mega-sacoleira. Fiz minha cara de “já fui loira” e expliquei como são as mulheres quando fazem as malas. O cara riu, e me poupou da humilhação de expor minhas calcinhas no balcão. Carol e Viriato me aguardavam na saída. Carol linda, de cabelão e nada diferente da adolescente que eu vi pela última vez há 16 anos. Quando fiquei parada em Madrid imaginei que alguma coisa estava acontecendo, porque todos os vôos de e para Santiago do Chile apareciam como cancelados nos painéis, então Carol me contou sobre o terremoto e me disse que eu estava chegando bem no alerta vermelho de tempestade que eles haviam acabado de receber no continente. A mesma tempestade que havia atingido a Ilha da Madeira há alguns dias. Chegava nesse final de semana, sem a mesma força óbvio, mas fazia o carro balançar. Fizemos um city tour embaixo de muita água e eles me levaram para conhecer o Teatro da Vilarinha, um espaço de amigos deles. Fui apresentada para cerca de uma dúzia de “Ruis” (e eu que achava que Portugal era cheio de “Manuels” e “Joaquins”). O Teatro da Vilarinha é uma graça. Todo estruturado, bem arrumadinho. Faz a gente ter vergonha das espeluncas em que enfiamos o público em São Paulo. O Porto é uma cidade extremamente charmosa. As ruas de paralelepípedos, repletas de prédios antigos e bem conservados. Lojinhas graciosas, cafés com mesinhas na calçada. Um ar muito nostálgico. A casa de Carol e Viriato é incrível. Um duplex térreo, com quintal, muito espaço. No andar de baixo fica a sala, a cozinha bem espaçosa, a sala de jantar, o escritório e uma “casa de banho” que é a que eu estou usando. Em cima o quarto e o banheiro deles, um quarto de vestir e o quarto que estou usando. E Carol é uma fofa em tudo. A casa toda é cheia de detalhezinhos de decoração, quadros, luminárias, bonequinhos fofos, almofadas. Me fizeram sentir em casa em dois minutos. Eles tem um boxer albino, o Babus. E ele está completamente apaixonado por mim. Ele fica me olhando, e senta ao meu lado, e se contorce todo quando falo com ele. Eu aprendi os comandos e fico me divertindo mandando ele sentar e deitar quando ele me segue pela casa. A gente tagarelou praticamente desde que saímos do aeroporto. Fomos jantar em um restaurante perto. Eu já estou eufórica de tão baratos e bons que são os vinhos! Ricardo (a puta portuguesa) apareceu para dar um “oi” e nós voltamos para casa e tagarelamos até às 7h. Dormimos ontem até às 17h e tagarelamos sem parar o resto do domingo. Carol e Viriato são anfitriões incríveis. Eles gostam de receber pessoas e fazem de tudo para me deixar confortável e à vontade e me sentindo em casa. São muito pacientes em me contar histórias e me explicar sobre a cidade, o país e a cultura. Engolimos baldes de café, e chocolates. Falamos de vida, de teatro, do arrebatamento do fado. Hoje o dia amanheceu seco. Um sol gelado, igual aqueles dias de inverno em São Paulo. Carol foi trabalhar. Combinamos de fazer compras no final da tarde. Viriato ainda dorme, mas vai me levar conhecer seu teatro depois. Quero me localizar, me entender na cidade hoje. O Porto é uma cidade pequena. São 250mil habitantes. Fácil de andar para todos os lados. Vou falar mais da Portugal que estou descobrindo. Mas depois. Depois que estiver mais localizada por aqui.