segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

NUTELLA NOS OLHOS DOS OUTROS É REFRESCO




Chega aquele dia em que você resolve jogar a toalha. Descer do salto. Abrir mão de todo seu orgulho. E admitir que precisamos de ajuda. No meu caso vou ser muito sincera. Acordei de um transe semana passada. Engatei um ano de reflexões pessoais, com um vício maldito em um jogo estúpido online. Coisa de quem é gordo, infeliz e não tem mais nada para fazer. Verdade que eu não sou infeliz, e tenho muita coisa para fazer, mas viciei no jogo. Então você vai pensar: Ahá! Tá gorda... Não é que eu esteja gorda (afinal, quem me conhece sabe que isso nunca vai acontecer), mas existe comprovação científica das consequências físicas de Nutella combinada a horas bundando jogando besteira no IPad. Depois de exaustivas pesquisas com mulheres entre 18 e 45 anos, das mais diversas classes sociais, que foram submetidas ao hábito da inércia somado ao consumo de Nutella de colherinha concluiu-se: 80% delas culpam a TPM, mesmo não estando em TPM. 10% culparam os próprios sobrinhos. 5% culparam o cachorro. 3% desenvolveram bulimia, e apenas 2% não sentiram nenhuma diferença por se tratarem de mulheres alienígenas com alto metabolismo e que não engordam com cremes de avelã. De qualquer forma o resultado da pesquisa foi contundente: Nutella faz com que suas formas fiquem mais roliças do que o desejado. Sim! Estou roliça. Pessoalmente acredito em uma conspiração malévola da empresa fabricante de Nutella para alterar as formas das minhas nádegas. Tudo bem que não precisava ficar aquela coisa esquálida de quando eu voltei da Guatemala, mas é de conhecimento público que coxas do tamanho das de assistentes de palco dos programas de auditórios só ficam bonitas em filmes de chanchada ou gosto duvidoso (Dúvida: Ainda fazem chanchadas?). Pode ser um baita preconceito meu (e quem não tem nenhunzinho preconceito, que atire a primeira pedra), só sei que a coisa não está legal. Sábado à noite fui parada por um bêbado na rua para elogiar minhas formas, caminhões de feira adoram buzinar quando estou andando na calçada (mesmo que eu esteja vestindo tailleur e com cara de brava), e ontem um morador de rua não sossegou enquanto não amarrou um balão de gás no meu pulso. De presente. Nutella deixa nossas curvas mais populares. Faz a gente cair no gosto do povo. Ganhar assobio na frente da obra, e ouvir na calçada do Trianon um cantado “Ô lá em casa!”. O que me levou a conclusão de que é uma grande injustiça da mídia nacional ao apelidar de frutas as mulheres roliças que tanto fazem nossos homens salivarem. Mulher melancia, mulher maçã, mulher jabuticaba. Meus senhores! Nenhuma dessas mulheres comeu melão ou banana com aveia para alcançar aquelas curvas. Vamos falar a verdade: estou virando a Mulher Nutella. Daquelas mulheres que passam bem longe da Vogue e se encaixam melhor em folhinhas de borracharia. Deus do céu! Como minhas ambições passam longe da exposição do corpinho em cadeia nacional, e eu sempre fui muito mais Audrey Hepburn do que Marilyn Monroe, tá na hora de assumir o problema, parar com a negação e procurar ajuda. Ah, principalmente: Jogar a Nutella fora! Portanto amiguinhos, vale tudo. Convite para corrida de rua. Indicação de nutricionista. Parceria para passeio de bike. Programa de trekking em montanha. Escalada em parede de alpinismo. Mergulho no final de semana. Dupla pra jogo de tênis. Companhia para massagem modeladora. Endereço de spa. Convite para jantar folhas e, principalmente, não me deixar voltar a fumar. Podem até dizer que eu estou bonita e estou bem e que "para-de-besteira-adriana-você-está-ótima, mas no fundo, quem passa o dia inteiro nesse corpo sou eu. E sou eu quem precisa se sentir bem. 

terça-feira, 13 de novembro de 2012

LEITULA DA VIDA


Sr. Hiroji e a desesperadora situação das linhas da minha mão. 

Esses dias hospedei o querido Dudu aqui em casa. O Dudu é uma dessas pessoas super agregadoras, super coração, que eu herdei de um outro amigo que fiz na vida. Eu adoro herdar amigos de amigos. Vira turma, cria história. Então, Dudu passou uma semana em SP e veio acampar aqui no sofá, já que eu não tenho ainda um quarto de hóspedes. Eu adoro ser anfitriã de São Paulo. Amo tanto essa cidade e adoro levar as pessoas para verem o que eu vejo nela. Em uma dessas, lá fomos nós almoçar na Liberdade no meu restaurante japonês favorito. Um trânsito chato de sábado, paramos o carro alguns quarteirões antes e subimos à pé até o Sushi Yassu olhando lojinhas e amando as calçadas. Foi quando eu vi um senhorzinho sentado em uma mesa de metal, na porta de uma galeria, com uma placa escrito “Leitula da vida”. Sim. Assim. Igual ao Cebolinha. Quer coisa mais adorável!? Como é que a gente pode resistir. Tirei R$20 do bolso, sentei na cadeira e estiquei minhas mãos. Houve um tempo em que eu fui mais crente, em que eu precisava acreditar na segurança de que as coisas estavam por vir. Já fui em cartomantes, tarólogas. Fazia até mapa astral todos os anos. Hoje acredito que essas visões são um pouco simplistas perto das possibilidades da vida. Mas ainda vejo com ternura um senhorzinho imigrante, sentado com um caderninho no colo, esticando uma lupa sobre a palma da minha mão. Tenho certeza que ele crê que aquilo pode ajudar as pessoas. E fico feliz de saber que algumas pessoas encontrem naquilo algum alento. Sr. Hiroji esticou minhas mãos e logo de cara me perguntou: “Você namorado com 34 anos?”. Respondi que sim. Que eu estava namorando quando tinha 34 anos. “Agora, não mais namorado.” Respondi novamente que sim. “Aquele namorado era casamento. Você não casou. Pedeu.” Cuma!??? “Perdeu. Cabô.” Que velhinho sacana! Como assim? Perdeu playboy? É isso? “Agora não casar mais.” Hein!? “Você, boca muito grande. Falar muito.” Quem te contou!? “Falar muito. Homem procurar mulher mais carinhosa.” Tá de sacanagem! “Você, fechar boca.”  E só para encerrar a “leitula”, ainda repetiu: “Cabô. Perdeu.” Pois é! Não se fazem mais videntes como antigamente. Foi-se o tempo em que todos viam que eu seria famosa, casar com uma cara rico e viajar para o exterior. Hoje a coisa é mais PCC: Perdeu, playboy! Claro, que rimos muito disso. Ainda mais porque em seguida o velhinho disse que eu teria 3 filhos. Mas, tirando a brincadeira toda, fiquei pensando muito nessas fórmulas e ideais todos. É como o médico da academia que me sugeriu congelar os óvulos (vide Um, dois, três indiozinhos...). Nessa carência gigante que nos faz buscar respostas nas linhas das mãos ou em cartas jogadas sobre panos indianos. Como se houvesse uma fórmula para ser feliz. Como se o segredo fosse esse mesmo. “Mulher fala muito. Falei pouco e encontrará o amor.” Então eu vejo hordas de meninas desesperadas, se espremendo em ideais que se auto-impõe, simplesmente porque querem ser aceitas. Vão minguando por dentro, assassinando o que possuem de mais lindo e precioso, para se sentirem dignas das projeções inventadas de futuro. Como é que pode haver felicidade se você mata o que faz de você, você? Como é que pode haver amor, se o que te move são os padrões de uma sociedade que você nem sabe se correspondem às suas vontades? Eu sou uma romântica. Sou mesmo, incorrigível. Eu acredito naquele amor absoluto. Poderoso. Naquele amor que abala estruturas e faz o ar faltar. Acredito no amor que faz com que duas pessoas façam sentido na vida. No amor “não-sei-como-vivia-sem-você-antes”. E exatamente por acreditar nisso que não acredito na “sorte” das previsões. Geralmente, as pessoas que conheço e seguem previsões de cartomantes, são mulheres tão inseguras e desesperadas que são capazes de fazer qualquer coisa para se enquadrarem àquela expectativa de felicidade. Inclusive serem infelizes. Se prendem em relacionamentos fracassados. Pior. Geralmente são mulheres que se sentem tão indignas de um grande amor que tratam o parceiro como se ele lhes estivesse fazendo um favor. Tornam-se submissas, ignoram suas vontades. Vivem uma imagem de felicidade fina, tal qual casca de ovo. Acabam solitárias, em seus ideias de vida perfeita. Eu sei que eu sou uma pessoa intensa. O velhinho tem razão, eu falo muito. Geralmente ofusco. Sou para iniciados. Mas se eu for acreditar que isso faz de mim um fracasso... Se eu for acreditar que minha autenticidade destruiu as únicas possibilidades de amor, isso seria negar o próprio amor. Porque eu acredito que a melhor coisa que se pode oferecer a outro é nós mesmos. Inteiros. Sem edição. E se alguém se “assusta”, é porque não era para ser. Não era seu amor. Não era sua alma gêmea. Na verdade, editar-se para outro é desonesto. Você o priva de te ter por completo. Portanto, com toda ternura que o Sr. Hiroji me despertou - e tenho certeza, ele só queria meu bem - não acredito que acabou, que todas minhas possibilidades de amor se foram. Não posso ser menos, nem mais do que sou. E, se o próximo moço não aguentar... Perdeu. Cabô. ;-)

domingo, 30 de setembro de 2012

NÃO SEI SE ADOTO, OU SE COMPRO UM NAMORADO


Vamos falar a verdade. Não é clichê não. Dez entre dez solteiros que moram sozinhos têm em seu maior pesadelo morrer sozinho e ser encontrado dias depois semi-comido pelos cachorros. Ninguém está falando da lógica racional de que eu nem cachorro tenho. E caso algo assim aconteça eu espero que a Holly não coma metade do meu rosto e confio fielmente na Jô em chamar ajuda quando chegar para trabalhar na segunda de manhã. A única diferença é a espécie animal e o tempo que vão demorar para encontrar o corpo. O medo continua o mesmo. No geral eu gosto da solidão. Busquei isso na minha vida. Gosto do silêncio, da rotina. De fazer as coisas que eu gosto sem negociar. Sem depender de ninguém. Mas existem os momentos que a gente sente falta de ter alguém por perto. Na hora da pizza sábado à noite. No frio embaixo do edredon. Naquele dia que foi estressante e dá vontade de abrir uma cerveja e conversar com alguém. Verdade que existem amigos para isso. Os meus faz tempo que não estão disponíveis. Ainda assim, amigo tem uma obrigação mais social. Inclui um programa, um compromisso. Telefonemas e combinações. Por mais íntimos que sejam, não correspondem à necessidade que a gente sente às vezes de estar junto. Tô falando daquela coisa família. Daquela companhia incondicional, que está ali porque vive ali. E da qual fazemos tanto parte da vida, quanto eles das nossas. Hoje cedo tinha planejado um domingão bem solitário. Tava um dia lindo de Sol, eu ia fazer um café gostoso em casa, ler o jornal e ouvir Rachmaninov. Depois pegar a bike e pedalar até o Ibirapuera. Adoro assistir às pessoas no Ibirapuera. Tomar água de côco. Voltar para casa, escrever. À tarde eu ia ao retiro no Centro Kadampa e, dependendo do pique no final do dia, assistir Cosmópolis porque todo mundo andou falando desse filme. Só que logo no “café da manhã gostoso”, fiz uma tapioca, capuccino na Nespresso, esquentei um ovo e... não é que ele explodiu no meu rosto. Quente. Fervendo. Bem na hora que eu colocava a cara em cima dele, pronta para jogar sal e comer. Foi uma explosão e tanto. Holly desapareceu de susto embaixo do sofá pelo resto do dia. Eu olhava em volta, a cozinha coberta de casca e ovo por todos os lado, e meu olho doía muito. Pensei: “Ceguei”. À lá Saramago. Mas não. Dramática. Corri para lavar o rosto e quando olhei no espelho lá estava, meu olho esquerdo todo queimado e vermelho. Então foi nessa hora, nesse momento, que eu me dei conta: Preciso arrumar um namorado! Porque essa é a típica situação em que você precisa correr para um hospital. Você vai largar a cozinha coberta de ovo, trocar de roupa apenas e correr para um pronto socorro (ou para a fila de transplante de córneas). Hoje de manhã senti muita falta de ter alguém que segure a minha mão. Que me diga que eu não vou precisar usar um tapa-olho, e nem vou precisar de cirurgia plástica. E que também eu não vou ficar com o rosto manchado para o resto da vida. É lógico que eu sei que nada disso iria acontecer. A dor era suportável e eu conseguia enxergar meu rosto no espelho, mas não existe nada mais solitário do que dar entrada no pronto socorro em um domingo de manhã. Começa assim, você vai para o pronto socorro sozinha, e quando menos se dá conta não tem ninguém no seu enterro e a única pessoa que chora é a carpideira do plano da funerária. A situação é preocupante, minha gente. Não é tanto pelos momentos que a gente vive, mas a solidão que existe no momento em que se morre. Ninguém deveria morrer sozinho.  Não deveria, mas a gente sabe que vai. No meu caso, como não estava morrendo nem com cachorros devorando meu corpo, resolvi ligar para o K porque ele sempre me salva. Acabei com o domingo dele. Dirigiu até o hospital, me disse que eu não ia precisar de um tapa-olho e nem ficar com o rosto deformado. Depois de eu ganhar uma pomada e um encaminhamento para um oftalmologista, voltamos para casa. K, que tem mais fobia de relacionamentos do que eu, me confessou que não gostaria de morar sozinho. Se não fosse a mãe moraria com um amigo, mas não moraria sozinho. Falei que tenho sentido vontade de adotar uma criança. Ou de arrumar um namorado (embora em alguns casos isso seja praticamente a mesma coisa). K me disse que achava mais fácil adotar uma criança do que morar com alguém. Não sei. Cada um sabe onde o sapato aperta. Talvez eu esteja amadurecendo. Deixando de lado um pouco essa ideia de autonomia absoluta. Talvez eu resolva baixar a guarda, assumir que eu preciso das pessoas. Deixar me envolver em um relacionamento outra vez. Ou eu sempre posso transformar a gata em vegetariana e ensiná-la a discar 190 para pedir ajuda. 

terça-feira, 25 de setembro de 2012




Corridinha depois de meses sem participar de uma. Na minha camiseta estava escrito “Eu corro por mais AMOR”. Haviam camisetas com Solidariedade, Amizade, Paz, Igualdade, Respeito. O minha caiu justamente a “mais AMOR”. O amor me persegue. Acho bom, porque eu também persigo ele. Então eu larguei, percurso de 7K delícia, saindo do Parque das Bicicletas até o Shopping Eldorado. Eu ainda mal ganhando a República do Líbano, no primeiro kilometro e... TIBUM! Sem água. Pisei em falso em um desses olhos de gato da rua e me estabaquei no chão de asfalto. Senti a palma da mão ralada. Uma dor excruciante no tornozelo esquerdo. Parei, tirei o tênis. O pessoal do apoio chegou de bicicleta. Passei gelol, alonguei. Acho que dá para continuar. Se inchar eu paro. Continuei. Me senti guerreira. O corpo já estava quente, então foi fácil não sentir muita dor. Manquei em alguns trechos, andei em outros. No último kilometro a coisa pesou. O andar leve claudicante deu lugar para uma dessas cenas que a gente vê em final de maratona nas Olimpíadas. Cruzei a linha de chegada arrastando a perna, fazendo caretas e imaginando “Carruagens de Fogo” na minha cabeça. Tantan tantanrantãããã! Me sentindo o próprio exemplo da força e da perseverança do esporte. A própria Gabriela Andersen-Schiess. Preparando meu discurso para o Fantástcio. Mas ninguém me deu bola. Sai da linha de chegada e fui direto para o posto médico. Ganhei um saquinho de gelo e um aviso de castigo. Conforme o tornozelo esfriava, as lágrimas desciam pelo meu rosto. Dói, mas não inchou. Cheguei em casa, fiz mais gelo. Enfaixei, tomei antiinflamatório. A dor passou. Pensei que estava tudo bem. Pensei que dava para ver o timão jogar tomando cerveja no Filial, e ir para o aniversário de 10 anos do Bar da Dida, e falar um monte, dar risada, andar para lá e para cá. Até fiz sala para o ex-namorado que resolveu passar férias no Brasil (isso porque estamos os dois muito bem resolvidos, obrigada!). Então, ontem de manhã, o tornozelo parecia uma bola de baseball. Ou melhor, de tênis. Não tenho nenhuma familiaridade com bolas de baseball. Cancelei compromissos, botei o pé para cima. Assustei. Não é que eu sinta dor mais, só que os movimentos estão limitados e parece que sempre vou puxar de mais alguma coisa. Suspeitei que não poderia fazer ballet essa semana. Suspeitei que não poderia correr. Fui hoje ao médico. Ganhei elogio pela corrida. Ganhei puxão de orelha por não ter parado e por não ter ficado quietinha. Tiramos uma “chapa”. Boas notícias. Lesão nível 1. O médico vira e diz: “quatro semanas de repouso”. Respiro fundo, puxo a bombinha de asma, e respondo:


- Ok, doutor. Só quero te pedir umas coisinhas: Vamos diminuir esse tempo aí. Eu nunca quebrei um osso na vida, meu corpo se recupera logo.
- Você é o que chamamos de péssima cliente! Hummm... Ok. Duas semanas. Mas em repouso.
- Repouso é o quê?
- Nada de ficar correndo 7K por aí. Tornozeleira de neoprene durante o dia. Pode tirar para dormir.
- Ok. Outra coisa. Um atestado para eu levar na academia.
- Certo.
- E, por fim. Posso fazer bicicleta?
- Na academia?
- Do prédio, em casa. Não tem atrito, não força a articulação.
- Hummm.... Ok, um pouco. E vou liberar membros superiores.
- Yes!
- Estou até me sentindo mal. Você tão atleta e eu sou totalmente sedentário. 


Amém! Alguém reconhecendo meu esforço. Para alguma coisa havia de servir cruzar parecendo o Smeagol a linha de chegada.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

FUCKING SPECIAL

Hoje a música Creep do Radiohead faz 20 anos. Uau! 20 anos. É um pouco assustador pensar que eu já me conhecia por gente e já era neurastênica 20 anos atrás. Eu tenho uma relação de muita completude com essa música. Pensa só: eu tinha 16 anos. Gostava de um garoto que não me dava bola. Sonhava em escrever cinema. Detestava meu cabelo. Usava camisas de flanela xadrez bem grandonas que cobriam meu corpo até legalzinho, de quem jogava handbol e praticava natação. E tudo o que eu queria era me sentir especial. Daí vem esse cara, cantando com vozinha rouca no microfone, que também gostaria de se sentir espeical, mas que ele é um estranho, um esquisito e que não se sente parte daqui. Bum! Tudo fez sentido. Eu não era a única. Até hoje quando ouço essa música parece que alguém escreveu lendo bem pertinho o que falava meu coração. É verdade também que se sentir estranho e esquisito era uma epidemia quando eu tinha 16 anos, (e definiu todo o movimento grunge, do qual tenho muito orgulho de ser filha e testemunha). Ok, eu sei que todo adolescente se sente estranho e esquisito, é o imperativo. Só que Creep foi escrita uma única vez e somente há 20 anos atrás. Desde então não vi outras coisas calando fundo como essa música. Estou bem longe de ser crítica musical, então não é o caso de dissertar sobre a qualidade musical ou técnica do Radiohead. Só sei que, ainda hoje, quando ouço essa música, minha alma assenta. 20 anos depois eu ainda sinto que não faço parte, e começo a desconfiar de que todos meus contemporâneos acabaram encontrando um caminho para "a perfect body, a perfect soul". Pior, começo a desconfiar de que, talvez, eu nunca vá ouvir essa música como uma balada apenas. Ela vai sempre me descrever... Ainda bem!

Aqui vai uma seleção minha das diferentes vezes que essa música espremeu meu coração.

O clipe oficial com o Thom Yorke merecendo um colo.





Essa é a fofa cena de "And they lived happily ever after" com Johnny Depp e Charlotte Gainsbourg, (os creepies mais descolados do cinema).




Uma animação linda feita com a versão acústica da música.




Maravilhosa em coro, com os suécos do Vega Choir. (Está na trilha sonora de "The Social Network").




E essa é minha favorita: o mendigo Mustard, que ficou famoso cantando Creep nas ruas do Village. (Irônico, não!?) Gosto de pensar que, tanto eu (uma pseudo-perua paulistana) quanto ele podemos nos sentir da mesma forma com uma música. :-)




terça-feira, 28 de agosto de 2012

Birth...

Falei que não ia mais reclamar da vida, então não vou falar sobre o meu aniversário.
A única coisa que importa é que agora eu tenho 36 anos. 

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

PRECISO muito disso!



1001 maneiras diferentes de cozinhar melanzane


Acho que viajei mais nesses últimos 3 anos do que na minha vida inteira. É legal sim. É um puta privilégio. Um pouco cansativo também. Na minha última viagem eu ficava me perguntando como consegui ficar aquele tempo todo na mochila em 2010. Sem dúvida que os amigos que me abrigaram por jornadas mais longas no meio do caminho foram essenciais. Por mais maravilhoso que seja viajar, se você não tiver a mínima referência de casa, vai enlouquecer. De verdade. Trombei com vários que estavam bem fora da casinha. Cruzaram a linha. Ficaram tanto tempo fora que talvez nunca mais sejam capazes de voltar. Eles possuem uma certa ânsia nos olhos, e ficavam largados pelos hosteis. Estavam 2-3 anos fora de casa. Já não sabem mais nem definir suas nacionalidades. É muito sedutora a vida na mochila. Ela te chama, te clama. Você quer muito ir, mas depois de um tempo dá medo de não voltar. Eu sempre fico maquinando maneiras de descobrir o meio termo. Sempre disse que quero criar meus filhos na mochila, trocando fralda em aeroporto. Já não tenho mais essa ilusão. Pela simples razão de que não acredito mais ser possível encontrar alguém com o mesmo pique. Alguém que goste da mochila, sem ter dreads e ser hippie; ou que ame a cidade e todas as frescuras que eu gosto nela, sem ser um coxinha empertigado. De qualquer forma, não vem ao caso. Tirei umas férias esse mês e, embora em um primeiro momento meu impulso tenha sido de narrar a viagem como sempre faço por aqui, dessa vez senti que precisava de fato ficar em silêncio. Tenho sentido a vida me fechando tantas portas, e eu precisava ficar quietinha para poder ouvir onde as outras estavam se abrindo. Foi ótimo. Achei foco. Achei o que eu queria no meio da balburdia que eu sou. Voltei com o olho na bola. Decidida também a cortar o cabelo e fazer uma tatuagem. É. Viajar pode ser perigoso também. Dessa vez dei uma passada em Portugal, só para ver pessoas que eu amo e que não posso ver todo dia porque o mundo é muito grande e coloca pedaços da minha alma espalhados entre oceanos. Talvez por isso eu sinto que preciso sempre partir. Depois eu e a Keka embarcamos para a Itália. Primeiro porque ela não conhecia. Segundo porque em Roma foi um dos lugares onde eu fui mais feliz. E é sempre legal voltar para lugares onde se é feliz. O mais gostoso é descobrir que aquele lugar te desperta ainda mais amor do que você tinha pensado. De uma forma que eu só conseguia suspirar pontualmente ao longo do dia “Eu amo Roma!”. Sim, e Roma é amor ao contrário. Ela estava lá, do jeitinho que eu lembrava. Com o metrô caótico, as ruas cheias de turistas. O calor escaldante, os nasonos jorrando água. Os melhores gelatos do mundo. Depois descemos para Nápolis, que foi bem decepcionante. Feia, suja, perigosa. Totalmente dispensável. E de lá, Erna nos encontrou e embarcamos em um Panda pela Costianera Amalfitana até Réggio di Calábria. Foi lindo. Foi como viver em um filme. Aquela costa deslumbrante, de mar azul e seixos quentes. A água salgada e transparente. Os dias intermináveis à 40o e spritz ao final da tarde com aperitivos. Vilas medievais. Vielas que nos imploravam por fotos. Na Calábria encontramos Schilla. Uma vilazinha de pescadores que foi paixão imediata das três. Víamos o Sol se pondo quase na Sicília, e jantamos sobre pallets com uma lua cheia gigante refletida na água. O melhor de ter feito tudo isso, foi ter feito sem a neurose de mandar emails, trabalhar, verificar mídias sociais, falar em skype. Sem nenhuma interferência que me tirasse da viagem. Apesar de ter viajado tanto ultimamente sempre estou com interferências me deixando incompleta na viagem. Isso devo muito à Itália. O italiano vive o momento. Ele é muito inteiro no que ele faz. Se ama, ama. Se chora, chora. Se está vivendo aquele momento, ele vive o momento por inteiro. Acho que a vida cosmopolita nos impele a ser multitarefados demais. Não basta tirar férias, é preciso atualizar status de FB, twittar a previsão do tempo, mandar email pro povo do escritório. Eu resolvi assumir o italian way of life e quando chegamos em Schilla eu já tinha certeza de que, embora eu seja feliz na minha vida e goste das coisas que eu faço, eu não estava vivendo a vida que amo. Porque existe uma diferença entre gostar e amar. Sim, eu gosto do meu trabalho. Não, não é a coisa que mais amo. Acho que se não tivesse feito essa descoberta tão óbvia até Schilla, não teria tido uma experiência tão formidável na Sicília que estava para vir. Erna se despediu em Catânia. Eu e Keka continuamos na Sicília, seguimos para as Ilhas Eólicas e depois encontramos Fran em Palermo para seguir para Trapani e as Ilhas Égadi. Talvez seja a baixa expectativa, já que eu esperava da Sicília uma paisagem desgastada e maltratada. Talvez seja porque aquelas ilhas são mágicas mesmo. Mas eu me rendi, me bronzeei. Descobri mil maneiras diferentes de comer melanzane (a nossa berijela). Me fartei em comidas, cheiros, vinhos. Tudo encharcado de azeite (e que azeite!), de molho de tomate tão fresco e tão doce. Tardes engolindo azeitonas. Longas caminhadas, mergulhos entre água-vivas. Desencanei do peso, das manchas na pele. Das roupas sujas de tanto tempo de mochila. Tem algo dentro de mim que é italiano. Tem algo que mora ali, naquele mar mediterrâneo. Voltei mais cedo. Quando se resolve o que quer da vida, não temos muito mais vontade de enrolar. Naquele mar resolvi o conflito do meu livro, reconquistei minha vontade de me apaixonar. Resolvi também a trama para mais dois livros e inspiração para um outro. Assim, em algumas semana, quatro livros. Quatro tatuagens. Eu nunca comprava berinjela em casa. Nunca sabia o que fazer com ela. Essa semana fui à quitanda. Na geladeira tem dois tipos diferentes de berinjela. Manjericão, limão siciliano, abobrinha, cogumelos. Só o tomate que não deu certo. Tava feio e tão caro! Eu, particularmente, gosto da vida com sabores frescos. Muitas vezes é só descobrir o que fazer com os ingredientes. 

(PS.: eu ainda vou voltar para a Sicília, aprender a cozinhar e escrever um livro com esse nome: “1001 maneiras diferentes de cozinhar melanzane”)

sábado, 4 de agosto de 2012

Eu estou fazendo brainstorm aqui com a Keka, tentando descobrir que filme nacional termina com uma cena de duas pessoas se encontrando em uma rodoviária, em um aeroporto, ou em uma junção de caminhos...

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Dolce far niente


Embora eu viaje mais do que o Lula na época do governo, estou no meio das minhas férias oficiais. Minha ânsia por conhecer o mundo antes de morrer queria carimbar o passaporte com outros países inéditos no álbum de figurinha, mas daí entre conversas com a Keka, planos de visitar a Carol no Porto, acabei pegando as milhagens guardadas e investindo tudo em uma volta ao Velho Mundo. Passei uma semana em Portugal revendo amigos e embarquei de volta a Roma, um dos lugares onde fui mais feliz durante meu ano sabático. Existe uma coisa curiosa quando você revisita um lugar que lhe é importante. Nos damos conta do tempo, da jornada. De tudo o que eu buscava quando estive na Itália pela primeira vez. A Itália foi um lugar em que eu amei. Amei em toda complexidade do verbo. Amei lugares, amei prazeres, amei amigas, amei um garoto. Mas uma das coisas que eu havia esquecido, é que foi na Itália que eu mais me amei. Foi um pouco chocante voltar e descobrir em mim como tem escapado tudo o que eu fui em busca e conquistei. Como eu deixei a vida me engolir novamente e me perdendo de mim mesma. Verdade que encontrei muitas outras coisas. Algumas de forma dolorida, outras alentadoras. Eu engordei. Perdi tantos amigos. Mas voltei ao vegetarianismo com uma propriedade enorme, e encontrei o budismo. Virei mãe de uma gata. E descobri que posso ser boa profissionalmente em tantas coisas. Fui capaz de reconstruir uma rotina e montar uma vida. Só que não é exatamente a vida que eu queria. Não estou reclamando. Tenho uma vida muito boa. Mas será que depois de ter ido tão longe, abdicado de tanta coisa, era essa a vida que eu buscava. Eu tive a sorte de ganhar um bilhete em branco, para ser o que eu quisesse. E é isso que eu estou fazendo com ele? Porque é tão fácil se perder de nós mesmos? Sempre achei que o mais difícil era largar tudo e pular. Porque então eu insisto em voltar para o mesmo lugar? Eu penso se talvez nossas frustrações pessoais não venham exatamente do medo de se reinventar de verdade. E se não agora, quando? Se existe um lugar no mundo onde eu me sinto inteira é na Itália. Talvez porque ela vá sempre permanecer. Talvez porque entre a bagunça e o barulhos dessas cidades, as pessoas vivem. Eles falam, gritam, brigam, comem. Mas de todas as pessoas no mundo, os italianos são os únicos que estão inteiros no momento. É o “dolce far niente”. A capacidade de aproveitar o momento com calma, de absorver a vida com tudo o que ela tem. Mesmo carregando o peso de toda a história da civilização ocidental, as coisas são no momento. Nunca deixaram de ser. Por isso a Itália vai permanecer. Mesmo com a crise, mesmo que o Euro quebre semana que vem. A Itália é um país eterno. E se você não é capaz de ser inteira aqui, não será em nenhum lugar. Nós descemos de Nápoles pela Costa Amalfitana, comemos kilos de pizzas, risotos e pasta. Tomamos vinhos, graniti di limone, gelato todos os dias. Como se cada dia fosse o único que nos sobrasse. No budismo acredita-se que você deve meditar sobre a morte. Sobre a possiblidade da morte. Somente sentindo verdadeiramente que a morte pode acontecer a qualquer momento, daremos o valor e a importância que o dia de hoje tem. A vida é uma benção. Não é glamurosa, nem extraordinária. Não vem repleta de aventuras mirabolantes como filme hollywoodiano. Mas é uma benção e acontece em um só momento: agora. Por isso é pouco passar os dias sendo quem você não quer ser. E se não agora, quando?

quinta-feira, 2 de agosto de 2012


Ando precisada de esvaziar-me. Passei o último ano procurando sentido para justificar minha vida e acabei perdendo tudo aquilo que fui em busca. Só agora, à distância, começo a enxergar que não tenho nada que me segure. Nada na minha vida. Embora eu tenha passado os últimos meses sentindo como se isso fosse uma perda enorme, começo a entender que é uma grande liberdade. Busquei tanto me encontrar e quando voltei me perdi na ideia do que eu pensava possuir. De São Paulo só sobra o amor que sinto pela cidade. A família, que sempre será minha não importa onde eu vá ou o que eu faça. As portas estão se fechando. Tenho apenas uma última missão para terminar. Depois, vou cortar o cabelo, comprar uma passagem e nunca mais voltar. Esse é o plano.

Ando precisada de esvaziar-me. Passei o último ano procurando sentido para justificar minha vida e acabei perdendo tudo aquilo que fui em busca. Só agora, à distância, começo a enxergar que não tenho nada que me segure. Nada na minha vida. Embora eu tenha passado os últimos meses sentindo como se isso fosse uma perda enorme, começo a entender que é uma grande liberdade. Busquei tanto me encontrar e quando voltei me perdi na ideia do que eu pensava possuir. De São Paulo só sobra o amor que sinto pela cidade. A família, que sempre será minha não importa onde eu vá ou o que eu faça. As portas estão se fechando. Tenho apenas uma última missão para terminar. Depois, vou cortar o cabelo, comprar uma passagem e nunca mais voltar. Esse é o plano.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

BACK FROM PARATY


O último dia de Flip foi mais reflexivo. Eu troquei a mesa do Suketu Mehta para ir à coletiva do Ian McEwan. Depois me arrependi. Não porque pela coletiva, que foi incrível. Mas por não poder estar em dois lugares ao mesmo tempo. E a mesa do Ian estava LO-TA-DA! Super concorrida, tava até calor lá dentro. Junto dele estava Jennifer Egan, uma das poucas mulheres de uma versão cheia de cromossomos Y da FLIP. Acho que foi a melhor mesa de todas. Os dois muito abertos, muito simples, e muito generosos com a plateia. Sem ficar regulando. Deram o que puderam no pouco mais de uma hora. É bom para refletir. E foi exatamente o que eu resolvi fazer. Resolvi sumir por um dia e refletir sobre o que eu quero, minha falta de foco e a habilidade de conseguir isso. Fiquei algum tempo andando pela cidade, que estava cheia, barulhenta e insuportável. Impossível tirar fotos, flanar, simplesmente parar em uma esquina e assistir a vida, porque logo alguém tropeçava no seu pé, ou dava um trombão no seu ombro. A contemplação não é muito amiga de pequenas cidades históricas super povoadas e ruas irregulares de pedras. Então resolvi experimentar o restaurante thailandês que eu tinha passado em frente em uma das andanças (e tinha um garçom tatuado gatinho). Como tudo na cidade estava caótico, cheio e insuportável, eu fiquei meio esquecida em um canto, em uma mesa sozinha, e tive o tempo de silêncio e contemplação que eu estava precisando. Li metade de um livro. Fiquei pensando nas escolhas e no comportamento que as pessoas acabam seguindo na vida. Quanto das nossas escolhas são nossas mesmo, ou são projeções do que consideramos ser o ideal para nós? Parei um minuto e percebi que 90% do meu dia é dedicado a coisas que não escolhi fazer. São coisas que fui fazendo e acabaram tomando conta da minha vida. Por isso tanto sofrimento para terminar meu livro. O coitado do livro não tem culpa. Fiz uma longa refeição pensando em algumas coisas que preciso decidir definitivamente. A caipirinha ajudou, confesso. Então voltei para a tenda para pegar a mesa com Zoé Valdés e Dany Laferrière. Eu queria muito ouvir a Zoé, porque adoro os cubanos e adoro qualquer livro que fale sobre a bizarra vida que resultou após o embargo. Acho mesmo que o mundo um dia vá virar uma grande Cuba. Mas isso é só minha opinião. O Dany Laferrière eu só tinha visto o livro na livraria (e largado na estante), mas não tinha ouvido falar nada dele. Achei que seria interessante um painel com dois exilados de países latinos, mas detestei o haitiano. Egocêntrico, narcisista, machista. Típico homem que foi criado rodeado por mulheres, e acha que elas devem alguma coisa a ele. Ok, que ele fez algumas observações interessantes (e todo mundo sabe que narcisistas podem ser até que bem charmosos quando querem), mas não existe milagre nesse mundo que me fizesse ler um livro desse cara. O problema do mundo é exatamente esse. Tendemos a perdoar um homem por qualquer canalhice desde que ele escreva/ toque/ componha/ atue ou faça qualquer coisa considerada descolada bem. E isso me leva a uma nova reflexão de vida. São mais de 3 décadas convivendo com narcisistas (não admira eu ter me tornado uma!). Chega né!? Na verdade no final do domingo eu tinha a sensação de ter tido muito. Muita informação, muita reflexão, muitas decisões, e definitivamente, muitas topadas nas pedras de Paraty. Tudo o que eu queria era sair logo de lá e fazer coisas práticas. Por mais que se discuta, que se fale, pense, especule, na prática o que precisa ser feito é sentar a bunda na cadeira e escrever. Ação. A vida é verbo. Eu ainda tenho uma viagem agendada logo mais. Vai ser minha despedida temporária. Chega de rua, chega de cursos, chega de viagens, expedições malucas. Quando 90% do tempo você está fazendo coisas por fazer, falta verbo. Falta ação.

sábado, 7 de julho de 2012

DIÁRIO DA FLIP - LOUCOS EM PARATY



Só hoje, sábado, é que consegui assentar e organizar um pouco mais o tempo. Os outros dias foram uma loucura de informações, e correria. Muita coisa para assimilar e a sensação constante de não estar realmente inteira em nada do que estava fazendo. A internet falha, os restaurantes lotados. O sono desgraçado que me atacava no meio da tarde. Hoje me sinto mais serena pela primeira vez. Ontem foi maratona. Trabalho, fotos pela rua, mesas interessantes. Teve Shakespeare ao meio-dia, disputadíssima. Depois Teju Cole e a única mulher que vi até agora, Paloma Vidal. Uma mesa que acabou prejudicada pela arrogância e falta de tato do mediador João Paulo Cuenca. Unanimidade nos comentários pós-mesa: “Pior do que o Jô entrevistando.” De onde eu venho isso não é elogio. À noite uma das grandes atrações que eu aguardava ansiosa. Jonathan Franzen em bate-papo com Angél Gurría-Quintana. No surto psicótico que eu tive na Livraria da Vila na quinta peguei os livros do Franzen umas 3 vezes na mão, mas devolvi sem a mínima vontade de ler. Imaginei um cara lento, prolixo e chato. Fui totalmente surpreendida com a conversa dele. Primeiro que o cara já entrou no palco correndo, meio como participante de programa de auditório. Fiquei imaginando que ele acenaria para a plateia e protagonizaria provas à lá Domingão do Faustão. Bizarro. Aliás, bizarro é a melhor definição para o cara. Um ser excêntrico que alternava períodos de silêncio viajandão, com um humor e auto-crítica, e discurso de raiva contra republicanos e o governo Bush. De longe a mesa mais interessante até agora pela peculiaridade e sair totalmente do lugar comum. Sim, o cara é louco. Totalmente lelé da cuca. Dizem pelas esquinas de Paraty que ele pediu para se hospedar sozinho em Ubatuba, longe do burburinho, e que é observador de pássaros e tem feito expedições no meio do mato. Eu posso bem imaginar o cara andando e falando sozinho pelo quarto, chacoalhando os punhos pelo ar e bradando frases de ordem revolucionária. “Die Bush, die!”. Fiquei apaixonada. Se existe algo que faz um escritor interessante é a completa falta de tédio de sua personalidade. Hoje, todavia, é o meu dia mais aguardado. Daqui a pouco tem a mesa com Ian McEwan e Jennifer Egan. Disputada à foice. Eu aproveitei os privilégios da minha credencial de imprensa hoje cedo e fui à coletiva de imprensa. Eu até tento ser blasè, mas eis uma coisa que não combina com meu sangue latino. Quando vi a cabecinha branca e inglesa do Ian, quase dei gritinhos. Me encostei na parede e assisti àquele senhor que escreve livros tão lindos e tão tristes falar com uma lucidez fenomenal sobre sua literatura, seus livros, e a maneira prática e límpida que encara o ofício. Por mais interessante que seja a loucura, definitivamente a solidez e a concretude da lucidez é furiosa. Tão oposto ao outro maluco americano. Muito curioso presenciar os dois em seguida. Dois extremos de um mesmo ofício. Ao mesmo tempo dois países que já experimentaram dias melhores. Não consegui evitar associar a tranquilidade e elegância de Ian com a sabedoria de um país que já foi um império e hoje sobrevive exatamente em saber enxergar os sinais dos tempos e se posicionar diplomaticamente no mundo. Enquanto o outro ainda carrega a angústia e a negação do que não considera ideal, brada revoltas, se debate, infla o ego acima da realidade prática cotidiana. Ainda que genial. Definitivamente, os EUA estão fora da casinha. Não sei se é preciso envelhecer, ou amadurecer. Acabei ficando com a sensação de que posso até ler Franzen, voltar à livraria e comprar seu livro. Mas McEwan é aquele que se perpetua, aquele que vamos ler todos os lançamentos, e continuar lendo depois de anos. Diplomaticamente.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

DIÁRIO DE PARATY - WOODSTOCK


Ontem o Edu me falou: “Daqui a pouco você vai perceber que isso aqui é o Woodstock da Terceira Idade”. Eu entendi o que ele quis dizer. A Flip é badalada. A cidade está apinhada, restaurantes lotados, gente para todos os lados. A expectativa é chegar em 25 mil visitantes no sábado. Vai ser legal manter barrinhas de cereal na bolsa, porque vai estar impossível sentar em algum restaurante. Mas porque uma pessoa viria à Flip se não é apaixonada por livros? Em síntese o que acontece o dia inteiro é que um monte de escritores sentam com outros escritores e respondem perguntas de mais escritores, sobre os seus livros, ou como escreveram seus livros, ou porque escreveram seus livros, ou como gostam de escrever seus livros, e que livros liam quando escreveram seus livros. Como a maioria das pessoas que eu conheço dizem que gostam de ler livros, mas gostam mesmo é do efeito decorativo que o livro dá à mesinha de cabeceira do quarto, dá para entender que neguinho para se enfiar cinco dias chutando pedrinha nas ruas de Paraty, só mesmo sendo apaixonado por literatura. E nisso a terceira idade sai ganhando. É um festival de cabecinhas brancas. Velhinhos e velhinhas em caravana, grupos de amigas fofocando nos cafés. Eu fico eufórica de saber que, enfim, minha vida social pode ter algum tipo de salvação. Mesmo que minha turma não tenha exatamente a mesma faixa etária. Hoje cedo fui para a sala de imprensa logo depois do café da manhã. A internet virou artigo de luxo e estava todo mundo reclamando. Ficava um tempão fora do ar, e quando voltava todo mundo corria para postar, mandar emails, fazer upload de fotos; o que durava 5 minutinhos, até aparecer a página de erro no seu browser novamente. Então eu pegava um café, puxava papo com os jornalistas do meu lado, e esperava a próxima onda de conexão. O 3G também é lenda urbana. Vi gente dizendo que postou foto no Instagram, mas só acredito vendo. O meu é totalmente inexistente. Depois peguei a coletiva de imprensa do Enrique Vila-Matas. Ok, eu não vou bancar a jornalista investigativa, mesmo porque eu não engano ninguém, e eu não tenho pauta nenhuma para escrever. Então o que eu fiz foi ficar quietinha na mesa, gravar tudo e anotar o que achava interessante. Algumas coisas deram para ser usadas como conteúdo. Outras anotei para mim. O que mais gosto de ouvir de escritores consagrados é sobre seus métodos de trabalho. Escrever é, talvez, um dos ofícios mais solitários que existem. Eu sinto muita falta de interação, de troca. Só quem escreve sabe como é torturante o processo de erro e acerto, e revisão, e tentativa, e comiseração. Aos poucos cada um vai criando um processo para facilitar o trabalho, melhorar a qualidade, otimizar o tempo. Acho que por ser um ofício tão pessoal, a gente não encontra um “Manual do escritor” para vender nas bancas. Não existe uma regra de como organizar seu tempo, ser disciplinado, facilitar a criatividade. Existem momentos em que a coisa flui miraculosamente. Outros de um desespero descomunal. E nesse processo todo a gente escreve muita coisa ruim, muita coisa que vai para o lixo. E muita coisa que somos capazes de matar para não deixar ninguém ler. Literatura não é texto de blog, que eu sento na cama antes de dormir, digito o que vem na cabeça e posto sem nem revisar os acentos. Literatura é ruminada. E esse processo de criação, a maneira como cada escritor trabalha e retrabalha seu texto, pode ser a diferença entre um romance de sucesso ou um texto nunca terminado. Por isso quando o Enrique Vila-Matas disse que imprime cada capítulo, trabalha à mão no papel, depois volta para o computador para reescrever, imprime novamente, volta para o computador... Eu achei brilhante (embora totalmente insustentável). Quantas vezes tive vontade de voltar para versões antigas do meu romance e que se perderam completamente em arquivos interminados e “salvar como” que nunca mais encontrei. Por mais que a virtualidade nos ofereça a praticidade da condensação do espaço físico, nada como manter uma trilha real de migalhas de pão do seu percurso para ter certeza de que vai chegar até o fim. A coletiva me garantiu material para o resto do dia, então resolvi tirar folga. Fechei o computador e assisti às duas mesas da tarde sem nem olhar para o celular. Me apaixonei de imediato por Alejandro Zambra. Corri comprar o livro dele assim que saí da tenda. Comprei outros 13 livros também. Sempre tive problemas com limites, não vai ser agora que isso vai mudar. Depois uma deliciosa mesa com Javier Cercas e Juan Gabriel Vásquez. Dei uma volta pelas ruas do centro histórico sozinha. Tirei fotos. Me senti apaixonada novamente. (E olha que faz muito tempo que não me sinto apaixonada). Tantas coisas que eu gosto tanto. Livros, histórias, literatura, pessoas andando pelas pedras, as luzes nas janelas das esquinas históricas, fotografias com cores de fábula. E eu me sentindo inteira como há muito não me sentia. Com aquela certeza de que estou exatamente no lugar onde eu deveria estar. Resolvi não assistir à última mesa, (era Fernando Gabeira e Luiz Eduardo Soares falando de autoritarismo). Encontrei a Lu para jantar em um restaurante bacana no centro. Tomamos vinho branco. Falamos sobre os livros. E na saída tivemos momento frissón ao ver Luis Fernando Veríssimo e Zuenir Ventura do nosso ladinho. Eu fiquei exausta desse primeiro dia. Sempre disse que sou uma senhoura de 85 anos aprisionada nesse corpinho de 35. Tudo o que eu queria era voltar para a pousada e começar a ler “Bonsai”. Dormir cedo. Ficar em silêncio assimilando tudo. Muito longe do rock and roll. Assim como minhas colegas da caravana da Terceira Idade, esse é sem dúvidas o meu tipo de Woodstock.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

DIÁRIO DA FLIP - LIBERTADORES EM PARATY



A primeira FLIP a gente nunca esquece. Dizem. Há anos tenho muita vontade de vir. Às vezes faltava recursos ($), às vezes faltava amigos. Dessa vez uma união cósmica (que só ocorre de 100 em 100 anos e pode ser vista a olho nú na altura do Trópico de Capricórnio) permitiu. Apareceu uma pousadinha conveniente, um pessoal do grupo de escrita começou a agitar, compramos convites para as mesas há um mês atrás, rolou até credencial de imprensa, e ontem às 13h14 eu peguei Domi na casa dela e nos metemos na estrada para Paraty. Primeira observação: porque é mesmo que eu faz tanto tempo que não desço para o litoral paulista? Porque é mesmo que faz 15 anos que não venho para Paraty? Eu havia esquecido como nossas paisagens são maravilhosas. A serra tropical possui mesmo uma aura mais humana, mais de verdade. E eu devia considerar usar alguns dos meus finais de semana procrastinadores para fazer umas trilhas por aqui. Tão lindo e tão perto. Domi é uma querida do meu grupo de escrita, e vai ser nossa anfitriã no upgrade do grupo no segundo semestre. Ela ainda é uma mulher forte, bonita, com sobrenome kilométrico de realeza. Acho fina. A gente tagarelou até chegar em Paraty, o que me deu ate certa dor no maxilar. Chegamos em cima da hora, tempo só de largar a bagagem no hotel e correr para as tendas para assistir à abertura. Eu ainda passei na sala de imprensa, sofri com a internet e peguei a programação de coletivas (vai ser legal demais poder participar das coletivas!!!). A internet está de fato sendo um grande desafio. Eu entendo que, um evento desse porte muitas coisinhas podem acontecer, detalhes e problemas aparecem só quando são colocados em uso mesmo, mas dá para ver que o pessoal da organização também está se matando para dar conta. De tempos em tempos eles precisam dar um reboot no servidor e daí gritam para os jornalistas “salvem seus textos!”, todo mundo salvando o texto e ficamos sem internet por uns 5 minutos até que ela volte. Mas funciona por uns 10 minutos e cai novamente. Acho que é para entrar no clima do tombamento histórico. Internet tombada! Well, well. A palestra de abertura foi quase técnica demais. Luis Fernando Veríssimo estava super nervoso, tremia segurando o papelzinho. Legal ver esses mitos em situação humana. Eu também tremeria igual vara verde no lugar dele, e talvez isso nos faça parecidos em alguma coisa. Pelo menos em alguma coisa. ;-) Depois foi o impecável Silviano Santiago fazendo um resgate da trajetória de Drummond através de uma análise de suas poesias. Lindo. Parecia aula de Literatura. Era, não era? E o Antonio Cicero, que tem aquela cara de mau, aquela voz potente, e esmiuçou alguns poemas com tanto (acho que a palavra certa aqui é “culhão”) que me fez lembrar o tanto que eu amava poesia na minha adolescência e me sentir um pouco culpada por negligenciá-la hoje em minha vida. Nunca mais li poesias. Acho que quando você deixa de ler poesias é porque está abdicando de um tantão de paixão na vida. Aliás, paixão era o que mais dava para sentir na palestra dele. O cara falou com sangue no olho. Desconstruiu a abstração típica em algo concreto, real, tocável. Eu apaixonei. Se você não consegue falar sobre algum assunto na sua vida com aquele sangue no olho, você está fazendo algo errado, meu amigo! Embora a abertura tenha sido um pouco “dura” por ter priorizado a técnica à emoção, eu gosto do que me instiga a pensar e fazer e sentar a bunda e escrever, mais do que o circo. Mesmo porque o circo para mim viria logo depois. Minha grande preocupação era onde ver a Final da Libertadores e o meu Coringão. A programação da FLIP apresentava um show com Lenine para a noite de abertura. Cheguei até a questionar a organização se eles iam atrasar o show ou algo assim. Achei sacanagem colocar o Lenini para competir com o Corinthians. Tadinho do Lenini, gosto dele. Mas competir com final da Libertadores... Isso é bullying. Sinto muito querido Lenini! Eu vou ver meu time ser campeão. Senti falta dos manos, senti falta do bando de loucos. Mas eu, o Edu, a Lu e algumas amigas dela sentamos em uma chopperia quase na periferia de Paraty (as mano as it gets) e roemos as unhas, comemos batatas fritas frias e vimos o meu time amado acabar com a piada favorita dos anti. Fiquei triste pela piada. Tenho vários amigos que gostavam de usá-la contra mim. Acho que estava acontecendo uma conjunção astral rara mesmo. De repente as coisas acontecem tão calmas e tranquilamente quanto nunca. Eu dou um ponta pé no passado, finalmente realizo coisas que nunca realizei antes, meu time ganha a Libertadores, e eu ainda tenho 4 dias de literatura pela frente. Agora, vou correr aqui. Me enfiar na coletiva do Enrique Vila-Matas. Ficar quietinha e ouvir. Coisa que também eu quase nunca faço. Deve ser a tal conjunção astral. 

terça-feira, 3 de julho de 2012

CORRENDO ATRÁS DO RABO


Minha gata corre atrás do próprio rabo. Eu acho engraçado, geralmente é um comportamento associado a cachorros. Ela sobe em cima do sofá e, de repente cisma com o rabo e começa a perseguição. A veterinária-tia disse que é normal. Que alguns gatos acabam inclusive destruindo os próprios rabos. Ficam com o rabo careca, peladinho, igual rato. É uma ação estúpida, não é mesmo? Correr atrás do próprio rabo. É engraçado e nos faz enternecer pelo serzinho naquela função inútil. Então por que diabos será que a gente se pega em momentos da vida correndo atrás do próprio rabo. Parada em cima do sofá, andando em círculos tentando alcançar algo que sabemos o que é o onde vai dar? De vez em quando a gente dá um basta. Ou pelo menos tenta. Eu tenho meditado muito sobre desapego. É o tipo de coisa que a gente almeja mas não consegue ter uma noção prática do que é. Desapegar não é apenas não dar valor desnecessário a coisas materiais. Desapegar inclui ideias, vontades, carinho e amor inclusive. Ainda mais quando você está “no sofá” sem fazer nada, sem muita coisa rolando a sua frente, a vontade de virar e correr atrás daquele rabo que está ali, você já conhece, já sabe como é, fica ainda mais tentadora. Não posso dizer que não tenho evoluído. No meu ritmo, do meu jeito, ando muito orgulhosa das minhas conquistas pessoais e espirituais. Mas estou subindo por uma escada em caracóis. De tempos em tempos me pego rodando no mesmo lugar, perseguindo coisas que já tinha abandonado lá atrás. Porque será que a gente faz isso? Medo? Carência? Falta de paciência de esperar? Às vezes é preciso dar um basta de verdade. Para conseguir subir um degrauzinho. Estamos vivendo uma época de culto à felicidade incondicional, do “todo mundo se relaciona com todo mundo”. Eu acho que isso deixa a gente estagnada. Tentando resolver coisas antagônicas simplesmente porque não pega bem abrir mão das coisas, das pessoas. Então somos pessoas incompletas, amigos incompletos, profissionais incompletos. Porque se você “curte” muita coisa, twitta, coloca foto no instagram, faz check in e mantém a popularidade administrada em todas essas novas esferas de relacionamento, é impossível você realmente se relacionar com uma pessoa de verdade. Como diz Brecht, não se come a carne sem matar a vaca. Mas eu sou vegetariana. E isso também é uma escolha. É desapegar de algumas coisas para escolher trilhar um outro caminho de forma mais real e profunda. Mesmo porque eu aprendi que, quando a gente corre muito atrás do próprio rabo, ele acaba mesmo machucado. Peladinho igual rabo de rato. Se foi preciso um chacoalhão para me lembrar que algumas coisas a gente abandona na vida para não doer, pelo menos alguma coisa me fez lembrar que não quero ficar andando em círculos em cima do sofá. Evolução não é tomar decisões e nunca mais se abalar. Eu, pessoalmente, acho que é sempre reencontrar o caminho que escolheu quando escapar. Então lá vou eu novamente. Respirando fundo, virando as costas, sem olhar para trás. Mesmo porque, dá que eu olhe para trás, veja o rabinho balançando e dê uma vontade de correr... de novo.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

FRASES DE LALAU

Lalau ontem comentando o caso Yoki:


"Por isso que eu falei para o Fê: Eu podia tá matando, eu podia tá picando... mas eu estou aqui, só dando um chiliquinho!"

A IMPRESSÃO DIGITAL

Ontem foi jogo do Corinthians. Eu estava tão nervosa, quase não consegui me concentrar o dia inteiro. Quem me conhece sabe que eu tenho motivos muito fortes para desejar com todas as forças a morte do Santos. Não existe dor maior do que perder para o Santos. Ainda mais na Libertadores, nosso grande tabu. Estou evoluindo espiritualmente em várias searas, mas ainda não estou pronta para receber impassível a derrota do meu Corinthians na Vila Belmiro. Bom, mas não vou falar de futebol. Foi lindo e foi emocionante. Vi o jogo na casa da Lalau, que é uma querida e faz um verdadeiro QG corintiano. Junta os amigos, distribui vuvuzelas. Churrasco na varanda, cerveja e caipirinha. Depois da vitória ainda ficamos dançando no Knect. Lalau é uma dessas minhas amigas que são prova viva de que existem caras legais no mundo, e nem todos são narcisista cafajestes. Ela casou com o Fê (em uma cerimônia que foi um dos maiores PTs da minha vida). Quando eu digo que acredito em almas gêmeas quero dizer que existe uma pessoa certa para você, com todas suas particularidades e defeitos. Acredito que toda mulher tem o seu príncipe encantado. Um "príncipe" não vai ser necessariamente alguém caretinha, convencional, montado no tal cavalo branco. Afinal, nem todas nós somos Kates Middleton. A Lalau sempre foi uma garota visceral, intensa, passional. Dessas que faz tudo por inteiro e não tem problema nenhum de ser dramática. O Fê ama exatamente isso nela e permite que ela seja quem é. Já perdi a conta das vezes que saí com a Lalau (o que sempre significa que vamos extrapolar na quantidade de chopps) e liguei para o Fê de madrugada para avisar que ela ia dormir em casa porque tinha dado PT. Em 90% dos relacionamentos que conheço isso significaria uma crise de 15 dias e acusações vergonhosas de caráter. (Em muitos dos relacionamentos que eu tive, inclusive!) Mas com eles, nada. O Fê agradece, deseja boa noite e pede para eu avisar caso ela queira que ele a venha buscar de manhã. Os dois cultivam uma relação super bonita de confiança e cumplicidade, e por isso fazem parte do meu rol de casais favoritos. Acho muito triste quando vejo garotas tentando mudar por causa de algum cara. Já vi histórias de mulheres que abandonaram tudo aquilo que fazia delas, elas; e com o fim da relação perderam suas identidades, perderam a autoestima e a noção de mundo. Algumas mulheres querem tanto ser amadas que são capazes de fazer de tudo para isso. Acabam adotando comportamentos que acreditam ser o que se espera delas. E não existe nada mais violento do que negar a si mesma o direito de ser. Falo isso, mas não sou inocente. Eu mesma já fiz isso no passado. Quis tanto ser amada que neguei a mim mesma minha autenticidade. Consequentemente atraí para o meu lado quem nunca me mereceria (e por isso acabei desejando a morte do Santos). A melhor coisa que se pode oferecer a outra pessoa é quem você é. Inteira. O pacote inteiro. Sempre existirá quem veja nisso um impedimento, um defeito intransponível. Essas são as pessoas que nunca serão capazes de te fazer feliz. Agora vai ter aquele que vai te amar exatamente pelas falhas, pelos defeitos, pela impressão digital que te faz única e original. Ontem falei para o Fê, "Sabe Fê, fico muito feliz da Lalau ter encontrado um cara como você. Você é um ótimo marido para ela e fico feliz de saber que minhas amigas se casaram com caras legais. Mas o mais importante, sua maior qualidade: Você é corintiano!". O Fê, que é sempre querido, concordou: "Exatamente!  Vai ver se consegue fazer um bom casamento com um santista!?". É. Vai ver. 

terça-feira, 12 de junho de 2012

FELIZ MEU DIA DOS NAMORADOS


Mais um Dia dos Namorados... houve tempo em que eu desejava atropelar casais apaixonados e tinha vontade de fazer engasgar com brownies em formato de coração quem me falasse sobre a data. Hoje, com os anos de maturidade, (agora “senhoura”) posso dizer que era puro ressentimento. Não existe nada mais triste do que uma pessoa ressentida pelo amor de outras. Que bom que não faço mais parte desse time. Não que eu esteja apaixonada, não estou - não por um ninguém em especial - mas o que pode dar uma certa depressãozinha nas pessoas, e o tal do ressentimento que eu sentia nos idos da minha juventude (bons tempos!), é a ideia de que a felicidade e o amor são provenientes de uma fonte limitada. Explico. Você só se ressente do amor de outro se acreditar que o fato de duas pessoas estarem apaixonadas reduz suas chances de amar e ser amada. Como se alguém estivesse usando a sua cota nesse latifúndio. Parece bobeira dito assim. E é. Amor é como Gremmlim, se reproduz quando jogado na água, se for alimentado depois da meia-noite. Hoje, quando vejo pessoas apaixonadas, fico esperançosa indeed. Sinal de que ainda não caímos todos no cinismo. Amor é contagioso. Quanto mais, melhor. Numa época em que tudo ficou tão banal, e levar relacionamentos superficiais virou até normal, eu me sinto aliviada de ver pessoas que ainda se amam, cultivam laços, declaram-se e são capazes de (grandes ou pequenas) demonstrações. Hoje em dia vejo mulheres que nem mais se ofendem se o cara não liga no dia seguinte. Verdade que desapego é uma evolução. Mas antes de tudo vem respeito, principalmente por si mesma. Cobrar respeito, cobrar consideração, cobrar carinho, virou sintoma de loucura. Quantas vezes ouvi amigas dizendo "Não vou falar isso porque ele vai achar que eu sou louca". Como boa corintiana admiro a capacidade de uma loucura sadia. Então eu acho lindo uma data em que as pessoas estão inundando o Instagram com fotos de coração, e postando músicas bregas no FB, e fazendo declarações de amor no Twitter. Porque eu sou caretinha em relação ao amor, e acho lindo escolher um dia para se permitir ser romântico, ser apaixonado, ser estupidamente ridículo em sua vulnerabilidade por outra pessoa. Se permitir ser vulnerável a outra pessoa. Acho que essas são as pessoas mais fortes. Eu e o amor, já tivemos nossa lua de mel, tivemos períodos de aflição e ceticismo. Mas eu sou uma romântica. Sempre volto para ele. Talvez não uma romântica de grandes gestos, ou declarações públicas; mas certamente daquelas que precisa de cilindro para mergulhar. Não gosto de ficar na superfície usando snorkel, quero tocar na areia do fundo do mar. Eu acredito em alma gêmea. Acredito em relações de verdade. Acredito em pessoas que buscam um tipo de cumplicidade e companheirismo que farão valer toda uma vida. Mas, acima de tudo, acredito que a maior relação de amor que temos é com nós mesmos. Enquanto eu não encontro meu grande amor, (para postar música do Fagner no FB e dividir brownie em formato de coração no jantar), eu digo feliz dia dos namorados para mim. Essa é a relação que vai me permitir ser vulnerável a outra pessoa. Vem ano, passa ano, todos os dias dos namorados, eu continuo apaixonada. Pela vida. 

domingo, 10 de junho de 2012

MILAGRES NO CAFÉ DA MANHÃ


Já estou de volta à São Paulo, aproveitando a inversão de horário que o jet leg me presenteou. Hoje acordei às 5h me sentindo a pessoa mais descansada do mundo! Fiquei brincando com a Holly na cama, meditei, li o jornal tomando café da manhã, arrumei a cozinha e estava agora respondendo os 2 milhões de emails entupindo minha caixa postal. Então lembrei de um detalhe importantíssimo que esqueci de contar!!! Meu hotel em Cape Town estava sendo usado também pela seleção sul-africana e a de Fiji de Rugby para concentração. Rugby é o esporte mais popular por lá e, só para se ter ideia do que isso significa, é a mesma coisa que você ficar hospedada com a seleção brasileira de futebol. Só que com jogadores bonitos. Porque os jogadores de rugby são muito gatinhos. Então é tipo, a seleção de futebol da Croácia (já viram a seleção da Croácia?). Por onde eu andava no hotel esbarrava nesses homens grandes, lindos e abstinentes para a concentração do jogo. Os de Fiji eram tão exóticos, com feições lindas e umas tatuagens muito interessantes em lugares estanhos (tô falando do cotovelo). No café da manhã, eu sentava sozinha bem de frente para a porta só para vê-los entrar. Automaticamente na minha cabeça tocava “You Sexy Thing” do Barry White (mas na voz do Hot Chocolate), e aqueles garotos lindos andavam em câmera lenta na minha direção. Homens musculosos em bando, concentrados para jogar, e eu uma mulher sozinha sentada de frente para eles. Todos abriam sorrisos amplos, com dentes impecáveis e diziam “Good morning!” no melhor estilo Joey Tribiani. E quando eu subia para o quarto, todos elevadores sempre tinham pelo menos 4 deles te esperando. Abria a porta e eles abriam espaço para eu entrar. A incomparável sensação de subir alguns andares rodeada por homens musculosos e suados que você SABE que estão te olhando. Yes! I do believe in miracles!
Para você sentir um gostinho de como foi, coloque um jogo de rugby em câmera lenta e dê play nesse vídeo. - Suspiro - Cafés da manhã nunca mais serão os mesmos!

sábado, 9 de junho de 2012

IN THE JUNGLE


E aqui vamos nós, para a floresta. Ok! Quando eu pensava em fazer um safari eu me imaginava em uma roupa caqui, com chapéu estiloso e acampando em barracas de lona verde oliva. Talvez eu ainda vá fazer um safari complete, desses que você se perde na savana por dias sem voltar para a civilização, mas na Sala VIP da África o melhor Safari que você pode fazer é um pouco diferente. Às 4h20 da manhã o telefone tocou com o motorista gritando que era hora de ir. Escova dente, enfia blusa, pega mochila e reza para a máquina fotográfica estar com bateria. Quando comecei a pesquisar o tipo de tour que eles ofereciam para safari, todos, em sua maioria, falavam de uma reserva chamada Aquila. Meu instinto estava dizendo que era roubada, e só por isso eu não fechei nenhum tour. Safari também é um tour mais caro. Custa em torno de R2000, ou  R$250,00. E já que estava rolando uma decepção de estar na sala VIP, então que pelo menos o Safari fosse bem autêntico. Foi fuçando que eu encontrei o Inverdoorn, uma reserva ambiental que promove Safari e também é um santuário de Cheetahs (que nada mais é do que um leopardo). Só a ideia de que eu poderia chegar perto e colocar a mão em uma cheetah, já me convenceu de que esse era o Safari que eu queria fazer. A Reserva de Inverndoorn é longe, foram 4 horas em uma van até chegarmos lá. Fizemos duas paradas em um frio absurdo para nos abastecer de café e donuts no caminho. Quando chegamos, o lugar também funciona como hotel e é maravilhoso. Ao lado da piscina havia um lounge com sofás e puffs aquecidos nos esperando, e chá, café e bolachinhas. Fiquei lá, me sentindo rica (impressionante como eu tenho o dom da primeira classe!!!), tomando Earl Grey, enquanto aguardávamos o guia que nos levaria. No grupo, um casal gay árabe (Sério! Entraram para o ról das coisa mais bizarras que já vi na vida!), um zimbabwense, um caboense, uma alemã e três brasileiros que vieram na mesma van que eu vim. Ter brasileiros + a que eu já conhecia no grupo significa um tanto a menos  de educação e classe automaticamente. Nada pessoal, vamos deixar claro! Os três eram muito gente boa. Um pouco novinhos demais, dois irmãos e o namorado da menina. Eles eram engraçados e divertidos. O único problema é que geralmente brasileiros se acham engraçados e divertidos demais e acabam perdendo o respeito pelo coletivo, falando muito alto, ignorando os limites. Houve alguns momentos que acabei perdendo explicações sobre o tour porque os 4 (os 3 adolescentes e a Manu) estavam tagarelando como se estivessem em uma cantina italiana. Tudo bem. Faz parte. O guia que dirigiu o Safari, no entanto, era um gato. Sem trocadilho. Um maravilhoso espécime de masculinidade. Queixo quadrado, mas com linhas suaves no rosto. Vegetariano. E quando ele tirou os óculos... Um par de olhos verdes esmeralda de te fazer perder a cabeça. Daqueles que fazem as mulheres em geral trocarem as letras, gaguejarem e uivarem para a Lua. Vou confessar que fiz muitos filminhos com o moço. Eu viria trabalhar na reserva ambiental e nós dois cuidaríamos da preservação das espécies e criaríamos nossas filhinhas ruivas e vegetarianas. Eu até conseguia vê-lo pegando a mais nova no colo e a esticando para alimentar a girafa. Uma linda família feliz! Não preciso dizer que passei o dia fazendo filminho da nossa família feliz enquanto ele nos levava para todos os lugares da reserva. A reserva resgata animais que são vítimas de tráfico ou de maus tratos, e ao mesmo tempo funciona como uma espécie de “banco de esperma”, mantendo machos e fêmeas para doar material genético para pesquisas e garantir a preservação das espécies. Logo de cara vimos um grupo de antílopes que estavam agrupados perto de um lago. Depois fomos para a reserva dos leões, que ficam em uma área separada (por motivos óbvios). Demos a volta em quase toda área antes de encontrar os danadinhos. Duas leoas e um leão, tranquilinhos buscando o Sol da manhã. Fomos orientados a não ficar de pé no carro ou fazer barulho, e o carro se aproximou até 50m dos bichinhos (mas com uma rota de fuga logo a frente). Um leão pode perseguir um animal de interesse (no caso nós, com nosso jipe) em uma velocidade de até 60Km/h por até 3Km. É um bom trecho de oração para que a máquina vença a natureza. Felizmente o leão não estava muito interessado na gente e ficava só olhando e bocejando. Depois do leão, voltamos para a reserva principal onde vimos uma série de viadinhos (da família dos antílopes), búfalos, zebras, hipopótamos, rinocerontes, girafas e tantos outros. O Eugène (meu futuro marido!) ia contando as particularidades de cada animal conforme parávamos para observar e falando de cada um deles com suas personalidades e história. Todos os animais da reserva tem nome. Ele disse que rhinos criam laços emocionais com humanos, e que um rinoceronte é capaz de lembrar de um acontecimento trágico que tenha testemunhado (por exemplo, um bebê rinoceronte que tenha testemunhado sua mãe sendo assassinada vai se lembrar do fato quando adulto) e chorar. Sei lá. Pode ser que eu seja muito bundona, mas não consigo entender como as pessoas continuam comendo carne mesmo depois de saber de uma coisa dessas. Mas como diz o ditado, ema, ema ema. Não vou julgar ninguém. Rinocerontes são muito visados por causa de seus chifres, que não têm valor nenhum e é exibido apenas como trófeu. Tipo, matar um bichinho lindo desses só para colocar um chifre na estante. Gente assim merecia um chifre em outro lugar... Depois do safari, voltamos para a base da reserva, que também funciona como um hotel 5 estrelas. Eles prepararam a sala da lareira com um buffet de almoço. Várias opções para os amiguinhos dos animais, como eu. Quando estava terminando o almoço vejo pela janela uma das voluntárias chegando com uma cheetah na coleira. Meu instinto Felícia foi para o nível 5 e eu voei pela porta tentando me conter para não pular em cima do leopardo e tomar uma unhada na cara. (Gosto muito de você, leopardinho!) Izzie, era o nome da cheetah, tem 9 meses e foi resgatada de uma casa onde ela era mantida como bichinho de estimação e sub-alimentada. Ainda dava para sentir as costelas saltando, mas ela estava feliz no novo lar. Ronronava muito alto. Eu não sabia que outros felinos, além dos gatos, eram capazes de ronronar, e a descoberta me deu vontade de espremer o gatinho, igual eu faço com a Holly. Não era permitido. Saco! Fiquei um tempão brincando com ela, acariciando o pêlo, coçando a barriga e deixando ela lamber minha mão. (Língua de cheetah é áspera igual a de gato. :-)) Tipo de coisa inacreditável que a gente passa. Fiquei flutuando entre o fascínio e a completa descrença de estar brincando com um animal selvagem, assim na minha frente. Sempre que vi imagens ou vídeos de felinos tinha vontade de pegar um no colo. E se a viagem toda para a África do Sul não tivesse valido de nada, só por esse momento eu empatava o jogo. O contato com os animais me desperta uma compaixão ainda maior pela vida, a natureza e o milagre de estar nela. Somos abençoados por viver nesse mundo rico, tão cheio de maravilhas e capaz de nos encantar irremediavelmente a cada segundo. Acho que é uma obrigação tomarmos um papel ativo e responsável na organização da vida. Preservação ambiental, a luta pelo bem estar dos animais, a manutenção das espécies, é muito mais do que um capricho ideológico. Eu enxergo como uma consequência coerente do caráter de cada um. Já dizia o ditado: Você conhece o caráter de uma pessoa pela maneira como ela trata os animais. Geralmente as pessoas consideram apenas os animais domésticos, cachorro, gato, papagaio. Eu, pessoalmente, acho a vida preciosa em todas as suas formas, e tento fazer minha parte com todo tipo de bicho. Sem nenhum juízo de valor. Tem gente que vai achar besteira, outros, pura demagogia. O importante para mim é ser verdadeira comigo. Eu presto contas do meu caráter para mim mesma. Quem sabe, o dia que eu ganhar na MegaSena, eu não me mude para o interior de Cape Town, trabalhe como voluntária em uma reserva, e ensine minhas filhinhas ruivas a alimentar girafas com as mãos. 

Os antílopes na relva.

Meu futuro marid... hum! O guia do safari.

Gosto muito de você, leãozinho.

Búfalos

Rinocerontes lindinhos.

Fiquei "Felícia" correndo atrás das girafas.

Olha a Glória do Madagascar!

Cheetahs em seu santuário.

Eu e a bebê cheetah. Ela ronronava igual a Holly. =)

quinta-feira, 7 de junho de 2012

IN VINO VERITAS



Ninguém vem para a África do Sul e sai daqui sem tomar um bom vinho. A primeira vez que provei um vinho sul-africano foi há uns 10 anos atrás, em uma confraternização das meninas da FAAP em que todo mundo ficou bêbada. Tipo de cair. A balada começou comum jantar comportado no BOP (que depois virou Studio SP e depois virou sei lá o que, porque não saio mais à noite) e acabou no extinto Massivo (Nossa, tô tão denunciando idade com essa abertura de post...) e tudo o que eu lembro é da gente comemorando e erguendo os braços toda vez que alguém lembrava do rótulo do vinho. “Vinho de oncinha, UHUUUUU!!!”. O rótulo tinha estampa étnica e eu procurei várias vezes por esse vinho novamente e nunca achei. Talvez porque a natureza é sábia e nunca mais vai me permitir repetir o tal episódio. Tenho certeza que perdi uns 500 pontos orgulho pessoal naquela noite. (Orgulho? É de comer?) Então eu já sabia que aqui era um lugar para se considerar os vinhos. E também que eles têm uma uva própria, o Pinotage (um híbrido de Pinot Noir com outra que esqueci o nome, mas termina com “age”). Fiz várias pesquisas sobre tours para fazer degustação, mas não tinha achado nenhum que tivesse me passado confiança. No geral são todos o mesmo preço (R850, algo em torno de R$210) e dizem fazer as mesmas coisas. Vi alguns por quase a metade do preço, mas fiquei com medo de acabar em um ônibus cheio de mochileiros de dreads e descartei logo de cara. You buy cheap, you got cheap. Aqui no hotel e o guia do transfer ficavam tentando empurrar tours para a gente, mas a coisa tinha tanta cara de roubada que meu instinto me faz ter vontade de sair correndo. Literalmente. Sabe quando você se imagina em um ônibus com outros 15 brasileiros fazendo piadas racistas e cantando Michél Teló? Então. Fora que tinha toda pinta de ser aquele tipo de degustação “CVC”: O cara pára o ônibus, desce a Caravana de Piracicaba, jogam meia dúzia de vinho tosco na nossa frente, a tia gorducha vai reclamar que não tem “vinho doce”, o povo vai comprar moscatel para comer com pizza, e ninguém vai falar nada sobre enologia. Tô fora! Sinto cheiro de roubada à distância. Tentei o Lonely Planet (sempre me ajuda, mas dessa vez foi nulo!), quase fechei com uma empresa que fazia tours nas vinículas em 4x4, mas então descobri a Wine Desk e a Ligia! Ligia é uma portuguesa da Ilha da Madeira (e sei lá porque nós só conversamos em inglês, fiquei pensando nisso hoje), que já trabalhou com a Board of Wine, foi professora, e resolveu usar seu conhecimento para ajudar as pessoas comuns a realmente conhecer o vinho sul-africano: abriu uma agência. Eles só fazem tours pequenos, com no máximo 7 pessoas. O guia é sempre um especialista em vinhos e os roteiros saem da mesmice do pacotão Stella Barros. Fiquei apaixonada na hora e, seguindo a recomendação dela, fizemos hoje um tour com degustação de brandy e chocolate ao final. Às 8h30 o guia veio nos buscar no hotel em uma Mercedes branca (tô falando que nasci para a primeira classe!!!). Sorte do dia um: como estamos em baixa estação éramos as únicas bookadas para o tour, então tivemos um tour particular! \o/. O guia, um senhor gentil, educadíssimo, chamado Dave. Apesar do forte sotaque inglês, ele jura que é sul-alfricano há 4 gerações. Manu estava de ressaca de ontem (ela ficou até depois na balada, eu canso logo e voltei para o hotel mais cedo) e foi dormindo no banco de trás. Eu fui na frente tagarelando igual uma matraca, falando sobre a cultura, a economia, contando piadas e me divertindo com Dave, enquanto ouvíamos música clássica. Dave também é um guia de hiking (Pois é rapazes! O tiozinho tem o maior fôlego e sobe mais montanha do que a galera com barriga de cerveja que eu conheço!) e conhece aquela região como a palma da mão. Me deu uma tristeza de pensar que não vou ter tempo de fazer nenhuma trilha se quer. A cidade é toda rodeada por montanhas e campos liiiindos! E existem diversas trilhas de hiking por todos os lados. Dava tranquilo para passar uma semana por aqui só subindo montanha.... - suspiro - A primeira parada foi na KWV, um monstro das vinículas do país. É na verdade uma cooperativa, então eles não produzem a própria uva. Compram de produtores selecionados. Colocaram um vídeo sobre a história do vinho em Cape Town, depois fizemos um tour pelas adegas. As instalações são lindas, impecáveis. A equipe de primeira, muito bem treinada, e o cheiro de madeira e uva curtida que se sente no ar é inebriante. Depois fomos para o bar onde Connie, uma senhora elegantíssima, nos recebeu para falar sobre os vinhos e oferecer a degustação. Foi ela que me ajudou na minha escolha. Fizemos a degustação “master”, só com os vinhos tops e premiados da casa. Provei dois brancos (um Chardonnay e um Viognier. Não sou super fã de brancos, mas gosto de Chardonnay. O outro achei meio enjoativo para tomar puro. Talvez com um queijo ou uma refeição. Depois provei três tintos. Um Pinotage, um Shiraz e um blend. O Shiraz fiquei completamente apaixonada. Foi de cara o melhor vinho do dia. Comprei duas garrafas! (Não comprei uma caixa porque eu destruí o limite do meu cartão de crédito em Miami). Depois fomos para a Kanonkop onde uma outra senhora elegantíssima  nos serviu uma degustação só de Pinotage. (Essas mulheres que trabalham em vinículas são sempre tão elegantes, gentis e educadas. Elas se movem com suavidade e possuem gestos comedidos. É uma coisa inabalável! Queria tanto ser como elas e não esbarrar nos displays de demonstração só de tentar deixar minha coluna reta...) Comprei outra garrafa e uma caixa de isopor própria para levar o contrabando para casa. Depois paramos em uma outra vinícula , essa familiar (que não me lembro o nome porque já estava bêbada e tirei um cochilo no carro). Era uma fazenda linda, dessas de cenário de filme. Entre as montanhas, com bichinhos soltos e um mastiff gigante e fofo nos recebendo na porta. Dentro nos esperando tinha uma lareira deliciosa e um almoço caseiro preparado exclusivamente para nós. Sorte do dia dois: fez um dia lindo! O clima está frio, rola um cachecol na rua, mas com Sol e céu aberto. Comemos maravilhosamente no meio daquele cenário incrível. Para mim uma torta especial vegetariana, compotas, geléias, patês, salada, tudo feito ali na fazenda. Inclusive o pão e a manteiga! Degustamos alguns vinhos durante a refeição, nenhum memorável, mas a essa altura já não fazíamos muita questão mesmo. Depois tomamos café fresquinho e voltamos para a estrada para a última parada. A destilaria de brandy foi uma surpresa totalmente positiva. Não tomo brandy, não sou uma pessoa de destilados, mas acreditei em Lígia que a experiência era de surpreender até os mais céticos. Dito e feito. O lugar era um paraíso, elegante e sofisticado. Desses que você até se sente mais rica só de sentar no sofá. Um homem muito educado e descontraído já nos recebeu na porta com coqueteis na mão (Gosto disso! Aceito alguém me esperando em GRU sábado à tarde com um coquetel no portão de desembarque!). Ele sentou com a gente, explicou sobre a história da casa, o processo do brandy e a forma como eles produziam a bebida ali. (Brandy nada mais é do que um “vinho destilado”, vulgarmente conhecido como cognac. Só que os franceses são chatos e dizem que cognac só o produzido na região de Cognac. Então, meu filho, se você tomava um “Dreher” crente que era conhaque, tenho péssimas notícias para você...) Depois nos trouxe uma bandeja com três taças de brandy, três barras de chocolate e uma xícara de café. Explicou como deveríamos aquecer o brandy na mão, qual era o ritual para provar, e orientou qual chocolate deveria ser harmonizado com qual brandy. O resultado foi que a cada mordida de chocolate e gole de brandy, uma explosão de sabores e sentidos acontecia na minha boca. Eu tinha vontade de escorregar no sofá de couro e virar meus olhos fazendo gemidos como se estivesse tendo um orgasmo. Sabe aquela descoberta sensorial que você tem quando descobre um sabor novo? Quando você junta queijo e fruta pela primeira vez, ou descobre o sabor de mel e mostarda junto, ou curry com leite de coco? Essas misturas que fazem a comida e a bebida ficarem divinas? Então. Brandy e chocolate! Minha nova paixão. Voltamos flutuando para o hotel, onde caí na cama e pedi serviço de quarto fechando completamente os trabalhos do dia. Sorte do dia três: bom demais estar viva. ;-)

Dave, nosso super guia, assistindo Manu tentando descobrir as notas do vinho na KWV.


O paraíso onde a gente almoçou.

Eu, bancando a rica, tomando brandy. A foto está fora de foco para mostrar o estado da pessoa...

quarta-feira, 6 de junho de 2012

UM PAÍS DE “ALMOST”


Cinco horas de diferença é muito. Então o jetleg está gritando. Perdi o café da manhã hoje, e passei o dia todo tentando me convencer de que era mais tarde do que realmente era. Ponto para as garotas, que foram dormir tarde e ligaram o piloto automático. Meu dia se resumiu a checar as condições do tempo para mergulhar - Péssima notícia: com a mudança do tempo a visibilidade está quase nula e a maré bem agitada. Sem previsões de mergulho até o final de semana - Aproveitei para passear por Waterfront, tirar fotos, comprar livros e postais para os meus sobrinhos. Até cruzei com uma foca no meio do cais. Fiquei louca, pulando igual a Felícia, querendo tirar fotos. A foto ficou ruim, mas eu agendei meu passei para Robben Island para ver a cela do Mandela. Só para registro, tudo aqui tem aroma de Nelson Mandela. Todas as ruas, os shoppings, as escolas públicas: tudo tem o nome do homem. E não precisa muita força para entender porque. Esse cara é mais do que um ser humano, e eu fico me perguntando se existiria África do Sul sem Mandela. Eu acho que não,e também é a opinião geral dos locais com quem tenho conversado. Tanto brancos quanto negros. Por isso parei em uma livraria grande, do tipo Fnac, e comprei dois livros de jornalistas. Um que fala do período pós Apartheid, e outro que fala do pós-Mandela. Gosto de comprar livros de jornalistas sobre os países que visito. Geralmente trazem um ótimo panorama em regiões que passaram por conflitos. Mas falando das impressões que tive de África do Sul até agora: O assédio é algo tão agressivo que me deixa enjoada. Do tipo, os caras te param na rua. Literalmente. Você está atravessando uma rua, cheio de carro esperando para passar, e o cara te segura pelos ombros para dizer que “você é uma mulher bonita, tem um sorriso bonito, um nariz bonito...”, até que você fuja e diga “Obrigada” o suficiente para eles ficarem sem argumentos. Hoje, voltando para o hotel, peguei um taxista que insistia em ser meu amigo no Facebook, e em fazer um rendez-vouz de vinhos e sexo no meu quarto de hotel. Assim, sem vergonha nenhuma. Na lata.  Eu, que não sou besta e aprendi que não se discute com um cara que está te dirigindo em um país estanho que você não conhece, só sorria e dizia em francês “oui, oui”, (ele era do Congo), mas rezava secretamente para um anjo me colocar bem longe dali (Mandela? Hello?). O assédio é algo extremamente agressivo aqui. Quem é mulher, fica se sentindo um pedaço de caça. Já tinha sentido isso no Marrocos, mas achava que era diferente na dita “África negra”. Puro engano. Embora Cape Town esteja muito longe de qualquer imaginário de África que eu já tive. É como entrar pela sala VIP. Nada aqui me parece real.  Consegui me livrar do taxista tarado e encontrei Manu para buscarmos alguma diversão na noite. Fomos até o Waterfront, que estava desértico, e esbarramos em um músico que estava saindo de um restaurante terminando um show. Como somos cara-de-pau, abordamos o moço e o fizemos nos oferecer um tour pela noite de Cape Town. Anthony é de ascendência inglesa, mas tem jeitão de holandês (Apesar de minha queda pelos holandeses, juro que a abordagem foi totalmente despretenciosa!), ele é casado e tem duas filhas. Uma de 7 e outra de 16 (alguém engravidou na adolescência, minha gente!). Ele nos levou até Long Street onde há vários bares e pubs, com música ao vivo, e clubs, que garantem o fim de noite da balada caboense (isso existe?). Segundo ele, todas as noites terminam em Long Street. Ficamos em um pub tomando Castle (cerveja típica da África do Sul que não tem nada de mais) e rindo do padrão “Discovery Channel” de relacionamento do local. Anthony, o músico que nós sequestramos, nos convidou para jantar na casa dele na sexta com sua esposa, (O que adoramos... Mas sabe como é, né!? Ainda não descobri se o povo de Cape Town é como os cariocas que dizem “passa lá em casa” e depois desaparecem.) Depois ficamos com algumas garotas do pub e eu dei um show ensinando-as a rebolar ao som de Carlos Santanna. (It´s all on the hips, baby!) Ainda se vê uma divisão bem nitída entre negros e brancos, embora os jovens digam que não sentem qualquer diferença. Todavia, quando pergunto se eles se sentem a vontade para fazer qualquer coisa que um branco faça, eles gaguejam e dizem “almost everything”. É um país de “almost”. Almost seguro, almost perfeito, almost África. Embora exista estrutura, e Cape Town seja um oásis de segurança pública e oportunidades, ninguém conseguiu me convencer de que, assim que o Mandela morrer, isso aqui vira um pátio de guerra. Outra coisa, impossível sair desse lugar sem uma opinião formada de Nelson Mandela. Ele é o ar, a atmosfera, a força que move essas pessoas. E qualquer pessoa que se diga atéia, eu aconselharia uma pausa para leitura dos pensamentos desse homem. Se ele não era um anjo, eu não sei o que são anjos. Uma das personalidades mais admiráveis, intrigantes e abençoadas que nós tivemos o privilégio de ter na história. Cruzar com o nome dele nas esquinas é um alento, uma certeza de que esse mudo tem salvação e de que existe todo um povo no Sul da África capaz de escrever uma história diferente. Gosto de dar valor para as pessoas pelo seu potencial, e não pelo o que elas ostentam ou acham que valem. Então eu sou fã desse senhor grisalho até a última vuvuzela. Depois da minha intensa experiência no Marrocos, queria muito conhecer também a África negra, não apenas a muçulmana. Cape Town não é seu melhor exemplar. É cosmopolita, europizada, almost branca demais. Mas mesmo entrando pela “sala VIP da África”, ainda acredito que não se sai ilesa de qualquer experiência. Ou almost ilesa.