sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

BEM LONGE DO ÚLTIMO DIA DO ANO

Meu ano de 2010 começou só em fevereiro. O Reveillon passado foi divertido, passei com família e primos. Muita risada e festa. E depois janeiro foi um ostracismo esperando toda  a emoção que o ano reservava. Mudança, devolução do apartamento, tudo o que eu tinha em um depósito. Malas prontas e, enfim, me joguei na jornada que fiz esse ano. Oito meses com a mochila nas costas. Acho que meu erro foi ter pensado que, ao voltar para São Paulo em outubro, essa jornada estaria terminada. Faz exatos dois meses que voltei, e sinto que São Paulo até agora foi só uma escala. Eu nunca “voltei” para casa. Eu tentei. Vim até com uma tabela de Excel planejadinha com uma rotina e milhões de coisas que eu ia fazer. Passei esses dois meses tropeçando em mim mesma e sem realizar nada. Tentei inutilmente alugar um apartamento e tudo, sempre, misteriosamente se desfazia no momento de assinar o contrato. Hoje às 8h da manhã o caminhão de mudança estacionou novamente no apartamento que eu estava acampada. Fiquei até de madrugada terminando de reencaixotar tudo o que eu tenho na vida. As caixas todas voltaram para o mesmo depósito em que passaram o ano inteiro. Eu? Enquanto todos estiverem embriagados, pulando ondinhas no litoral paulista, eu vou estar em um taxi com a minha mochilona rumo ao aeroporto. Vou ficar um mês na Guatemala fazendo um trabalho voluntário com crianças de uma tribo indígena. Não sei o que estou indo buscar lá. Não faço a mínima idéia de porque escolhi a Guatemala. Ou quais as expectativas que eu deveria ter. Só sei que a minha jornada não terminou. Assim como o meu ano. Quando eu conseguir de verdade encerrar 2010, eu volto para casa. Por hora, eu vou para o exílio. Feliz da vida.  Parto às 2h da madrugada. Meu primeiro reveillon sem contagem regressiva. O primeiro sem usar branco. Calça jeans, roupa de mochileira e minhas botas de hiking. Feliz Ano Novo para vocês, mas para mim, esse ano não ficou tão velho assim.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

VENENO

Sabe que quando uma pessoa é envenenada ela sofre todos os sintomas até que o veneno seja processado pelo organismo. Náuseas, dor de cabeça. Mudança do apetite. Até a coloração da urina muda. Dizem que o ideal é não deixar a vítima se mexer muito. Para o veneno não circular mais rapidamente pela corrente sanguínea. Dor abdominal. Dores de muita formas. Se a vitima estiver inconsciente, não se pode provocar vomito. Seria mais fácil se fosse só enfiar dois dedos na garganta e se livrar de tudo o que entrou no organismo. Após mais de duas horas, nem lavagem estomacal adianta. É preciso correr para o hospital, e ficar em repouso até o organismo processar todo o veneno. Visão turva. Desorientação. Boca seca. Tontura. Fazer qualquer coisa quando se descobre envenenado pode ter conseqüências graves. Corra para o hospital e lide com os sintomas. Cada um que aparece. Eu estou lidando com sintomas. Até que todo o veneno saia. Então eu passo horas chorando quando a dor tá de chorar. Eu como 15 vezes por dia quando bate a fome inexplicável. E tomo vitaminas quando não tenho fome nenhuma. Eu vou largar tudo dentro de um depósito já que não vai dar para mudar esse ano. E estou revendo com calma, cada palavra que me foi dita, cada mentira que eu não vi ser contada. Tentando descobrir quais os tamanhos das conseqüências que podem vir de cada uma dela. Apagando vestígios, bloqueando em comunidades virtuais. Fazendo a faxina. Afinal, só depois de tudo limpo é que vou ter idéia do tamanho da cicatriz. Por enquanto é muito cedo. Ainda tem muito veneno circulando em mim.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

AULA DE ROTEIRO

Ouvi essa agora cedo no Globonews. E isso na véspera de Natal. Os roteiristas da vida não são tão criativos assim. Em teatro esse recurso se chama "Deus ex machina".

http://www.jornalvaledoaco.com.br/novo_site/ler_noticia.php?id=88223

FAZENDO O MELHOR COM O QUE SE TEM

Já pensou que talvez os conceitos de bem e mal sejam pura ilusão? Que talvez todos nós estejamos fazendo o melhor que podemos com o que temos em mão? Às vezes o que temos em mão é um coração gigantesco, uma capacidade de compaixão. Muito amor por tudo. Às vezes o que se tem é um coração de pedra, o cenho carrancudo ou um caráter vagabundo. Eu fico pensando, e se todo mundo merecesse o benefício da dúvida? Sem querer justificar atitude de ninguém, mesmo porque pena e compaixão não são sinônimos. Mas entender que talvez (apenas talvez) o mundo não seja um buraco apocalíptico repleto de pessoas enfiando a mão no teu bolso para roubar sua carteira vazia. Entender que na vida, ninguém entrou pensando em dar o pior. Apenas o melhor. E o “melhor” é algo subjetivo. Entender que quando tudo dá errado não se trata de uma conspiração paranóica do universo contra a gente. Que em vez de desentortar banana, o melhor é descascá-la assim mesmo. Como ela é. Fazer de conta por um minutinho que estressar, ficar irritado, chutar a porta do carro; só faz dos nossos dias mais chatos e pode resultar em um dedão quebrado e uma conta salgada no funileiro. Já pensou que a gente tem o que tem, e assim como todo mundo no mundo, a gente precisa tentar fazer o melhor com o que temos? Pode ser só sintomas do feriado. As luzes de Natal para todos os lados da cidade. A alegria de ver o Sol brilhar na manhã do dia 24. Pode ser só isso. Eu mesma sou PHD em me desesperar e chutar porta de carro. Acabo julgando as pessoas, duvidando de todos. Mas uma coisa que sempre digo aqui, Amar é um exercício. Então eu vou sair agora para comprar os últimos presentes (Sim. Eu também sou procrastinadora. Eu e 19 milhões de habitantes em São Paulo.). Vou passar na casa da Kika (que foi assaltada... longa história!) para colocar um cadeado na janela. Vou me enfiar na rua, tomar um sorvete porque é verão por aqui. E vou exercitar olhar para cada um, para cada situação, com o benefício da dúvida. Talvez pudesse ser melhor. Talvez sim. Talvez desse para ser perfeito e impecável. Mas eu vou aceitar o que se tem. E fazer o melhor com isso. Feliz Natal para todo mundo aqui. Vamos ser feliz gente. (porque ser triste é muito chato!) ;-)

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

VERÃO

Hoje às 21h38 o Verão estará começando no Brasil. Verão de verdade, quente, abafado, com Sol de deixar a gente moreninha. Direito à tromba d’água no final do dia. Chinelos Havaianas e sorvete. Adoro verão. Sempre me dá uma nostalgia de adolescência. Dos vinte e poucos anos. De descer para a praia. Noites quentes tomando cerveja na Vila Madalena. Meu carro não tem ar condicionado, então eu acabo amaldiçoando um pouco o universo quando fico presa no trânsito. E todos os anos eu juro por Deus que vou trocar de carro e melhorar as condições de trabalho. Uma coisinha de cada vez. Esse mês acabou o orçamento. Duas mudanças em menos de dois meses. Comprei geladeira, fogão, lavadora Brastemp. Falta a escrivaninha e o sofá-cama. Vou fazer um quarto de hóspedes, aberto ao público. Mas vai todo mundo jantar sentado no chão da sala, com o prato no colo. Mesa e cadeiras ainda vão demorar um pouquinho. Além dos R$70 que sobraram na minha conta no banco, tenho só R$25 na carteira. Mas feliz pra burro! Ando feliz mesmo. Felicidade daquelas que vêem milhões de possibilidades. Cheia de vontade de fazer de 2011 um ano ainda melhor que esse. E esse foi um ano incrível. Embora eu esteja terminando o ano com o coração destroçado. Eu nunca mais toquei nesse assunto, mas é isso. Meu coração está destroçado. Faz parte. Só fica assim quem ama. Eu ainda prefiro destroçar meu coração um milhão de vezes do que parar de amar. Não somos todos assim? Gosto de pensar que sim. Acho que as pessoas são todas iguais. Somos um bando de gente carente só querendo ser amada. Hoje fugi do temporal e vim para casa. Meu celular completamente descarregado de bateria e eu vim trabalhar enquanto ele carregava. Gosto de trabalhar com a televisão ligada. Faz a casa parecer mais cheia. Ouvir vozes de pessoas quando se mora sozinha. Então estava passando “Notting Hill” em um desses canais do cabo. Eu adoro comédias românticas. Eu poderia escrever uma tese sobre elas. Assisto todas. Choro em todas. Amo. “Notting Hill” tem uma coisa em particular. A música “She” no final feliz. Eu sempre disse que queria casar com essa música. Agora já nem sei se quero mais casar... mas toda vez que ouço essa música, imagino alguém olhando para mim como Hugh Grant olha para Julia Roberts naquela cena da press conference final. Não é tudo o que a gente gostaria de verdade na vida? Encontrar alguém que nos olhasse com aqueles olhos? Às vezes sinto que sou muito mal agradecida. Sou uma pessoa tão abençoada com tanto amor na minha vida, e fico falando exatamente daquele amor que falta. Mas então tem aquela cena. Essa cena aqui embaixo.



“Eu sou só uma garota, parada em frente a um cara, pedindo que ele me ame”. Talvez isso defina as coisas um pouco mais. Eu também não passo de uma pessoa carente, querendo ser amada. Às vezes as pessoas não estão dispostas a nos amar. Também faz parte. É um direito delas. Eu vou pegar meu coraçãozinho destroçado, mudar para o meu apartamento novo. Vou comemorar o Natal (que ainda é o meu feriado favorito), vou me despedir do melhor ano da minha vida. Aproveitar o verão que está só começando. Afinal, está só começando. Tanto Sol ainda para brilhar. Vou abrir um sorrisão (o meu não é tão bonito quanto o da Julia Roberts, mas é meu) e se algum dia em 2011 eu me encontrar parada em frente a um garoto novamente... não vou hesitar em pedir que ele me ame.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

LEILÕES E CAIPIRINHAS

Tem aquela filosofia “Noviça Rebelde” que diz: Quando Deus fecha uma porta, em algum lugar ele abre uma janela. No filme eles só não falam que a janela vai custar mais caro do que a porta que foi fechada. Mas eu também não quero vir aqui para ficar reclamando. É tão difícil entender o que é realidade hoje em dia que estou desistindo. Jogando a toalha. Abrindo mão. Piloto automático. Passei quase o dia todo procurando apartamento. Acho que visitei uns 10 só hoje. Tenho mais um tanto agendado para amanhã. Já perdi totalmente a referência de valores. No geral acho tudo astronômico, mas quem sou eu para reclamar. Já decidi que é mais fácil ganhar mais dinheiro do que ficar achando tudo um absurdo. Tudo o que eu quero é resolver isso o mais rápido possível, mudar e poder gastar minha energia em fazer dinheiro entrar. O primeiro ajeitadinho que eu achar, estou batendo o martelo. Vendido para a senhorita de rosa ao fundo! Isso tá valendo para homem também. O primeiro ajeitadinho que chamar para jantar... Vendido para a senhorita de rosa ao fundo! Não adianta desesperar, não é verdade!? Vou fazendo. Uma hora dá certo. A árvore de Natal está montada. Não parece aquelas coisas perfeitas de Shopping Center (como eu até gostaria de fazer), mas tá bonitinha e fui eu quem fez. Então fico feliz. Hoje busquei algumas fotos que havia mandado ampliar na Labtec. Uma fortuna para um lixo de resultado. O efeito do papel metalizado ficou bem estranho em algumas fotos. Mas era exigência da escola. Eu prefiro a foto em papel comum memso. Algumas até no fosco de preferência. Anyway. Paguei uma fortuna por fotos que ficaram esquisitas e muito mais escuras na ampliação do que no tratamento todo que dei no computador. A menina me jurou que eles não mexiam no arquivo. Eu duvido. E estava com preguiça de discutir. Paguei e saí rosnando. Não vai dar para fazer portifólio, mas vou aproveitar algumas. Fazer uma série e colocar na parede. Assim que eu tiver uma parede para colocar. Outro ditado que aprendi: Se a vida te dá um limão, faça uma limonada. Eu gosto mesmo é de fazer caipirinhas, mojitos, limoncello. De qualquer forma, a idéia é deixar a coisa mais divertida. Verdade que não sou a melhor nisso. No geral fico só resmungando. Estou mais para Dramma Queen do que Party Girl. Mas eu tento. Uma hora a janela certa se abre. E daí... Vendido! Para a senhorita de rosa ao fundo...

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

BAD HAIR DAY

Acordei hoje às 7h, com a sensação de que deveria ter ficado dormindo. Tem dia que é assim. Melhor mesmo ficar na cama e fingir de morta para não piorar as coisas. Mas não. Eu levantei. Tentei inutilmente meditar para acalmar um pouco o vulcão dentro de mim. Fui flagrada pelo vizinho enquanto descia de pijama para buscar o jornal. Derrubei café no fogão (de novo!). Levantei documentação para a imobiliária do apartamento que finalmente eu ia alugar. Estressei durante meia hora para aceitar que duas das declarações não poderiam ser tiradas porque amanhã é feriado em Caieiras e o meu contador achou que seria legal emendar um feriado assim, no final do ano. Comecei a trabalhar, já recebendo um monte de críticas de um monte de gente de tudo quanto é lado. Minha assistente resolveu que “aviso prévio” significa que ela não precisa trabalhar, então ela não faz relatório, não dá satisfação. Simplesmente faz o que lhe dá na cabeça. Eu passei a manhã toda tentando descobrir o tamanho das pendências que ela está deixando para trás e juntando ao meu tamanho de pendência que já não dá mais para organizar nem em ordem alfabética. Depois tive uma tensa conversa por telefone, tentando me defender de ter cobrado que a inútil da minha assistente fizesse o trabalho para o qual ela foi contratada. Legal! Então eu respondi uma tediosa pesquisa de marketing e tentei inutilmente reaver o pagamento de um trabalho contratado que nunca foi executado. A essa altura do championship recebo uma ligação da minha corretora dizendo que o proprietário do imóvel desistiu da locação. Então assim, de uma hora para outra, uma coisa que estava resolvida na minha vida deixa de estar. Isso significa que eu preciso bater perna novamente, ver pulgueiros novamente, achar algo mezzo mussarela, mezzo calabresa, negociar, fechar contrato e mudar. Tudo até segunda-feira que vem, em tempo de passar festas e me organizar para viajar dia 1. Minha primeira reação foi chorar. E foi exatamente o que eu fiz. Deitei na cama e chorei por cinco minutos. Liguei para minha mãe, porque tem horas que tudo o que a gente quer é chorar no colo da mãe. Mas minha mãe está toda passiva-agressiva e foi a mesma coisa que nada. Depois de 20 segundos eu já tinha me arrependido de ter ligado para ela. Então eu resolvi que era melhor não pensar naquilo e tentar fazer algo bem inútil e fútil até me acalmar. Resolvi montar minha árvore de natal. Eu sei que está em cima da hora, mas eu adoro Natal e adoro árvores de Natal e eu prefiro ter uma árvore de Natal por uns dias do que não ter nenhuma. Abri a caixinha com as lindas bolas que eu comprei ontem. Todas em tons pastel e textura brilhante. Abri o pacote com o laço rosa que era para decorar e descobri que o laço era duro e ficava assutador na árvore. Depois consegui derrubar a caixa de bolas no chão e quebrar metade delas (que, claro! Eram de vidro!). Pensei em tirar o chinelo e pisar em cima dos cacos só para me autopunir. Em vez disso deitei na cama de novo. E chorei. De novo. Só mais cinco minutinhos. Então preparei algo para comer, almocei checando emails e saí atrasada para os exames médicos que eu tinha agendado e que demoraram um mês para eu conseguir conciliar todas as variantes necessárias para realizá-los. Meu carro foi fazendo um barulho estranho no pneu traseiro direito. O laboratório, bem. Esse merecia um capítulo à parte. Depois de eu ter de esperar 15 minutos para um segurança apertar um botão e me dar uma senha. Tive de esperar mais 25 minutos para minha senha ser chamada, 20 para dar entrada no pedido do exame e aprovação do meu plano de saúde e mais 15 minutos para uma enfermeira olhar meu papel, olhar para minha cara e me mandar esperar em outro andar do prédio. A sala de ultrassonografia estava sendo disputada por médicos e instaladores de ar condicionado (que limpavam a poeira que caía do teto em cima da maca com uma vassoura de chão!!!). A médica estava navegando por um site de compras entre um paciente e outro. Pedi para ser atendida em outra sala e com outro médico. Ainda tive de bancar a maluca com TOC para ter certeza de que o aparelho estava higienizado e pedir para eles limparem novamente com álcool na minha frente. Fiquei andando durante uma hora e meia no corredor do laboratório até que minha bexiga estivesse cheia para o ultrassom de vias urinárias e descobri que algo muito sinistro pode estar acontecendo com o meu rim esquerdo (ainda bem que ainda tem o direito!). Com toda a novela no laboratório, acabei pagando R$17 no estacionamento e perdi um teste de casting que era do outro lado de São Paulo até às 17h. Eu tinha decidido nunca mais fazer teste de publicidade ou trabalhar como atriz na minha vida, mas como eu estou precisando de dinheiro desesperadamente (afinal São Paulo resolveu virar a cidade mais cara do mundo enquanto eu estava fora), estou topando vender desinfetante em rede nacional sem fazer um pio. Ainda corri para o shopping para fazer um wire transfer para o projeto que vou participar em janeiro e as duas casas de câmbio que consegui chegar em tempo não faziam esse tipo de serviço. Completamente derrotada, saio do estacionamento sob o dilúvio que caiu no final da tarde em São Paulo. Vidro embaçado. Goteira do lado do passageiro. Está assim desde que roubaram meu carro e entortaram a porta. Fica uma piscininha no chão. (E não. Não tenho dinheiro para mandar arrumar.) Eu só pensava em chorar, parar no farol com um monte de carro buzinando atrás e chorar. Quando eu vi uma loja de artigos de Natal. Resolvi que ia resgatar meu “momento esperança” da manhã. Ia comprar novos enfeites para a árvore, luzinhas, e uma fita decente. Acontece que a loja era uma coisa de dar dó. Haviam enfeites de Natal horrendos, aprisionados em caixas em prateleiras baixas. Todos em pouquíssima quantidade e somente nas cores verde, vermelho e dourado. Nada branco. Nada rosa. Nada azul ou prata. Era a loja de enfeites de Natal mais triste que já entrei na minha vida. Olhei com compaixão para a vendedora e declinei a oferta de um guarda-chuva até o carro. Juro que o carro parecia estar a um pulinho só da porta. Só que com a chuva torrencial (e minhas sandálias de salto alto) eu consegui sentar na direção parecendo um pinto molhado. E me sentindo o ser mais miserável do planeta. Alguns dias são assim. A gente pode encher de mousse. Fazer chapinha. Amarrar em um rabo de cavalo, encher de presilhinha. Pode até fazer um coque, uma trança de raiz. Nada vai resolver. Há dias que nada vai fazer seu cabelo ficar legal. Melhor seria ter ficado dormindo. Mas enquanto eu estava encharcada dentro do meu carro, tentando enxergar alguma coisa pelo vidro embaçado. Esfregando minha mão no parabrisa, parada em um trânsito surreal. Rezando para não ser levada por alguma enxurrada. Enquanto eu estava ali me sentindo a pessoa mais miserável do mundo, a única coisa que eu conseguia pensar era: “Amanhã eu vou acordar mais cedo, e vou levantar, e vou fazer tudo o que eu não fiz hoje. E vou fazer mais. E vou fazer melhor. Vou achar um apartamento e adiantar as matérias. Vou organizar minha agenda. Vou malhar. Vou fazer. Porque eu não sou do tipo de mulher que vira para o lado e volta a dormir.” Talvez existam dias em que seja melhor nem levantar. Mas eu ainda sou daquelas que prefere enfrentar um dia inteiro de coisas dando errado, do que raspar careca só para evitar um cabelo arrepiado. Bad Hair Day a gente resolve assim. Esconde em um gorrinho, enrola uma bandana na cabeça, mas vai pra vida. Todo mundo sabe que tem dias que o cabelo fica horrível, mas há também os dias que (sem que a gente faça nada) ele nos faz divas!

domingo, 12 de dezembro de 2010

DOMINGO

Sabe o que faz um domingo? Acordar inchada de tanto dormir. Depois inundar a casa com cheiro de café fresco e beber a bialetti inteira lendo o jornal, pulando cadernos, recortando as ofertas de eletrodomésticos que te interessam mais. Cozinhar legumes para fazer uma maionese e deixar tudo na geladeira enquanto toma um banho e se arruma para dar uma volta com uma grande amiga. Tomar café (mais, nunca é de mais) e comer um pedação de bolo caseiro, com direito a cobertura e lambuzar os dedos. Então seguir tagarelando para a Etna, para olhar móveis, coisinhas de decoração. Anotar tudo, tirar medida com fita métrica na mão. Imaginar como seria ter uma sala maior para aquele sofá azul florido lindo, ou um pé direito duplo para preencher com aquela estante maravilhosa. Encher de livros. Fazer uma lista de prioridades para, quem sabe um dia, terminar de decorar a casa do jeitinho que a gente quer. Então comprar uma árvore de natal, com enfeites brancos, rosas e azuis. Comprar uma guirlanda com um Papai Noel fofo de ponta cabeça, para colocar na porta e (mesmo mega improvisada, mega acampada) entrar no clima das festas de final de ano. Porque eu adoro as festas, Natal, Ano Novo. Comer cereja e cortar panetone. A delícia de concluir um ano, comemorar, abraçar, sorrir e começar cheia de esperanças um ano novo. E eu tive um ano fantástico, só tenho o que agradecer e comemorar. Depois voltar para casa com sua amiga e bebericar uma cerveja gelada, com espuma de chopp, enquanto se aventura no fogão para fazer uma farofinha bem brasileira, com linguicinha e bacon e cheia de sabor. Almoçar de gula, ouvir elogios sem fim a sua comidinha e capotar na cama depois. Nada de dormir, só coçar a barriga de forma preguiçosa. Pensar na vida. Transpirando com o calor de louco, janelas abertas, ventilador ligado. Terminar o dia tomando uma ducha delícia para refrescar. Ler notícias e livros, bebendo água de coco gelada e baixar o episódio 10 de Grey´s Anatomy, para babar no Scott Foley sorrindo para a câmera. Isso para mim faz um domingo. Uma delícia de domingo. Simples. Sem grandes ambições. Mas de verdade.

sábado, 11 de dezembro de 2010

Se a gente for pensar, tempo é tempo. 24 horas para cada dia e isso não muda. Completamente democrático. Não importa se você é rico, pobre, gordo, feio, magro ou diva. São 24 horas em um dia e você precisa se virar para tirar o maior proveito desse tempo. No geral eu costumo atropelar. Começo a matar horas de sono, então passo a me alimentar no carro, entre um lugar e outro. Depois a vida social vai pro saco e quando eu vejo estou correndo como uma louca, sem fazer nada de produtivo e com uma lista de pendência kilométrica. O tempo continua o mesmo. Eu tenho plena consciência de que a culpada sou eu. Hoje eu dei reboot. Dormi. O dia todo. Muito. Dormi até meio-dia e meio. Acordei, comi qualquer coisa. Liguei a TV em algum filme e voltei a dormir. Até 16h30. Quando enfim sai para levar a Kika ao aeroporto e voltar para a cama. Agora escrevendo ainda estou com sono. Louca para terminar e voltar a dormir. Quero dormir mais umas doze horas e quando acordar repensar em como organizar a vida. Em como ganhar dinheiro. Em chegar até o final desse mês sem deixar meu saldo negativo. Em todos os textos que preciso escrever e organizar. Em como treinar uma nova assistente. Em tratar fotos no computador. Em organizar documentos para por minha vida em ordem. Em tirar fotos. Em fazer um plano estratégico de trabalho. Em comprar móveis. Em mudar. Em voltar a ter vida social. Em namorar. Em viajar para a Guatemala. Em fazer exames médicos. Em consultar minha dentista. Em comprar presentes de Natal. Em ser mais presente na vida dos meus amigos. Tenho uma “To Do List” gigantesca para resolver, mas nesse momento, eu só quero dormir.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

DOIS X

Ando pensando muito em como ser mulher é uma coisa definitiva. Não na questão óbvia e imutável dos dois cromossomos X. Mas em como sua vida está subordinada irremediavelmente a essa condição. Essa semana fiz exames ginecológicos de rotina, mamografia e fiquei menstruada. Isso significa uma série de procedimentos bem invasivos e pouco confortáveis. Meus seios foram achatados e massacrados em um aparelho enquanto eu gritava “Ui! Ui! Ui!”. E homem ainda reclama de exame de próstata. Só porque o médico precisa enfiar um dedo em algum lugar pouco confortável. Em mim enfiaram, além do dedo, um espéculo, dilataram, jogaram líquidos que ardiam, passaram gaze, recolheram secreções, tiraram fotos e filmaram. Depois foi a TPM. Os hormônios todos brincando de ping-pong com o meu humor. Eu comendo todo o chocolate possível e imaginável em um raio de 30Km. E agora vou ter de sangrar por uns dias e fingir que nada está acontecendo. Essas são questões biológicas. Básicas. Imutáveis. Fazem parte dos dois X no meu DNA. Tudo isso é chato mas faz parte. Tem uma função na roda da evolução. Está determinado desde que eu nasci, o médico bateu no meu bumbum, eu comecei a chorar e ele sentenciou “It´s a girl!”. A partir dali todo mundo sabia que seria assim. O que eu tenho pensado é no outro lado de ser mulher. No que não está determinado por cromossomos, mas ainda assim foi sentenciado no mesmo momento do tapa no bumbum. Tenho pensado em como a minha opinião vai ser sempre levemente subjugada por causa do tal cromossomo X. Como vão sempre me olhar com cara de espanto por eu viajar sozinha. Como eu vou sempre ser uma presa mais apetitosa para violência urbana. E as exigências estéticas da sociedade serão muito mais enfáticas. Como as decisões que eu tomar nessa fase da minha vida (casar, não casar. Ter filho, não ter filho. Fazer ginástica, não fazer ginástica. Etc...) são muito mais determinantes do que se eu tivesse um cromossomo Y. Essa semana tive uma reunião com um advogado que acabou de ter seu primeiro filho. Ele pediu para fazermos a reunião no café ao lado da casa dele, e lá estava ele com o bebezinho fofo de tudo enquanto discutíamos os procedimentos legais para a abertura da associação. O bebê chorou durante quase toda a reunião e por diversos momentos tivemos de fazer algumas pausas para ele ninar a criança. Claro que eu acho lindo pessoas com bebês, ainda mais os recém-nascidos. Nas mesas ao lado todo mundo olhava com ternura. Que louvável um homem fazendo papel de pai! Eu fiquei pensando. Se eu tiver um filho, e marcar uma reunião do lado de casa, e levar meu filho para a reunião. As pessoas vão achar louvável também? Será que vão enxergar como sinal de fraqueza? Será que vão achar apropriado? Será que a tolerância das mesas ao lado seria a mesma se meu filho começar a chorar? Não acho que o advogado esteja errado, pelo contrário. Acho que as mulheres deveriam poder fazer as mesmas coisas sem serem julgadas silenciosamente. Sem receberem olhares atravessados. Sem temerem pelos seus empregos. E se eu resolver não ter filhos agora, é algo que vai determinar o resto da minha vida. É uma escolha imutável. Eu não vou poder arrumar um cara de 30 quando eu tiver 56 anos e resolver engravidar. Não funciona do jeito inverso. E se eu ficar careca e barriguda, dificilmente isso será visto como sinal de seriedade e maturidade. As minhas relações românticas serão sempre regradas pela minha capacidade de me fazer levemente menos inteligente do que a pessoa com cromossomo Y que estiver ao meu lado. E mesmo eu sendo mais eficiente e produtiva, ainda será considerado futilidade os sapatos que eu compro. Mesmo que custem muito menos do que a motocicleta, o capacete e outros apetrechos dos hobbies dos cromossomos Y. Essas são apenas algumas coisas que foram determinadas quando o médico me deu um tapa na bunda e que não são naturais. Não são biológicas. Não são como TPM. Mas que é preciso lidar e de preferência de boca fechada. Não quero fazer apologia feminista aqui. Estou apenas refletindo e tentando entender. Porque tem coisas que eu sinto na pele, que nem consigo imaginar como mudar. Tem coisa que é biológica e eu não quero mudar. É como me imaginar sendo oriental ou negra. Não consigo. Mas todas as outras, que não estão em nenhum dos milhões de cromossomos do meu DNA. Essas são difíceis de entender.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

DESLIGAR

Sabe quando o carro está acelerado? Quando a gente anda com ele, pisa no acelerador e parece que vai arrebentar alguma coisa. Quando pára no farol ele fica berrando, fazendo mais barulho do que devia. Todo mundo em volta acaba olhando para o seu carro, parece que o mundo inteiro tapa os ouvidos com medo dos tímpanos estourarem. Às vezes é assim. Parece mesmo que vai estourar. Eu ando uma “bitch”. Tento tirar o pé do acelerador mas o motor berra chamando atenção de todo mundo em volta. Morro de vergonha. Ando dando patada em liquidação. Vendendo baratinho. Parcelinhas Casas Bahia. Hoje consegui até brigar com a coitada do telemarketing da TokStok que só queria agendar a entrega do meu rack. A coitada. Só fazendo o trabalho dela e eu demônia pelo fone de ouvido no carro “Muito bem então. Quero só ver essa entrega. Estou SUPER curiosa para ver essa entrega, mal posso esperar”. Tá cheio de louco no mundo e quando chamam por ordem alfabética eu saio logo de cara. Dei piti com a minha mãe que está no hospital com pneumonia. E com as enfermeiras que demoravam uma eternidade para atender o chamado. Paciência zero. Minha assistente pediu demissão. Passou a tarde chorando. Engraçado é que, se do lado de fora o motor tá berrando, por dentro eu estou transbordando de compaixão pela humanidade. Mas parece que toda essa compaixão está lacrada, selada. Sem ar. Eu não consigo nem meditar. Nem ficar um segundo concentrada. Queria desligar. Por uns dias, algumas horas. Achar uma brecha e reencontrar o centro.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

SE UM ANJO SOPRAR...

Tem coisa que só é fofo quando a gente é criança. Depois de uma certa idade vira possessão. Mas enquanto é criança, pode fazer careta à vontade que fica adorável.
Eu mesma só canto fazendo caretas no banheiro. E adoro!

COISAS QUE SÓ OUÇO DAS MINHAS AMIGAS

"Meu, você viu o cineasta italiano? Se matou... COM 95 ANOS! É muuuuuita prepotência."

sábado, 27 de novembro de 2010

CACHINHOS DOURADOS

Nada como começar um dia com “good news”. Ontem eu já estava atrasada para a primeira reunião do dia. Saí correndo, largando a cama desarrumada, secador de cabelo jogado em cima da pia do banheiro e comendo um bombom de cupuaçu como café da manhã. Entro no meu carro, que estava quase em frente ao prédio, já que aqui não tem garagem, e... o banco de trás estava abaixado. Hum! Não gosto nada disso. Dá aquela sensação estranha de algo fora da ordem. Como se eu fosse um dos três ursos descobrindo que alguém havia mexido no meu mingau. Então eu olhava em volta. A porta fechada, os vidros intactos. Comecei a procurar por algo faltando, porque eu certamente não tinha deixado o banco de trás abaixado. Meu creme de mãos, ok. Álcool em gel, ok. Cinco garrafinhas de água mineral semi bebidas, ok. Caixinha de lenço, ok. Carregador do IPhone... not ok! Putz! Levaram meu carregador. Tudo bem. Eu não ando com nada de valor mesmo no carro, e nem tenho rádio. Só então que me ocorreu que, no porta-malas estava o mega-presente que eu comprei para a Olivia e não tinha levado na casa da MH ainda. Olivia nasceu no feriado de 15 de Novembro e eu tinha comprado um berço dobrável de viagem super legal. Rosa e cinza. Paguei uma grana nele e quase enlouqueci as vendedoras para escolher o melhor. Eu as fiz abrir e montar três berços diferentes até escolher aquele. Ai que raiva viu! O banco de trás abaixado e o porta malas escancarado e vazio. Eles entraram pela porta do passageiro. Entortaram com alguma alavanca. Deixaram um vão barulhento e ótimo para chuva. O que me dá mais raiva não é só a invasão de pensar que alguém andou, ajoelhou, apoiou as mãos em um lugar que é pessoal e onde eu passo tanto tempo do dia. O que me dá mais raiva é ver que, depois de todo o trabalho e risco de entortar a porta, entrar no carro... neguinho vai embora e larga o carro! Como assim minha gente? Já fez o mais difícil, então leva o carro embora. Me deixa receber o dinheiro do seguro que vale mais. Dava para trocar de carro, comprar outro presente para a Olívia e eu ainda saía no lucro. Vou te falar. Não se fazem mais ladrões como antigamente. Eu fiquei grunhindo por um tempo. Ligando para as amigas para compartilhar meu horror com a falta de ética da bandidagem de hoje. Mas dando risada, porque não é esse tipo de coisa que vai abalar meu bom humor no dia. Na hora do almoço fui correndo na funilaria e o moço desentortou a porta em cinco minutinhos. Tudo em ordem, vida normal. Fez um dia lindo. Eu estava usando um macacão de malha ecológica creme novinho que comprei em Belém e todo mundo me dizia que eu estava bonita e elegante. Eu toda pimpona. Muita coisa acontecendo de bom ao meu redor. Não dá para arruinar um dia por causa de um episódio desses. Eu não lembro muito bem como termina a história dos três ursos, mas eu lembro que a cachinhos dourados estava cansada e com fome. Eu até desconfio que a pessoa que entrou no meu carro não tinha cachinhos dourados... mas espero que o berço que eu escolhi com tanto carinho para a Olívia chegue pelo menos a alguma criança que encontre nele mais segurança e conforto.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Eu fiquei sem internet esses dias viajando. Cheguei agora à noite em São Paulo e ainda vou longe trabalhando hoje. Mas eu tinha escrito alguns posts, que foram todos carregados de uma vez, em suas respectivas datas. De 21 à 24 de Novembro. Tudo aí embaixo.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

ELEGÂNCIA E MORTE

Estou em um bom humor insuportável. Eu sei bem o que você vai dizer. A pessoa precisa ir para Ilha de Marajó para ficar bem humorada. Em minha defesa vou dizer que podia ser pior. Eu poderia ter ido para Marajó e ficado rabujenta. Quem me conhece sabe que isso é possível. Mas não. Estou bem humorada e feliz da vida. Nenhum acontecimento extraordinário, só que eu acho que é melhor ser otimista e feliz. Dá muito menos trabalho. Então eu estou sendo prática. E egoísta. Ficando bem humorada visando única e exclusivamente meu bem estar pessoal. HAHA! Hoje eu acordei e tomei um café da manhã saudável. Resisti à tentação de encher meu prato com rabanada e essas coisas gordas que hotéis adoram colocar no buffet. Só não resisti a fatia de queijo de bufala fresquinho que parecia um requeijão de tão macio. Joguei um monte de geléia de morango em cima e resolvi que aquele ia ser meu pecado do dia. Depois saí para uma caminhada na enorme faixa de areia da praia que fica em frente ao hotel. Praia particular, quase deserta. Um vento gostoso disfarçando a temperatura que subia astronomicamente ao longo da manhã. Andando descalça e deixando meu cabelo se emaranhar. Fiquei tirando fotos de um bando de abutres comendo carcaças de peixes que as ondas do rio traziam para a praia. A gente estava tão perto da foz que o rio nesse trecho tem ondas, praia de areia e água salgada. Para mim é mar. Depois fiquei olhando as fotos e pensando que algumas pessoas achariam pesadas fotos de aves de rapina comendo carniça. Realmente a gente sempre associa a visão de um abutre ou de um urubu com morte, lixo, doença. Tudo de ruim que vem a mente. Mas eu só tenho conseguido ver beleza com esses meus novos olhos de fotógrafa. Enquanto eu estava agachada atrás de um tronco, apertando enlouquecidamente o disparador da minha câmera, eu fiquei pensando como a natureza é mesmo incrível. Como ela pensou em cada mínimo detalhe, inclusive na faxina das praia caso o mar trouxesse corpos de peixes do mar. Que aquelas aves, que nem são fofinhas como o filhote de coruja que apareceu no jardim ontem, possuem um papel vital dentro do ballet da vida que a gente insiste em bagunçar. São aves grandes, que ficaram um pouco desconfiadas com a minha presença ali em volta. Mesmo eu ficando quietinha, quase imóvel atrás de um tronco, elas se alternavam para comer o peixe e me vigiar de longe. Depois alguns turistas apontaram na orla e elas todas levantaram vôo juntas. Perdi essa foto porque fiquei babona olhando aquelas aves de asas compridas cortando o ar e compondo um quadro tão bonito com o céu azul, as nuvens e a cor da água. As penas nas pontas de suas asas são mais longas e grossas. Quando elas voam essas penas se abrem em cinco como se fossem dedos de bailarinas. É tão lindo! Ok! Eu sei. Estou falando da elegância dos urubus. Talvez isso soe meio estúpido mas eu não me importo. Gosto de pensar que a vida é assim. Toda elegante. Ah! Antes que eu me esqueça, porque acordei pensando em escrever isso aqui. Sonhei que alguém tinha assassinado o Lula! Hahahah! O dia cheio de boas notícias. No meu sonho a Dilma já estava morta há alguns dias, então eu estou no metrô de SP (olha só. EU no METRÔ!) e vem a notícia de que o presidente Lula tinha sofrido um atentado e morrido. No meu sonho eu tinha uma urgência em chegar em algum computador, porque de alguma forma minha função era noticiar, mas eu estava feliz pra burro. Ai, eu não tenho jeito. Começo o post celebrando a vida e a imbecilidade de estar feliz e bem humorada, para terminá-lo desejando a morte do presidente. Quem sabe uma coisa está ligada a outra? Talvez meu sub-inconsciente acredite que felicidade e bom humor funcionem bem em um mundo em que o Presidente Lula e sua duvidosa sucessora não existam.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

MARATONA MARAJÓ

Mais um dia de funcionária pública. Pegue seu cartão de ponto e vamos para a primeira parte da maratona. "Passeio Fluvial". Como eu estava com uma baita dor de cabeça ontem, fui dormir cedo e acabei acordando às 2h da manhã. Nem Jesus me fazia dormir depois disso. Fiquei fritando na cama, pescando até a vontade acabar e compensando todas as noites mal dormidas das últimas semanas. Hoje na praia a gente teve uma surpresa. Um filhote de coruja branca (LINDO! LINDO! LINDO!) tinha caído do ninho e estava com cara de perdido na areia. Se eu não tivesse tanto medo do barulho que ele fazia com o bico (Juro que aquilo pode arrancar um dedo), eu levava para casa. Embrulhava e escondia na mochila. Tomei um café reforçado e entrei na van super-mega-arcondicionada feliz da vida. Fomos até o porto de Salvaterra e pegamos um barquinho de pescador adaptado para levar turistas. O pessoal do grupo chamava o barco de "Pópópó". Referência direta ao som do motor (que parecia de geladeira) do barco que penava para atravessar o rio. Entramos no Igarapé do Garrote. Eu já fiz passeios semelhantes, mas dá uma certa emoção pensar que aqui já é mata amazônica. Esse é um tipo de passeio completamente diferente, se a pessoa vem para Marajó esperando o hedonismo das praias nordestinas. Eu gosto mais, mas eu sou eu e não sou referência nenhuma a não ser de mim mesma. Logo na entrada do igarapé um bando de garças e guarás. Show para brincar de Araquém Alcântara. Saíram algumas fotos legais, embora na maior parte do tempo eu ficasse brigando com o fotômetro e com o "pópópó" do barco. Subi para o teto e me lambuzei com a tele e as paisagens cruas, verdes. As raízes aéreas, a água escura e sem fundo. Essa coisa de fotografar é totalmente viciante. Talvez o melhor vício que tive até agora (depois da corrida!). Eu não consigo parar de ver fotos, pensar enquadramentos. Agora tudo o que eu faço, meu primeiro instinto é tirar a tampa da objetiva e apontar. Pode ser um pouco alienante mas eu vi o passeio todo pelo visor da câmera. E adorei. Ganhei algumas marcas da alça da camiseta nos ombros (um dia eu vou aprender que com a cor da minha pele eu PRECISO usar protetor solar além do rosto) e uma mancha vermelha na nuca, mas quem está reclamando? Fiz fotos ótimas. Um cartão inteiro de 2Gb. Voltamos para a pousada e eu lagartixei na piscina com meu livro por uma hora. Beberiquei água de côco e arrisquei umas braçadas na água, tomei um banho e almocei rapidinho para estar pontualmente às 13h na recepção e encarar os passeios da tarde. Um novo grupo da CVC chegou hoje e se juntaram para o mesmo passeio. Mais senhoras, casais de meia idade e quarentonas descoladas. Em vez da van, um microônibus. Pensei, agora sim dá para rolar uma musiquinha "Motorista! Motorista! Olha a pista. Olha a pista." Mentira. Não tive coragem. Eu já não sei mais o que fazer para ficar invisível, até parece que vou me meter a cantar no ônibus. Meio difícil não despertar a curiosidade do grupo inteiro. Geralmente só por ser uma mulher viajando sozinha já desperta a curiosidade de muita gente. As pessoas não entendem muito porque eu não tenho namorado, ou não tenho marido, ou não estou com um grupo enorme de gente, ou mesmo com uma amiga à tira colo. Pior ainda é que eu não sou obesa, nem feia, nem limitada intelectualmente. Então eu viro um gigantesco ponto de interrogação. Para ajudar agora eu tenho uma câmera bacanuda pendurada no pescoço. Já estava até rolando um bolão de que eu era alguma jornalista camuflada. Às vezes sinto como se eu fosse uma atração de circo. Ando me limitando a sorrir e evitar contato visual. Sei que existem técnicas mais eficientes, mas ando chata e preguiçosa. O roteiro da tarde foi em Soure, considerada a capital do Marajó. Uma cidadezinha toda planejada, cheia de ruas e travessas que não tem nomes, só números. Como New York. Lá fomos até uma praia lindíssima, que se chega depois de atravessar uma ponte de 300m no meio do mangue. A praia, uma faixa sem fim de areia branca, com árvores perdidas aqui e ali. Raízes aéreas encontrando o solo, a maré baixa formando ilhas de terra até cair no mar. Choupanas de palha para a gente sentar embaixo e respirar a paz de um lugar que parece estar quase intocado, puro. (Vinte minutos para "explorar" a praia. Humpf!). Depois corremos até uma olaria indígena e loja de artesanato em cerâmica. Visitamos um Batalhão de Polícia Militar que usa búfalos na guarda montada. Fomos até uma fazenda de búfalos, tomamos café com bolinhos de tapioca, manteiga de búfala e suco de manga fresquinho do pé. Seguimos para um curtume e loja de artesanato de couro (tinha umas bolsas maravilhosas de couro de búfalo, mas achei cara e com um acabamento fraquinho). Tudo isso para voltar a tempo de pegar a balsa para Salvaterra às 18h. Com direito a Pôr do Sol lindo refletindo na água do rio. Agora à noite, enquanto eu mastigava um filé de búfalo com mussarela e arroz de jambu (vi tanto dos bichinhos hoje... eu precisava comer um deles à noite, não!?), um grupo folclórico da região apresentava coreografias de carimbó no salão do restaurante. Mais fotos lindas. Lua cheia toda enevoada também. (mas essa foto não ficou linda). Saí à francesa agora e me tranquei no quarto. Fiquei pensando no dia que tive. Me diverti com muitas coisas. Fiz coisas que certamente não teria a oportunidade se não me enfiasse em um grupo. Mas em alguns momentos do dia, eu olhava pela janela do ônibus, toda refrescada pelo ar condicionado, e me batia uma pontinha de tristeza. Uma vontade de me jogar no bafo quente, de ir para aquelas ruas andar sem rumo, bater papo com os moradores. Sentar em um boteco e ver a vida passar, sem pensar que eu tenho 20 minutos para fazer qualquer coisa. Sentei na minha cama e pensei "Então é assim que vivem os gafanhotos?". Não quero soar metida, ou ser mal agradecida com a oportunidade de conhecer esse lugar paradisíaco, de fazer essa viagem. A vida é sem dúvida generosa demais da conta comigo. Então eu vou parar de pensar e só agradecer. Agradecer a chance de ser gafanhoto por uns dias. Porque isso também reforça minha alma mochileira, que cada dia mais, tenho certeza que, mochileira sempre será.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

MARAJÓ

"Pois diga que irá
Irajá, Irajá
Pronde eu só veja você
Você veja a mim só
Marajó, Marajó"

Eu sempre gostei de Gil. Mentira. Eu sempre amei Gil. E se o Gil mandou ir para Marajó, a gente vai e não discute, certo!? Acordei 5h30 na segunda-feira. Tempo só de me arrumar e fechar a mala, e Taís já estava interfonando para o meu quarto avisando que aguardava na recepção. Taís era a guia responsável pelo receptivo até a pousada em Marajó. Uma garota nos seus 20 e tantos anos, sorridente, e com o delicioso sotaque paraense. Ela tem aquele jeito de quem adora o que faz, embora deva ter algumas limitações de formação. Ela tinha um energia e uma paciência descomunal para responder todas as perguntas, dar dicas e sugestões para as 13 pessoas que também estão fazendo o roteiro "Belém e Marajó Maravilhosos". O grupo é formado em sua maioria por mulheres, senhoras viajando com as amigas e dois casais de meia idade. Eu ganhei o troféu caçula sem nem precisar mostrar a identidade. São Paulo (capital e interior), Rio e Minas. O Sudeste em peso viaja. Ainda acho que somos a locomotiva e mais uns 5 vagões desse país. Uma van nos levou até o porto e lá vamos nós balançar 3h30 em um barco até Marajó. Mal pisamos na ilha e já fomos jogados dentro de uma van com ar condicionado que nos trouxe até a Pousada dos Guarás. Nem toquei na minha mala. Tinha sempre alguém carregando daqui, levando dali, e eu me sentindo inútil no meio de tudo. Se eu não tenho de carregar minha própria bagagem, qual é mesmo minha função nisso tudo? Cheia de adesivos do Guia 4 Rodas na porta de entrada e reproduções de reportagens nas paredes, a Pousada é uma área enorme com chalés espalhados em um gramado entre coqueiros, piscinas, trilha de arvorismo e uma praia particular de frente para o Rio Pará. No meio do gramado alguns cavalos mirrados olhando a vida e até búfalos (a criação de búfalos é uma das principais atividades econômicas do arquipélago). Quartos simples e confortáveis. Uma das tops de Marajó. Tivemos um tempo livre, que eu sabiamente usei para tomar uma caipirinha na beira da piscina e mandar bala no livro que estou lendo e amando. Almocei um Frango no tucupi delicioso e segui para o passeio programado à tarde. Vila de Joanes, onde a promessa era visitar "ruínas das antigas missões jesuítas", que se traduziram em duas paredes resistentes em cima de um penhasco. Vista bonita, mas nada muito emocionante. Como a gente é carente de história e conservação de patrimônio, não? Na volta passamos pelo centro de Salvaterra, o município que estamos hospedados. Acho que era Happy Hour então as ruas e bares estavam cheios, meninas arrumadas com roupas provocantes e salto. Os rapazes exibindo os biceps e as motocicletas. Ah, isso é universal. A tal da dança do acasalamento. O ônibus estacionou e o guia nos deu 20 minutos para "explorar" o lugar. Vinte minutos. Hum. Saí do ar condicionado para o bafo quente da rua. Parei em uma barraquinha de calçada e tomei um Tacacá. Prato típico no Pará que as pessoas costumam tomar no final da tarde como um aperitivo para abrir o apetite para o jantar. Um caldo de tucupi bem temperado que recebe goma quente (um derivado da mandioca), jambu (uma erva verde escura com poderes anestésicos) e camarão seco. Você vai tomando o caldo em uma cuia que se mistura à goma e, com um palitinho de dente, espeta o jambu e os camarões. Delícia, mas mega forte. Quem disse que dá para jantar depois de um prato desses está louco. Eu fechei a noite naquilo mesmo. Voltei para a pousada com uma mega dor de cabeça e uma sensação meio ridícula de ter passado tanto tempo dentro de um ônibus. Eu sei que esses pacotes turísticos dão oportunidades para uma fatia enorme da população de viajar e conhecer lugares e culturas diferentes. Mas eu não consigo me livrar da impressão de que estou apenas cumprindo um protocolo. De que falta um bocadinho ainda para chegar na Marajó de verdade. Talvez eu esteja mal acostumada. De qualquer forma, preciso moderar minha mania de querer controlar e ter expectativas de tudo. As coisas são como são. Pode não ser o meu ideal de viagem, mas é uma forma de viajar. Legal experimentar outros formatos para variar. Melhor mesmo é aceitar e tirar proveito ao máximo. Quem sabe amanhã eu não puxe "O jeep do padre fez um furo no pneu" dentro do ônibus para animar a galera!?

domingo, 21 de novembro de 2010

BELÉM DO PARÁ

Minha mochila nem esfriou no armário e lá estou eu novamente na estrada (ou melhor, no aeroporto). Eu adoro viajar pelo Brasil. É um continente todo próprio de possibilidades. Já fazia um tempo que eu queria atacar o norte do país, e quando a gente fala em norte vem logo a mente a Floresta Amazônica e Belém do Pará. Chegar em Belém tem um gostinho de viagem internacional. São três horas em um avião (eu demorava muito menos na maior parte dos trechos que fiz pela Europa), então o sotaque é tão forte, o vocabulário todo próprio, a paisagem, cores, cheiros. E como sempre, como todas as vezes que vim para o Norte-Nordeste, fico me questionando o que nos faz nação. Como essa viagem é um bate-volta, e o propósito é mais de trabalho, vim com um pacotinho CVC. Nunca tinha viajado com essas companhias de viagens antes. Tô achando um luxo essa coisa de "transfer no aeroporto", "receptivo" e "city tour". Dormir em hotel com TV, frigobar, Ar Condicionado e sem nenhum coreano tagarela roncando na parte de baixo do beliche. Mas tive de aturar uma senhorinha japonesa que estava do meu lado no avião looooouca para compartilhar sua empolgação. Empolgação mesmo foi entrar na van do transfer e descobrir que ela e as três amigas dela estão fazendo o mesmo pacote que eu. Ficou toda animada, coitadinha. Eu me sentindo culpada. Ok! Às vezes eu estou mais aberta para interações sociais com estranhos, mas no geral não sou conhecida pelo meu bom-humor e simpatia. Cheguei no hotel e já liguei para a CarolH. Fomos bater perna pela cidade e tentar tirar algumas fotos. Esqueci que nessa região chove todos os dias. Tava um Sol lindo quando pousei no aeroporto, mas no meio tempo de chegar no hotel e arrumar as coisas, o céu tinha nublado e destruído minha luz azul linda de tirar foto de coisas coloridas. Ainda assim tirei alguma coisa que dá para usar, com cara cinza de céu todo poderoso.Tomei um "Guaraná Garoto" na Praça da Republica, que a vendedora jogou dentro de um saquinho e me deu para tomar com um canudinho. Adoroa lógica prática de preservação dos vasilhames. Andamos até o famoso "Ver o Peso", comemos Pirarucu com Açaí e provamos uma infinidade de sorvetes diferentes. Todos um desbunde. Sapotilha, tapioca, bacuri. Coisas que só existem por aqui e para mim é difícil explicar. Como explicar que a semente, ou fruta, ou raiz, ou folha, ou algo inominável e que só existe nessa região do mundo, e que foi processada e utilizada por alguma tribo indigena para algum propósito terapêutico, e que acabou caindo no gosto popular e chegando à mesa do nortista comum? Mais do que um outro país, parece mesmo que estou em outro planeta. Depois andamos pelas Docas, que parece uma galeria com lojas e restaurantes mais sofisticados. Eram as antigas docas da cidade e passaram por uma mega recauchutagem. Tem um deck longo para as pessoas passearem a beira rio, mesinhas em choperias chics, galpões de vidro, banheiro limpinho e ar condicionado (nem vou ficar com aquele chororô que todo mundo tem quando o assunto é temperatura em Belém. É quente? Sim. Muito? Muito. É o que é. E ficar repetindo que é quente não vai mudar nada a situação) Verdade que é meio cafona, mas às vezes eu acho que gente que reclama desse tipo de restauração de espaço urbano é intelectual da Vila Madalena que quer manter tudo com uma certa estética de miséria para se sentir menos culpado de tomar vinho impor'tado. Qual é a graça de vir para o Norte do Brasil se está tudo cafona e com paredes de vidro? Ainda cafona, eu acho legal que a população daqui tenha algo arrumadinho e bonito para poder passear. As meninas botam vestido e salto alto para andar de um lado para o outro no deck. E mesmo que elas nunca tenham ouvido falar de Manolos ou Laboutins, eu gosto de ver que isso é universal. Eu também tenho meus endereços em São Paulo onde eu gosto de andar de um lado para o outro de salto alto. Agora à noite a gente foi ver a estética de miséria que infelizmente é grande parte desse país. Fomos para o bairro da Cremação para jantar na Peixaria do Careca. Famoso por todos os lados, o Careca em questão é o dono de uma garagem com meia dúzia de mesas de plástico na calçada. O cardápio, bem simples, foi impresso à jato de tinta e laminado na papelaria do bairro. Peixes nas melhores receitas paraenses e algumas opções básicas para os menos afoitos a novidades, como PF, bife à cavalo e filé de frango à milanesa. Tudo muito simples e com promessa de bem feito. Mandamos ver uma caldeirada mista de peixe, que ele adicionou camarões e patinhas de caranguejo. Veio acompanhada de arroz branco e pirão. Aquela panelada fervendo, inundando de cheiro verde nosso paladar. Um crime! Comemos como duas felizes. Eu ainda que amo pirão. Sobrou a panela inteira, que fizemos uma quentinha e levamos para uma moradora de rua no caminho de volta. Ainda pensamos em dar uma volta na feira da Cremação, mas a maior parte das barracas estavam fechadas. As únicas resistentes eram algumas de sopas e comida rápida de rua. Um grupo de pessoas viam o show de Paul McCartney em uma TV improvisada, enquanto um casal comia um PF nas mesinhas mal iluminadas por uma instalação elétrica puxada de gato do poste da esquina. Ao lado deles, no balcão da barraca, três baratas dançavam frenéticamente. Uma delas, tão feliz e confortável, tinha as asas levantadas. Parecia que torcia \o/. Eu não resisti. Comentei mesmo, e bem alto "Olha só, as baratas!". Em toda volta era como se o comentário nunca existisse. O casal continuava comendo, a cozinheira mexendo a sopa. Nem Paul McCartney notou. As baratas faziam parte, eu é que não. Então é curioso, pensar que me sinto mais parte de Roma, na Itália, ou de Amsterdam, na Holanda, do que de uma capital do meu próprio país. E daí? Daí que é muito contraditório, que é muito diverso. Talvez por isso que eu ame, e eu sinta mais sede de viver e conhecer. Porque como o Brasil não há. Ainda que seja tudo diferente, e tão distante do que eu chamo de realidade. Ainda é Brasil. E é por ser tão diferente que é tudo Brasil, e meu país.
Foram dez dias sem internet. E uma semana intensa de trabalho e noites de pouco sono. Aqui ficaram apenas os grilos. Sabe terreno baldio sem nada? Só com mato? Os grilos fazendo barulho no meio da escuridão. Acho que o mais difícil dessa volta para casa está sendo domar a avalanche de coisas que eu tenho feito. Eu tentei me organizar antes de voltar. Fiz até uma planilha de Excel com rotina, tempo de lazer, minhas corridinhas. Mas um mapa é só um mapa. É como seguir o GPS do carro. Se tombou um caminhão no meio da marginal a gente pega a primeira saída que dá e deixa o GPS recalcular o trajeto. Adaptação é uma virtude dos fortes. Eu acho. Então eu fui correr mesmo só um dia. Tive duas gripes fortíssimas e inexplicáveis. Bem estranho. Duas gripes em menos de um mês. Ignorei completamente. Fui me entupindo de paracetamol e tocando a vida. Mas não dá para abusar de exercício físico quando nosso corpo dói. Agora estou bem. As olheiras profundas são das poucas horas de sono, e do peso que não paro de perder. Só fui ter idéia do tanto que tinha perdido durante a viagem quando cheguei no Brasil e me pesei pela primeira vez em meeeeses. Surpresa mesmo foi ver o ponterinho da balança continuar a cair nessas semanas depois de ter voltado. Inexplicavelmente. Não paro de emagrecer. 52Kg e caindo. Acho um luxo tentar engordar. Ontem pedi uma pizza enorme e comi sozinha entre jantar e café da manhã de hoje. E uma barra de chocolate GG. Já fiz tanta coisa para emagrecer. Chega a ser irônico ter de me esforçar agora para segurar o peso. Não por vaidade não. Completa falta de grana. Estou completamente sem roupas. Todas minhas calças estão largas, e eu não posso comprar roupas novas agora. Pois é. A vida é irônica. De qualquer forma, eu me sinto estranha de voltar aqui depois desse tempo e de tudo que tenho feito das 7h às 3h. Já estive afastada do blog outras vezes, mas acho que nunca me senti estranha como agora. Vou precisar pegar o assunto aos poucos. Acho que é um pouco de vergonha.




Faz menos de um mês que eu voltei e minha vida agora está assim. Colocando em ordem tudo o que ficou pendente nesses 8 meses com o trabalho, recebendo gente, fazendo planejamento até o final do ano. Tem um projeto que está de vento em popa, só que eu não falo sobre ele até que ele seja uma realidade. Uma idéia que foi se formando em 8 meses de viagem e eu voltei seca para colocar em prática. Eu acredito que quando uma coisa é para acontecer o universo conspira. E do jeito que as coisas têm acontecido tão rápido, acho mesmo que o universo está conspirando. Fora desse que é meu “carro-chefe”, tem o curso de foto. Vou confessar que estou sendo uma aluna meio relapsa. Eu já devia ter entregue um mega relatório e fotos ampliadas que não tive nem tempo de cuidar. Coisa feia. Tenho também dedicado um tempo para organizar meus projetos de literatura e procurar um apartamento. E o planejamento de uma viagem para janeiro. Falando em viagem, pintou uma outra essa semana. Vou à trabalho para Belém do Pará amanhã cedinho. Aproveitar e esticar dois dias na Ilha de Marajó (que eu sempre fui louca para conhecer) e jantar com a CarolH amanhã à noite que está por lá fazendo pesquisa de culinária amazonense para o livro dela. Colocando tudo aqui nem parece tanto. Mas está difícil entender porque eu não consigo tempo para dormir.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

ALONE

Hoje o técnico veio arrumar a geladeira. Eu fiquei a tarde toda trabalhando e arrumando as coisas no apê esperando ele aparecer. Quando ele chegou eu estava montando uma estante de metal que eu comprei no setor de “Faça você mesmo” da loja de materiais de construção. O cara chegou, arrastou a geladeira e, enquanto mexia nos fios, ficava me olhando de rabo de olho. Eu lá, tentando encaixar o tubo B com o tubo H e o parafuso G. Então ele me pergunta “Você gosta de fazer isso?”. Eu abaixei a chave de fenda e fiquei olhando para a cara do técnico. Sabe que eu não tinha pensado nisso? Se eu gosto de montar uma estante de metal no meio de uma sala caótica e vazia com metade das minhas coisas enfiadas em caixas. Mas eu não tenho muita opção. É isso, ou continuar com tudo nas caixas. Foi essa minha resposta. Ele continuou, “É raro ver mulher fazendo isso. Geralmente elas deixam para os maridos, para os namorados...” E continuou lá falando atrás da geladeira. Eu gosto de fazer as coisas sozinhas. Desde pequena. Aos 18 resolvi que queria fazer faculdade nos EUA. Fiquei um ano e meio correndo atrás de toda a papelada, estudando, fazendo TOEFL, cuidando da burocracia. Quando fui aprovada, cheguei com o papel para os meus pais e fiz as malas dois meses depois. Comprei meu primeiro carro sozinha, embora meus pais tivessem condições de me dar um. Sempre adorei ir ao cinema sozinha. Viajar então! Passei os últimos 8 meses fazendo isso. Também sai de casa sozinha, sem ajuda de ninguém. Claro que minha família sempre me deu muito apoio, e eu tenho uma rede de proteção de amigos invejável. Tenho mesmo os melhores amigos do mundo. Mas eu sempre fiz as coisas sozinha. Sei lá. Desde que saí de casa aos 21 anos eu mudei 8 vezes. Inclusive voltei para casa dos meus pais por um período. Todas essas mudanças eu fiz sozinha. No começo do ano minha irmã me ajudou uma tarde a encaixotar algumas coisas, mas de resto era eu e eu. Fechando cada caixa, embalando cada copo, chamando carreto, carregando caixa pesada de livro. Então chega na nova casa e abre caixa por caixa. Vai colocando cada coisa em seu lugar. Eu sei que se eu precisar eu posso dar um telefonema e vou ter pessoas me ajudando de todas as formas que elas puderem. Mas a questão é, eu continuo sozinha. Fazer as coisas sozinhas é muito legal. É uma conquista para a maioria das pessoas. Conheço muita gente que morre de fome mas não senta em um restaurante sozinho. É uma coisa que parece bobeira, muito simples até, mas é um grande desafio para muita gente. Então eu tenho orgulho da minha independência e do tanto de coisas que eu faço sozinha. Eu gosto de fazer as coisas sozinhas, e de curtir minha própria companhia. Eu escolho ficar sozinha muitas vezes. Troco um barzinho com galera no sábado à noite por uma taça de vinho sozinha na sala de casa fácil, fácil. E isso é uma grande conquista de ter me encontrado e estar feliz comigo. MAS... hoje, sentada no chão no meio dos tubos da minha estante nova eu entendi que eu não estava apenas sozinha, mas construindo uma vida sozinha. A vida segue, a gente vai tocando. Vivendo os dias com o que se tem, e o que eu tenho é que eu estou sozinha. Então eu compro coisas de gente sozinha, e arrumo um apartamento de gente sozinha. Eu faço coisas de gente sozinha. Tenho rotina de gente sozinha. Carrego caixas e malas por três andares de escadas, porque eu estou sozinha. Escolho a cor da cortina única e exclusivamente dentro do meu gosto pessoal, afinal, é o único em questão. Eu me esparramo em uma cama Queen size, porque não tem mais ninguém para dormir nela. Eu posso até dormir cada dia de um lado. É uma cama de solteira. Eu nunca me incomodei. Mas hoje eu entendi porque talvez eu tenha passado 18 horas chorando de domingo para segunda. Porque eu estou seguindo minha vida, construindo uma vida, quando na verdade eu quero compartilhar uma vida. E compartilhar é um verbo que a gente não faz sozinha. Eu posso controlar um milhão de coisas que dependem de mim. Sozinha. Posso comer em um restaurante, sentar em uma sessão de cinema com um potão de pipoca. Posso mochilar pelo mundo. Sentar em um bar de jazz e tomar um drink. Posso ir a concertos, museus. Posso dormir até o meio dia, ou acordar de madrugada e praticar esportes. Ficar horas dentro de uma livraria, ler o jornal na padaria. Posso freqüentar cursos, sair para dançar, tirar fotos na rua, participar de reuniões. Eu posso determinar um milhão de coisas sozinha. Porque essas são conquistas que a minha independência me trouxe. Mas eu não posso controlar como compartilhar minha vida. Porque todo o resto, só depende de mim. Eu sou uma pessoa muito comprometida quando me envolvo. Depender de nós mesmos sempre me pareceu muito libertador. Agora eu estou presa na minha independência. Compartilhar não depende só de mim. Não se compartilha quando só um dá e a gente nem sabe ao menos se o outro recebeu. Compartilhar vida exige ação de dois. E eu sou sozinha. Talvez eu precise fazer o inverso. Aprender a fazer as coisas junto.

VOCÊ ESTÁ PASSANDO POR UM NOVO TRÂNSITO ASTROLÓGICO

SOL NA CASA 4, LUA NA CASA 7

DE: 10/11 (Hoje), 22h31
ATÉ: 13/11 , 15h13
Ocorrido anteriormente em: novembro/2009


O período que vai de 10/11 (Hoje) a 13/11 é marcado pela Lua, que entra em fase crescente, formando um ângulo tenso com o Sol. O conflito aqui é traduzido como um choque entre suas necessidades reais de introspecção neste momento, explicitadas pelo Sol na Casa 4, versus um desejo emocional de agradar o outro, de atender às necessidades do ser amado. O conflito aqui poderia ser traduzido da seguinte forma: o que você quer neste momento, no fundo de sua alma, tem a ver com o que sua(s) pessoa(s) querida(s) também querem? Este é o tipo de trânsito planetário em que você pode receber cobranças dos outros, que talvez não entendam bem esta sua temporária necessidade de recolhimento. De todo modo, seria interessante você esperar o final deste trânsito lunar para poder resolver suas questões afetivas, pois a fase astral atual tem uma carga de forte contradição!

Isso significa que até dia 13 às 15h13 eu não faço nada!

domingo, 7 de novembro de 2010

MOVING

A vida é feita de mudanças. Milhões delas. Um dia a gente acorda, tem uns fios brancos aparecendo no espelho. Uma dor nas costas que a gente nunca tinha sentido antes. Ficamos até mais tolerantes em relação a uma porção de coisas (para um monte de outras continuamos teimosos e rabugentos). Ontem eu mudei. Não dessa maneira sutil que o tempo e a vida nos trazem. Mudei de mudar mesmo. De botar a calça jeans velha, uma camisa xadrez e carregar caixa pesada escada a cima. Não é um lugar definitivo ainda, mas é meu primeiro passo para voltar para a cidade e organizar minha rotina. A Cí tem um apartamento em Pinheiros que ela está terminando de reformar. Vaziozinho. “Dri, pega suas coisas e fica lá em casa até você se organizar. Assim você tem tempo de procurar um lugar com calma.” Nem precisou oferecer duas vezes. No dia seguinte eu já estava arrancando a chave das mãos dela e chamando um carreto. Só a idéia de poder concentrar tudo o que é meu em um único espaço físico (e poder ter noção real do que eu ainda tenho ou não na vida) pareceu cair do céu. Eu sou meu xiita no quesito “quero tudo arrumado ao mesmo tempo agora”. Quando eu mudo, gosto da casa com cara de ser habitada há décadas no final da tarde. Dessa vez não foi bem assim. Peguei minha faxineira de manhã e fomos as duas dar um gás no apartamento antes do carreto chegar e colocar caixas em todos os lugares. Acontece que o apartamento estava imundo. IMUNDO! Sabe quando fazem aplicação de gesso e fica tudo branco? Então. Tenta limpar casa suja de gesso, tenta. Às vezes eu sentia que a gente estava vivendo o Mito de Sísifo. Varria, limpava, passava pano, ficava bonitinho. Quando secava, continuava tudo branco. Vontade de chorar. Um apartamento tão pequenininho e parecia que a gente não ia terminar nunca. Não terminamos. Conseguimos dar uma bela geral, deixar as coisas mais ou menos organizadas e a cama arrumada. Isso já eram 20h. Eu ainda tinha aniversário da vovó. Voltei mega tarde e capotei. Literalmente. Melhor jeito de ignorar a zona que está isso aqui. Como eu falei, o apartamento está terminando reforma. Então agora, além de tentar abrir todas minhas caixas e arrumar as coisas, eu preciso acertar os detalhezinhos que estão pendentes. A geladeira não está gelando (assistência técnica durante a semana e comer na padoca até segunda ordem), o pezinho do fogão está quebrado (juntei umas madeirinhas e fiz um calço, tipo quando a gente dobra guardanapo de papel para não deixar a mesa do bar bamba). A pia da cozinha não está instalada. Isso vai ser mais complicado, precisa de um pedreiro e a Cí precisa ver como ela vai querer o gabinete que fica embaixo. E o chuveiro está bichado (resolvido. Comprei um novo hoje na Leroy Merlin por R$25. Agora só preciso achar alguém para instalar na segunda-feira... já me disseram que não é uma boa idéia fazer isso sozinha.) O interfone está desconectado e a escrivaninha precisa instalar. Estou sem intenet, sem TV à Cabo. Preciso comprar uma estante para meus livros. Meus sapatos estão amontoados no meio da sala, parecendo o Monte Fuji. Eu tenho 7 caixas de mudança que nem foram tocadas ainda. Continuam com o lacre. Com toda a loucura e falta de tempo que está minha vida, essa adição de tarefas caseiras quase me deixou louca nos últimos dois dias. Eu sou virginiana. Padrões estéticos e ordem são realmente necessários para a minha saúde mental. Então eu começo a olhar para a toda a bagunça, começo a fazer lista de coisas no meu caderninho para não esquecer de nada, e olhando dessa forma a coisa começa a ficar bem desesperadora. Quase 48h que eu comecei a mudança e não está com cara de que vai ficar em ordem tão rápido. Essa situação de impotência perante a desorganização me deixa bem angustiada. Me faz sentir insegura. “ÊÊÊ Laiá Dona Adriana! Vai saber porque a vida está te colocando nessa situação logo de cara, chegando de volta em casa!?” Pois é. Talvez porque se tudo fosse do jeito planejado, eu iria continuar rolando pedra montanha acima só para vê-la despencar quando chegasse ao topo. Talvez porque na minha vida eu rolei pedra demais. E eu acho que estou chegando no momento em que, se a pedra tá afim de ficar lá embaixo, que bom para ela. Vou deixar ela lá. Ficar um pouco acampada no meio das caixas, porque a gente não se instala impecavelmente em 15 dias. Não precisa estabelecer certezas só porque eu voltei para casa (mesmo porque, durante toda a viagem eu só carreguei incertezas). Quem quer fazer muita coisa, acaba não fazendo nada. Eu percorri milhares de kilometros esse ano. Não tem como voltar ao mesmo lugar. Não dá. Então eu mudei. Assim como esse apartamento, essa mudança não é definitiva. E cair no truque de achar que é, é como rolar pedra morro acima. O segredo é cuidar das coisas que eu tenho controle. Ligar para a assistência técnica, pendurar roupa no cabide. Tomar banho gelado, passar pano úmido no chão e rever a trilogia do Kieslowski que eu roubei da minha irmã no laptop mesmo. Porque é sábado à noite e eu não vou conseguir transformar esse lugar em uma casa se eu ficar acordada até as 4h da manhã todos os dias. Eu não sei nem de que lado da montanha eu quero ficar. Quanto mais carregar a pedra comigo.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

STRIKE A POSE!


Minha primeira câmera fotográfica eu comprei com 18 anos. Uma Pentax K1000. Acho que esse era o modelo “minha primeira reflex” de todo mundo na época. Fui lá na Sete de Abril. Dinheirinho juntado e mais ajuda da mamis. Comprei a Pentax, um filtro skylight, dois rolos de filme P&B da Fuji ISSO 400 e um envelope de papel fotográfico. Me inscrevi em um curso do Senac. Sonhava em juntar mais dinheirinho e comprar uma tele. Uma Nikon automática. Sempre gostei muito de tirar foto de gente. Na mesma época eu faculdade também tive aulas de fotografia. Mas era mais genérica. O legal era que o laboratório era liberado. Eu podia brincar de revelar filmes e ampliar. Experimentar técnicas de máscara, ficar na sala escura por horas. Tudo saía meio tosco, porque eu ainda estava aprendendo. Mas eu amava. Quando saí da casa dos meus pais, com 21 anos, fui dividir com uma amiga fotógrafa. Procuramos um apartamento planejando transformar o quarto da empregada em uma sala escura. Não preciso dizer que o quarto da empregada nunca mudou de status. A gente ficou tão ocupada com os 20 e poucos anos que tudo foi ficando procrastinado. Fiquei tão ocupada me tornando a “dancing queen”, descobrindo a música eletrônica (pois é! Eu já gostei disso...), fazendo um milhão de amigos... Até que eu fui ficando cansada da noite. Então a gente envelhece, entra na corrida das carreiras. Começamos a priorizar a conta bancária (que nunca ficava positiva), o corpo em forma, o sapato de marca. Os relacionamentos se complicam. Será que eu caso? Será que eu compro uma bicicleta? Será que eu vou na liquidação do QBazar no Jockey? No Ano Novo eu sempre fazia minha listinha de objetivos. Imprimia em uma cartolina, plastificava e colocava na agenda do ano. Nela tinhas as coisas que eu queria conquistar. Academia 3 vezes por semana. Trocar de carro. Emagrecer 6 Kilos. Viajar para NY. Comprar um laptop. E uma mega câmera fotográfica. E assim iam se passando os anos. Eu nunca comprava a câmera. Durante esse ano, durante toda a jornada que passei, eu fui revendo tudo o que eu gostava, o que eu queria, o que eu era. Então eu achei aquela garota descabelada, que queria ter uma sala escura no quarto da empregada. Achei ela perdida dentro de mim e me perguntei “Porque mesmo que eu a abandonei?”. Então quando eu estava fazendo minha lista de “Coisas que eu gosto”, meu passaporte emocional de volta para casa, eu coloquei lá. “Comprar uma mega câmera fotográfica (e fazer um curso de foto)”. Dessa vez eu fiz. Porque agora o foco é não me perder mais de mim. Troquei idéia com amigos que fotografam sobre equipamentos, aceitei dicas e, antes de embarcar de volta, comprei minha primeira câmera reflex digital. Uma Canon EOS 500D e mais três jogos de objetivas. Uma mochila linda para carregar todo o equipamento. Me inscrevi em um curso de foto que começava logo no dia que eu cheguei. Não quero nunca mais procrastinar. A gente vai deixando para depois até um dia que não nos lembramos mais porque estamos fazendo as coisas que fazemos. Com toda a bagunça que ainda eu preciso organizar nessa minha vida de volta, eu tenho ido no curso de foto direitinho. Fazendo dois módulos logo de cara. Os módulos mais básicos. Relembrando tudo aquilo que aprendi quando todas as câmeras eram analógicas e a gente nem sonhava com todos esses recursos digitais. Logo de cara tava sendo 10x0 para a câmera. Agora já estou começando a ter um pouco mais de domínio. Deixando de ser uma apertadora de botão e pensando na foto. Hoje voltei para casa cheia de orgulho. Durante nossa saída prática no curso de hoje à noite, resolvi bater uma foto da minha cidade. Apoiei a câmera em cima do Viaduto do Chá e fui exercitar foto de movimento. O resultado é esse aí. Não está perfeito, mas me deixou feliz pra burro. Tirei umas 5 fotos antes dessa até acertar o tempo de exposição para conseguir os risquinhos. São esses os tipos de detalhes que a gente esquece e a prática vai deixando cada vez mais automáticos.  Cada dia eu vou desperdiçar menos cliques. Estou apaixonada de voltar a fotografar. E ainda tenho São Paulo posando para mim.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

VOLTEI!

Sim! De volta. De volta ao Brasil. De volta ao blog. Sabe que eu tenho um ditador latino-americano dentro de mim. Sou minha pior inimiga. Determino regras malucas, toque de recolher. Sempre tentando ser perfeita e fracassando retumbantemente em tudo. Dentro da infinidade de coisas que eu aprendi nesse ano (que foram tantas e não dá nem para listar), uma foi ser mais “democrática” comigo mesma. Respeitar mais meus limites, e principalmente minhas vontades. Então eu sumi daqui mesmo. Sumi porque tinha coisa demais acontecendo e meu barulho interno não me deixava escrever nem uma linha. Daí a gente respeita, né!? Minha última semana na Europa foi de tanto amor. Passei em Lisboa e Portugal aninhada com Kika e Carol. A volta teve suas peculiaridades, um contratempo com a passagem, malas pesadas demais, falta de ordem completa e absoluta. Então a viagem de volta. Brasileiro tem mesmo um jeito muito peculiar de viajar. De impor suas presenças dentro de um vôo. Aplaudir quando o avião pousa. Vai dando a sensação de acordar de um sonho muito gostoso e ir perdendo a memória dele. Cheguei irritadíssima. Dando patada para tudo quanto é lado. Eu sei que é injusto, mas eu sou uma pessoa imperfeita. Foram umas 30 horas até o som, o cheiro, as cores pararem de me agredirem. Para enfim eu me sentir aterrissada. Daí ficou tudo bom. Mais do que bom. Tudo lindo. São Paulo renasceu para mim. Linda! (Ok, beleza não é exatamente o forte de São Paulo, mas é preciso olhar apurado para entender as sutilezas estéticas das quais eu falo.). Com tantas perspectivas mudadas, tanto tempo fora de casa, eu volto para descobrir que a minha cidade é incrível. Mais do que eu pensava. São Paulo é uma das cidades mais fantásticas do mundo. E essa é tão somente minha opinião. Agora estou sentindo todos os sabores aos poucos. Sem pressa. Sem desespero. Sem saber o que vai ser o dia de amanhã. Acordando todos os dias e agradecendo o dia lindo. Arrumando e organizando um pouquinho da minha vida a cada dia. Ainda tenho roupas espalhadas em caixas e malas. Estou acampada na casa de uma amiga. O número novo do celular não foi distribuído para quase ninguém. Não consegui correr nem um minutinho no parque. Trabalhar então... Acho que só semana que vem. Mas mesmo com todo o caos, zero de rotina, ando feliz pra caramba. Não é legal!? É um novo tempo. Um novo paradigma. Meu ditador latino-americano está como Fidel Castro. Velhinho e impotente. Eu gosto assim. Não sei se é melhor, se é pior. Tem sido assim. E eu gosto.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

EMBARQUE

Estou deixando a Holanda hoje. Estou escrevendo no avião, indo para Barcelona. A passagem mais em conta que consegui era essa. Uma escala de 3 horas em Barcelona, para só então ir para Lisboa. Cheguei correndo em Schiphol hoje, bem em cima da hora do vôo, até perdi meu guarda-chuva LINDO do Van Gogh no caminho. (Fiquei tão triste, tão, tão triste com isso!). Tudo para chegar no balcão do check in e ser informada de que o vôo ia atrasar duas horas por causa da greve de Paris. Globalização é isso aí minha gente. Para uma brasileira voar de Amsterdam para Lisboa, ela precisa pingar em Barcelona antes e, sabe-se lá porque raios, uma greve em Paris no meio do caminho faz com que tudo fique bagunçado. Lá vamos nós brincar de “Tom Hanks” de novo no aeroporto. Quando eu era pequena adorava ir ao aeroporto. Ver os aviões pousarem e decolarem. Era tão mágico assistir aquela geringonça flutuando no ar. Até pouco tempo atrás eu era a maior rata de aeroporto. A primeira a se oferecer para levar ou buscar alguém. Adorava aquela atmosfera de gente indo e partindo. De expectativas, sonhos, possibilidades. Mesmo quando não era eu viajando. Agora parece que toda essa magia se transformou. Não sinto mais friozinho na barriga de chegar no aeroporto. Não fico sonhadora cada vez que ouço a voz aveludada anunciando os vôos nos auto-falantes. Não babo mais de assistir o portão de embarque. Aeroportos perderam o glamour. O vôo atrasou um pouco mais então no total foram três horas fazendo hora no portão de embarque. Fiz compras no Duty Free. (Outra coisa que me empolgava bem mais e agora não vejo graça nenhuma.) Alguns perfumes e maquiagem, nada de mais. Depois sentei e trabalhei no computador. Plantei minha fazenda do Farmville inteira. Mandei emails. Cobrei respostas. Fechei o computador e fui comer alguma coisa. Paguei uma fortuna por um saquinho com maçãs fatiadas, um stick de queijo e um iogurte. Enquanto eu comia fiquei assitindo pela janela o tráfico da pista de pousos e decolagens. À minha volta dezenas de pessoas com as feições mais miseráveis do mundo. Sentadas, entediadas, esperando. Alguns no computador como eu. Outros deitados no chão ouvindo Ipod. Mas a grande maioria com o olhar perdido no ar. O que será que pensam? Tudo para entrar em um avião de uma Cia. Aérea low cost. Com assentos apinhados igual sardinha em lata. Ter de se encaixar milimétricamente e procurar ficar o menos desconfortável possível durante a viagem (Desconfortável a gente sabe que vai ficar mesmo. Então é tentar ficar menos.). Depois assistir à humilhante sessão de “topa tudo por dinheiro” que os comissários dessas companhias são obrigados a passar hoje em dia. Eles desfilam pelos corredores vendendo lanches, sucos, salgadinhos, bilhetes de loteria, raspadinha, óculos escuros, bichinhos de pelúcia e até ticket de ônibus. Eu perdi as contas de quantos vôos fiz durante os últimos meses. Muitos trechos eu fiz de trem, alguns outros de carro, mas minha intimidade com aeroportos mudou. Não sei se para melhor, ou para pior. Talvez eu tenha apenas desmistificado. Talvez os tempos de glamour da aviação tenham acabado. Talvez não tenha nada a ver com isso e eu seja apenas uma pessoa diferente hoje, que sente e percebe as coisas de forma diferente e ponto. Mas eu ainda não consegui entender porque eu sempre acabo indo (nem porque vim.).

domingo, 17 de outubro de 2010

I AM STERDAM

Eu estou em Utrech com a Lulu e o Pedrón. É bem pertinho de Amsterdam e a Lulu não me deixou ficar em nenhum outro lugar. Eu também não resisti muito porque só a idéia de arrumar a mochila me dá calafrios. Tipo, stress pós-traumático mesmo. Então eu tenho ido todos os dias para Amsterdam e voltado. Praticamente só durmo em Utrech. Primeira coisa é que eu AMO Amsterdam. Isso é fato, inquestionável. E falo de amor, amor. Amor de verdade. Não da euforia da paixão. Amor daqueles que é simplesmente. Daqueles que a gente não precisa sair e berrar. Estou aqui martelando o Tico e o Teco, pensando em uma desculpa para mudar para Amsterdam e virar dutch. Tá difícil, mas eu ainda vou ter uma idéia brilhante. E dito isso, agora podemos fofocar sobre outras coisas. Comprei o I AMsterdam Card de 48h. É um pouco salgadinho (€48), mas te dá livre acesso à todos os museus da cidade, transporte público e desconto em uma infinidade de shows, restaurantes, atrações. E ainda vem incluso um tour de barco pelos canais. Sabe aquelas pessoas que comem até vomitar no rodízio só para fazer valer o que estão pagando? Foi mais ou menos assim meus dois últimos dias. Uma glutona cultural. Fui no Van Gogh, no Rijks, no Rembranthaus, no Museu do Diamante (dizem que são os melhores amigos das garotas...), dois museus de foto IN-CRÍ-VEIS! O Foam e o Marseille. Aproveitei que estava no meio do caminho e fui em um museu que mostra como eram as casas de canais do século XVIII. Fiz o tour nos canais de barquinho e assisti um concerto desbunde. Rachmaninov. Ainda é meu favorito. Hoje tirei o dia para a ressaca. Acordei quase meio-dia, fui encontrar uma amiga de infância com quem não falava há 15 anos. Talvez 14, não importa. A verdade é que eu estava muito nervosa de encontrar com ela. Nossa amizade ficou abalada todos esses anos por um motivo muito dolorido. Coisas que o coração às vezes arma para a gente, e eu nem sei explicar como foi especial encontrá-la hoje, assim, fechando minha jornada. Passamos a tarde conversando como se nunca tivéssemos deixado de nos falar. Sentadas em um Café na beira do Rio Amstel. Comendo nachos com guacamole e suco de maçã. Tomei uma cervejinha, daquelas frutadas que parecem suquinho, mas continuo feliz com a abstinência quase total. Engraçado como a vida vai dando voltas e faz tanta coisa com a gente. Quando eu estava no foyer do teatro, aguardando para assistir o concerto, comecei a lembrar de algumas coisas que tinha lido no Museu Van Gogh. O trecho de uma das cartas dele para o Theo antes de se matar. “Sou um fracasso. Sou um desapontamento.” Dois meses depois, essa alma tão perdida (e já sem uma orelha) deu um tiro no próprio peito e morreu após 5 dias em decorrência dos ferimentos. Ele tinha 37 anos. Morreu sem assistir como seu trabalho genial e sem precedentes inspirou toda uma geração de pintores e deu início à Arte Moderna. Então caiu uma ficha. Uma fichona. Caiu e eu comecei a gargalhar. Gargalhar igual idiota no meio do foyer, segurando o programa da noite e uma xícara de cappuccino. Pela primeira vez na vida eu realmente entendi a frase de Sócrates, “só sei que nada sei”. E a gente não sabe nada mesmo. A gente precisa parar de arrancar a própria orelha e de dar tiro no pé, porque às vezes o que é fracasso e desapontamento se transforma no movimento mais instigante que já vimos na história da arte. (Pelo menos na minha opinião. Não acho que nada foi feito de muito genial depois do Modernismo e todas suas variantes.) Eu sou uma louca. Obcecada por certezas, regras e seguranças. E a única certeza que eu tenho na vida é que não tenho certeza nenhuma. Isso é muito libertador. Ainda não tenho o distanciamento suficiente da minha própria jornada. Eu ainda não coloquei os pés no Brasil. Ainda estou homeless quando voltar para São Paulo. Mas eu consigo ver que durante todo meu caminho eu passei por fracassos e desapontamentos. Um atrás do outro. Surtos um atrás do outro. E no final de tudo a única coisa que foi sempre uma constante é a incerteza. Por mais paradoxal que seja, ter certeza da minha incerteza está me fazendo sentir calma, tranquila e segura como nunca. Não sei se vou virar dutch. Nem se algum dia vou voltar para Amsterdam. Mas não tenho vivido a cidade como se fosse o começo ou um fim. Estou apenas me deixando encaixar aqui. De resto é um dia de cada vez. Uma pincelada a cada hora. Vou pintar milhões de quadros. Posso não vender nenhum. Mas a incerteza. Assim como essa cidade cheia de bicicletas e galerias perdidas entre ruas estreitas e canais. Ambas. Ainda serão minhas.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

NETHERLANDS

Eu deixei a Holanda por último. Não foi planejado, mas foi perfeito. Eu sei que para muita gente a Holanda é sinônimo de loucura e piração. Maconha liberada, cogumelos em cada esquina. Só que eu sou careta. De tudo. Não uso, não gosto, não me importo. Os holandeses são detentores da menor taxa de consumo de drogas da Europa. Como diz o ditado, “uma vez em Roma...”. Se eu não fazia em casa, e se os holandeses não fazer, para que diabos eu vou perder meu tempo e meu rico dinheirinho fumando maconha em coffee shop. Então não. Eu não provei maconha. Nem comi space cake. Nem tentei os cogumelos. Pelo contrário, mal tenho bebido. E beber eu gosto. Andei tomando umas tacinhas de vinho nas refeições com a Erna e a Lu. Arriscamos um prosseco no domingo porque a Rachna estava milagrosamente de passagem por 3 horas no país e a gente almoçou juntas. Delícia de domingo. Ensolarado, lindo. À beira de um parque em Rotterdam. Fora isso ando à base de suco e Coca Zero. Adorando ficar básica. A Holanda tem essa atmosfera calma, muita qualidade de vida. Gente bonita, inteligente, bem educada e culta. Um jeito de levar a vida muito lânguido, desencanado. Que me agrada muito. Bicicletas para todos os lados. Isso é verdade, e isso os holandeses todos fazem. As garotas se montam, botam o salto alto, e vão pedalando para a balada. Acho um charme. E nada de 18 marchas e quadro de alumínio. Quer andar no dutch style tem de ser bicicletão de ferro, marcha simples e freio no pé. Isso mesmo. Freio no pé. Pedala para trás, parou! Eu fiquei meio insegura no começo, porque nunca usei freio no pé. Mas se não sabe brincar, não desce no play. Lá fui eu correndo atrás da Erna pelas ruelinhas e canais de Amsterdam. Ela que é original de fábrica e apenas se joga nos quilometros de ciclovia, olhava de tempos em tempos para trás e gritava “Ciao Bella! Don´t fall in any canal!”. Eu tentei. Consegui. A gente ainda deu uma explorada maravilhosa pelas cidadezinhas. Algumas eu não vou conseguir soletrar, mas fui ver os famosos moinhos de vento. Fofos de tudo. Tiramos milhares de fotos e até fizemos um amigo. Um senhorzinho japonês que estava sozinho no meio do campo desenhando os moinhos em um caderno de rascunho. Super bucólico. (Eu acho!) Depois fomos para Den Haag, que é a capital da Holanda, (Eu jurava que era Rotterdam!), passamos uma tarde na praia (que não era nada especial, mas é bem especial pensar que se mora em um país onde se chega à praia em no máximo 2 horas, não importa onde você more), eu comi haring (o tal do peixe cru cheio de cebolas que faz a gente lembrar dele por dois dias consecutivos), fomos para Haarlen e Delft. Delft, aliás, é uma gracinha de cidade! Vontade de embrulhar e levar para casa. Ontem ela me deixou em Utrech onde a Lu e o Pedro estão morando desde final de agosto. Invejinha dos dois. Morar nesse país, com toda essa calma, essa tranquilidade. Verdade que começo de imigração é perrengue. Mas ainda assim. Invejinha dos dois. Amanhã vou novamente para Amsterdam. Quando fui com a Erna fomos com agenda planejada. Fui visitar um projeto assitencial na periferia de uma amiga dela que conheci aqui. Trocamos figurinhas e estreitamos contato para o projeto que vou montar quando voltar para o Brasil (está no quadro de conquistas que estou levando na minha bagagem de volta). Depois almoçamos com uma outra amiga dela. Estilosérrima e dona de uma invejável coleção de 250 sapatos (OHHHHH, Deus! Porque dai tanto a uns e tão pouco a outros???). Me fez pensar em como foi que eu consegui sobreviver todos esses meses com apenas 3 pares de sapato (um tênis, uma sapatilha e uma havainas). E em como eu quero muito corrigir isso assim que pisar em São Paulo. Terminamos o dia destruidas no Anne Frank Haus. Triste, triste, triste. Para fechar todo o resgate Holocausto da viagem. Foi um pacotinho de lenços de papel para conseguir passar por todos os cômodos e chegar do lado de fora. Essa é, sob uma ótica, minha última semana de jornada. Quarta-feira que vem volto para Portugal. Juntar minha bagagem, beijar minha família européia e embarcar de vez. Com a Holanda eu fecho todos os países que eu queria conhecer. Cumpro tudo o que tinha me proposto. “Me concentrar na Europa Ocidental (Portugal, Espanha, França, Itália, Suíça, Bélgia, Alemanha, Holanda, Inglaterra, Irlanda e Escócia). Aprender uma nova língua. Voltar para o casamento da minha prima.” Marrocos, Croácia e República Tcheca vieram de brinde. Milhões de outras coisas vieram de brinde. Eu quase não tenho mais forças para carregar a mochila. A única coisa que consigo pensar é que agora só preciso empacotar mais uma vez para chegar em Lisboa e depois empacotar tudo de vez. Eu cavei até o osso. Não sobrou nada. Segui juntado cada pedacinho de mim pelo caminho. Vou jogar tudo dentro das malas que estão há meses me esperando em Portugal e voltar para casa. Vou precisar de muito tempo para montar o quebra-cabeças de novo. Por isso é simplesmente perfeito essa calma. Esse país pequenino que parece a sala de casa. É simplesmente perfeito olhar o outono se firmar (mais uma estação passando no meu nariz). Perfeito não fazer planos nenhum aqui, não ter agenda, não ter celular (o meu foi perdido na Escócia, só para registro), não ter compromisso, não ter roteiro. É simplesmente perfeito apenas me jogar, aceitar tudo o que vem. O quem vem com os amigos. O que vem com as cidade. O que vem cada dia. Poder apenas ser. Nem que seja “ser” por uma tarde inteira, sentada em um café, olhando as bicicletas passarem e refletirem na água escura dos canais.

domingo, 10 de outubro de 2010

SECRETÁRIA ELETRÔNICA

No momento não posso atender sua ligação. Estou na Holanda. Usando conexão de internet emprestada. Sem muito tempo também para escrever. Achando esse país maravilhoso, as pessoas deliciosas, e a vida uma benção. Eu achava que minha jornada estava já terminada, mas cada dia eu me invento, reinvento, me encontro e me acho. Cada dia melhor. Amém. Nem sempre dá para processar tudo assim de cara. Nem sempre dá para contar tudo no mesmo dia em um post aqui. Exitem coisas que vão vir com o tempo. Outras que só escrevendo com muita calma. Agora estou caçando moinhos de vento. Na Holanda eles são de verdade. Se aqui estiver em silêncio por muito tempo, deixe seu recado depois do sinal. Retorno assim que puder. Piiiiiiiiiiiiiii...

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

UM DIA DEFINIDO PELO XIXI

Hoje acordei bem cedinho. Eu tinha o dia todo muito bem planejado. Pegar os museus logo cedo, almoçar pelo centro histórico, alugar uma bicicleta e pedalar até o outro lado da ponte e pelo bairro da universidade. Depois eu ia sentar em um café e ler meu guia da Holanda. Gosto de fazer assim. Comprar o Lonely Planet antes de ir para o país. Ler tudo o que me dá vontade. Dobrar as orelhinhas do que eu quero ver. E chegando ao país eu esqueço o guia e vou seguindo conforme dá vontade. Só que comigo sempre que eu tento controlar, sempre que eu tento planejar demais, dá tudo errado. Então hoje eu acordei, fui fazer xixi e... senti uma ardência. Qualquer mulher com mais de 30 anos já passou por isso pelo menos uma vez na vida. Cistite! A famosa infecção urinária, que vem do nada, ninguém sabe direito porque (no meu caso até sei), e é bem chatinha. Eu estava pesquisando no google sobre sintomas e tratamentos, e tinha um site enumerando quais as possíveis causas de uma cistite. Número um: “ser mulher”. Pois é. Ano passado tive duas vezes. Meu médico me explicou que a maneira como o corpo da mulher foi concebido favorece. A uretra do homem é muito mais longa e por isso os casos de cistite neles são mais raros. Anyway. Como minha uretra é curtinha, acordei e senti o xixi arder. Ontem eu estava dizendo que me preparei para tudo nessa viagem. Tudo mesmo. Antes de sair do Brasil minha médica me passou uma lista super “drugstore cowboy”. Tinha inclusive um antibiótico para o caso de uma cistite no meio do caminho. Que eu, talvez por burrice ou talvez por otimismo, deixei junto com a minha bagagem na casa da Carol em Portugal. Não achei que ia perambular por meses e precisar de um antibiótico. Então comecei a levantar minhas alternativas. Ignorar e não tomar remédio é a menos inteligente das alternativas. Todo mundo sabe que se a bactéria subir para o rim, a infecção se alastra e vira uma nefrite. Daí sim dói para burro e se tem um problema de verdade. Hum! Se fosse no Brasil eu só precisava do nome do remédio e compraria em qualquer farmácia. Fiquei ponderando as possibilidades de comprar um remédio regulamentado sem receita médica e sem falar alemão em uma farmácia de Colônia. Pois é. Talvez não seja das melhores opções também. Então fui para a terceira alternativa (porque a pessoa é preguiçosa e já foi loira). Ativar meu seguro viagem. Em quinze minutos um simpático atendente falando português com aquele sotaque gostosinho de gringo que troca todos os artigos, me passou o contato de uma médica do outro lado da rua do meu hostel, avisou que eu não precisaria pagar pela consulta e que eles me reembolsariam depois pela medicação (olha só!). Lá fui eu na médica alemã. Imaginando que tipo de mímica eu deveria fazer para explicar o que eu tinha caso ela não falasse inglês. E não é que a médica alemã era na verdade romênia e não falava inglês. Mas falava francês, e eu fiquei bem feliz de ter estudado línguas na minha vida, porque mesmo a versão Tarzan me deixou bem confortável de que ela não erraria o diagnóstico e me daria um remédio para bicho de pé. Eu fiquei na sala de espera um tempão lendo meu guia da Holanda e tomando água, porque “je n´avais pas beaucoup du pipi pour l´examen clinique” e saí de lá com uma receita de antibiótico. Depois de toda a maratona, meus planos de pedalar e explorar bairros já tinham passado do meio dia. Acho que antes eu ia ficar bem mal-humorada. Eu ia acabar me trancando no quarto ou passar o resto do dia reclamando que meu dia estava arruinado, e que meu final de semana seria arruinado pelo remédio. E daí sim eu perderia meu último dia em Colônia. Mas como eu não sou a pessoa que eu era ontem. Muito menos a pessoa que eu era há 8 meses atrás, ou um ano atrás, eu já aprendi que a vida sabe mais das coisas do que a gente. Então eu aceitei. Aceitei o dia com cistite, com a manhã passada em um consultório médico. Com jejum forçado até o meio da tarde. E fui andando até o centro histórico. À pé mesmo. Olhando vitrines. Procurando um presentinho para a Erna que vai me pegar na estação de Rotterdam amanhã e me hospedar por uns dias. Comi donuts, daqueles que lambuzam os dedos, e fiquei horas em uma exposição fantástica no Museum Ludwig. Pop Art (que eu AMO AMO AMO!!!), muita video-arte, algumas instalações, uma exposição especial de Lichtenstein (que me deu uma perspectiva totalmente diferente dele) e uma delícia de exposição de “La Bohème” com fotos eróticas do início do século XX (que eu sou completamente apaixonada), entre outras coisas. Vi o pôr do Sol na ponte, linda, toda pendurada de cadeados, e voltei sem rumo, deixando o caminho me levar até em casa. Ainda tropecei em um restaurante vietnamita e comi muito bem. E muito barato. Chegando no quarto, sentei na cama e consegui uma milagrosa unha francesinha enquanto conversava com a Cí pelo skype. Ando tão feliz. Essa coisa de a gente ser responsável pelo nosso estado de espírito é uma puta descoberta. Dá um alívio. Saber que meu dia só vai ser um mal dia se eu deixar. Se eu quiser que ele seja. Se eu escolher. Mesmo que nada esteja sob meu controle. Mesmo que nada saia como o planejado. Mesmo que eu acorde com o xixi ardendo. Agora à pouco os caras que estão dividindo o quarto comigo vieram aqui me chamar para tomar uma cerveja. Eu agradeci, usei o antibiótico com desculpa e sorri. Gentil deles me terem convidado. Mas eu acho que eu prefiro colocar Macy Gray no Ipod, desligar o computador e escrever no meu diário. Acordar bem cedo amanhã e não fazer planos nenhum.