quarta-feira, 16 de outubro de 2013

SOBRE DÉBITOS E AREIA MOVEDIÇA


Ano passado, quando tirei férias e fiz uma roadtrip pela Itália, havia prometido ao Alê que passaria na volta por Barcelona para ficar um pouco com ele. Acabei cancelando e voltando antes para o Brasil por causa de alguns problemas de trabalho. Em janeiro havia me programado para uma nova temporada européia, e novamente prometi passar para ficar uns dias com o Alê. Cancelei a viagem por vários motivos, e aumentei meu débito de amiga que promete e não cumpre. Dessa vez cruzei o oceano novamente, mas nem considero uma viagem. Vim para um retiro budista em Sintra e resolvi aproveitar para visitar algumas amigas que tiveram filhos no último ano. Para quitar o grande débito, resolvi que chegaria por Barcelona, para cumprir a promessa e rever essa cidade que não tive a oportunidade de absorver de verdade da outra vez que estive. Acabei ficando uma semana inteira com o Alê, e foi como era quando estávamos saindo da FAAP e passávamos as tardes e noites por São Paulo. Continuamos os mesmo. Envelhecemos, mas continuamos os mesmos. Alê me leu alguns trabalhos lindos que tem escrito. Acho um desperdício tão grande ele não colocar um pouco mais de esforço em produzir e publicar. Alê é de verdade um escritor fantástico, um pós-beatinik com muito mais autenticidade do que todos os posers que tentam ser undergrounds no Brasil. Ele foi uma grande inspiração para mim. Foi por causa do Alê que comecei a pensar a sério em escrever, como profissão, como vida. Na verdade essa é a única coisa que realmente fazemos bem. Somos bons em várias coisas, somos versáteis, mas nossa essência é essa. Nós dois somos pessoas que escrevem. Alê tá levando uma vida ótima em Barcelona. Seu apartamento é espaçoso e confortável, tem até um terraço grande com churrasqueira, onde ele estende uma rede e planta girassóis. De onde também se avista as torres da Sagrada Família. O prédio não tem elevador, e nos primeiros dias senti meu pulmão desafiado para subir os 123 degraus até o sexto andar. Eu contei. Acho gostoso ver essa vida simples, sem extravagâncias que ele está levando. Coisa que nos é quase impossível em São Paulo. Faz quase três anos que eu me restabeleci, só com uma mochila de roupas velhas e surradas, e já acumulo mais coisas do que o Alê em 7 anos fixos em Barcelona. Porque acabamos tão rapidamente como acumuladores inúteis? Mesmo olhando para minha bagagem de não-viagem agora - já que não vim de mochila dessa vez - tenho a certeza de que carrego só o básico, mas o meu básico está excedendo os limites de despacho. Esse é o tal do piloto automático. Ficamos tão acomodados nessa vidinha de rotina e conforto urbano, que vamos afundando no supérfluo sem nem nos darmos conta. Vira areia movediça. O dia que você se pegar assinando contrato de casa em condomínio fechado, e blindando o carro para poder ir ao cinema no shopping, sinto muito! É porque já perdeu o fôlego e nada mais te salva. Quando eu quebrei com tudo e resolvi ir em busca do que me fazia sentir viva, eu achei que era uma coisa definitiva. Que aquela experiência e aquela transformação me pertenciam eternamente, e que eu nunca precisaria me preocupar de estar absorvida no nada novamente. Então eu estava arrumando minha mala ontem, me perguntando como era possível o meu “básico” ser tanto assim, quando me ocorreu que é preciso um trabalho contínuo. Aqui estou eu já afundando novamente, ligando o piloto automático e deixando tudo o que realmente me faz feliz para uma outra hora. É preciso acordar todos os dias, e quebrar essas amarras sociais todos os dias. É preciso partir e buscar o que nos faz vivos todos os dias. Porque quando relaxamos, quando nos acomodamos no que pode ser seguro e certo - ainda que seja a segurança e a certeza de que nos transformamos - a areia movediça nos engole, e passamos nossas semanas entre a rotina de trabalho, a cerveja com os amigos, o programa de TV, a pizza do sábado e a busca nas araras e prateleiras das lojas de uma satisfação que não está ali para vender. Compramos o que nos oferecem para que sirvam como substitutos. Compramos qualquer coisa que esteja ali para vender. Se não nos reinventamos todos os dias, e nos atiramos no mundo com os olhos ávidos pelo novo, pelo maravilhoso todos os dias; se não nos dispomos a experimentar, transgredir, inovar, podemos assassinar nossos talentos, endurecer nossa alma, até o ponto de que nem a memória nos resgate a euforia de sermos nós mesmos. Quando nos perdemos na insatisfação do trânsito, da política, da corrupção, dos impostos, da crise, deixamos de usar essa energia para mudar de lugar, e mudar nossa perspectiva. É preciso estar em constante movimento, constante renascimento. Resgatar nossas essências do lodo desse mundo amortecido, hipnotizado. Deixei meu livro em cima da mesa de centro do Alê. Escrevi na dedicatória: “Senta essa bunda na cadeira e escreva. É só isso que a gente sabe fazer. Te amo. d.”

terça-feira, 1 de outubro de 2013

CORRA, DRI CORRA



Eu sou da opinião que, cada pessoa deve achar qual o seu esporte. Não que cada pessoa tenha apenas um esporte, mas cada pessoa vai se sentir bem fazendo determinada(s) atividade(s) física(s). Tem gente que gosta de tudo, é verdade. Faz, pula, pinta e borda. Outros já comparam qualquer atividade com uma sessão de tortura chinesa. Mas a verdade é que, quando encontramos alguma atividade que nos dá prazer, a vida fica muito mais gostosa e fácil de se levar. Já vão 10 anos e eu descobri a corrida. É uma das atividades da minha vida. Nesses 10 anos passei por períodos de intensa dedicação, e completa abstinência. Mas sempre corri. O que gosto na corrida? É um esporte independente. Não dependo de ninguém para correr. Sou eu, meu tênis e uma pista. A gente pode correr em qualquer lugar do mundo, qualquer hora do dia. Funciona quase como uma meditação. Enquanto corro sou eu e meus pensamentos, e nós vamos nos organizando conforme meu corpo vai sendo desafiado. Para mim sempre foi um problema, a mente muito ativa e o corpo nunca cansava. Sofri anos de insônia por causa disso. A corrida me ajuda a equilibrar a equação. Me faz um bem danado. Com os acontecimentos dos últimos meses, que me obrigaram a refletir sobre todas as coisas que eu tenho feito na vida, comecei a resgatar o que realmente me é caro. Com isso voltou a corrida à toda. Ainda não recuperei o fôlego dos meus tempos aureos, mas o gostoso de atividade física é que conseguimos ver resultados rápidos, eles são perceptíveis. O fôlego melhorou gigantescamente. E já estou alcançando um ritmo que não dá mais vergonha de contar para os amigos. Para me coroar retomei com tudo as corridas de rua. Esse é um dos meus grande prazeres. Adoro corridas de rua!!! Acho que todo mundo deveria participar de pelo menos uma na vida. É uma atmosfera muito boa, muito positiva, de alegria, dedicação, saúde. Cheia de gente bonita. A gente vai correndo pelas ruas da cidade, enquanto voluntários gritam frases de incentivo e nos aplaudem quando a gente passa. No final a gente ganha um monte de brindes e até uma medalha. Quer coisa mais legal!? Eu sinto falta de companhia para fazer essas coisas. Meus amigos são todos sedentários, e ninguém nunca se anima a me acompanhar. Mas a corrida pode ser assim também. Uma história da gente com a gente mesmo. Esse final de semana fiz dobradinha. Fiz a Fila Night Race e a Etapa Primavera do Circuito das Estações da Adidas. A Fila Night Race foi na USP. Achei um pouco desorganizada. A largada estava quase sendo dada e ainda havia uma fila kilométrica para retirar o chip. Os funcionários sem nada de proatividade. Alguns sem fazer nada, parados, olhando a banda passar, em vez de se prontificarem e ajudarem a distribuir os chips para que todos os corredores pudessem largar com calma. Ainda não entendo porque esse frescura de entregar chip no dia. Antes tivessem entregado já com o kit. Eu gosto bastante de corridas na USP. A USP é como um dos nossos quintais, um lugar tradicional para corredores paulistanos. Também é uma das poucas oportunidades de ir ao campi. Desde que saí da faculdade o universo universitário foi ficando cada vez mais distante. É gostos correr entre as faculdade, beirando a raia. Uma pena que a USP esteja tão abandonada. As ruas estão todas esburacadas, feias, mal tratadas. A prova virou praticamente uma corrida de obstáculos. Desvia do buraco, pula a cratera, e cuidado para não tropeçar no degrau. Fiz 5K assim, passando por todos os obstáculos sem torcer o pé nem uma vez. No domingo foi o dia do Circuito das Estações. Acordei às 5h30 e tava uma chuva forte na janela, o dia todo escuro. Juro que fechei os olhos e considerei por dois minutos a possibilidade de ficar na cama e cabular a corrida. Mas depois resolvi ir, porque correr me faz sentir muito melhor do que ficar na cama. Fui esperando fazer a corrida na chuva. Me agasalhei, coloquei uma camiseta de manga longa por baixo, tênis velho para poder ensopar na chuva e saí toda descabelada, esperando que a chuva desse um jeito na juba. Mas Murphy sabe das coisas. Assim que cheguei no Pacaembu o céu abriu, o tempo esquentou e no primeiro km eu já estava super-aquecida. Tive que perder um tempo parando e tirando a blusa de baixo para continuar a corrida. Essa prova é bem legal. Tem um pouco de altimetria, para aumentar o desafio. A gente sai da Praça Charles Miller, desce a Pacaembu e pega o Minhocão, depois volta pela contramão até a praça de volta. É um circuito gostoso de fazer. Adoro correr no Minhocão. A organização lançou um desfio bem legal. Fez percursos com 1K a mais para quem quisesse se desafiar um pouco mais. Como não aceitar uma proposta dessas!? Claro que fiz 6K, feliz, tranquila. Cheguei descabelada, mas com um sentimento de bastante completude. Depois o tempo fechou de vez, mas daí eu já estava em casa. Pude ficar nas cobertas, trabalhando em um livro o domingo inteiro, sem um pingo de peso na consciência. Achar uma atividade física é um pouco assim, deixa de ser um sacrifício. Passa a ser um suporte para a vida, algo que soma e fortalece os nossos dias. 

sexta-feira, 27 de setembro de 2013


Acho que se eu for escolher algumas palavras para definir meus últimos meses seriam dor e mudança. Ah sim, e um enorme sentimento de “foda-se”. Uma vontade muito grande de me jogar verticalmente em mim mesma. Já parou para pensar no quanto a gente vive pelos outros. As relações que construímos, as pessoas que amamos, as responsabilidades que assumimos. Quando nos damos conta a vida dos outros nos influencia mais do que nossa própria. E é muito doloroso se desvincular emocionalmente das provações que as pessoas que nós amamos passam. É como diz aquele ditado, aprendemos pelo amor ou pela dor. Para mim a lição veio em uma crise de stress, meia dúzia de consultas médicas, exames, uma doença crônica e uma cirurgia para biopsia. Enquanto eu estou aqui, aguardando o resultado da biopsia e vivendo um pós-operatório chato, com remédios que me enchem de sono, volto a questionar onde está minha vida no meio disso tudo. O que é meu, o que faz parte da minha história, e o que eu peguei emprestado por achar que era responsabilidade minha. Ah, a gente faz terapia a vida inteira e continua errada. Sabe o que tem me feito feliz esses dias? Ser saudável. Gosto muito de ser saudável. De me cuidar. De fazer esportes, correr. Sentir meu sistema cardio-respiratório sendo exigido. Gosto de me alimentar bem. De comer coisas saudáveis. De ver a reação de uma boa nutrição no meu organismo. Gosto de ser vegetariana. Eu gosto de lubrificar a maquininha. Eu estou me pegando no colo. Quando a gente se dissocia do que não nos pertence, parece mais evidente cuidar de quem realmente faz parte da nossa história. Quero me rodear do que é bom. Do que é saudável. Do que faz bem.

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

FLORESCENDO



Semana cheia de surpresas. Se por um lado a saúde anda frágil, por outro tudo o que eu escrevo me faz mais feliz. Minhas colunas no PPQO essa semana foram avassaladoras. O John passou a semana empolgado, dividindo comigo os stats e celebrando um dos textos mais lidos de todo site. Fico feliz. Não só porque massageia o ego, e meu ego é um bichinho adestrado que faz direitinho seu trabalho histérico e carente; mas também porque sei como o PPQO é um projeto legal, como tem gente boa e com muita garra investindo nesse site, e se meu texto ajuda a contribuir para o sucesso, então VIVA! É aquilo que estava dizendo, quando escrevo perco o direito sobre o texto, e acredito que ele só se realiza quando passa a ser lido. Uma vez ouvi que “a folha está sempre em branco”, porque mesmo quando superamos o bloqueio criativo e escrevemos, o texto só se realiza quando é lido. Enquanto ninguém lê, a folha continua em branco. É um pensamento que me agrada. Além do sucesso das colunas, uma grande novidade. Vamos virar livro! Pois é. Ainda acontecendo de forma embrionária, mas em breve as melhores colunas do PPQO vão ser editadas em livro. Luxo duplo desse ano em que já debutei em tantas coisas. Falta enfim terminar meu livro autoral. Falta é muita vergonha na cara. De qualquer forma já agendei na Tattoo You um  horário para fazer minha tatuagem. Minha primeira. Vão ser flores de cerejeira, uma para cada conquista literária. O objetivo é ficar velhinha um dia com o ombro mais florido do mundo. :-)

terça-feira, 13 de agosto de 2013

O LADO BOM DA VIDA



Nos últimos dias estou sucumbindo a uma crise de stress. Estou enfrentando alguns problemas particulares e, mais uma vez, a vida está me mostrando que eu não sou forte o suficiente. O resultado é que o stress, que eu “sabiamente” ignorei na esperança que ele deixasse de existir sozinho, passou a somatizar fisicamente. Primeiro um sono violento, falta de energia, irritabilidade, início de depressão. Então nesse final de semana uma crise de alergia de pele. Estou com dermatite nos braços, unhas quebradiças, a pálpebra do olho inchado. Até aí eu ainda estava duvidando do poder do stress. Mas quando chegamos no limite, quando nos sentimos sufocados pela impotência de não poder fazer nada, a garganta trava. Assim, do dia para a noite, fiquei completamente afônica, com uma bela inflamação de garganta. Daquelas que nos impedem até de atender ao telefone. Quando isso acontece a gente para tudo. Cancela a corrida, desencana dos compromissos. Guarda todos os recursos para que o corpo possa se recuperar e combater o inimigo. Portanto, guardada em casa e com a boca fechada à força, resolvi tirar o atraso de filmes que eu queria ter visto e não vi, seja por falta de tempo, seja por falta de coragem de ir ao cinema sozinha. 
Ontem vi “O Lado bom da vida”, o filme que deu à Jennifer Lawrence o Oscar de melhor atriz. Se ela mereceu? Não. Muito menos tirando o prêmio de Emmanuelle Riva no arrebatador “Amour”. Mas a garota faz bonito, em um papel que exigia muita honestidade e delicadeza para ser justo. Eu gosto de filmes em que as pessoas encontram o amor, gosto de histórias em que mesmo as pessoas mais improváveis de encontrarem o amor, encontram o amor. Porque não acredito em uma fórmula perfeita de felicidade eterna, mas acredito sim que, desde que você esteja disposto e vulnerável, a vida pode ter surpreender por inteiro. Não acredito em gente perfeita, gente sem falhas, sem culpas, sem arrependimentos. Se você não flertou com a loucura, não teve o seu momento na borda da piscina, é bem provável que não tenha vivido direito. E vão nos dizer sempre que não pode ser assim. Sempre haverá quem nos queira controlar, quem nos alerte sobre os comportamentos adequados. Sempre haverá alguma medicação para nos enquadrar no que é considerado correto, convencional. Mesmo que você não se reconheça, mesmo que você se torne um estranho para si mesma. Por isso precisamos encontrar os nossos iguais, aqueles loucos como nós. Para nos amar é preciso ter passado por uma loucura igual a nossa. Só mesmo na insanidade acreditamos em coisas assim. Perdendo de 10x0 para as adversidades que não sei como resolver, calada muito mais na alma, do que na voz em si, mas ainda assim acreditando que haverá quem consiga entender exatamente onde dói em mim. 

segunda-feira, 12 de agosto de 2013




Escrever é uma coisa engraçada. Não é o tipo de coisa que dá para encher muita linguiça. Você não consegue disfarçar falta de conteúdo. Ou tem, ou não tem. Você pode ser um ator medíocre, mas ainda assim sair em capa de revista, protagonizar novela das 9 e ganhar muito dinheiro fazendo campanhas publicitárias. Mas você não pode ser um puta escritor, sem ser um puta escritor. Você não pode provocar as pessoas sem ter opinião. Você não vai conseguir prender o leitor no seu texto, surpreender, emocionar, se não souber exatamente o que está fazendo. Se não tiver um bom domínio de seu estilo, se não escolher as palavras certas. É diferente de quando a gente fala. Em uma conversa. Nossa opinião fica diluída no ambiente, nas inflexões usadas, no tom de voz. No histórico que temos com o interlocutor. Se falamos com uma pessoa que gosta da gente, a tendência ao conteúdo do discurso ser bem recebido é maior. Quando alguém manifesta uma opinião contrária a nossa, nos inflamamos e falamos por cima, cortamos o raciocínio, fragmentamos a explicação. Escrever é colocar em público o processo de reflexão que muitas vezes não ousamos partilhar em uma conversa, porém a reação a leitura é muito mais forte do que a da palavra falada. Quando se lê, apropria-se do que está escrito. Ainda que o conteúdo seja pessoal, único e intransferível, há quem se ofenda com as palavras dos outros. Quando escrevo perco o direito às palavras. Aceito a livre interpretação do meu interlocutor. Talvez também por isso eu não responda comentários aqui. Quando comentamos um texto, comentamos mais o reflexo que enxergamos nele, do que as intenções de onde eles saíram. Não seria educado intervir na auto-imagem de ninguém.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

EU, VOCÊ E TODOS OS OUTROS



Ontem fez um domingo lindo de Sol. Ainda está muito frio em São Paulo, mas o Sol faz o dia ficar mais bonito. Adoro esses domingos de inverno. Correr no parque de moletom, comprar o jornal e tomar chá bem quente com leite. Já falei em outros posts o quanto adoro correr no Ibirapuera. Tenho uma relação bem intensa com esse parque. Sinto saudades de morar mais perto, poder ir ao parque todos os dias. Respirar as árvores, olhar as pessoas. Organizar meus pensamentos e viver mais essa cidade ao ar livre. Agora morando em Pinheiros as corridas matinais passaram a ser na academia do prédio. O parque só mesmo aos finais de semana. Quando eu me junto à população que vem dos bairros e ocupam o parque, cada tribo ao seu estilo. Ontem o parque não parecia domingo. Sem aquela movimentação frenética, alamedas cheias, ciclovia lotada. Apenas os frequentadores de sempre, praticando esporte, passeando com suas famílias, entretendo os cachorros. Me faz tão bem estar no meio da natureza, a energia de quem se gosta e cuida de si. Eu chamo isso de qualidade de vida, e me sinto bem privilegiada de poder ter isso na minha cidade. Enquanto eu corria ia observando as pessoas. Pessoas são curiosas. São lindas. E no parque vemos pessoas de todos os jeitos. Altas, magras, tortas, atarracadas, carecas, cheias de pêlos, atléticas, siliconadas, sorridentes, carrancudas, pessoas perfeitas, assoberbadas, deficientes, obesas, apaixonadas, sozinhas, comunitárias. São tantos tipos de pessoas, e o mais maravilhoso, não existe nenhuma igual a outra. Acho isso algo realmente formidável. Em todo o mundo, de todas as pessoas que já nasceram, morreram e ainda vão nascer, não existe ninguém igual a nós. Somos únicos, irrepetíveis. Pensando assim é sempre uma benção conhecer alguém. É a única oportunidade em toda a história da humanidade de você conhecer alguém como aquela pessoa. Talvez se tivéssemos mais consciência do quão raras as pessoas são, não desperdiçaríamos um segundo do privilégio de tê-las. Vale para nós também. Eu sou uma pessoa única, exclusiva. Nunca existirá ninguém no mundo com as minhas característica físicas e psicológicas, e o privilégio de me ter, de ter a minha companhia é raro e exclusivo para essa vida, para esse lugar em que estou. Engraçado como, apesar de desfrutarmos dessa vantagem valiosíssima, nos esforçamos tanto para camuflar exatamente o que nos torna especiais. Fazemos tanta força para nos tornar mais um, iguais. Usamos as mesmas roupas, mudamos a cor e a textura dos cabelos, adquirimos vícios de linguagem. Até que nos tornemos cópias mal-feitas uns dos outros. Até que nossas essências pessoais desapareçam no perfume de uma imagem social pré-estabelecida. Porque fazemos isso? Porque é tão apavorante sermos únicos? Porque temos tanta necessidade de mudar o que somos para parecermos o que não somos? Eu me entedio com o óbvio. Me entedio com a imagem produção em série. A beleza se revela na diversidade, na diferença. Naquilo que temos e ninguém mais tem. Então a gente pega todas essas coisas maravilhosas, únicas e exclusivas que temos, e levamos para correr no parque, para passear por aí. Por mais que os olhos hoje busquem a maquiagem genérica da mesmice, ainda acredito em olhos ávidos por aquilo que é raro e belo de verdade. 

sábado, 27 de julho de 2013

SONHOS




Andei pensando ultimamente sobre os sonhos de vida. Quando eu era mais nova eu tinha muitos sonhos. Uma vontade gigante de ser e fazer. Parecia sempre que o mundo não era suficiente. Aos poucos essses sonhos foram enfraquecendo, mudando, até que acabaram. Tenho sentido há alguns anos que não tenho um grande sonho. Uma grande vontade. Será que é um sinal da tal maturidade? Enquanto envelhecemos vamos perdendo a utopia de fazer algo significante na vida? Eu escrevo, é verdade. Não tanto quanto gostaria. É minha válvula de escape. Mas por mais apaixonada que eu seja por literatura, escrever não é um desafio para mim. É orgânico. É o que eu sou. Não é algo que eu anseie ou busque com uma vontade descabida. É algo que eu possuo e sei que jamais vai me abandonar. Então como fica a necessidade de se realizar? De conquistar algo com esforço? De estabelecer um objetivo inalcançável e conquistá-lo apesar de tudo e todos? Em que momento a vida entra no piloto automático? Quando foi que a gente se acomodou na zona de conforto até o ponto em que não se enxergar mais as fronteiras dos que nos maravilha? Já saí pelo mundo buscando ser maravilhada, mas ainda preciso descobrir como fazer isso nos limites da minha casa. 

quarta-feira, 17 de julho de 2013

FASES


Essa semana terminei mais uma fase conturbada. Dá uma exaustão encerramento de fase. A gente fica meses respirando fundo, tirando força do útero e dizendo para si mesma que é só uma fase. Ajuda a passar os dias. É como fazer natação. Depois de uma hora na piscina, fazendo uma série interminável, os braços doem, o fôlego some e a gente pensa “só mais uma piscina”. Essa frase acessa uma carga de bateria extra, aquele tanto de gasolina depois que a luzinha no painel acendeu. Eu nado. Consigo dar as braçadas. Mais uma piscina. Mais um dia. Mais uma fase. Depois o cansaço se apossa do corpo. A exaustão toma conta da alma. Sinto necessidade de colo, de silêncio. De ficar dias deitada no sofá até acreditar que passou, que acabou. Que eu sobrevivi. Eu tenho sobrevivido fases desde o começo do ano. Tantas fases que elas começaram a se cornubar. Uma fase em cima da outra. Eu termino uma, mas ainda estou no meio de outra. Não tenho conseguido colocar a cabeça acima da água para respirar. Uma sacanagem já que eu estou vivendo as coisas mais legais que já me aconteceram, e as fases mais tensas ao mesmo tempo. Tremenda sacanagem dos roteiristas da minha vida. Intensificando os conflitos, estabelecendo o clímax do herói. A gente sabe que depois de toda a provação vem a redenção. Mas antes tem mais uma fase. É só uma fase. Mais uma piscina para nadar. Tem mais força aí para arrancar do útero, e você sente até vergonha de estar miguelando com a vida quando descobre todo novo dia que consegue dar mais. Eu dou mais. Mais um dia. Mais uma fase. E for isso? Se a vida toda for só uma fase? E se no final a gente só sobrevive e acaba desfalecida no sofá de casa? E se a calmaria é só uma ilusão que contam para a gente conseguir nadar mais uma piscina? E se essa piscina nunca tiver fim? Não vai existir momento posterior de calma e tranquilidade para viver. Ou eu encontro a força - mais força - para me sobrepor às fases agora, ou vou afogar no meio da raia, sem nunca encontrar a borda. Hoje vou aceitar a vitória de ter sobrevivido mais uma. Com os óculos embaçados e cãimbras na panturrilha, buscar ar na superfície e continuar. Mais uma piscina.

quarta-feira, 19 de junho de 2013

VAMOS DESENHAR...

Para quem não está entendendo nada:

sexta-feira, 10 de maio de 2013

RENASCIMENTO

Nos últimos meses duas matérias sobre experiências que eu vivi foram publicadas na Vida Simples. Foram duas revoluções na minha vida, tanto pela experiência em si, quanto pela repercussão das matérias. Recebi uma enxurrada de cartas, elogios, comentários, convites. É um sentimento de estranhamento muito intenso. Existe uma distância entre o ideal e o real, e quando se quer muito uma coisa, e se prepara e se persegue essa coisa, quando recebemos respostas é um pouco surreal. Não cai a ficha direito de que, talvez, eu esteja cruzando a fronteira entre o tentar e o realizar. Já disse isso aqui: eu escrevo. Acho que é a única coisa que faço bem. A única coisa que me faz sentir inteira, completa. Então quando a Ana, minha editora, me mandou por email a carta dessa leitora, eu desabei em lágrimas.  Meu peito ficou pequenino para o meu coração. Eu faço um milhão de coisas erradas. Me estapeio todos os dias para tentar ser uma pessoa melhor. No geral, estou perdendo a guerra. Mas pelo menos nessa batalha, acho que estou ganhando. :-)




Meu nome é Rita e já faz um tempo que sou leitora da Vida Simples. Amo a forma como esta revista aborda temas variados como sustentabilidade, arte, gastronomia, atualidades e, principalmente, assuntos delicados como arrependimento, que foi a capa da última edição.

Sempre me identifiquei com os textos, mas o que aconteceu quando li o texto da Adriana Rossatti foi uma verdadeira catarse. Primeiro estranhei o assunto da reportagem, mas curiosa que sou fui em frente. A sinceridade e coragem com que ela se expôs me fascinou profundamente! Ao ler a parte ela cantando Beatles baixinho me fez rir e no próximo parágrafo eu estava chorando ao me reconhecer inteiramente quando conta sua história ao nascer (eu estava na linha verde do metrô de São Paulo e se alguém me visse ia achar que estava louca ao ir do riso ao choro em menos de dois minutos). Temos muita coisa em comum e ler o seu depoimento me fez entender um pouco mais o meu passado. De certa forma, eu também morri e renasci junto com ela e acabei me conhecendo um pouco melhor.

Nunca escrevi para vocês (nem pra nenhuma outra revista), mas foi a primeira coisa que pensei ao me recompor. Quero parabenizar a Adriana e pedir pra que ela continue escrevendo para a Vida Simples e que vocês continuem fazendo essa delícia de revista que tanto bem me faz!

Um grande abraço a todos!

Rita de Cassia Reis

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Coisas que me fizeram sorrir essa semana

1.
A singeleza da amizade entre uma criança e um cachorro.



2.
Coisas que me lembram que o ser humano é do bem.



3.
Coisas que eu não pensava desde os anos 90... AQUI



4.
Constatar a passagem do tempo.



5.
Mensagem dele no meu celular. <3

quinta-feira, 18 de abril de 2013

DIÁLOGO

EU - Não estou conseguindo subir a foto. Acho que está muito pesada para o FB.
EDITOR DE ARTE - Qual que você está usando?
EU - Tô usando a _WEB, como a gente falou ontem.
EDITOR DE ARTE - Tá com quanto.
EU - 3,5M... Acho que está muito pesada.
EDITOR DE ARTE - Deve ser sua net.
EU - Mas minha net é 10mega, não pode ser minha n.... Ahhhhh!!! Lembrei! Estou baixando a 1a Temporada inteira de Game of Thrones
EDITOR DE ARTE - É isso!
EU - Sabe como é... sou nerd. Não queria assistir, mas não consegui resistir por muito tempo...
EDITOR DE ARTE - Poxa, eu também! Tanta gente falando. Também não sei se vou resistir...

NERDS. A gente disfarça, mas sempre se entrega. <3

domingo, 7 de abril de 2013

1996 - 2013



1996
Eu tinha 19 anos, estava com o coração partido e fui ao Hollywood Rock ver o show do The Cure. Era uma pessoa ansiosa, queria fazer tantas coisas. Eu não sabia muita coisa da vida naquela época. Não que eu saiba muito mais agora, mas tenho uma visão muito mais real do que é a vida. Muito menos ilusões. Minha bagagem era pequena. Eu tinha muitos sonhos e planos para realizar. Queria viajar. Sonhava em ir para a Índia, mas o máximo que tinha chegado era a Disneyworld. Queria escrever, fazer cinema. Queria fazer trabalho voluntário, ser correspondente de guerra, grande executiva, mudar o mundo. Lia compulsivamente. Ia ao cinema mais compulsivamente ainda. Eu não sabia me expressar direito naquela época. Não sabia falar, opinar. Estava em metamorfose. Eu era magrela, tinha o cabelo armado. Sabia tocar os acordes de “Close to me” no piano (talvez por isso ainda hoje seja minha música favorita deles) e, durante aquele show, me apaixonei. O moço estava fascinado por mim. Era narigudo e tinha um sorriso lindo. Me levantou nos ombros, cantou “Friday, I’m love” no meu ouvido e trocamos de camiseta. Levei para casa a sua da “Física - USP”. Ainda demorei meses em uma paixão platônica até ficar com ele. Depois ficamos, desficamos. Namoramos, brigamos. Eu fui morar nos EUA, voltei. Ele foi morar nos EUA, voltou. Viramos vegetarianos. Fizemos yoga. Namoramos de novo. Até que eu parti o coração dele e ficamos anos sem nos falar. 

2013
Comprei o ingresso no primeiro dia de venda do show do The Cure. Ainda liguei para o moço e rimos como seria divertido irmos juntos nesse show 17 anos depois. Ele hoje é um amigo querido, está no segundo casamento e só não foi ao show porque acabou de ser papai. Eu dessa vez fui tranquila. Com o coração inteiro, sem nada para consertar. A tranquilidade de quem está conseguindo viver a vida que sonhou. Faço o que amo. Moro onde amo. Tenho amigos que amo e conheço muito mais do que a Disneyworld. Sem a energia que eu tinha em 1996, mas a bagagem necessária para assistir 3h30 de show sem nem me abalar. Ou talvez, abalada demais. Foi uma máquina do tempo. Uma viagem por memórias, momentos, sentimentos, tudo o que eu vivi nesse intervalo de 17 anos. Cada música que tocava era como se um flash involuntário na minha mente. Memórias de tantas coisas que fiz e fui. De tantas coisas que amei. Os anos de FAAP. As festas, os porres. As tarde chuvosas ouvindo “Lullaby”. As madrugadas dançando “In between days” e dublando a música com raiva para outro moço. Discussões ao som de “Push”. O carro cheio com as meninas gritando a plenos pulmões pelas janelas “Friday, I’m in love”. Dias preguiçosos no sofá do Alê ouvindo “The Caterpillar”. Estradas que se desenrolaram ao som de “Lovecats”. Sem querer estavam tocando a trilha sonora da minha vida. E foi uma danada de uma vida. “To kill an arab” me lembrando que eu estava sim, viva. Sempre. “Just like heaven”, “A night like this”, “Why can’t I be you”... São tantas, tantas lembranças. A gente sai pela vida com uma camiseta de um curso universitário na mão e anda tanto, faz tanto, que nem lembra onde ela foi parar. De repente, em uma noite, alguém vai jogando luzes em pontos da nossa trajetória e nos lembramos do caminho que percorremos. Do quanto nos transformamos. Aquelas músicas vão tomando um outro significado. Vão ficando impregnadas com nossas vivências. Viram um canal para tudo que construímos e amamos. Assim, quando estamos perdidos no meio de algum país estrangeiro, depois de muitos meses longe de casa e já sem nenhuma referência de quem somos; ouvir “Close to me” faz com que nos resgatemos. Vem com a memória de quem somos. No show, a voz de Robert Smith já não é mais desamparada também. É mais densa, mais encorpada, e ele não é mais capaz dos gritinhos. Mas ainda é doce. Não podemos nunca deixar de ser doces. Então, quando os acordes de “Close to me” tocaram, me dei conta que não os sei mais decór. Ainda não fui para a Índia. Não mudei o mundo. Não estava apaixonada. Ainda assim, tinha construído uma trajetória muito melhor do que tinha imaginado, descoberto novas formas de amar, de tolerar, de viver. Eu estou exatamente onde quero estar e isso me faz sentir inteira. Olhei no telão e ele sorria. De forma inédita, Robert Smith sorria. Ele também talvez não seja mais aquele garoto melancólico. Eu? Eu também sorria. 

terça-feira, 2 de abril de 2013

DIÁLOGOS

Diálogo com meu sobrinho de 11 anos.

"Rafa, você não falou nada sobre o meu novo corte de cabelo."
"Eu sei."
"Hum... Mas e aí? Você gostou?"
"É. Eu vou me acostumar."

Meninos: Fazendo garotas se sentirem inseguras desde a mais tenra idade. 

segunda-feira, 1 de abril de 2013

MORE BOOKS, LESS LOOKS

O Alê é uma dessas pessoas que eu tenho vontade de bater. Primeiro porque a gente só sente instintos assassinos com pessoas que a gente ama muito. Segundo porque ele é talentoso até dizer chega e não produz um décimo do que deveria. Alê é um dos escritores mais talentosos que já li. Só que ninguém nunca ouviu falar dele porque o moço não publica. Ele foi uma das minhas grandes inspirações a escrever. Desde a época da FAAP, a gente ficava pelos corredores, enfiados na casa um do outro e ele escrevia de um jeito que parecia tão fácil que resolvi também enfrentar o medo. Ele tinha um livro lindo que abandonou no meio. Na época resolvi que era daquele jeito que queria terminar meus dias: escrevendo. Alê é uma dessas forças da natureza, tudo com ele é intenso. Nós tivemos paus homéricos e passamos alguns anos sem nem olhar para cara um do outro. Ele mudou para Barcelona e durante minha mochilada passei alguns dias maravilhosos com ele. Andamos por toda cidade, tomamos muitos drinks, taças de champagne. Foi tudo como nos velhos tempos. Foi lá que disse para ele que não ia esperar o fim dos meus dias para escrever. Que estava mudando tudo na minha vida e que só queria fazer isso agora. Secretamente eu esperava que ele se juntasse a mim. Que não desperdiçasse todo aquele talento somente com emails fechados para amigos. No meu livro tenho diversas homenagens a ele. 
Então ontem recebo um email dele. Que surpresa descobrir que ele está saindo da ostra. Resolveu fazer um Tumblr, e como tudo que ele faz é genial. Ele escreve suas poesias na máquina de escrever e publica as fotos. Bem old school, como só os puristas podem ser. Ainda que de purista o Alê não tenha nada, mas aí é que está sua maior virtude. Sua nada convencional genialidade. Para variar saí inspirada. Vou passar a semana em antiquários buscando uma velha Remington para mim. 
O Tumblr do Alê chama "More books, less looks", e já está nos favoritos. 


domingo, 31 de março de 2013

INTOCÁVEIS



Eu sei que estou atrasada. A Gi me chamou para ver esse filme umas 10 vezes no cinema. Sempre acontecia alguma coisa e não dava. Geralmente era minha preguiça de sair de casa, mas chegamos a ir ao cinema umas duas vezes e perder o horário. Enfim, ontem resolvi pegar no Now e fazer uma sessão pipoca particular. Que delícia de filme! No budismo sempre falam sobre o “saber apreciar o outro”. Vi muito disso nesse filme. Quando conseguimos tirar da frente nossos preconceitos, nossa bagagem cultural, nossos fantasmas e limitações, e dos outros também, conseguimos enxergar o verdadeiro ser humano. Deixando de lado toda a maluquice de cada um descobrimos que no fundo somos todas pessoas inseguras, com medo, querendo ser amada e sem saber direito como fazer isso. Mais do que isso. Somos todas pessoas capazes de um grande poder de amor. E descobrir isso no outro é ouro. Faz com que a gente rejuvenesça 15 anos. É aí que a vida acontece. Às vezes sinto que estou passando pela vida sem viver. Talvez porque são poucos os momentos que realmente paro para enxergar o outro. É um longo caminho até evoluir. Não basta apenas a meditação. A vontade de ajudar os outros. É preciso olhar, apreciar. Eu sei muito pouco disso. Mas acho que, assim como o amor, é questão de prática. 

sábado, 30 de março de 2013

NA OSTRA



Eu passo longos períodos na ostra. Outro dia um amigo meu até me falou que isso era problema de autoestima. Não é não. Gosto de ficar em casa. Gosto de ficar reclusa, sozinha. Ler, trabalhar, escrever. Elaborar planos mirabolantes. Bundar no sofá vendo besteira na TV. Ficar enroscada com a gata na cama. Fazer roteiros para minha próxima viagem. Às vezes coloco uma música e fico horas olhando pela janela. Outras, abro o aplicativo de algum jogo bobo no celular. Dependendo do que eu esteja estudando, tiro diversos livros de ordem da estante, desço todos para a sala. Vou folheando aleatoriamente. Quando canso, levanto para descascar uma fruta. Fazer um chá. Então me distraio com uma revista ou com um livro de receitas sonhando em realmente um dia fazer todas. Eu realmente gosto muito da minha casa e da minha companhia. Chego às vezes até a ficar irritada se o telefone tocar. Como se alguém estivesse atrapalhando a incrível simbiose minha comigo mesma. Hoje, no final da tarde, resolvi ir à pé até a Livraria Cultura comprar um livro de roteiro que estava faltando para minha pesquisa e um presente de aniversário para o meu sobrinho amanhã. Quem sabe um novo CD com um concerto de Rachmaninov. Pensei em dar um passeio, respirar ar puro depois de dois dias de computador e livros. Tomar um café olhando a rua. Os primeiros minutos foram até revigorantes. Me senti animada em ver as pessoas. Pegar metrô, ouvir conversas. Fiquei pensando comigo mesma como eu deveria me obrigar a sair mais, a fazer mais coisas à pé e na rua. Gosto tanto da cidade e há tanta diversidade. Desci na Paulista e tinha um grupo de bailarinas dançando na ponta para ganhar uns trocados. Mais a frente um senhor tocava clarineta. Ah, que delícia de cidade! Então eu entrei na Livraria Cultura, no final da tarde de um sábado de feriado. E me lembrei porque eu detesto gente. Aquele caos, a cacofonia. Gente aos montes, falando alto, tropeçando, esbarrando no meu ombro. Pessoas que param para conversar no meio da passagem, e outras lerdas que sobem escadas pensando na morte da bezerra. Filas enormes. Crianças chorando. Uma falta de educação coletiva revoltante. E asssim, de repente, foi-se toda minha predisposição em fazer parte do mundo um pouquinho. Corri para o primeiro vendedor que achei, comprei os livros protocolarmente, e desisti do CD ou do café. Já sou ansiosa demais no meu íntimo. Tanta bagunça me deixa nervosa. De volta a ostra me sinto tranquila novamente. Vou ler, fazer algo para comer e quem sabe depois alugar um filme no Now. Sábados são terríveis para sair da ostra. Eu até gosto de fazer parte do mundo, mas fora dos horários comerciais. 

quinta-feira, 28 de março de 2013

MEDO, MEDO, MANO VELHO.



Impressionante que por mais que a gente se esforce, medite, tente ser uma pessoa melhor, existem algumas características que são muito difíceis de serem mudadas. Vira e mexe, cá estou eu esbarrando nas minhas falhas. Isso é para provar que se livrar de alguns traumas não é tão fácil. Se eu fizer uma busca de quantos textos já escrevi sobre meu medo de relacionamento nesse blog e no meu anterior, acho que dá para escrever um livro. Todas as vezes eu quero fazer diferente, eu quero passar por cima desse medo. Mas lá vou eu de novo me autoboicotar. Eu sempre estrago tudo. Eu fujo, ou mostro o pior de mim para o cara fugir, ou surto, ou menosprezo o moço, ou ignoro, ou sufoco, ou machuco, ou... Eu sempre dou um jeito de acabar com qualquer chance da coisa dar certo de forma irremediável. É como se eu tivesse dizendo o tempo todo “olha, eu sou uma baita de uma encrenca”, porque daí, quando o cara vai embora, ou quando eu consigo fazer o cara perder o interesse, eu posso voltar para a tranquilidade da minha solidão e dizer para mim mesma: “Viu só! Eu tinha razão!”. Completamente isenta de culpa. Meu modelo de relacionamento não é saudável. Também não quero entrar em detalhes aqui. Mas eu sempre acho que homens vão me machucar, me julgar, me humilhar e me abandonar. Invariavelmente eu acabo contribuindo para que eles reforcem  esse modelo e eu possa sempre falar, “Viu só. Eu sabia.”. Por que será que é tão difícil fazer a ponte da consciência racional para o comportamento prático? Por que será que esse medo nunca vai embora? A Keka e a Carol brigam comigo. Dizem que eu sou muito corajosa, e de fato não tenho medo para um milhão de coisas que botam medo nas pessoas. Viajo pelo mundo sozinha. Encaro o monstro da solidão. Mas daí é que entra a picareta. Eu me sinto segura na solidão. Meu medo é quando tem mais alguém. A minha coragem é só de fachada. É só porque eu me sinto segura no que dá medo aos outros. Daí não é coragem. Coragem é quando a gente encara o desafio apesar de. E não quando o desafio não nos custa nada. Essa semana saí para almoçar com uma amiga. Ela me contava sobre o relacionamento dela com um cara que talvez nunca tivesse imaginado que ela ficaria. No meu caso acho que nem aceitaria um convite para jantar. Mas ela, não só está com ele há mais de um ano como pensando em morar junto. “Dri, ele não é nada do que eu sempre sonhei ou quis, mas eu não acredito em coisas perfeitas. Eu vou até o fim.”. Se for pensar assim talvez eu tenha sim sido corajosa em algumas coisas. Nas vezes em que me via chorando no meio da mochilada sem saber o que estava fazendo ali. Ou depois de 9 horas de trilha carregando uma mochila de 15Kg e desejando por um helicóptero que me tirasse dali. Nas vezes que tive vontade de deletar meu livro e jogar o computador pela janela. Ou quando eu me vi em trabalhos com pessoas completamente sem caráter e me senti impotente. Em todas essas vezes eu disse exatamente a mesma coisa, “Vai demorar, vai ser sofrido, mas eu vou até o fim.” Eu tive medo, mas empurrei um pouco mais os limites da minha zona de conforto e ganhei experiências incríveis como resultado. Talvez eu precise começar a fazer isso nos relacionamentos. Nas horas que eu perceber que estou começando a boicotar, a desejar um helicoptero que me tire dali, me propôr a ir até o fim. Me propôr a ver onde a coisa vai dar. Dessa vez eu fiz uma coisa inédita. Engoli meu orgulho, pedi desculpas e pedi para voltar. Não sei se funcionou. Mas eu empurrei o limite da zona de conforto. Resolvi que vou esperar para ver o fim. Se o fim chegar, prometo não usar para reforçar minhas certezas de medo e abandono. Mas se ele não chegar... quem sabe eu não vivo uma experiência incrível. 

segunda-feira, 25 de março de 2013

UM SHOW PERFEITO


Ontem fui arrastada ao Show da Bluebell e Blacktie no Auditório Ibirapuera. Não que fosse um peso para mim, mas é que passei o dia me sentindo muito mal, com dores no corpo, um princípio de gripe e a noite estava chuvosa. A vontade era continuar na cama lendo até que meu corpo fosse encontrado pela empregada na segunda-feira de manhã. Mas como já havia combinado com a Kika e ela tinha comprado os ingressos, eu me arrastei até o Ibira para não deixar ninguém na mão. Melhor coisa que eu fiz. Eu gosto da Bluebell, gosto do timbre dela. Ela consegue agudos invejáveis. Mas é uma voz perigosa, pode se tornar irritante ou enjoativa. Acho que ela sabe disso e conhece muito bem o instrumento que tem, porque o repertório que escolheu para o show é perfeito para ela. Com Cole Porter, Piaf, The Who e Nelson Cavaquinho. Ainda convidou para participações Laura Lavieri, Mariana Aydar (mega grávida) e o sempre apaixonante-casa-comigo Zeca Baleiro em versões de Beatles. Para finalizar cantou “It’s Oh So Quiet”, que foi gravada pela Bjork (foi minha mensagem de caixa postal no celular por anos), mas que parece ter sido composta para a voz dela. Some a isso que a garota é um fofa, super carismática e com presença de palco impecável e pronto. Um show impecável e um domingo que se salvou pelo gongo. A gripe acabou me pegando de verdade, ajudada pela chuva que tomei do estacionamento até o auditório. Mas junto com o chá de gengibre, mel e limão que estou tomando agora, estou também caçando o CD da parceria da cantora com os músicos do Blacktie. São dessas músicas que fazem a vida parecer mais linda e leve. :-)




domingo, 24 de março de 2013

O CAOS, MINHA GATA E O PARADOXO DA DEPENDÊNCIA

Uma das minhas grandes lutas é trabalhar minha mania de controle. Eu sou uma pessoa controladora. Perfeccionista. Cheia de manias. Tenho momentos em que a virginiana bate forte. Gosto de ordem e método. De planejamento, organização, rotina. De saber com antecedência das coisas para poder organizar da maneira como eu acho mais adequada. Gente assim sofre, eu sei. Nunca satisfeita. Acho que por isso de tempos em tempos sinto uma necessidade tão grande de sair da zona de conforto. Ir para o caos, para o inseguro. E depois volto e tenho períodos de mania extrema, onde arrumo o homeoffice, jogo fora sacos de papéis (às vezes alguns importantes) e organizo os livros em ordem alfabética. Na minha casa eu tinha manias que beiravam o TOC. A ordem das almofadas no sofá, o alinhamento dos livros de foto em cima do rack. Até a maneira de dobrar o paninho da pia. A Kika me enchia o saco porque parecia que ninguém morava na minha casa. Fica aquelas salas congeladas, com cara de novela, de revista. Totalmente sem vida. Até que, um ano atrás, eu tive um desses meus momentos impulsivos. Saí para dar uma volta, passei em uma feira de doações e trouxe a Holly para casa. Lindinha, toda bebezinha. Até que ela crescesse o suficiente para subir em todos os móveis e descobrisse como afiar as garras na minha poltrona retrô, a casa ainda refletia meus distúrbios de organização. Não demorou muito para eu entender que quem manda na casa é ela. Enche de pêlos, derruba CDs, quebra enfeites, desaparece com anéis que eu amo. Nunca sei para o que vou acordar, ou voltar para casa. A casa sempre se transforma com ela. De certa forma me ajuda a relaxar. A aceitar um certo caos incontrolável no meu íntimo. Hoje acordei tarde com dor nas costas, porque a gata estava estirada bem no centro da cama, me jogando para escanteio. Levantei e pisei descalça na bombinha de asma que ela tinha transformado em brinquedo no meio da noite. O chão cheio de lenços de papel. No banheiro o tapete estava revirado, dois potes de gel para cabelo no chão e diversos cotonetes jogados dentro da pia. Ela, sem cerimônias, foi pulando os obstáculos e parou em frente ao box miando para eu abrir a porta. Holly agora deu para só beber água no box. Na sala, um furão de pelúcia está em cima do receptor da NET, sacolas que usei para comprar vinhos ontem estão destroçadas pelo chão, marcas de patas em cima da mesa e mais uma mancha no sofá porque ela derrubou suco ontem à noite. Como eu fiquei fora o dia todo ontem e voltei bem tarde de madrugada, Holly achou legal também jogar um tanto de areia para fora da caixa. A poltrona jangadeiro está com fios puxados, existem rolhas nos vãos do sofá e bolinhas de amendoim japonês que ela pegou para brincar embaixo do puff. Holly está em cima da pia, tentando pegar os pingos d’água que caem da torneira. Com a mudança da ordem eu também já deixo louça suja dentro da pia e livros espalhados pela casa. O IPAD carregando no chão, o celular embaixo da mantinha da TV e caixinhas de lenço em cima dos móveis. Me abrir para o caos que outro possa criar me faz ser mais humana. Deflagra minha fragilidade e imperfeição, e é exatamente isso que me faz inteira. Ainda não sinto que tenho muito espaço para viver com outra pessoa. Mas permitir que um ser vivo entre em minha vida e desconstrua meus ideais controladores, me ajuda a ficar mais aberta para o que a vida traz. Amplia minha zona de conforto. Deixa as fronteiras mais largas. Quem sabe assim quando eu tiver que fugir, que buscar o inseguro, eu possa ousar mais. É a maior beleza desse paradoxo. Quanto mais crio vínculos, dependências no meu íntimo, mais livre me torno para ousar. Ganho mais independência. Por enquanto é uma gata que entra e domina minha vida. Ando pensando em fazer agora um jardim, ou uma horta. Quem sabe no final do ano comprar um cachorro. - O Cavallier que sempre sonhei. - Aos poucos vou me deixando depender de outros seres vivos. Se uma gatinha está me deixando tão livre de mim mesma, imagine quando eu for enfim capaz de depender de alguém. Acho que então vou poder conquistar o mundo. 

sexta-feira, 22 de março de 2013



Acho bom quando a vida me coloca em situações para confrontar o que eu realmente quero. Reforça minhas crenças. Ao mesmo tempo é frustrante. Secretamente fico pensando se não busco algo que não existe. Acho que estamos vivendo uma época de superficialidades. Uma época sem comprometimento. Sem verticalização em nada. Somos milhões de pessoas sozinhas, tentando se convencer de que a auto-suficiência é nossa única saída. Nos forçando a viver sozinhos, a nos adaptar. Não existe mais o "junto", o ensemble. Vive-se ao lado. Em paralelos. Não quero isso. Quero mais. Quero aquele nivel de cumplicidade que só temos quando nos conhecemos por inteiro. Quero a disponibilidade completa e apavorante de se perder em outra pessoa, até um ponto em que não se pode achar um caminho de volta. Talvez eu seja a pessoa certa, na época errada. Uma época onde tudo deve ser leve, suave, despretencioso. São coisas boas também. Mas eu sou intensa. Quero tudo. Quero o pesado, o ríspido, o apegado também. A ideia de ter algo em frações, de ter algo meia boca, me dá uma aflição terrível de não estar vivendo. De desperdiçar. Eu preciso me maravilhar. Preciso queimar, mesmo que eu me quebre. Nessa época de gente morna. De gente com medo de fogo. Com medo de gosto. Com medo de vida. 

terça-feira, 19 de março de 2013

"Quão feliz é o destino de um inocente sem culpa. O mundo em esquecimento pelo mundo esquecido. Brilho eterno de uma mente sem lembranças. Cada orador aceito e cada desejo renunciado."
Alexander Pope



Pensando em coragem hoje. Pensando em fazer o que é certo ao invés do que é conveniente. Pensando que ninguém é uma ilha, embora a gente não escolha quem participa da reunião de condomínio. Pensando em como eu estou triste hoje. Tristeza faz parte. Como disse em um conto meu, “dói até em dente de leite”. Acho horrível essa coisa de auto-suficiência. Não quero ser auto-suficiente. Não quero ser só eu resolvendo toda a bagunça. Não precisa ajudar também, mas só de ficar ao lado... De dizer que dá tudo certo no final, já estava bom. Às vezes eu acho que São Paulo é muito cruel. Nessas horas tenho vontade de fugir, de hibernar. Morar em Roma, ou na Tailândia, ou nas Ilhas Maurício. Ou em algum lugar onde minha bagagem pudesse ficar longe. Extraviada. Apagar as memórias como no filme do Michel Gondry. Virar um donut, sem nada no meio. Mas não é São Paulo o problema. É a história que construí aqui. A necessidade tão angustiante de ser amada. Hoje dói tudo. Doem todos os meu músculos.

segunda-feira, 18 de março de 2013

COMO ENTENDI QUE O APEGO É MINHA MAIOR FORÇA



Em dezembro o João Luiz Vieira me convidou para escrever para o Paupraqualquerobra.com.br. O site é um projeto antigo dele, um portal que fala sobre sexo, relacionamento, comportamento e direitos de gênero. A princípio fiquei com medo, porque tenho uma pegada bem careta e tradicional. Meu texto é de mulherzinha. Mas era exatamente isso que ele procurava, então lá fui eu, achando que seria bombardeada. Em três meses o site alcançou 50mil acessos diários. É um fenômeno. E minha coluna, que entra todos os sábados, é super bem recebida. Virou uma diversão procurar assuntos e temas para a coluna da semana. Fuço pela internet, converso com amigos, ouço histórias. Às vezes o tema cresce sozinho e a coluna repercuti muito bem. Outras nem tanto. Mas é assim mesmo que funciona. Estou me divertindo tanto com a nova temática que tenho feito muitas pesquisas bibliográficas. Uma vez por semana dou um pulo na livraria e ataco a sessão de livros de “autoajuda”. Ali a gente encontra 90% do que está errado nas expectativas de relacionamentos das pessoas. Ainda se acredita que um relacionamento interpessoal pode ser conduzido como receita de bolo. Faça isso, não faça aquilo. Sem levar minimamente em consideração as nuances de personalidade de cada pessoa, suas necessidades emocionais, sua base afetiva. Ler livros do naipe de “Como fisgar um homem em 50 lições”, ou “Tudo o que você queria saber sobre as mulheres (mas nunca teve coragem de perguntar)” me ajuda a entender e conversar na coluna sobre as angustias dos relacionamentos. No geral somo todas pessoas carentes, querendo encontrar o amor de alguma forma. Sempre acreditei nisso. Mas nem sempre essas referências bibliográfica são pataquadas caça-níqueis. Vez ou outra eu esbarro com um livro que realmente aborda questões pertinentes sobre relacionamentos e sobre a forma das pessoas se relacionarem. Semana passada esbarrei em um livro que me trouxe luz e clareza sobre as necessidades de apego (sobre as minhas inclusive): Apegados - Um Guia Prático e Agradável para Estabelecer Relacionamentos Românticos Recompensadores, de Amir Levine e Rachel S. F. Heller. A dupla de psicólogos pegou a teoria do apego desenvolvida nos anos 50 por John Bowlby e passou a aplicar estudos com esse foto em relacionamentos românticos. O resultado é fascinante, entendendo as maneiras de se relacionar de forma autêntica e colocando por terra todas as teorias de regras para estabelecimento de intimidade e comprometimento. Eu particularmente adorei o estudo, porque coloca por terra a eficiência dos joguinhos românticos. Odeio jogos e nunca fui praticante, mas já tive dúvidas sobre se não deveria praticá-los. Se eu não deveria me mostrar menos disponível, ou “me fazer de difícil”. Se eu não deveria evitar manifestar minhas necessidades emocionais, porque não queria ser considerada frágil. São crenças cada vez mais em voga na nossa sociedade, que exalta a autossuficiência como um grande mérito. E vai acabar levando uma geração inteira a envelhecer solitária e infeliz. Eu sempre achei que a força vem da união, da capacidade de se entregar, de se submeter, de criar intimidade e vínculos profundos com outra pessoa. A maior descoberta para mim, no entando, foi finalmente entender que, para algumas pessoas, isso é completamente impossível. Que a intimidade é violenta e sufocante para algumas pessoas e elas terão muitas dificuldades para realmente construir uma relação de cumplicidade e apoio mútuo, constantemente criando armadilhas inconscientes para afastar o outro. Daí vem a infindável gama de relações infelizes que vemos por aí, onde pessoas se sentem sufocadas, ou frustradas, inseguras, carentes. É tudo uma questão de saber entender a linguagem afetiva do outro e assumir se somos capazes de falar a mesma língua. 

segunda-feira, 4 de março de 2013

NÃO VIOLENTA


Está fazendo um ano que eu adotei o budismo como religião. De todas as linhas religiosas, o budismo foi o que eu me reconheci mais. E mesmo dentro do budismo, até encontrar a Ordem Kadampa, de origem tibetana, eu passei por uns lugares que não me senti nada a vontade. Faz parte. Não acredito que exista ideologia perfeita. Exista aquela em que você se reconhece. Até por isso não faço muito alarde. Faço minhas meditações, minha sadhana diária, estudo e apareço no templo quando tenho vontade. Mas isso diz respeito somente a mim. Quando alguém se interessa, respondo às perguntas, até dou o site, mas fico na minha. Duas coisas que aprendi: As pessoas só vão de encontro a alguma religião quando sentem real necessidade, e aquilo que para mim faz sentido, pode não fazer para outra pessoa. Sei que é bem possível que se algum amigo se mostrar interessado na minha ordem e for comigo ao centro, vá achar tudo uma maluquice. Ou não. A verdade é que religião é algo muito pessoal, e por isso cada um encontra a sua. Para mim foi uma das melhores coisas que aconteceu em 2012. Hoje acabo me encontrando em situações muitas vezes que em outros tempos teria reações de muita angústia, tomaria atitudes precipitadas. Mas sinto que estou bem mais calma, centrada e relaxada. Eu sei que devo isso ao budismo. Tenho muitas coisas para trabalhar e conquistar ainda, mas eu me sinto melhor e mais feliz depois que passei a praticar. Claro que isso não muda minha natureza. Eu continua uma pessoa sensível, reclusa. Mas tem sido mais fácil lidar com alguns confrontos do dia a dia. Uma das maiores descobertas foi o sentimento real de não-violência. Ele primeiro foi se manifestando de força mais física, e agora tenho conquistado suas outras acepções. Eu nunca fui uma pessoa violenta, fisicamente. Mas sempre fui bem violenta na maneira de pensar e de opinar. Pensar na não-violência através do vegetarianismo, das influências que recebo, foi fácil. Eu não assisto a lutas na TV, por exemplo. Esses UFC da vida. Não vejo, não gosto. Me faz mal. Hoje não mato nem barata com inseticida. Acho bem fácil praticar a não-violência quando estamos defendendo cachorrinhos fofinhos, mas é um grande exercício respeitar o direito à vida de uma barata nojenta. Eu fico feliz de conseguir seguir a risca aquele ditado “não faz mal a uma mosca”. Agora tenho buscado outras formas de não-violência. A pela palavra é mais difícil. Falamos coisas agressivas o tempo todo e nem nos damos conta disso. É preciso me policiar o tempo todo e geralmente tenho perdido mais do que ganhado. Ainda assim, é com o exercício e a intenção que vou chegar lá. Esse ano me deparei com um novo desafio: a não-violência comigo mesma. Depois de experimentar a dizer “sim” para tudo, comecei a perceber que algumas situações me violentam. Temos uma tendência a suportar mais a dor quando ela é submetida a nós mesmos. Porque tenho mais cuidado com a violência ao outro e me permito ser violenta comigo? Talvez o segredo não seja dizer “sim” ou “não”, mas se permitir viver o que não lhe cause violência. E dizer “não” para qualquer coisa que lhe violente. Nessa horas tem muita gente que vem dizer “ah, deixa disso”, ou “não dê tanta importância”, e normalmente achamos que é por aí mesmo. Não damos tanta importância para a violência que estamos sentindo e continuamos com relações e situações que nos agridem. Para algumas pessoas, um local com música alta, repleto de gente bêbada pode ser muito violento. Relacionamentos protocolares em ambientes cheios de fofoca podem ser muito violentos. Tudo o que vai contra nossa natureza mais íntima, pode ser muito violento. Essa semana fui colocada a prova, em uma situação muito difícil de escolher. Talvez se fosse em outra época da minha vida, minha decisão seria diferente. Talvez quando eu for mais forte e tiver mais prática, eu consiga tomar outra decisão. Nesse momento eu decidi não me violentar. Me preservar. Me retirar. Não por que eu tenha medo, ou rancor. Mas porque eu não vou me submeter a qualquer coisa que possa me causar dor. 

sexta-feira, 1 de março de 2013

O QUE APRENDI QUANDO ESCREVI SOBRE O QUE APRENDI POR AÍ


Nasceu. Saiu semana passada meu primeiro texto em uma revista. O processo foi um tanto doloroso. Primeiro, porque não sou jornalista. E respeito muito a profissão de jornalista. Então sentia um medo danado de escrever algo que não estava a altura dos profissionais que geralmente escrevem nessa mídia. Segundo porque era sobre um tema pessoal. Verdade que só sei escrever sobre meu umbigo. Sou capaz de uma abertura em texto que não tenho na vida real. Mas uma coisa é me abrir aqui no meu blog, onde só meia dúzia de amigos entram de vez em quando. Outra coisa é se abrir com uma tiragem de mais de 50 mil exemplares. Ainda tenho muito medo de pagar mico. Não sou tão desprendida assim. Quando a Ana Holanda me pediu para escrever sobre minha experiência de voluntariado na Guatemala, levei um susto. Eu tenho muita sorte de trabalhar para a Vida Simples, e lógico que intimamente sonhava em escrever para a revista, mas até a coisa concreta... Aflora em mim toda minha insegurança de bichinho do mato. Pois é. Sou uma pessoa imperfeita. Tenho medos, angústias, e inseguranças. Hoje em dia não tenho mais problema nenhum em manifestá-los. O que eu fiz na verdade foi enrolar a Ana por três longos meses até sentar minha bunda no computador e escrever. Quando terminei, enviei o arquivo tremendo por email, acompanhando de uma carta explicativa pedindo “desculpas por qualquer coisa”. Para minha surpresa a Ana me ligou 15 minutos depois dizendo que tinha amado o texto e que estava emocionada. Emocionada é bom, embora eu sempre tenha receio de ficar piegas com essa do povo sair se emocionando com meus textos. Então veio a segunda parte mais difícil. Como sou prolixa e superlativa, meu texto tinha 20 mil toques. Eu tinha o desafio editorial de cortar pela metade. Uma semana de sofrimento e 8 mil toques a menos, devolvi o texto para a Ana e falei “fiz o que consegui, pode cortar o que quiser”. Primeira conquista que escrever um texto para um veículo de massa me trouxe: desapego! É bem difícil exercitar o desapego com trabalhos intelectuais, ainda mais com relatos pessoais. Nessa hora entrou minha voz interior pedindo a mim mesma para ter confiança nos outros. Foi. Ana me retornou com o texto editado algumas semanas depois, lindamente. Tanto que eu quase não percebia as edições. Não é a toa que ela tem o cargo que tem, e é tão boa no que faz. A Ana é, antes de tudo, uma pessoa gentil e generosa, e isso é muito bom para bichinhos ressabiados e ariscos como eu. Então o texto entrou na pauta da edição de março. Continuei com a minha vida. No fechamento, Ana estava de férias e era a Jeanne quem estava revisando a edição final. Ela me mandou um email com duas dúvidas sobre meu texto e sugeriu uma alteração. Alterações são coisas que me deixam alterada. De imediato não recebi muito bem, acho que nem fui muito legal com a coitada que só estava querendo me ajudar. Mas depois pensei com calma, lembrei de aprender a confiar. Lembrei que precisava aprender a desapegar, e afinal de contas, a Jeanne é jornalista, tem muito mais experiência do que eu, está naquela revista desde sempre. Se ela sugere uma alteração é óbvio que vai ficar melhor. No dia seguinte fui lá, mandar um email pedindo desculpas e dizendo que confiava nela. Eu acho importante às vezes nomearmos as coisas. Hoje em dia fica tudo subentendido. Dizemos em alto e bom som tudo que odiamos, mas achamos que emoticons dão conta dos sentimentos positivos. Eu sou a prova viva de que, por mais que a casca de fora aparente segurança e auto-confiança, no fundo precisamos ouvir coisas boas a nosso respeito. Dizer com todas as letras “confio em você”, “você é bom no que faz”, “sinto orgulho de você”, “eu te amo” pode mudar o dia de alguém. E Jeanne me respondeu para eu ficar tranquila, que a matéria ficaria legal. Ela tinha razão. Ficou. Ainda ganhei de presente algumas ilustrações lindas da Lydia Megune e voilá! Estreei lindamente com um texto para revista. Melhor, ganhei uma consciência mais completa de como funcionam esses veículos de massa. Como o resultado é sempre um esforço entre escritores desapegados e editores generosos. Certamente se eu fosse mais arrogante e cabeça dura do que sou, não teria ficado tão perfeita. Então é isso. Estou pimpona. Estou aliviada de ter dado certo. Eu sei que para muitas pessoas isso nem é grande coisa, e não merece atenção de grande feito. Mas, dentro na minha nova proposta de ser generosa comigo mesma, eu comemoro a superação das minhas fraquezas. O entendimento de que, mesmo tão avessa e imperfeita, ainda dá para fazer alguma coisa certa. 

PS.: se você é um dos meus “meia dúzia” de amigos que lê esse blog e ainda não foi comprar a revista para ler, lembre-se que também faz parte do meu pacote de imperfeições a vingança e o dramalhão! :-P

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013


O ano mal está encerrando seu segundo mês e eu já tenho 2013 como um dos mais importantes da minha vida. O livro está no prelo, minha primeira matéria foi publicada semana passada na Vida Simples, outro texto foi aprovado (talvez um dos mais corajosos que escrevi) para publicação em breve, a coluna no PPQO indo de vendo em popa, conheci Cuba. A vida está calma, e isso me faz sentir feliz e inteira. Essa mania de dizer “sim” para tudo me trouxe algumas surpresas sociais, novos amigos, e a chance de me envolver com uma nova pessoa - que talvez eu não me envolvesse em outras épocas. Acho que agora é tempo de qualificar tudo isso. Como disse minha editora, essa coisa de aprender a dizer “sim” é tão importante quanto aprender a dizer “não”. Vamos lá, aprender os dois. Comecei dizendo não para baladas. Oficialmente, não posso com baladas, aglomerações de pessoas, gente bêbada e qualquer coisa que avance noite a dentro. Não sou eu. Ontem disse não também para a academia. Não para a prática de exercícios, só para minha academia. Ela, que eu gostava tanto, e que foi paixão a primeira vista quando me inscrevi em uma segunda-feira. Nada contra a academia. Continua excelente e apaixonante. É só que estou diferente. Vontade de fazer ballet apenas. E correr. Correr eu corro em casa, e se é para fazer apenas ballet, então vou para uma escola só disso. Sentei ontem na recepção e pedi para cancelarem meu plano. Já visitei a nova escola que tem uma sala enorme com piso de linóleo e um piano. Outro não que estou aprendendo a dizer é para a ansiedade, a insegurança e as expectativas. Escolhendo viver um dia de cada vez, e fazendo dele o melhor que eu posso. Bem calma. Eu calmo, você calmo. Todo mundo calmo. 

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

ZOÉ VALDÉS



Mais uma coisa sobre Cuba. Quando li "Trilogia Suja de Havana" do Pedro Juán Gutierrez fiquei apaixonada por Cuba, pela literatura cubana e por aquele careca de charuto na boca e cara de mau. Inclusive um dos meus planos diabólicos era perseguir o escritor pelas ruas de Havana. Não aconteceu. Ano passado, na FLIP, assisti a mesa em que Zoé Valdés participou com o tema literatura no exílio. Zoé é uma escritora cubana, exilada em Paris. Já achei a garota esperta de imediato. Se é para se exilar, nada de ir para Miami, a cidade mais cafona do mundo. Exile-se em Paris, claro! Comprei o livro dela e deixei procrastinando na prateleira. Quando estava arrumando a mala, pensando qual seria a literatura da viagem, puxei o exemplar de "O Todo Cotidiano".  Na verdade é uma edição de dois livros de Zoé: "O nada cotidiano" de 1995, que narra sua infância e adolescência na ilha; e outro mais recente, de 2010, "O tudo cotidiano", que fala de seu exílio em Paris. Achei que seria uma leitura adequada nesse momento de suposta transição da ilha, ler dois relatos de Cubas diferentes. Acho que eu não podia ter feito escolha melhor de literatura. Zoé é uma escritora punk! Se eu achava Pedro Juán pauleira, nada como ver alguém de saias falando sobre Cuba. Sei que sou suspeita para defender escritoras mulheres, mas acho que quanto mais dolorosa é uma realidade, mais pungente fica a narrativa feita por mãos femininas. Mulheres possuem outra maneira de viver a dor, talvez porque é tão inerente a nossa vida. A fragilidade do sexo, que pode nos tornar cruéis e inocentes ao mesmo tempo. Independente de qualquer sentimento que você possa ter pela ilha, vale a pena ler os livros. Os dois. Um seguido do outro. 


terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

CUBA: TODA, INTEIRA E DE UMA VEZ



Pois é. Primeiro choque de Cuba foi me deixar completamente incomunicável virtualmente. Nos últimos dias até consegui internet (mas só porque estávamos em um hotel 5 estrelas), mas ela era cara, lenta e usei só para trabalho. Os planos de postar um diário da viagem foram por água a baixo. Agora, de volta, estou amargando uma virose chata no sofá de casa e vou fazer um resumão. Vai ficar um post longo, mas serve para situar um pouco da experiência que tive na ilha, e dar umas dicas para quem pensa em viajar para lá em breve. Vamos lá!
Primeira coisa a se notar, Cuba fica longe! Eu achei que o trajeto fosse mais curto, ainda nosso vôo tinha conexão em Lima, então fizemos um triângulo na América Latina. Foram quase 12 até chegar em Cuba, e depois mais duas de ônibus até chegar em Varadero. Some a isso que agora é regra nas companhias aéreas servir pão. É um tal de lanchinho aqui, lanchinho ali. Meu humor estava no chão. Eu estava voando na jugular de qualquer um que chegasse na minha frente. Tanto que virou frase de ordem durante a viagem sempre que o stress se instalava: “Olha o mau humor!”. Não dá para viver sem humor. 

Cubanos -
Primeira coisa que a gente percebe logo de cara, os cubanos nos adoram! Eles amam o Brasil e só de dizer de onde somos, eles abrem um sorrisão e repetem prolongando o final: “Brasiiiiilllll!!!!”. Acho tão gostoso esse fascínio que o Brasil gera em todo mundo. Onde vamos, as pessoas amam os brasileiros (menos em Portugal). Muito bom ser um povo amado, sinônimo de alegria, de felicidade, de coisa boa. Depois de relaxarem um pouco e abrirem o sorrisão por sermos brasileiras, o comentário era obrigatoriamente a principal referência brasileira que eles têm: novelas! Agora estão assistindo “Insensato Coração” e a reprise de “Por Amor”. Todos comentam da novela e perguntam sobre a trama. A gente se divertia contando segredinhos que estavam por vir. Eles adoram! A novela passa em horário nobre, três vezes por semana. O governo intercala o horário com uma produção cubana, para alavancar a audiência da novela nacional. Outra unanimidade é Glória Pires. Eles amam Glória Pires. Homens, mulheres, velhos e crianças. Todos eles perguntam de Glória Pires, se conhecemos Glória Pires e como ela é. Acho que se algum dia ela for para Cuba, os próprios irmãos Castros estariam esperando-a no aeroporto. Usando camisas polo da Lacoste. Depois dessa introdução comum a todos os cubanos as reações se dividiam dependendo do gênero do nosso interlocutor. Se fosse mulher, conversávamos normalmente sobre as unhas, as melhorias da abertura, o emprego. Agora, se fossem homens, começava um assédio insuportável. No começo a gente sorria, e até se sentia lisonjeada, mas logo se aprende que em Cuba fazer contato visual é perigoso. O povo gruda em você e não larga. É sério. Então diziam que éramos lindas, que mulher brasileira era a mais bonita do mundo, estalavam os lábios e puxavam o ar fazendo barulho, chamavam de Miss Brasil, pediam em casamento. Acho que recebi uns 200 pedidos de casamento. Isso é para acabar com qualquer crise pós-35 que uma mulher solteira possa ter. (Embora nenhum dos pedidos veio acompanhado de uma aliança Tiffany’s com diamante princess cut de 1ct.) Se a essa altura a gente não desse logo um corte no rapaz, a coisa ficava mais complicada. Começavam a colocar a mão, puxar pelo ombro... e dava um pouco de medo. Demorei alguns dias para inventar um “novio” e usá-lo para escapar de todas as situações. Outra coisa que era comum a todos cubanos, homens e mulheres: todos fechavam a cara quando o assunto era política, Fidel ou o governo cubano. O sorriso sumia, os olhos se enchiam de medo e então a gente descobria que eram pessoas tristes, sofridas. Toda aquela alegria e simpatia faz parte do mis-en-scéne turístico. Coisa para inglês ver. 

Dinheiro -
Em Cuba há duas moedas, o peso cubano e o peso convertible, ou CUC. O CUC é a moeda usada pelos turistas e tem taxa de 1-1 US dólar. Embora a base de cálculo seja o dólar, a melhor moeda para troca em Cuba é o Euro. Se você for tentar trocar dólares pagam CUC 0,80 por US$1. É a vingança comunista. Trocar CUCs ou qualquer outra moeda pelo peso cubano só no mercado negro, e certamente você via perder muito no câmbio. De qualquer forma, todos os serviços, lojas, restaurantes, taxis vão te cobrar em CUCs. A gente não tem muito acesso aos estabelecimentos dos cubanos. Tentamos entrar em um mercado do governo e quase fomos enxotadas. Era um salão grande, com grãos a granel e produtos com cara de baixíssima qualidade. Os produtos de higiene eram estranhos, todos com embalagens genéricas. Também havia uma longa fila para comprar pão (1 por pessoa) e um bar com café e rum baratos. Me proibiram de tirar fotos e disseram que não podíamos consumir nada ali. Lá os cubanos podem comprar produtos baratos ou trocar seus talões de “ração”. Ninguém morre de fome, mas estão muito longe poderem dizer que comem de verdade. O regime garante que todos “se alimentem”. O básico para sobreviver. Todo mundo sabe que existe uma grande diferença entre viver e sobreviver. O comunismo garante só a segunda opção. As pessoas mais ligadas ao partido garantem empregos mais privilegiados em hotéis e restaurantes, onde se recebe “propina” dos turistas. Embora os taxis sejam caros, não é tão lucrativo quanto uma camareira de hotel. A gasolina é muito cara e, por mais que ganhem em CUC, mais de 75% fica com o governo como pagamento de impostos. Camareiras além de gorjeta, ganham presentes e produtos dos hóspedes. Nós deixamos shampoos, cremes, pasta de dentes, sabonete, perfumes. Ela quase nos levantou no colo de tanto que agradeceu. Além de péssima qualidade, os produtos de higiene cubanos são caros e com o pequeno orçamento acabam virando itens supérfluos no final do mês. O salário médio cubano varia de 350-450 pesos. Algo como 13-18 CUCs. Eu comprei um shampoo na lojinha do hotel que era esse preço. É isso mesmo. As pessoas passam o mês com R$35 e um talãozinho de ração. Vidão!

Carros - 
Uma das imagens mais icônicas do meu imaginário do que seria Cuba era a frota de carros. Sonhava com aquele país parado no tempo, cheio de latas velhas sem manutenção e Bel Airs rabo de peixe. Eles continuam lá. Junto com Ladas aos montes. Muitos passaram por tantas funilarias que viraram carrocerias disformes, e mal se consegue determinar o modelo original. Mas há muitos carros impecáveis, brilhando. Compondo um quadro irresistível com os prédios em ruínas ao fundo. A surpresa veio da quantidade de Peugeuts, Kias e Hiundais novinhos em folha que também se encontram por todos os lados. Faz bem pouco tempo que o governo abriu o comércio de carros novos, até por isso não esperava ver tantos na rua. Esse é só um dos sintomas do quanto Cuba está mudando, e em que velocidade. Não vai demorar muito e talvez os Bel Airs sejam reduzidos a apenas alguns para divertimento turístico estacionados na entrada do Bairrio Cino. Não demora muito também para descobrir que todo e qualquer carro na rua é um taxi em potencial. Existem cinco modalidades de taxis: 
Os de empresa: são amarelos e se parecem muito com os rádio-taxis de São Paulo. Podem ser facilmente identificados nas ruas e alguns deles até tem taxímetro. Taxímetro é artigo de luxo e encarecem bastante o trabalho para os taxistas que são hiper-taxados pelo governo. Quase nenhum taxi tem. 
Os regulamentados: são taxis particulares, com motoristas regulamentados pelo governo. eles possuem carteirinha, registro, luminoso no teto do carro e, obviamente, pagam também uma fortuna de impostos. 
Os ilegais: nessa categoria entra praticamente qualquer carro nas ruas de Havana. Em sua maioria Ladas velhos e caindo aos pedaços, com bancos de mola estourando na sua bunda e maçanetas que podem te passar tétano. 
Os lotações: esses são carros comuns que dificilmente pegam turistas. São os mais usados pelos cubanos. Fazem um trajeto fixo e vão pegando pessoas pelo meio do caminho. São baratos, cobram em pesos, ou o mínimo em CUCs. Pegamos um desses só uma vez porque um casal cubano foi muito gentil e nos colocou lá dentro, senão nunca teria parado para nós. Nos cobrou apenas 1CUC por um trajeto em que normalmente nos cobravam 5CUCs. 
Os coquitos: são as tradicionais lambretas com carroceria em formato de coco. Vale para fazer trajetos curtos, porque não são as coisas mais confortáveis do mundo e à noite, com a temperatura mais baixa, você passa frio. Cobram o mesmo tanto que os ilegais, mas possuem autorização para trabalhar. Me lembraram os tuk-tuks que eu pegava na Guatemala. 
Com exceção dos regulamentados, todos os outros vão sempre tentar te dar um golpe. A boa notícia é que você nunca vai saber se estão mesmo dando um golpe ou não. Com a falta de um taxímetro o preço é estabelecido basicamente pela sua cara. O motorista olha para a sua cara e imagina quanto acha que consegue arrancar de você. No geral nós tínhamos cara de 10CUCs, porque qualquer trajeto que tentávamos fazer custava isso. É preciso negociar e ter muita paciência. Nas calçadas nós éramos atacadas por taxistas e representante o tempo todo. Depois de alguns dias estava tão farta da cara de pau dos taxistas que parei de negociar. Entrava no carro, se me falassem um valor muito alto, eu simplesmente dizia “No, gracías.” E saía do carro para procurar um outro. Eles podem até ter um regime comunista, mas eu cresci no capitalismo, onde impera a lei da oferta e da procura. E lá, há muito mais oferta do que procura.

“No, gracías” -
Golpes. O tempo todo vai ter alguém tentando te dar algum tipo de golpe. De todos os tipos. Eles não vêem turistas como iguais. Às vezes tinha a impressão que o regime os deixou tão individualistas pela sobrevivência que eles não vêem ninguém como igual. Por isso mesmo vão sempre tentar se aproveitar, passar a perna, te explorar de alguma forma. Seja cobrando 10 vezes o valor do produto, seja inventando uma história para te ludibriar a comprar gato por lebre, um cubano nunca vai vir conversar com você sem algum interesse por trás. A melhor coisa é relaxar e saber que invariavelmente você vai cair em algum golpe na sua estadia. É melhor pensar assim para não ficar muito revoltado quando acontecer. Claro que existem os mais óbvios. Quando estávamos indo para a Fábrica de Charutos  fomos abordados por um rapaz na rua que, depois do ritual Brasiiiilll-novela-brasileiraslindas-casacomigo nos garantiu que a fábrica estava fechada naquele dia porque era um feriado nacional onde “somente aquele dia” o governo permitia que as cooperativas de funcionários da fábrica vendenssem charutos em suas casas pela metade do preço. Para um desavisado parece mesmo a sorte do século! Qual a possibilidade de você estar viajando bem no dia de tão maravilhoso feriado!? Claro que é uma história inventada para levar turistas mais ingênuos para casas particulares onde se vendem charutos (de baixíssima qualidade, diga-se de passagem) no mercado negro. Eu já estava avisada desse tipo de golpe, então continuei sorrindo, agradeci a dica e enfiei meu “novio” na jogada. “Ah, que pena que a gente não sabia disso antes, mas é que meu ‘novio’ já está nos aguardando lá na fábrica. Quem sabe da próxima vez!?”. E sai andando. Depois de dois dias eu já nem me dava ao trabalho de inventar muitas desculpas. Só repetia, sorrindo, “no, gracías”, sem parar de andar, até o indivíduo desistir. Vencer pelo cansaço. A Lau me perguntou se o assédio era como no Marrocos. É bem diferente. Nas suks eles também pulam no seu pescoço e é um perigo fazer contato visual, mas a diferença é que o marroquino é um negociador. É uma coisa cultura. Ele tem um produto e ele vai exaltar todas as qualidades para conseguir o melhor preço por ele. Ele não quer te oferecer um lenço por 100 dirhans, para você pagar e ir embora. Ele quer que você barganhe, negocie, argumente. Ele conhece o produto que tem em mãos e você vai saber quando chegou no limite do que ele realmente vale. Em Cuba não. O que eles querem é te extorquir, te fazer de trouxa. O prazer está em enganar, levar vantagem. Fazem os vendedores de canga e taxistas cariocas parecerem trombadinhas pés de chinelo.

Segurança -
Com tudo isso você pode pensar que Cuba é um lugar perigoso. Não é. Super seguro! E a sensação de segurança é presente. Mesmo à noite, mesmo sendo mulher andando sozinha. Pode-se sacar dinheiro em caixa eletrônico no meio da rua, andar com câmeras a tira-colo, exibir IPhone, relógios, jóias. Sem nenhuma preocupação de ser assaltada. Parece estranho em um lugar onde as pessoas vivem com tão pouco e são expostas constantemente a uma abundância que não podem ter acesso, mas essa segurança tem pouco a ver com o caráter do cubano e muito mais a ver com a polícia do regime. Cuba tem um policiamento ostensivo, violento e implacável. Faz a ROTA e o BOPE parecerem seminaristas. Nos hotéis existem casos de furtos de dinheiro. Objetos, jóias, eletrônicos são mais complicados de justificar a posse, mas algumas camareiras podem não resistir de ver exposto o valor muitas vezes de um ano de trabalho. Nada que usar o cofre do quarto não resolva. 

Comida -
É horrível! Comi muito mal na maior parte do tempo. Tudo tem gosto artificial, enlatado, de baixa qualidade. Quanto mais fresca a comida, mais cara, então é um festival de purê de batata em pó, molho de tomate aguado, massas rançosas e arroz azedo. O queijo tinha gosto de plástico. Comer era sempre uma aventura, e muito caro para o que se oferecia. Em tudo, a Cuba em CUC era bem cara. Encontramos algumas opções mais palatáveis depois de quebrar um pouco a cara, e nisso vimos um certo refresco de uma Cuba que está aos poucos renascendo e se abrindo para o mundo. Havana está começando a ter novos endereços, restaurantes, cafés. Em imóveis reformados, muito bem decorados, com equipe treinada e chefs treinados nas técnicas culinárias. Nesse lugares encontramos uma comida criole revisitada e saborosa. Outra surpresa foi almoçar no La Bodeguita del Medio. Nem tínhamos planejado isso, por ser um dos endereços mais turísticos de Havana, mas os turistas passam em frente, tomam um mojito, tiram fotos e vão embora. No salão dos fundos fica um restaurante vazio, farto e de ótimo preço. Comida caseira, muito bem feita. Comi arroz de mouros, batata doce, banana frita e salada (com folhas!!!). E o mojito deles é mesmo o melhor de Cuba! Os restaurantes do hotel também salvavam a pátria. Ficamos no Meliá Havana, que é maravilhoso. Mesmo quem não liga para estrelas, como os preços são mais ou menos os mesmos, vale a pena ficar nesse. Limpo, seguro, correto, equipe muito atenta e com internet (Yeay!!!). Você não vai encontrar isso em nenhum outro lugar de Cuba.

Varadero -
Varadero é aquilo. Uma coleção de resort cafona, um atrás do outro. Coisa de chorar de rir de tão ridículo! No nosso tinha até show de cabaré todas as noites, daqueles bem decadentes, de inspirar nossos mais profundos instintos de vergonha alheia. A praia é incrível! Uma faixa sem fim de areia branca, um mar calmo e delicioso de água limpa e cristalina. Tudo aquilo que você espera quando junta as palavras “férias” e “Caribe” em uma frase. Mas como eu não sou muito rata de praia (por mais que quisesse, meu bronze vai de rosa à roxo sem escalas), passamos um dia só lagartixando na praia e provando todos os tipos de drinks. Nos outros dias fui buscar tours e passeios para fazer. Fui mergulhar na Baía de Cochinos (a Baía dos Porcos, cenário de episódios da Revolução) em um paredão de corais que dizem chegar à 200m. Não sei. Fui até 30m só. Maravilhoso! Vi peixe escorpião (que era louca para ver) e nenhum tubarão. Agora que não tem mais cubanos em boias no caminho para Miami acho que eles migraram para outros lugares. Queimei minha perna em alguns corais de fogo. Vi uma embarcação de pequeno porte naufragada bem raso. Uns 10m apenas. Visibilidade excelente, alcançando 30-40m, água a 29oC. Perfeito! No outro dia fizemos um safari de 4x4. Pegamos um jeep e dirigimos pelas cidades vizinhas, fizemos snorkling, mergulhamos em um lago de água doce dentro de uma caverna e almoçamos em uma fazenda. Pude satisfazer todo meu instinto Felícia e passei a tarde brincando com galinhas, gatos, cachorros, papagaios, burros, touros, cabras e bodes. A melhor parte de Varadero é poder explorar um pouco do interior de Cuba em passeios. Me deu vontade de voltar um dia, alugar um carro e viajar entre as cidades até chegar a Guantanamo. 

Arte -
Dizem que Hitler era um leitor voraz, mas que não assimilava nada do que lia. Seja para exibir na prateleira ou para auto-afirmar seus frágeis egos, todo regime totalitário acaba investindo em algumas modalidades artísticas para justificar suas atrocidades. A arte de Cuba é do tamanho da falta de liberdade. Se você tiver que ver apenas um museu em toda sua viagem a Cuba, nem pestaneje. Vá direto ao Museu de Belas Artes - Coleção Cubana. In-crí-vel!!! Reserve uma tarde inteira para ele. Você vai se arrepender se ficar sem tempo. Distribuído cronológicamente, a coleção do museu é abundante, rica, prolixa, enlouquecedora. Eu mal conseguia dar conta de tantas influências, tantas novidades, tantas coisas lindas e maravilhosas todas de uma vez. Poderia ficar aqui falando sobre os artistas cubanos por horas, mas dois me tiraram o fôlego. René Portocarrero e Wifredo Lam. Me parecem esses tipos de artistas que nunca se esgotam na gente. Então, depois dessa avalanche de frescor, angústias, vísceras e úteros, a gente descobre outra coisa que é um pecado no comunismo. A falta de uma lojinha de museu que nos abasteça de livros, catálogos, reproduções que possam ficar reverberando em nossas casas as maravilhas. Uma pena. Mas se o museu não está acessível como souvenir, as ruelinhas de Havana Vieja está carregada de pequenos studios e ateliers. Alguns bem turísticos, mas se enfiando entre um e outro, pode-se achar coisas lindas, interessantes, frescas, feitas por artistas que pintam pelo prato de comida, assim como Picasso em Paris. Dá para levar para casa algumas coisas muito boas por 100-300 CUCs. Comprei dois, de duas pintoras. Muito femininos. 
Outro motivo de orgulho cubano (e que eu não ia perder por NADA nesse mundo) é o Ballet Nacional de Cuba. A famosa cia dirigida por Alícia Alonso. Fui. Chorei. Me emocionei. Foi o ponto alto de toda minha viagem. Estavam apresentando um espetáculo em homenagem à Feira do Livro que acontecia na cidade. Uma sequência de peças. "La siesta del Fauno", primeira coreografia de Nijinski, obviamente perturbadora e genial. Algumas coreografias de Alicia inspiradas em obras de Portocarrero e obras de compositores cubanos e o ponto alto (que encerrou o primeiro ato da noite): o pas de deux do terceiro ato de "O Lago dos Cisnes". O desbunde de coreografia com Viengsay Valdés, primeira bailarina do Ballet Nacional de Cuba fazendo Odile e realizando impecavelmente as 32 piruetas... De tirar o fôlego. Se fosse só por essa peça já teria valido tudo. A viagem, o investimento, tudo. Saí de lá com vontade de virar anoréxica e me dedicar somente ao ballet. Uma pena que já é tarde...

Orgulhos Nacionais - 
Pode ser coisa de turista, mas existem algumas coisas que não se pode sair de um país sem fazer. Em Cuba elas são bem óbvias: rum, tabaco, música. Havana Club é o rum oficial de todos os lugares com um pouco mais de estrutura. É usado nos drinks de Hemingway (o mojito da Bodeguita e o daiquiri do Floridita, ambos ótimos!), e em todos os drinks de todos os bares e hotéis. Todavia, basta uma conversa mais profunda com alguém que entende para descobrir que o melhor rum de Cuba é o Santiago. Trouxe uma garrafa 15 anos. Não bebo rum, e quase não tenho bebido, mas se é para ver fotos da viagem e falar sobre Cuba com os amigos, que seja com o melhor rum. O charuto é orgulho nacional. Talvez o souvenir mais comprado pro turistas na ilha. Os únicos lugares confiáveis para comprar são casas de tabaco, lojas de hotéis e na fábrica. O resto nem vale tentar. São caros. Beeeem caros! Doce ilusão pensar que seriam baratos na fonte. Uma caixinha com 10 Cohibas saem facilmente por 200 CUCs. Os preços variam de acordo com a qualidade e o calibre. Eu aprendi a fumar charutos com meu tio há uns 15 anos atrás. Comprei alguns Cohibas e guardei para ocasiões especiais.
A música talvez tenha sido a única decepção da viagem. Eu esperava ver mais música, mais coisas atuais, verdadeiras. É bem difícil encontrar os endereços onde a música está acontecendo agora sem ter algum contato local. Todo mundo jogava a gente para os endereços turísticos onde as pessoas se contentam com um pastiche de Buena Vista Social Club ou com Gangnam Style em ritmo de salsa. Gustavo Lima também é uma unanimidade na noite (embora eu acredite que é só porque os Castros acreditam que a música é um hino revolucionário à Che: “
Tchê tcherere tchê tchê,
Tcherere Che Che Che, que hoje vai rolar”...). Tudo isso regado a mulheres vestidas como prostitutas (bom, eram prostitutas!) e danças muito sexualizadas. Nossa melhor noite foi no La Zorra y El Cuervo. Uma tradicional casa de jazz no Vedado, que fica em um porão apertado por onde se entra através de uma cabine telefônica inglesa. No palco uma pessoal jovem, músicos muito talentosos e jam rolando solta. É uma casa onde Chucho Valdés tocava e onde Roberto Fonseca toca todas às quintas. Lá também vendem CDs e consegui garimpar algumas novidades, e peguei sugestões com o DJ do que ele achava de melhor da nova safra de jazz cubano. É. Nem tudo está perdido. 

Havana -
Havana é a jóia de Cuba, e a gente não precisa de mais do que alguns minutos para entender por que. Linda! Mesmo decadente, deteriorada. Havana é linda. A gente consegue enxergar a cidade maravilhosa embaixo do abandono e falta de cuidados. As grandes avenidas e plazas. O Malecón interminável. Quando o tempo virou e vimos o mar revolto estourando ondas no muro daquelas calçadas, entendi porque todo escritor cubano coloca o Malecón em algum momento do livro. Ele é a passarela de Havana, e eu também o colocaria como protagonista se escrevesse um livro ali. A arquitetura é um deleite. Havana Vieja exibe ruelas e prédios que não deixam esquecer a colonização espanhola, Centro Havana com suas fachadas neo-clássicas caindo aos pedaços e prédinhos art-déco. O Vedado foi de longe meu bairro favorito. Cheio de gente jovem, paladares, lojinhas e casas de jazz. Nosso hotel ficava em Miramar, um pouco afastado do centro (o que significa 15 minutos de ônibus). Miramar é a Vila Nova Conceição de Havana. Lugar de alto padrão, com mansões gigantescas, embaixadas, jardins. Foi nesse bairro que Che foi morar depois da revolução. Ele e todos os altos cargos do partido. Não são bobos nem nada. Os casarões foram todos tomados pelos líderes do regime. Até hoje são. A melhor coisa para se fazer é se perder entre as ruas de Centro Havana e Havana Vieja. Eu passaria mais uma semana ali, tirando fotos, tomando mojitos e daiquiris. Fumando charutos. Entrando nas dezenas de museus por metro quadrado, livrarias, casas de artesanato. Descobrindo as lojas centenárias deixadas intactas. Havana é o que redime Cuba. Parece que há uma cidade cosmopolita, vibrante, rica, adormecida. Esperando ser libertada. Esperando que os tempos negros passem e ela possa se reerguer e tomar seu posto como uma das cidades mais interessantes do mundo. Aos poucos está sendo restaurada. É bom para os cubanos. É bom para a humanidade. Esse tempo vai passar. Os Castros não vão viver para sempre e, quem sabe, ganhamos Havana de volta. Quem sabe.