domingo, 24 de março de 2013

O CAOS, MINHA GATA E O PARADOXO DA DEPENDÊNCIA

Uma das minhas grandes lutas é trabalhar minha mania de controle. Eu sou uma pessoa controladora. Perfeccionista. Cheia de manias. Tenho momentos em que a virginiana bate forte. Gosto de ordem e método. De planejamento, organização, rotina. De saber com antecedência das coisas para poder organizar da maneira como eu acho mais adequada. Gente assim sofre, eu sei. Nunca satisfeita. Acho que por isso de tempos em tempos sinto uma necessidade tão grande de sair da zona de conforto. Ir para o caos, para o inseguro. E depois volto e tenho períodos de mania extrema, onde arrumo o homeoffice, jogo fora sacos de papéis (às vezes alguns importantes) e organizo os livros em ordem alfabética. Na minha casa eu tinha manias que beiravam o TOC. A ordem das almofadas no sofá, o alinhamento dos livros de foto em cima do rack. Até a maneira de dobrar o paninho da pia. A Kika me enchia o saco porque parecia que ninguém morava na minha casa. Fica aquelas salas congeladas, com cara de novela, de revista. Totalmente sem vida. Até que, um ano atrás, eu tive um desses meus momentos impulsivos. Saí para dar uma volta, passei em uma feira de doações e trouxe a Holly para casa. Lindinha, toda bebezinha. Até que ela crescesse o suficiente para subir em todos os móveis e descobrisse como afiar as garras na minha poltrona retrô, a casa ainda refletia meus distúrbios de organização. Não demorou muito para eu entender que quem manda na casa é ela. Enche de pêlos, derruba CDs, quebra enfeites, desaparece com anéis que eu amo. Nunca sei para o que vou acordar, ou voltar para casa. A casa sempre se transforma com ela. De certa forma me ajuda a relaxar. A aceitar um certo caos incontrolável no meu íntimo. Hoje acordei tarde com dor nas costas, porque a gata estava estirada bem no centro da cama, me jogando para escanteio. Levantei e pisei descalça na bombinha de asma que ela tinha transformado em brinquedo no meio da noite. O chão cheio de lenços de papel. No banheiro o tapete estava revirado, dois potes de gel para cabelo no chão e diversos cotonetes jogados dentro da pia. Ela, sem cerimônias, foi pulando os obstáculos e parou em frente ao box miando para eu abrir a porta. Holly agora deu para só beber água no box. Na sala, um furão de pelúcia está em cima do receptor da NET, sacolas que usei para comprar vinhos ontem estão destroçadas pelo chão, marcas de patas em cima da mesa e mais uma mancha no sofá porque ela derrubou suco ontem à noite. Como eu fiquei fora o dia todo ontem e voltei bem tarde de madrugada, Holly achou legal também jogar um tanto de areia para fora da caixa. A poltrona jangadeiro está com fios puxados, existem rolhas nos vãos do sofá e bolinhas de amendoim japonês que ela pegou para brincar embaixo do puff. Holly está em cima da pia, tentando pegar os pingos d’água que caem da torneira. Com a mudança da ordem eu também já deixo louça suja dentro da pia e livros espalhados pela casa. O IPAD carregando no chão, o celular embaixo da mantinha da TV e caixinhas de lenço em cima dos móveis. Me abrir para o caos que outro possa criar me faz ser mais humana. Deflagra minha fragilidade e imperfeição, e é exatamente isso que me faz inteira. Ainda não sinto que tenho muito espaço para viver com outra pessoa. Mas permitir que um ser vivo entre em minha vida e desconstrua meus ideais controladores, me ajuda a ficar mais aberta para o que a vida traz. Amplia minha zona de conforto. Deixa as fronteiras mais largas. Quem sabe assim quando eu tiver que fugir, que buscar o inseguro, eu possa ousar mais. É a maior beleza desse paradoxo. Quanto mais crio vínculos, dependências no meu íntimo, mais livre me torno para ousar. Ganho mais independência. Por enquanto é uma gata que entra e domina minha vida. Ando pensando em fazer agora um jardim, ou uma horta. Quem sabe no final do ano comprar um cachorro. - O Cavallier que sempre sonhei. - Aos poucos vou me deixando depender de outros seres vivos. Se uma gatinha está me deixando tão livre de mim mesma, imagine quando eu for enfim capaz de depender de alguém. Acho que então vou poder conquistar o mundo. 

Um comentário:

Cláudia disse...

Os filhos fazem isso na vida da gente, não importa se humanos ou felinos ou caninos, ou de que espécie sejam: nos mostram que a vida não é bem assim, que nosso planejamento pode ser furado de um instante para o outro. Eles fazem uma bagunça imensa na nossa vida, física e emocional, e a gente não sabe como é que conseguiu viver sem isso por tanto tempo.
Já sobre a Holly, ela precisa de companhia, se fica muito tempo sozinha. Adotei a Cora para fazer companhia pra Cindy, que passou a ficar muito sozinha e aprontava para chamar atenção. Passado o trauma inicial, hoje vejo que quando a Cora não vai encher o saco dela, a Cindy a procura. bjs