terça-feira, 31 de agosto de 2010

HVALA CROÁCIA!

Deixando a Croácia daqui à pouco. Pego um vôo para Zurich, com uma escala longa em algum lugar da Alemanha. Chego só no final do dia. Suíça eu vou atravessar igual o Pateta correndo em cima de brasa. Pulando e gritando “Ai, Ai, Ai”. Só de reservar os hostels já doeu a alma ver os preços. Mas tenho fé que no final tudo dá certo. Quero passar um tempo sozinha, meditar um pouco, e fazer algumas trilhas nas montanhas. A temperatura caiu drasticamente aqui em Zagreb ontem. A gente parecia uns pinguinzinhos embaixo da chuva. Uma pena que não deu para ver a cidade direito, e Zagreb me pareceu uma cidade muito interessante. Tem aquela dureza arquitetônica do antigo regime socialista, mas eles plantam alguns jardins de flores coloridas e dá uma respirada. Muito mais antenada, globalizada e bem menos gafanhotos. Domingo fiquei um tempo conversando com umas garotas de 19 anos daqui. Lindas, como todas as croatas. Super maquiadas como todas as adolescentes. Inteligentes e conscientes como quase nenhum dos que conheço no Brasil. Elas vêm de famílias de classe média e classe média alta. Falam inglês fluentemente, estudam ecologia e comunicação, ou qualquer outro curso que as façam se sentirem parte do tempo atual. Possuem opiniões muito fortes sobre o país, a política e a própria geração. Gastam suas kunas em bebidas baratas e festas alternativas em bairros de Zagreb. E fumam muita maconha. Me contaram que lembram pouco da época da guerra e foram as mais abertas de todos os croatas a falarem sobre isso. Os mais velhos ainda sentem as feridas sangrarem, mas elas falam sem constrangimentos e acreditam que esse é um assunto que deveria ser perdoado e esquecido. Me contaram que recebiam caixas com presentes na época. Cheios de desenhos de outras crianças de outros lugares do mundo que enviavam em solidariedade. E que se lembram de comerem muito pudim. Para manter as aparências, como Zagreb não foi afetada pela guerra, o governo distribuía pudim para as crianças numas de política “pão e circo” infantil. Uma infância cheia de pudim. Hoje elas anseiam pela entrada da Croácia na Comunidade Européia. Vislumbrando as possibilidades de trabalhos e estudos pela Europa. Acham que o impacto da moeda seria um problema só no início, mas que valia a pena uma vez que o país seria cobrado para uma postura mais responsável. Esperam que seja uma forma de freiar a corrupção que lava à rodo o país. Eu queria que o Brasil entrasse na Comunidade Européia se fosse assim. Fico só imaginando qual vai ser o choque agora. Ir direto para o clichê do primeiro mundo. Ao mesmo tempo tenho tantas peças de quebra-cabeça para juntar. O final da viagem vai ser uma descida de montanha russa. Sinto São Paulo cada vez mais perto. Uma parte de mim tem medo de me esquecer para trás.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

TRILHA SONORA DO DIA

Ando amando essa música! Não é fun?
O vídeo me lembra uns experimentos que a gente fazia na Faap... mais fun ainda!

MANTENHAM SEUS PASSAPOTS EM MÃOS!

Saímos de Dubrovnik com o coração na mão. Acho que a Kika nem tanto, mas eu 100%. Foram 8 horas de ônibus até chegar em Zadar. Cruzando um trecho de Bósnia no caminho. A gente parava na fronteira, um policial entrava no ônibus e checava o passaporte de todo mundo. Até que muito tranquilo. Uma senhora no banco ao lado tentava me explicar o que estava acontecendo em croata e dizia “Iuguslávia. Iuguslávia.”. Na cabeça dela o país é o mesmo. Deve ser difícil aceitar tantas mudanças. Um pouco depois da fronteira o ônibus parou em uma vilazinha. Eu entedi “5 minutos”. Tempo de ir ao toilette. Descemos as duas rapidinho, para descobri quando saímos do banheiro que o ônibus já tinha ido. Primeira sensação, frio na barriga de pânico. Perdida em um vilarejo perto da fronteira da Bósnia, sem falar uma palavra (útil) de croata. Depois lembrei que meu passaporte e minha carteira estavam comigo na mochila e relaxei. Na pior das hipóteses ia ficar caro, mas eu ia dar um jeito. Kika já beirava as lágrimas. Eu corri até o bar da estação e fiquei fazendo mímica para me fazer entender. Me levaram até o guichê da companhia de ônibus. Ninguém falando inglês naquele lugar. Foram alguns minutos de mímica para explicar “Bus. Go. Me. Stayed”. Acho que agora falo croata tarzan! Quando o rapaz entendeu, bateu com a mão na testa e saiu falando com outros homens muito rápido e com a voz enérgica. Todos aqueles homens discutindo e balançando a cabeça, e eu explicando para Kika que ia ficar tudo bem. Então apareceu um anjo. Juro que ela era um anjo. Linda como todas as croatas, não tinha mais de 21 anos. E inglês perfeito. Veio falar comigo, eu expliquei a situação. Foi nossa interprete e foi nos explicando o que estava acontecendo. Basicamente eles iam tentar telefonar para o motorista do ônibus para ele parar e alguém ia nos levar até lá. Depois de uns 15 minutos de espera, ela nos disse que já tinham resolvido e o ônibus voltaria para nos pegar. Da mesma forma que ela tinha aparecido do nada, sumiu do nada. Eu falo que viajantes possuem anjos da guarda particulares! Ainda esperamos uns bons 20 minutos sentadas na guia da calçada. Quando o ônibus chegou foi uma bela gargalhada de todo mundo assistindo a cena. Entramos com o motorista muito nervoso falando várias coisas para gente. Eu não entendo nada de croata, mas eu tenho certeza que foi algo como “Suas turistas malucas. São bobas, são? O que vocês estavam pensando? Tá achando que isso é praia? Que é excursão na Disney? Olha só o que fizeram! Agora estamos todos atrasados. Porque tivemos de voltar para pegar as bonitas que estavam se emperequitando no banheiro. Eu tenho mais o que fazer! Precisam ficar atentas, acordar. Acordar.” Acho inclusive que devo ter aprendido alguns palavrões em croata. Entrei quietinha, igual cachorro que fez arte, e sentei no meu assento segurando para não rir. Do lado de fora os homens que nos ajudaram acenavam e gargalhavam. Eles é que estão certos. A gente precisa rir de coisas assim. Pensar que por um segundo eu quase deixei a mochila no ônibus. Aí sim seria burrada animal. Ficar sem passaporte, sem dinheiro.... Tem gente que deixa tudo na bagagem. Na parte debaixo do ônibus. O meu vai comigo onde eu for. Mantenho grudado. Minha prova de quem eu sou. De onde eu vim e de que um dia eu vou. De resto, tem coisas que são engraçadas em qualquer língua...

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

34 anos e 6 meses

Hoje é meu aniversário. E está fazendo exatamente 6 meses que estou viajando. Muito tempo para uns. Pouco tempo para outros. Tudo depende de onde a gente se coloca para analisar. Cheguei em Dubrovnik e a princípio os planos eram seguir para Split. Mas eu resolvi ir devagar, abrir mão de algumas coisas, e ficar em Dubrovnik. Terminar meu inferno astral aqui. Eu gostaria de escrever um post maravilhoso e inspirado, mas o estado de graça que eu consegui alcançar... é simplesmente impossível falar dele aqui, assim, rápido, descartável, instantâneo, diário... como um blog sempre é. Eu demorei 34 anos e 6 meses para chegar aqui, e isso não cabe em um post de blog. Infelizmente. Esse é um capítulo que pertence ao livro somente. Só para registro, passei o dia na paradisíaca ilha de Mljet. Dizem que Homero se inspirou nela para seu Ulysses. É o que dizem, eu mesma não sei. Sei que se houvesse uma ilha para ser exilada, seria aquela. Ulysses deve ter tido dias incríveis. Como o meu hoje. Agora estou em uma pausa rápida para falar com a família e tomar um banho. Fiona, minha nova amiga de vida (uma neozelandesa que está viajando há 2 anos pelo leste europeu e está em Dubrovnik há 3 meses), Kika e Mike (well! Mike é a maior figura que você pode encontrar. Se você não se deixar levar pelo ar irresponsável e a cara de moleque, você descobre que ele tem os meus mesmos 34 anos, já deu a volta no mundo, meditou com o Dalai Lama, se enfiou em roubada, fez de tudo e caiu na Croácia há 10 anos atrás, com Dubrovnik ainda sangrando da guerra e as maiores oportunidade imobiliárias na Old Town. Comprou um prédio, largou por anos, e agora que esse é o lugar para se estar no verão europeu, montou um hostel. Adivinha onde eu vim parar?). Os três vão me levar para jantar e alguma surpresa mais. Não faço idéia para onde vão me levar. Mas nesse ponto, na verdade, realmente não me importa. Minha viagem não está mais sendo pelos lugares, mas por dentro de mim.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

DUBROVNIK 2

Se você tem a minha idade, provavelmente teve de estudar e ler nos jornais sobre a Guerra dos Balcãs para prestar vestibular. A coisa estava fresca quando eu prestei. Um par de países se formando, outros sumindo. Dubrovnik sempre foi uma cidade visada. Invadida um milhão de vezes ao longo da sua história. Foi dominada pelo o império romano (AH! Quem não foi?), foi um dos mais importantes portos da Europa, destruída por um terremoto, reconstruída e murada, foi invadida por Napoleão (novamente, quem não foi?) e dada de presente para a Aústria. Até o começo do século passado era parte do Império Austro-Húngaro. Foi nessa época que desenvolveram o turismo por aqui. Então virou Iuguslávia e, há pouco mais de 15 anos eu estudava sobre o surgimento desse novo país chamado Croácia. Ouvindo histórias de quem também se apaixonou pela cidade (mas resolveu ficar) a guerra foi muito mais terrível do que a gente leu nos jornais (sempre são). E na vida real dessas pessoas se arrastou por mais dois anos além do fim oficial em 1993. Olhando com calma e atenção para as pessoas a gente descobre que eles estão escondendo alguma coisa. Algo que eles não querem falar, não querem lembrar talvez. Coisas que só quem chegou ao ponto de não ter nada a perder e viu o marido e os filhos se jogarem em 300 barquinhos de pescadores e enfrentarem o bloqueeio. Estenderem o peito e gritarem “Somos civis, mas atirem. Podem atirar porque nós vamos passar.”. Existe sempre o dedo de um americano destruíndo a vida das pessoas. Dubrovnik é uma cidade tentando se encontrar. Coincidência eu ter me sentido tão bem aqui? As ruas de mármore da cidade antiga são fascinantes. O contraste com o branco da pedra faz saltar aos olhos o que é importante para mim. O que eu quero. Pode ser o fim do inferno astral, ou só porque o astral está me mandando tudo o que sempre pedi. Não importa. Seja o que seja, tem uma pontinha de arrependimento por eu ter os 10 dias todos planejados na Croácia. Reservas em hotéis e planejamento com a Kika. Só por isso vou sair daqui amanhã para Split. Só por isso talvez eu vá sair daqui. E de toda a saudade que sinto de casa, dos amigos e da família; dói também pensar que são apenas mais dois meses. Não é mais quase nada. Na verdade eu sei que eu nunca vou voltar para casa. Como Dubrovnik. Vou virar diversos países, ser invadida e conquistada; mas o tempo todo nunca deixou de ser Dubrovnik. E continua tentando se encontrar.

domingo, 22 de agosto de 2010

OWWWW!!!

Eu amo a Croácia. Quando eu crescer eu quero ser croata! Juro que se minha prima não fosse casar em outubro e eu não tivesse essa jornada para terminar, eu ficava aqui. Me perdendo por essas ruas, estendendo roupas nos varais entre os prédios, sorrindo para o mar e para a vida, como fazem todos os croatas. Povo lindo e incrível. Gentis, educados, simples. São como os irlandeses, só que sóbrios. Eu e Kika estamos exatamente no mesmo astral. Curtindo a vida e agradencendo um milhão de vezes por tudo. Ontem passamos o dia na Ilha de Lokrun, tomando Sol nas pedras e cosmopolitans na beira de uma lagoa natural (daquelas estilão “A Lagoa Azul”) e conversando com os vários pavões que moram na ilha. Demais! Pavões para todos os lados. Eles ficam passeando do seu lado enquanto você lê um livro, sobem nas árvores. À tarde fomos mergulhar no Mar Adriático. Kika estava com medo, quase desistiu no último minuto. Mas depois ficava me apertando e dizendo “Obrigada Gorda! Obrigada! Amei! Amei!”. Kika chama todo mundo de gorda. Depois fomos experimentar uma das especialidades da culinária croata. Lulas recheadas ao molho de tomate. Vem grelhadinha com rechei de bacon e mais alguma coisa, em um molho de tomate bem suculento e fatias de uma polentinha. Hummm! A cidade está um festa. Última semana da temporada de verão. Os europeus estão todos desfilando os bronzeados. A molecada de 20 e poucos anos paquerando e lotando os bares. A noite vai até tarde, sem hora para acabar. Cheio de gafanhotos no porto de manhã e pela Stradum (o calçadão principal) o dia todo. Mas como existem milhares de ilhas e outros lugares que dá para ir de barco, a gente nem sente o movimento todo e desaparece pelo dia. Aliás, é o que vou fazer agora. Kika já está me cutucando para tomarmos o café da manhã. Vamos fazer as Ilhas Elafiti. Difícil ficar escrevendo aqui quando se está no paraíso...

sábado, 21 de agosto de 2010

COISAS QUE EU AMO NAS MINHAS AMIGAS

...embora algumas vezes eu duvide da sanidade mental delas.
Email que eu recebi de Y hoje.

"Se o Corinthans é o Timão, o Ronaldo é o
Pumba...
Com o anúncio do fim da carreira, a dupla ira acabar no fim do ano.
Triste.
Muito triste.
Achava o Pumba divertido."

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

TUDO NOVO

Noite exaustiva no aeroporto. Embora o sleeping bag tenha sido uma benção (dormi enroladinha e quentinha dentro dele) é ainda bem desconfortável para alguém que nunca cogitou a possibilidade de acampar. Fiquei no setor de embarque onde tinham algumas outras pessoas dormindo nos bancos. Enfiei minha bagagem embaixo e estiquei o sleeping na frente. Do lado ficava a escada rolante com uma gravação ininterrupta e alta dizendo “Please watch the step. If you are carrying a large bag, please consider to take the lift. Thank you!”. Isso sendo repetido um zilhão de vezes por toda a madrugada parecia um mantra nos meus sonhos. Às quatro da manhã a sala estava lotada de gente. Povo passando e empurrando carrinhos e bagagens do meu lado. Levantei, enrolei o sleeping e desci para fazer o check in. Ainda tive de esperar as atendentes da British Airways abrirem para despachar a mochilona. Elas com uma cara de sono tão forte quanto a minha. Fui até o banheiro, lavei o rosto, escovei os dentes. Me sentindo o próprio Tom Hanks. Eu não tinha jantado ontem, então estava me sentindo um pouco fraca. Comi uma versão light do café da manhã escocês. Pão, linguiça, bacon, ovo frito, café e suco de laranja. A versão completa vem ainda com feijão cozido (!!!), tomate e cogumelos assados e haggis. Eu comi haggis em Edinburgh, e vou falar que não é comida para começar o dia. Haggis é comida de gente pobre que, assim como nossa feijoada, acabou virando tradicional e todo mundo come. Antigamente as melhores partes do carneiro ficavam com as pessoas ricas. A classe média se apoderava dos fígados, rins, coração, etc... E quem era pobre, pegava todo o resto (e eu digo TODO o resto mesmo) triturava em uma massaroca, enfiava tudo dentro do estômago do bicho e assavam. O resultado é uma almondega duvidosa que se come com purê de batata e molho de pimenta. É bem saboroso se você não pensar o que pode ter lá dentro. Mas eu também não penso o que tem dentro de uma salsicha quando como cachorro quente. É só torcer para não morder em nada “sólido” demais (vai que é um dente...). Meu vôo saiu às 6h30 e eu capotei de sono antes mesmo de ouvir os avisos de segurança. Sou tão grata por ter comprado uma almofadinha de pescoço inflável há alguns meses atrás. Acordei com o baque do avião pousando em Gatwick, Londres. Uma hora de conexão e peguei um outro vôo para Dubrovnik. Do meu lado uma adolescente de cerca de 18 anos, muito bonita, digitava frenéticamente no blackberry conversando com alguma amiga por IM. “Agora que veio a tona que papai tem um caso a situação toda tá uma merda. Eu não sei se eles vão se divorciar, ou não, mas mamãe fica fingindo que está tudo bem e eu sou a única que está puta com tudo isso...”. Olhei para o lado e nas outras poltronas estavam a irmã mais nova lendo um dos livros descartáveis de Jodi X, o pai adultero com cara de cidadão exemplar em um blazer Zegna (muito bem cortado por sinal), a mãe e um menino de uns 8 anos tocando o terror. A mulher era bonita, muito bem conservada. Devia ter uns 48 anos, magra, elegante, e com olhos de completo terror. Acontece até nas melhores famílias inglesas. Cheguei em Dubrovnik e passei por um segundo de desespero quando imaginei que minha mochilona havia sido extraviada em algum lugar da conexão de Glasgow para Gatwick. Só susto. Foi a última a sair na esteira, mas saiu. Enquanto eu puxava a mochilona para colocar no carrinho pensei que talvez teria sido uma boa idéia extraviar a bagagem. Minhas coisas essenciais estão na minha bagagem de mão (laptop, diários, HD, cartões e documentos). Ando sentindo que minha “bagagem” anda pesada demais. Talvez eu esteja me agarrando a coisas e insistindo em carregar. Talvez seja melhor largar algumas coisas por aqui... Eu fiz uma sessão estabanada de “Dia da Noiva” em Glasgow antes de voltar para o verão. Resolvi eu mesma fazer minhas unhas, depilação, tingir o cabelo (que sempre desbota depois daquela vez que tive de ficar loira e ruiva... quando eu tinha outra vida.). As unhas estão todas machucadas para variar. E tortas. Deixei o creme depilatório tempo demais, então minhas axilas estão doloridas. Arranquei um pedaço do meu lábio superior com a cera fria tentando fazer o buço. Só dói quando eu rio. O cabelo, todavia, ficou milagrosamente perfeito. Mais escuro e no tom exato do natural. Estava saindo para o saguão aqui no aeroporto (o vôo da Kika chega em uma hora e estou esperando ela para irmos juntas para a cidade) e minha imagem apareceu refletida na porta de vidro. Parei por um minuto. Me olhei no reflexo. Sem maquiagem, com o rabo de cavalo. Os ossos dos ombros estão um pouco saltados porque perdi peso. Meu cabelo escuro como há muito tempo eu não via. Estou no controle da minha vida, pensei. Estou no controle da minha vida. Passei pela porta automática e recebi na cara o bafo quente do verão dos balcãs. Não falo a língua (não dá nem para tentar uma versão Tarzan), não entendo o dinheiro. Agora é tudo novo. Meus primeiros minutos na Croácia e eu já aprendi duas palavras. Voda e Pivo. (Água e cerveja, respectivamente!) Agora é tudo novo.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

THE JACOBITE

Semana passada eu tinha entrado no site da West Coast Railways para ver os tickets para o “Jacobite”. Um dos poucos trem à vapor que ainda funcionam e faz o percurso de Fort William até Mallaig. É ele que aparece nos filmes de Harry Potter e esse roteiro é um dos mais famosos e considerado um dos mais bonitos do mundo. Semana passada os tickets tanto para ontem como para hoje já estavam esgotados. Eu fiz todo meu planejamento de transporte e estadia pensando em pegar esse trem hoje. O Jacobite sai às 10h20 de Fort William. Não dá tempo de chegar de Glasgow em tempo no mesmo dia. Então ontem eu peguei um trem de Glasgow e fui até Fort William para tentar conseguir um milagre de última hora. Eu já tinha planejado tudo, e não estava afim de mudar meus planos. O caminho de Glasgow até Fort William já é um desbunde. Trem comum, mas as paisagens maravilhosas conforme vamos entrando nas Highlands (again!). Cheguei em Fort William e fiquei no mesmo hotel que a gente tinha ficado na sexta-feira. A cidade estava diferente, toda movimentada. Tinha uma farmes´market acontecendo, várias barracas pelo calçadão. Eu dei uma volta, fiquei escrevendo um pouco, lendo. Fui dormir cedo para não perder a hora de manhã cedo. Me informaram que eu precisava falar com os funcionários da West Coast Railways antes do tem partir para ver se conseguia um ticket de última hora. Então lá fui eu com minha mega mochila (que agora está maior ainda porque eu comprei um saco de dormir) ver se eu conseguia entrar no trem. Logo na plataforma tinha uma placa enorme dizendo que estava esgotado. Mas como eu sou brasileira e não desisto nunca, fui falar com a funcionária que organizava as dezenas de crianaças correndo de um lado para o outro e se pendurando nas janelas. Ela me disse que talvez eu pudesse ir de pé, mas que não aceitavam cartão de crédito. Hum! Já que estou aqui, pensei. Vou de pé mesmo. Não tinha nenhum outro plano para hoje e amanhã às 6h30 parto para a Croácia. Quais as minhas opções? Voltar para Glasgow e ficar vagando com minha mochila até dar a hora de ir para o aeroporto? Então resolvi colocar a mochilona em um locker na estação, atravessei a rua, retirei dinheiro e voltei para pegar o trem que ia partir em poucos minutos. Mas, como eu sou uma pessoa de sorte e a vida sempre se encarrega de providenciar tudo o que eu quero, quando eu voltei para comprar o ticket inteiro para viajar de pé, a mulher me diz que houve uma desistência de última hora. Na Primeira Classe!!! O legal é que o vagão da primeira classe é o único conservado original por dentro. Os outros são como um trem comum, só a parte de fora é antiga. Então eu sentei no meu sofazinho super confortável, serviram café da manhã (outra vez, ebaaa!!!). A viagem é um desbunde. E passar por cima do viaduto do Glennfinan foi mais divertido do que eu pensei. Descobri inclusive que esse viaduto (o tal do filme do Harry Potter) foi o primeiro viaduto de concreto construído no mundo. (Viu só!) Na parte de baixo a gente vê um monte de turistas tirando fotos, parados no mesmo lugar em que eu e Y fizemos as fotos com a plaquinha para a MH. Depois de passar o viaduto o trem faz uma parada de 20 minutos na estação de Glennfinan, que é toda charmosinha e tem um vagão restaurante. Foi nessa parada que eu descobri que minha sorte era maior ainda do que eu pensava. Assim que as portas se abriram a plataforma foi inundada por uma legião de crianças correndo, gritando e estapeando os pais. Não só eu dei sorte de ficar na primeira classe, como eu também me livrei de todos os Gremmlins pelo dia todo. Do meu lado, no vagão, viajaram um casal na terceira idade de irlandeses. (Aliás, toda a Primeira Classe era da Terceira Idade. Verdadeiro Coccoon rolando lá!) Super simpáticos e engraçados. Viajam o tempo todo, conheceram já quase o mundo inteiro. Na minha frente foi um homem super charmoso. Piloto da Eurostar, 42 anos. Ele é apaixonado por trems e faz a rota do Jacobite todos os anos. Ele foi me dando as dicas de onde tirar as fotos legais, me contou sobre o funcionamento de um trem à vapor e me levou para almoçar em um restaurante com uma vista linda para as ilhas na nossa parada em Mallaig. Depois na volta, quando chegamos à Fort William, ele ficou comigo esperando meu trem para Glasgow, tomando um pint em um pub perto da estação. Verdade que é um programa meio para crianças, mas não dá para negar que foi um dia quase perfeito. E vou dizer que o “quase” fica só porque agora estou no aeroporto de Glasgow fazendo hora para o meu check in que vai ser daqui algumas horas. Dormir em aeroportos não é mais novidade por aqui. Pelo menos dessa vez eu tenho um saco de dormir.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

GLASGOW

Ai que dó de Glasgow! É o patinho feio, sabe? Ninguém dá muita bola para ele não. Fica todo mundo fascinado com Edinburgh, lavando a alma nas Highlands, e Glasgow acaba ficando por fora da competição. É triste dizer, mas é uma cidade desprovida de charme. Entendi porque 10 em cada 10 viajantes que cruzei me aconselharam a pular Glasgow. Mas não me entendam mal. Não me arrependo nem um minuto de ter vindo para cá. Não tem charme, mas não quer dizer que não seja interessante. Afinal, é como homem. Nem todo homem é bonito, charmoso e interessante. A gente precisa ser generoso na vida. E eu quero, antes de tudo, me tornar uma pessoa melhor. Então eu me joguei nas ruas hoje com o coração aberto para aceitar. Foi assim que a cidade ficou interessante. Glasgow tem um quê de cosmopolita. Não tem nada da Escócia que estava estampada na cara de todas as outras cidades pelas quais passei. Muitas lojas. Muitas marcas. Restaurantes, empresas. Homens ruivos e charmosos andando engravatados pelas ruas. Adolescentes de moicano pink, ou revivendo Robert Smith com maquiagem gótica. Milhões de carrinhos de bebê de gêmeos. O que me leva a pensar que Glasgow deva ser a capital escocesa da inseminação artificial. Existe uma atmosfera mesmo no ar de que as pessoas passaram muito tempo cuidando da carreira. Era aqui que eu iria morar se eu fosse escocesa e yuppie. Muita gente de tudo quanto é lugar também. E nada de gafanhotos pela rua. Uma benção! Claro que vários turistas devem estar tirando fotos por aí, mas a cidade é maior do que o espetáculo. Camufla os gafanhotos. O centro é cortado por dois calçadões para pedestres que fazem uma cruz. Me lembrou a Rua Direita no centro de São Paulo em dia de pagamento. Uma babel de gente. Brancos, negros, asiáticos. Em uma esquina alguém tocava uma gaita de fole, só para me lembrar que eu continuava no mesmo país. Mas em seguida uma senhora do Leste-Europeu arranhava um violino mais para cima. Até os escoceses acabam camuflados por aqui. Andando pelos bairros descobre-se comunidades indianas, paquistanesas, chinesas. Tudo o que uma cidade grande tem, mas com anonimato. No almoço encontrei Francesca, que conheci em Roma estudando italiano. Uma querida, mas ainda me choca um pouco interagir com alguém tão novo. Francesca tem apenas 17 anos e eu sinto que nunca sei onde colocar as mãos quando converso com ela. A gente foi passear pelo Jardim Botânico, que é lindo e pacífico e seria meu lugar de contemplação favorito se eu fosse ficar mais por aqui. E eu me desmanchei toda por um lindo Cavalier que estava com a dona, uma senhora simpática com um delicioso sotaque. Ele pulou no meu colo, me lambeu, deitou de barriga para cima e se esparramou nos meus carinhos. Eu me esparramei por ele também. À noite sentei no computador e só cuidei de trabalho. Estou querendo deixar o mínimo de pendência possível para ir para a Croácia na sexta sossegada. Sexta de madrugada embarco para a Dubrovnik. Encontro com a Kika no aeroporto. Estou louca para me jogar no Sol, na cidade, no mar. Reta final de inferno astral. Estou com pena de deixar Glasgow amanhã. Vou subir para Fort William denovo. Tentar conseguir uma passagem para o trem à vapor da West Coast Railway. O trem do Harry Potter. Nem tanto pelo personagem ou pelo filme. Mais porque acho divertidíssimo roteiros de trem. E esse é um dos mais famosos do mundo. Se eu fosse ficar mais por aqui, talvez eu fosse explorar o cenário musical alternativo que rola nessa cidade. Glasgow não tem charme, mas tem uma vida musical fervilhante. Cheia de bares com música ao vivo. Afinal, daqui saíram Belle and Sebastian, Primal Scream, Simple Minds, Franz Ferdinand, The Marmalade e Mark Knopfler, guitarrista do Dire Straits, entre tantos outros. Quem chega procurando tirar foto com o Mickey, pode mesmo achar Glasgow desinteressante. Eu, como fui patinho feio tantas vezes, gosto de acreditar que dá sempre para virar cisne.

GLASGOW BY ABBA

Cheguei em Glasgow ontem à noite. Chovendo. Acabou a boa vida das Highlands!
Mas meu hostel é ótimo e eu acho que eu vou gostar da cidade (apesar de umas duzentas pessoas terem me dito que Glasgow não valia a pena).
Sempre que penso em Glasgow me vem essa música na cabeça. Vim no caminho inteiro do trem cantarolando... Eu gosto de ABBA. Pronto, falei!
Então, cantando junto:
"I was sick and tired of everything,
When I called you last night from glasgow
All I do is eat and sleep and sing..."

KEEP WALKING

Outro dia eu falei aqui do comercial da Johnny Walker com o Robert Carlyle. Esse eu conheci também por meio da Eva. Só para manter o clima scottish que está rolando. O filme é bem mais longo do que um comercial comum, mas um show de ator.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

HIGHLANDER

Depois de Skye nós pegamos o dia mais azul nas Highlands em seis anos. Passamos pelo Eilean Donan Castle. O mais incrível de todos. Fica em uma pequena ilhota no meio do lago com uma pontezinha de arcos ligando até ele. Como o dia estava azul, lindo e incrível, as águas do lago funcionavam como um espelho gigante duplicando a imagem do castelo, da ponte e das montanhas. Era como andar no meio de um cartão postal. A gente tirou milhões de fotos pulando em frente ao castelo. Fazendo uma sessão “Maxwell Jump”. De lá passamos pelo lendário Loch Ness. Pausa aqui. Eu não entendia direito a história do tal do monstro. Loch Ness é o maior lago da Escócia. Tem mais de 23Km de comprimento. É tão profundo que os pesquisadores não conseguiram até hoje medir com precisão. Existem alguns satélites tentando definir essas medidas. Há 500 anos alguns moradores da região reportaram terem visto um monstro, parecido com um dinossauro, nadando pelo lago. Desde então mais de 100 pessoas juraram que viram o bichão pelas águas. Até hoje parece que ele faz aparições esporádicas. Fazendo a média, uma aparição a cada cinco anos. Nenhuma quando eu estive lá. Eu coloquei a mão na água, chamei o bichinho. Até joguei pedrinhas para ver se ele acordava, mas nada. A água aliás é bem gelada, não muda de temperatura durante o ano inteiro. O volume é tão grande que ela permanece a mesma no verão e no inverno. Conheci alguns malucos que deram um mergulho. Águas escuras e sinistras. Dizem que é algo obrigatório, dar um mergulho com o monstro de Loch Ness. Isso é o que dizem, eu mesma nem tentei. De lá fomos para Inverness, a única cidade das Highlands (para ser considerada “city” é preciso ter uma catedral. Todo o resto é considerado “town”.) e a menor cidade da Escócia. Bem simpática Inverness, uma pena termos ficado só por essa noite. Parece que tem bastante coisas para se fazer nas redondezas e está cheio de gente que se perdeu e acabou ficando por ali. Uma boa estrutura de comércio, restaurantes. Todavia não tirei nem uma foto. Sei lá. Não deu vontade. Depois do almoço fomos até Fort George. Estava terminando algum festival ou comemoração. Um monte de barraquinhas montadas no gramado reproduzindo campanhas de guerra. Gente fantasiada para todos os lados e crianças fantasiadas de soldados e guerreiros. O Forte é grande, bonito. Com uma vista linda para outra parte de Loch Ness, mas a gente esquece que é um lago e parece mais um mar. Gaivotas voando e descansando nas muralhas. Fizemos mais uma sessão de “Maxwell Jump”, com um céu tão azul que era uma ignorância. Dia lindo. Quente. E eu sentei em cima da muralha, em uma parte gramada, e fiquei um tempo contemplando o horizonte que dava a volta em mim e me abraçava. À noite, depois de voltarmos de um “nutritivo” jantar no MacDonalds (apesar do nome, não era culinária típica escocesa) Y e o irmão dela foram para o B&B e eu fui para o meu hostel. Um hostel bem legal. Cheio de gente louca, mas tranquilo. Com uma atmosfera de casa e conforto. Eu fiquei até tarde conversando com as pessoas no lounge. Gente bêbada passava na porta o tempo todo. Ficavam batendo na janela. O recepcionista do hostel, um australiano de 27 anos que tinha cara de 17, me disse que todos os dias era assim. Que toda as Highlands eram assim. A noite dos mortos-vivos. As pessoas saem para os pubs, enchem a cara e se jogam nas ruas pelas madrugadas procurando desesperadamente alguma interação humana. A grande maioria é inofensiva. Zumbis bonzinhos. Parecem cachorrinhos arranhando a porta e querendo entrar. Querem conversar, falar. Querem companhia. Em um dos lugares mais lindos do mundo as pessoas estão anestesiadas pelo alcóol, carentes de amor. Chocante? Não. Nem um pouco. Chocante mesmo é o quanto as pessoas se assustam e saem correndo quando ouvem “Eu te amo”. Pensando assim deve mesmo ser uma maldição ser um “Highlander”. Quem quer viver para sempre? Para que viver para sempre se for assim?

domingo, 15 de agosto de 2010

SKYE


Nós somos as pessoas mais sortudas do mundo. Desde quinta-feira estamos sendo presenteados por dias lindo, céus azuis, Sol brilhante e nem uma gotinha de chuva. Ainda é frio, principalmente para nossos padrões de verão, mas os dias estão muito agradáveis. Perfeito para ficarmos ao ar livre sem nos cansarmos. Às vezes dá até para abandonar o montão de casacos e arriscar umas voltas usando manga curta ou blusinhas leves. Ontem chegamos em Skye. A ilha mais famosa da Escócia. Foi uma viagenzinha curta da Fort William para Mallaig. O mesmo caminho que o trem à vapor usado nos filmes de Harry Potter passa. Eu vou voltar a Fort William semana que vem para tentar pegar esse trem. Cruza o Glenfinnan, aquela ponte em arcos que também aparece no filme. Divertidíssimo. Tiramos milhões de fotos. E ainda escrevemos “MH” em um papel e tiramos fotos com ela. Para MH se sentir parte da viagem. Ela está em outro momento de vida, cozinha um bebê fofo (que por sorte eu vou estar de volta ao Brasil para o nascimento), então a gente deu um jeito de colocar o terceiro vértice do trio na foto. Também porque ela é fã de Harry Potter e na verdade acho que essa era uma viagem que ela deveria estar fazendo. De Mallaig pegamos um ferry para Isle of Skye. Então é como entrar em um mundo paralelo. Vários vilarejos, muitos turistas para todos os lado. A sensação de sermos os únicos brasileiros em toda ilha. Skye é um local muito popular de esportes de aventura. Rafting, hiking, escaladas. Muita gente fazendo cayaking nessas águas que parecem cristal. Ficamos no vilarejo de Portree. É a maior cidade de Skye (o que não quer dizer muita coisa). Todos os hotéis e as centenas de Bed & Breakfast lotados. Não havia uma única vaga na cidade. Y e o irmão dela ficaram em um B&B e eu em outro que já estava reservado. O legal de ficar em B&B é sentir como as pessoas realmente vivem. B&B são casas de pessoas adaptam alguns quartos para receber hóspedes. Mary, uma senhorinha de uns 85 anos era minha host. A casa era tudo o que se imagina de uma casa de vó. Fofa, cheia de babado e bibelôs. Com uma varanda fechada, cadeiras de madeira com almofadas floridas e um cocker babão fazendo festa para você. Uma senhora adorável que não tirava o sorriso do rosto e estava encantada porque eu era a primeira brasileira que ela conhecia. Perguntou o que eu queria para o café da manhã e só faltou tricotar um cachecol para mim. Depois fomos explorar um pouco da ilha. Bem pouco mesmo porque a ilha é grande e o ideal seria passar uma semana aqui fazendo trilhas, se perdendo pelas florestas de pinheiros. Assistindo o Sol se pôr às 20h30. Em junho dizem que o Sol se põe às 22h30 aqui e nasce às 4h. Nem chega a ficar totalmente escuro durante a noite. A gente foi fazer a trilha para o Old Man Stone. Nada demais, nivel de dificuldade zero. Trilha marcadinha, degraus de pedra para subir a montanha. Y ficou na base, nem arriscou tentar subir. No quesito aventura somos extremos opostos. Subimos o irmão dela e eu, para ficarmos sentados em uma pedra babando na vista inacreditável lá de cima. Eu me sentia o Frodo em “O Senhor dos Anéis” (não precisa falar, eu sei que “O Senhor dos Anéis” é Nova Zelândia, mas é bonito igual.) Depois voltamos para pegar a preguiçosa da Y na base e voltar para o carro. Ainda dirigimos para ver um penhasco e uma cachoeira. A essa hora o ar já estava tomado pelos mosquitinhos. Acho que umas 30 pessoas me aconselharam a trazer repelente para Skye, mas eu sou teimosa e só me arrependi depois que a gente engoliu umas dezenas desses mosquitinhos insuportáveis que insistem em entrar por todos os orifícios do seu rosto. A gente poderia dedetizar a ilha, verdade. Mas daí não teria graça. Como dizia o poetinha, não basta ser só bela. É preciso ter algo de ri, algo que chora. Mais ou menos isso. Skye faz jus ao nome. Um pouco como o paraíso. Um pouco com um mundo mágico em outra dimensão. A gente dirigia pela estrada e reinava uma paz. Nada de ruim pode te acontecer ali. Uma aldeia habitada por pessoas adoráveis, emanando amor por todos os lados. Um lugar que mais parece terreno de fábula. Parece que aqui o mundo conta uma história diferente, os relógios ticam em outro tempo. E se você pegar um barquinho, for navegando, desviando das montanhas do Cuillen. Se você mirar bem no meio e seguir sem falar nada, assim que chegar no horizonte, você alcança o céu.

sábado, 14 de agosto de 2010

APAIXONADA

Estou apaixonada pela Escócia. Isso sim foi uma coisa surpreendente. Escócia nem fazia muito parte dos meus planos iniciais. Acabei vindo porque precisava dar um tempo fora da Comunidade Européia então, olhando no mapa... Hum! Tem a Escócia ali em cima. Se é para conhecer a Escócia, que seja no verão pelo menos. Hum! E tem o festival em Edinburgh. Hum! Então tá. Vim para a Escócia. Na verdade pensava em passar só um par de dias e ir para outro lugar. A gente nunca ouve falar muito de Escócia (e é praticamente um alívio de turistas brazileiros por aqui). Acho que é mais legal quando a gente se apaixona do nada. Sem esperar. Sem nenhuma expectativa. As Highlands Escocesas são supreendentemente verdes. Verdes, vivas e vibrantes. Eu achei que ia me deparar com uma paisagem muito mais próxima daquele comercial da Johnny Walker com o Robert Carlyle. Alguma vantagem deve ter tanta chuva. Temos dirigido de cidade em cidade. As paisagens são breathless! Montanhas surreais que se desdobram umas atrás das outras. Lagos e mais lagos de águas cristalinas. Rochas que parecem estar aqui há milênios. Uma imensidão de paz e silêncio. Começo a entender um pouco do povo escocês. Uma nação que não é nação. Que ganhou um parlamento há pouco mais de 15 anos. Que é um país, mas vive sob o poder da Rainha de um outro país. Que tem o mesmo dinheiro, mas imprime suas próprias cédulas. Quando cheguei em Edinburgh no começo da semana achei que isso tudo era submissão. Achei que os escoceses tinham um quê de covardia. Mas água e óleo não se misturam, e o que faz de um povo, povo, é muito mais do que as leis escritas e assinadas por alguns homens em salas cheias de pompa e pedaços de papel. É o país que eles respiram. A língua que falam. (Tem o gaélico, mas mesmo o inglês é praticamente incompreensível com o sotaque deles). Andando por esse país, pela imensidão e grandiosidade desse país, a gente começa a acreditar em Deus. Em uma força mais absoluta do que todos nós. Na imensurável fragilidade humana. A vida é só uma paisagem. De tirar o fôlego. Eu tenho experimentado momentos de grande euforia. De uma felicidade que quase não cabe no peito. Seguidos de alguns momentos de instrospecção. De olhar para mim e para onde eu estou. Grata, imensamente grata por estar na segurança da companhia da minha amiga. É longe. Mas é lar. Meu lar vai comigo onde vou. Eu sinto o vento gelado emaranhando meus cabelos. O cheiro fresco de vida. A grande imensidão deste mundo, tão antigo e tão aparentemente intocado. Então eu suspiro baixinho “Obrigada! Obrigada!”. Esperando que essa força maior (O astral? Deus?) me ouça e entenda. Estou tão apaixonada pelo mundo.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Só porque eu estava perguntando sobre as pessoas de 30, uma pessoa de 30 muito especial veio me pegar na porta do meu hostel em Edinburgh para a gente fazer as Scottish Highlands juntas. Y está na Escócia e, além de uma das minhas melhores amigas, ela está salvando a pátria agora. Tudo o que eu precisava era mesmo gente que me conhecesse há mais de algumas horas para conversar. Y é trabalhadora de verdade (cá entre nós, NUNCA faria o tipo de viagem que estou fazendo), mas tirou férias esse mês e vai passar 20 dias em UK. Andou por Oxford, Bath, Stratford. Ontem estava parecendo um zumbi porque tinha dormido só uma hora. Veio de Mount St. Michel na França na Quarta-feira à noite e embarcou para Edinburgh ontem de manhãzinha. Ela está com o irmão dela de 25 anos, que acabou de se formar em medicina e os dois dirigindo pelo lado esquerdo da pista é uma coisa que eu tenho procurado nem pensar muito à respeito. Ainda bem que temos um médico no carro. De presente fez um dia lindo. O primeiro desde que estou na Escócia. Frio, verdade. Mas lindo. Sol o dia todo, céu limpo. Verdade que apareceram algumas nuvens no final da tarde, mas foi só ameaça. Dia de presente para a gente começar nosso tour. De Edinburgh fomos para Stirling, ver o castelo. Foi decepcionante. Nada do que a gente imaginava, embora a visão dele à distância em cima da montanha seja mesmo algo impressionante. Vimos o Wallace Monument, construído para o grande herói nacional Willlian Wallace (vulgo Mel Gibson em Braveheart). E depois ainda dirigimos em volta de Loch Lohrmon, e eu consegui ver as vaquinhas cabeludas que eu tanto queria (é um tipo de gado típico das Highlands que chama exatamente “Highlands Cow”, porque o povo é muito criativo para dar nome aos bois). As paisagens escocesas são deslumbrantes. Ainda temos muito chão para dirigir, cidadezinas para visitar e fotos para tirar, mas se a coisa continuar como tem estado, esse vai ser um dos trechos mais bonitos da jornada (embora eu ainda ache que alguém podia ligar o aquecedor!!!). Agora estou em Oban, terminando de empacotar para jogar tudo no porta malas do carro. Hoje vamos fazer algumas ilhas aqui em volta, ver mais castelos e mais lagos. Oban é uma mini-cidade. Li em algum lugar que tem 500 habitatante. Imagina a conexão de internet... Tenho 20 minutos apenas. Em tempo de um post rápido. Afinal, não sei quando vou conseguir postar denovo.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

WHERE ARE ALL THE 30´s PEOPLE GO?

Edinburgh é mesmo uma cidade fascinante. Eu ligaria um pouco o aquecedor, mas é uma cidade fascinante. Cheia de lendas, histórias, becos que parecem te transportar para uma dimensão paralela. É como se a cidade fosse uma cebola, e você vai descobrindo as várias camadas dela. É um personagem coadjuvante interpretado por um ator fenomenal. A gente não consegue tirar os olhos dele, mas a peça é sobre outra coisa. De qualquer forma, fui fazer o super recomendado Edinburgh Literary Pub Tour. Não conheço muito da literatura escocesa além dos clássicos óbvios (O Médico e o Monstro, Rob Roy, etc), e de Harry Potter (só que J. K. Howling é inglesa, não escocesa.). Então foi legal fazer um tour passando pelos bares icônicos e pelos lugares onde grandes poetas e escritores viviam. Dois atores vão levando o grupo de bar em bar e, enquanto você toma um pint de alguma cerveja escocesa, vão contando as biografias e declamando poemas e trechos desses autores. O tour parece até uma peça interativa. Cada ator representa um personagem, eles seguem um roteirinho e vão alternando entre narração e personagem. Fiquei louca para ler tudo de Walter Scott, Robert Burns e Muriel Spark. Os guias ainda te dão dicas das melhores livrarias de Edinburgh e inside tips para aproveitar melhor. Agora, adivinha só. Era um pub tour, né? Quantas pessoas de 20 e poucos estavam nesse tour? Exato. Nenhuma! Depois fiquei conversando com umas alemãs super descoladas. Me encheram de dicas sobre a Alemanha, roteiros para fazer, o que evitar. Falamos sobre “Adeus Lenin” e “A Vida dos Outros”, e sobre a queda do muro. Todas na faixa dos 50. Voltando para o hostel eu comecei a prestar atenção nas pessoas que andavam na rua. Nos turistas. Uma horda de pós-adolescentes produzidos para a balada. Grupos de 20 e poucos na porta dos pubs. Todos sempre em bando. É o comportamento da matilha. E saindo dos restaurantes alguns casais de meia idade. Grupos de terceira idade também estão para todos os lados. Pequenos grupos de amigas na faixa dos 40. Algumas famílias... Comecei a refazer meus passos durante o dia. As salas do Castelo de Edinburgh. A Royal Mille. O Elephant Cafe. Então caiu a ficha! Eu estava sozinha. Em todo o trajeto do Grassmarket, pelo tour literário, pelos pubs, e por toda a multidão desviando de performances na Royal Mille. Eu era a única pessoa de 30 e poucos viajando sozinha. Me lembro de dois casais no Elephant Cafe com um bebê e uma criança de 2 anos insuportável. Um casal na minha frente na fila para ver as jóias da corôa no Castelo de Edinburgh com um bebê lindinho pendurado nas costas, dormindo como um anjinho. Lembro de um casal australiano de “quase 30” (ela tinha 26, ele 28) indo à pé para Arthur Seat, e da australiana de 28 que viu o show de stand up comigo. (mas acho que esses não contam, porque não têm 30 e poucos) E me lembro ... Não! Não lembro de mais nada. É isso. Tinha eu. E tinha um monte de gente ou mais nova, ou mais velha. Eu estava sozinha. Onde é que foram parar todas as pessoas de 30 e pouco do mundo? Será que está todo mundo tendo filho e aparando a grama do jardim no final de semana? Será que é isso? Tão triste! Será que as pessoas só criam coragem para viajar depois dos 40? Ou deixam para se jogar na vida na terceira idade? Porque a gente faz isso? A molecada de 20 anos só quer festa. Eles bebem a noite inteira, beijam todo mundo, não sabem nada da história e da cultura do lugar. Voltam para o hostel no meio da madrugada e dormem até meio dia. As mais velhas seguem tours agendados, nunca se arricam. Pagam guias, comem em restaurantes caros. São cheias de horários e rotinas, e acabam perdendo um pouco da vida autêntica de rua dos lugares. E se você está bem no meio, é obrigada a se enfiar em um inútil pub crawl no estilo “American Pie” ou discutir Hume em uma mesa de bar onde a sua chegada vai DIMINUIR a média de idade em uns 10 anos. O que aconteceu com as pessoas de 30 e pouco? Não é possível que estavam todas fazendo o roteiro “Edinburgh para crianças”. Eu cheguei no meu hostel (que já falei, parece uma república) e Cindy Lauper cantava “Girls Just Wanna Have Fun” a plenos pulmões. Uma menina loira passou correndo na minha frente com enormes óculos escuros de aro branco e um lenço de oncinha amarrado na cabeça. Na escada para o quarto tinha um casal quase chegando às vias de fato. As coisas não mudaram nada desde o tempo em que eu dançava essa mesma música da Cindy Lauper. Já tive 20 anos uma vez. Não quero ter denovo. Também não quero viver a meia idade por antecedência. Eu tenho 33 anos de idade. Eu quero viver meus 33 anos de idade. Não quero viver a vida de filhos, nem de uma comunidade de casais. Não agora. Eu quero viver minha vida de 33, não um personagem. Um papel que foi estipulado para mim. Quando eu penso nisso eu vejo que o mundo não reservou muito espaço para pessoas assim. Nunca senti tão forte a inadequação quanto depois que passei da marca dos 30. Estou vivendo. Estou vendo meus amigos perdidos. Ninguém sabendo direito o que fazer, para onde ir. Todo mundo se descobrindo insatisfeito. Todo mundo tentando se agarrar a alguma certeza. Eu mesma só estou aqui porque resolvi sair em busca de alguma coisa. Onde estão as pessoas da minha geração? Quando foi que a gente deixou isso acontecer?

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

VIVENDO COMO MAGGIE DICKSON

Vou contar uma história que ouvi ontem. História de uma escocesa chamada Maggie Dickson. Ela era casada com um cara que não dava nenhum valor para ela. Ele era um pescador, foi o que era considerado um bom casamento para a época, e Maggie gostava de verdade do cara. Mas um dia esse cara sumiu. Desapareceu. Escafedeu-se. Largando Maggie desesperada e sem nada. A garota então mudou de cidade e começou a trabalhar em uma estalagem. Acontece que o dono dessa estalagem tinha um filho, e os dois se apaixonaram perdidamente. Amor à primeira vista. Um amor tão forte e tão intenso, que ignoraram todas as circusntâncias e depois de um tempo aconteceu o inevitável. Maggie ficou grávida. Como a situação seria um escândalo, já que ela ainda era casada, Maggie resolveu esconder a gravidez. Disfarçava com roupas, vestidos mais largos. Tanto que ninguém, nem mesmo o dono da estalagem descobriu. Maggie teve um parto prematuro e seu filho nasceu morto. Arrasada, Maggie pega o corpinho de seu filho e enterra na margem de um rio. Alguns dias depois descobrem o corpo e acabam chegando até Maggie. Ela estava encrencada. Não porque teve um filho de outro homem quando ainda era casada. Nem por ter sido acusada de matar o próprio filho. Nem mesmo por ter enterrado a criança na margem do rio. Maggie foi acusada de esconder a gravidez. Naquela época uma mulher que escondesse sua gravidez da sociedade era acusada de crime grave e condenada à forca. Foi exatamente isso que aconteceu com Maggie. Ela foi trazida para Edinburgh e enforcada em 1728 no Grassmarket. Lugar onde ficava o cadafalso e onde eram feitas todas as execuções da Escócia na época. Depois dos sete minutos habituais o corpo de Maggie foi retirado da forca, ela foi declarada oficialmente morta e colocada em um caixão para ser levada de volta a sua cidade e ser enterrada. Só que, no caminho de volta, Maggie acorda e começa a bater no caixão. Os cocheiros ficam assustados, abrem o caixão e se deparam com Maggie vivinha da silva! A única coisa que poderiam fazer era trazer Maggie de volta à Edinburgh para ser enforcada novamente (e dessa vez de maneira eficiente). Então Maggie é levada de novo para o Grassmarket, é colocada no cadafalso e quando está prestes a ser enforcada pela segunda vez no mesmo dia, alguém na multidão intervém. “Ei! Espere um pouco! Margareth Dickson foi executada e declarada morta de acordo com as leis escocesas, pelo crime de ter escondido sua gravidez.” Correto. “Só que, de acordo com essas mesmas leis, uma pessoa não pode ser condenada e executada duas vezes pelo mesmo crime.” Hummmm... Correto. Isso se chama Double Jeopardy. Então as autoridades foram obrigadas a libertar Maggie e deixá-la ir. E como ela havia sido considerada morta e as leis matrimoniais exigiam fidelidade “até que a morte os separe”, Maggie Dickson conseguiu cancelar seu casamento, se casou com o filho do dono da estalagem e eles foram felizes para sempre. Eles mudaram para Edinburgh, compraram um apartamento no Grassmarket, bem de frente ao cadafalso. Todas as vezes que ia haver alguma execução, Maggie sentava na janela para assistir. E quando o condenado tinha a corda envolta ao pescoço, ela se debruçava e gritava: “Não é tão ruim quanto parece. Eu passei por isso e SOBREVIVI!”.
Eu sou louca por histórias de mulheres. Por história de mulheres fortes. De mulheres ousadas. Principalmente de mulheres inteiras. Às vezes a melhor solução é entregar para o astral. A gente está envolvido demais para achar as melhores soluções para nós mesmos. Não importa que a gente esteja literalmente com “a corda no pescoço”. O universo sempre vai achar uma maneira simples, óbvia, fantástica para nos garantir um final feliz.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

EDINBURGH CRAZY

Edinburgh ferve. Cheguei aqui ontem e a cidade pulsa de um jeito, que não dá para explicar. Durante todo o mês de agosto acontece o Edinburgh Fringe. O maior Festival de artes performáticas do mundo. São mais de 25 mil artistas apresentando peças, stand-up, dança, música e performances de rua. Uma loucura. Você vai andando pela rua e tropeçando em tudo quando é tipo de gente. Os atores passam o dia entregando flyers de seus espetáculos, tentando chamar a atenção do público para, de alguma forma, se destacarem na imensidão de ofertas da programação. Cartazes com atores fazendo poses e caretas espalhados por TODA a cidade. São tantas coisas, tantas coisas, que não dá vontade de ver nada. Depois de uma hora eu tinha a impressão de que era tudo igual. Tudo um pouco mais do mesmo. Eu fui fazer um walking tour e tirar minhas primeiras impressões da cidade. O clima está doidinho. Amanheceu com Sol, mas antes de eu terminar o café da manhã ficou nublado. Depois choveu. Abriu Sol de novo. Choveu. Nublou. E terminamos a tarde com um Sol gostoso e um dia claro. Entendam que Sol gostoso aqui significa aqueles dias de inverno com Sol gelado que a gente tem em São Paulo. O povo andando de regata na rua e eu pensando em comprar luvas. Compras aliás, tem sido uma tortura. Não apenas porque não tenho como carregar, mas também porque as coisas são caras. Tudo bem, é cashmere. Mas é caro. Eu tenho vontade de comprar tudo, mergulhar em um mundo de cardigãs, suéters, boinas e cachecóis tão fofinhos que eu nunca mais usaria outra roupa na vida. Cores lindas. As padronagens de tartans a gente nem sabe por onde começar. Mas eu acho £30 por um cachecol muito dinheiro. Mesmo sendo cashmere. Então eu ficava entrando nas lojas, babando. Passando a mão em tudo. Esfregando minha bochecha nas araras. Os vendedores deixam. Acho que todo mundo faz isso. Cashmere tem esse poder magnético sobre as pessoas. Seria um crime se não deixassem. Verdade que estou conhecendo uma Edinburgh bem descaracterizada. Jovens festejando e enchendo a cara por todos os lados, performances, música. Imagina a Virada Cultural. Agora imagina isso por um mês todos os dias. É assim que Edinburgh está. Quando você consegue achar um escocês perdido no meio da multidão, dá para sentir o ar de cansaço. As pessoas estão nervosas no trânsito. Andam buzinando e xingando. Ônibus enormes estão sempre fechando o cruzamento. Dá para entender. Todo mundo vem para cá nessa época do ano em busca dessa ebulição. Eu achei que ia chegar aqui e mergulhar no meio da loucura. Me inebriar pelas noites. Redescobrir o teatro em mim. Falar, conversar, fazer um milhão de amigos. Eu pensei que eu ia para a lama. Mas não sinto a menor vontade de virar uma “party animal”. Tudo o que eu consigo ver é uma grande feira de vaidades. Meu tempo já passou. Eu aproveito a diversidade, sorrio. Tiro fotos, dou risada. Mas assisto. É o que eu sinto vontade. Eu desconstrui tantas coisas em mim e estou começando a juntas os pedacinhos. Acho que gosto mesmo é de assistir. Observar. Distanciar. As coisas se processam em mim de uma outra forma. Eu não quero ser a pessoa maquiada no centro do palco. Nem a que comprou lugares na primeira fila. Não quero ser a pessoa no meio da galera na mesa do bar. Também não quero ser a “Dancing Queen” na pista do club (Young and sweet, only seventeen). Acho que comecei a enxergar em que lugares eu estou realmente confortável. Comecei a enxergar uma possibilidade de vida em que se pode ter tudo e nada. A vida é uma grande feira de vaidades. A gente acaba se matando para sentar na primeira fila, ou distribuindo flyers para convencer o público de nossos espetáculos particulares. Às vezes o melhor mesmo é nem se inscrever no Festival.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Meu último final de semana em Londres foi incrível. Passeei. Tomei prosseco com amigas. Paquerei. Dei muita risada. Dancei. Tomei sorvete. Fiquei bundando no hostel lendo livro. Fui comer indiano na Brick Lane. Fuçar em lojinhas em volta da Liverpool Street. E domingo ainda fez um dia lindo. Hoje também. Fez Sol, estava quente. Eu nem precisava de casaco. É para lembrar porque a gente ama London. Só porque é um lugar para se amar. Não fui correr nenhum desses dias. Culpa da boa e velha equação “idiota-alicate-dedão”*. Vivo fazendo isso. Nunca aprendo. Mas resolvi também fica um pouco sem correr. Dar um tempo de algumas semanas. Resolvi tirar todas as pressões. Todas as obrigações. Todas as rotinas. Esvaziar de vez e só deixar o barco fluir. Quinta-feira encontro a Y, e estou tão feliz que ela está aqui e a gente vai viajar juntas. Vamos fazer Highlands. Estou empolgada. Ando precisada de gente que eu conheço. De gente que me conheça. Cheguei em Edinburgh. Também está quente. Não como nosso verão, lógico. Mas está uma temperatura agradável. Dá para ficar de camiseta. Meu hostel parece uma república. Cheio de gente de 20 poucos anos. Tem um bar, mesa de bilhar, WII. Eu sentei em um sofá e tomei uma cerveja. Só para relaxar. Para chegar de vez na cidade. Tenho de parar de pensar. Penso muito. Me machuca. Preciso parar de pensar.

*"idiota-alicate-dedão" significa: "a idota aqui enfiou o alicate no dedão do pé até sair sangue, então agora está inflamado e doendo muito."

domingo, 8 de agosto de 2010

O ASSASSINATO DA STEPFORD WIFE



Morreu. Minha Stepford Wife. Para quem não sabe, “Stepford Wives” é o nome de um livro do Ira Levin em que as mulheres são perfeitas. Lindas, excelentes donas de casa, gentis, submissas, doces, ótimas anfitriãs, cozinheiras impecáveis, mães exemplares, esposas atenciosas, gostosas, um escândalo na cama. São tão perfeitas, tão perfeitas, que são robôs. Existem dois filmes baseados no livro. Um de 75 e outro recente com a Nicole Kidman e o Matthew Broderick. É uma grande crítica na verdade, e acho que toda mulher teve em algum momento um sentimento (mesmo que no fundinho) de inadequação por não conseguir corresponder a tantos padrões. Eu sou virginiana e perfeccionista (é pleonasmo, eu sei!), então na maioria das vezes eu não consigo me perdoar por não ser um robô. É cruel. Estúpido, na verdade. Mas o que se há de fazer. É como me sinto às vezes, e aprendi que negar algumas verdades sobre nós mesmas só torna as coisas piores. Estou aqui, me esforçando para ser uma pessoa melhor. O surpreendente é que estou descobrindo que, para ser uma pessoa melhor, eu preciso ser mais imperfeita. Explico. A experiência na Farmville. Eu arregacei as mangas da minha Stepford Wife e pensei “É agora! Agora que ela vai se refestelar!”. Mas na verdade o que acontecia é que eu não dava conta. E por mais que eu me esforçasse para ser perfeita, as coisas simplemente saíam erradas. Eu me matava para acordar mega cedo, correr antes de começar a trabalhar, fazer tudo o que me pediam, escrever à tarde, ler os livros que havia me proposto ler, planejar a continuação da viagem, manter meu trabalho no Brasil, superar crises, cuidar da pele, do cabelo, relaxar, passear, conhecer as cidades em volta. O que aconteceu foi que, nem todo dia eu conseguia acordar cedo porque eu estava sempre exausta. E fazia muito frio, então eu acabava cabulando a corrida alguns dias. Outros eu me atrasava, e começava a trabalhar depois de todo mundo (Eles são ingleses. Super pontuais. 15 minutinhos é muuuito atraso!) Nem sempre eu conseguia cumprir todo o trabalho, porque obviamente eu demoro muito mais tempo para limpar uma casa do que uma pessoa que está acostumada a fazer isso como profissão. Eu me queimava com o ferro de passar roupas, quase quebrei o aspirador de pó. Super-alimentava a cachorra e a gata. Não conseguia de jeito nenhum limpar as janelas sem deixar a marca do pano (mas nem com reza brava!). Nas vinhas, eu acabava quebrando todos os galhos das parreiras. Perdi inclusive alguns cachos de uva. E todos os bolos que eu tentei assar foram fracassos retumbantes. Viraram comida dos porcos! A parte culinária então foi um desastre. Meu último jantar, fiz batatas gratinadas que ficaram totalmente cruas. Não deu para engolir nem por piedade. Todo mundo quieto na mesa empurrando com o garfo para o canto do prato. Escrevi só meio capítulo do meu livro (eu devia ter escrito cinco). Fiz posts de péssima qualidade no blog. Fui a amiga mais pentelha e carente para os santos dos meus amigos no Brasil e em Portugal. Minha pele virou um lixo (Eu estava fazendo um tratamento com ácido porque ganhei uma mancha castanha na bochecha depois da última mochilada pelo nordeste ano passado, mas estraguei tudo e acho que agora só a dermatologista para consertar.) Meu cabelo todo desgrenhado. Não passeei nem um terço do que tinha imaginado. Li metade só dos livros que eu havia me proposto. E quanto à relaxar, me lembro de apenas um momento em que eu peguei uma caneca de chá, fui para o jardim e fiquei contemplando a vista. Ontem quando o Steve e o Justin foram me deixar na estação de trem, eles se despediram, me desejaram sorte e todo aquele blábláblá. Então Steve vira para mim, cheio de ironia e diz “Ah! E muito obrigado pelas refeições. Foram muito... interessantes. É bom a gente ter algumas surpresas de vez em quando.” O Justin balançando a cabeça e concordando. Daí nós três caímos em uma gargalhada. Porque a vida tem de ser assim. Não pode ser levada à sério. Eu não sou uma cozinheira tão horrível. Nem sou tão estabanada como parece. E eu consigo sim conciliar várias tarefas ao mesmo tempo. Mas parece que desta vez, talvez porque eu estava tão empenhada em ser perfeita, a vida passou uma rasteira e fez tudo o que eu tentava fazer sair do avesso. Porque eu sou humana. E existem muitas coisas que simplesmente não vão funcionar. Porque fazer força só deixa a gente cansada e não faz com que as coisas sejam diferentes do que são. Então eu tinha duas opções. Eu poderia me martirizar. Ficar deprimida. Me auto-repreender e criticar por meses. Poderia me recolher em vergonha e humilhação (dramática!!!). OU! Eu poderia rir disso tudo. Porque é só uma experiência. E é mesmo engraçado. É plot de sitcom. Botar uma brasileira em uma vinícula no interior da Inglaterra e tudo o que ela consegue é um sucessão de fracassos retumbantes. Então nós três caímos em uma gargalhada enorme. Gostosa. Porque era óbvio que, se eu tive alguma Stepford Wife louca para tomar posse desse corpinho, ela caiu em alguma ralo pelo caminho e perdeu a chance. Estou longe de ser perfeita. E isso é o que faz de mim uma pessoa melhor do que quando eu penso que sou (ou tento ser). Complicada. Imperfeitinha. Mas eu. Graças à Deus, não um robô. Mas única em toda a linha de produção.

sábado, 7 de agosto de 2010

REI

E falando em Rei, esse me tocou o coração.
Sou mesmo uma cat person...

DIÁLOGOS CURIOSOS COM MINHAS AMIGAS

Ela - Amiga, o problema é que a gente sempre acaba procurando um príncipe encantado.
Eu - Outro dia me disseram que isso tudo não passa de uma grande conspiração da Disney!
Ela - Disse tudo! É uma conspiração da Disney.
Eu - Não é?
Ela - Mas amore, você está afim de Príncipe Encantado? Pra quê? Você saiu da torre sozinha, se jogou no mundo.
Eu - Verdade. Não preciso de ninguém para me salvar.
Ela - É o que eu digo. Que Príncipe Encantado o quê? Eu quero mais é um Rei!

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

A CORREDORA NOS CAMPOS DE TRIGO

O campo de trigo por onde eu corria.. até hoje!

É minha gente! Último dia de Helpx na Farmville. Passou mais rápido do que eu pensava. Porque houve um momento em que eu pensei que não ia passar nunca. Não pela experiência em si, mas por tudo o que eu passei enquanto aqui. Hoje acordei, ou melhor. Madruguei, como todos os outros dias. Saí no frio ingrato que faz aqui todas as manhãs e fui dar minha corridinha. Eu já estava acostumando com o caminho. Desço pela rua, até a estradinha. Vou por ela até o morro, de onde se vê os trilhos do Eurostar saindo do túnel e entrando na Inglaterra. Terra louca essa Inglaterra. Uma ilha gelada e úmida. Como uma gruta. O Sol quase nunca sai. Quando sai não esquenta nada. Chove. Sempre. Todos os dias têm cara de depressão. (Y vai ter espasmos de felicidade com essa agora) Não moraria aqui por nada. Volto um milhão de vezes, mas não pra morar. Deve ser desesperador pensar que as estações vão mudar, o Sol vai se aproximar e se afastar. E você vai contar nos dedos da mão (do Lula!) quantos dias de calor verdadeiro você vai ter no ano. Eu procuro mais do que isso. Procuro algo um pouco mais extraordinário do que isso. E agora eu não estou falando do clima. Vou tentar explicar, sem falar. Eu me adaptei ao caminho. Todo dia (quase todo dia...) acordo e corre esse caminho. Às vezes Jesse me acompanha e vai correndo na frente. Outro dia tentou caçar uma raposa. As duas se enfiaram no meio da plantação de trigo. Eu vou correndo, ouvindo meu set list “Running Girl”. Já me perguntaram se eu corro ouvindo sempre o mesmo set list. Sim! Eu gosto de saber o que vem depois. Gosto de ir reconhecendo o caminho. Então fica ainda mais fácil ir se adaptando ao caminho. O ser humano é um bichinho bem curioso. Se adapta a tudo. Sem menosprezar as virtudes todas da coisa. É uma vista linda! Quando sai um solzinho gelado, o campo fica todo dourado. Como um tapete rústico, imóvel a minha volta. Me invade uma sensação de liberdade. De correr em um lugar que se estende pelos horizontes, cruza um mar, acaba longe. Sou eu, a estrada. Parece que, por eu estar correndo o campo respira. Mas isso sou eu. Sou eu correndo. O campo é só um campo. Um campo de trigo baixo. Todo molhado da chuva diária. Com um Sol de verão que não seria ameaça nem para um albino. É frio. É gelado. Sem nenhum calor humano. E eu não sou mulher para me contentar só com isso. A gente é capaz de se adaptar a qualquer coisa. Tem muita gente que vive aqui. Que ama viver aqui. Tem gente até que faz de tudo para mudar para cá! Mas para mim, é muito frio. É muito pouco. Eu estou em busca de algo que seja mais extraordinário do que isso. E novamente, não estou falando do clima. Então hoje eu corri pelos campos de trigo pela última vez. Amanhã pego minha mochila e vou para London, segunda-feira Edinburgh. Ainda frio, verdade. Mas agora estou falando do clima. Eu sou uma corredora. Vou em busca de algo extraordinário. Meu set list “Running Girl” não muda, mas os campos de trigo... esses não vão na minha bagagem.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

JUGULAR

Eu fico toda orgulhosa quando percebo alguma mudança em mim. Quando percebo que melhorei em alguma coisa. Vamos combinar que eu sou uma pessoa complexa. Tudo menos feijão com arroz. Menos sopa de chuchu. Às vezes a pimenta é tão forte que não é para o paladar de qualquer um. Muito menos para quem tem paladar infantil. Então outro dia a irmã da Penny estava aqui. Dormiu uns dias aqui. Ela é uma pessoa um pouco arrogante. Na postura, no tom de voz. Na maneira de se dirigir às pessoas. Ela é daquelas pessoas que sempre olha para os outros por cima. Elevando o queixo e tombando a cabeça para trás. Como quem procura foco em óculos bifocais. Penny já havia me preparado um pouco, pelo visto ela deve estar acostumada a lidar com situações constrangedoras com a irmã. Sentamos todos na mesa para o jantar. Mesa cheia, tivemos até de pegar uma cadeira extra na sala. Eu quietinha na minha, mastigando salmão defumado. A mulher sentada exatamente na minha direção, do outro lado da mesa. Sem olhar para o meu rosto, enquanto ela empurrava comida com a faca e segurava o garfo como a batuta de um maestro, ela fala: “Então Adriana, onde exatamente fica o Brasil? Nunca prestei muita atenção.” Hum! Eu tive vontade de rir (Penny riu!), mas terminei de mastigar meu salmão, engoli e com muita calma e educação olhei nos olhos dela e respondi “Na América do Sul.” Então a mulher devolveu meu olhar, e finalmente olhou diretamente nos meus olhos. Todo mundo na mesa deu uma risadinha, porque minha resposta simples e direta fez a pergunta dela parecer um pouco imbecil. Não tive nenhuma intenção disso, afinal ninguém é obrigado a saber onde ficam todos os países do mundo. Mas todo mundo sabia também que ela não estava perguntando sobre um país menos expressivo no cenário mundial (como Botswana, por exemplo!). Eu vi uma rajada de raiva passando pelos olhos da mulher, mas eu procurei manter minha expressão o mais aberta e neutra possível. Então, com uma rispidez na maneira de colocar as palavras ela ignorou os risinhos e continuou com a pergunta. “Eu SEI que fica na América do Sul. Mas ONDE exatamente na América do Sul?” Ah! Estou entendendo essa mulher. Ela está querendo dizer que eu venho de um lugar que ela nem se dignifica a conhecer direito, mas ao mesmo tempo ela procura ser condescendente em manter um pouco de “small talk” e conversar sobre esse obscuro e exótico país. Hum! Pausa aqui. A DriDri de 2-3 anos atrás enxergaria nesse comportamento uma refeição completa. Entrada, dois pratos, sobremesa, licor e café. Eu ia pular na jugular dessa mulher, tanto que ela não ia saber nem onde o Reino Unido fica no mapa. Não que eu me sinta ofendida pela ignorância das pessoas em relação ao Brasil, muito pelo contrário. Acho vergonhoso algumas vezes. Outras, é para isso mesmo que a gente viajar e troca experiências. Para conhecer mais de outras culturas e para nos conhecerem melhor. Mas o que me deixa possessa é quando eu vejo gente tentando tripudiar sobre outras. Gente que se acha melhor do que os outros. Eu pularia na jugular dela não importa com quem ela estivesse falando. Sendo comigo ainda... Hum! Aquela mulher não tinha nenhum respeito pela própria vida! MAS! Como eu não sou mais a DriDri de 2-3 anos atrás, e como eu quero ser uma pessoa melhor ainda daqui 2-3 anos não houve sangue na mesa. Quando ela terminou a pergunta, as pessoas começaram a se mexer e rir mais alto. Eu apenas sorri, repousei meus talheres no prato e, como quem fala com uma criança de 7 anos, com muito carinho e sinceridade, sem ser irônica em nenhum momento, respondi. Respondi com o meu coração cheio de amor. “Então, sabe aquele país bem grande? Um que toma quase toda a América do Sul? Aquele é o Brasil.” Então ela fez uma cara de quem tinha perdido alguma coisa. Penny levantou e pegou um Atlas para mostrar para a irmã como a pergunta dela soava engraçada para todo mundo. Então ela olhou por cima do mapa. “Tudo muito interessante. Mas eu NUNCA iria lá.” Minha vontade era dizer. “Porfavor! Não vá!”. Mas em vez disso eu sorri e continuei a mastigar meu salmão. As pessoas têm razões para agir como agem. Sejam elas justas ou não. Um monte de coisas fizeram dessa mulher o que ela é hoje. Eu não sei se eu não seria exatamente como ela se tivesse tido a história de vida que ela teve (seja essa história qual seja!). Algumas pessoas precisam diminuir outras para se sentirem bem. Algumas pessoas precisam menosprezar coisas, lugares, pessoas, idéias, religiões, raças, origens, sexo, o que seja. Para se sentirem melhores sobre elas mesmas. E a gente não pode julgar ninguém por isso. Eu não posso mudar a maneira dessa mulher agir. Mas posso mudar a minha maneira de reagir. Às vezes são só crianças assustadas. E a gente não pula na jugular de crianças.

BOYS NIGHT OUT

Ontem Penny foi visitar uma amiga. Vai ficar alguns dias fora de casa. À noite ficamos só eu e os meninos (Steve, Justin e Armand). Minha vez de preparar o jantar. Todo mundo um pouco apreensivo, disfarçando, oferecendo ajuda. Isso porque eu andei perdendo a mão no sal das últimas vezes que cozinhei. Ficou mega salgado. O pessoal comendo quietinho, sem falar uma palavra. Muita água sendo bebida com a refeição. Então eles já estavam sofrendo por antecipação. Imaginando o jantar que ia sair. Mas dessa vez eu tomei bastante cuidado. Fiz uma mega lasanha, feijão com linguiça, arroz e salada de couve-flor. E saiu tudo certinho. Eu precisava me redimir antes de ir embora daqui. Vocês precisavam ver as caras de alívio quando comeram a primeira garfada e estava gostoso. Resultado que não sobrou nada. Eu tinha feito uma quantidade maior, esperando que sobrasse, mas que nada. Depois a gente ficou na mesa e enxugamos três garrafas de vinho. Deu até dor de cabeça hoje cedo. Eu sempre tive facilidade de sair com meninos. De conversar até tarde, sentar em mesa de bar e deixar o papo rolar. Foi legal fazer isso aqui na Farmville. A gente tirava sarro da cara do Armand, porque ele tem dezoito anos e está sempre entediado. (Sempre! O tempo todo! Eu também estaria se fosse adolescente.) E trocamos várias histórias engraçadas e trágicas de nossas vidas. Todo mundo tem passado, isso é sempre fato. Agora, adivinha só!? Eu acertei em cheio sobre o canadense. Ele teve mesmo o coração partido. Um dia ele voltou para casa e a namorada tinha levado todas as coisas dela. Pior. Ele não tinha nada dele. Tinha uma caneca, um prato, um garfo e uma faca. E um colchão inflável. Tudo o resto era dela. Então ele chegou em casa e estava aquele apartamento enorme e vazio. Caiu a ficha de que ele não tinha mais nada na vida. Então ele vendeu a empresa dele e se jogou no mundo. Isso faz três anos. Há três anos que ele vai de Helpx em Helpx. E eu achando que tinha problemas. Eu só não consigo me achar. Tem gente que desistiu de procurar. É. A gente brinda. Abre mais uma garrafa de vinho e fazemos piada com o mal gosto musical um do outro. Todo mundo tem passado. Mesmo que não queira.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

CARROSSEL

Minha última semana na Farmville. Eu tento sempre me apegar ao que interessa e jogar fora o resto. Não tem sido nem de perto a experiência que eu imaginava. Não tem sido também nem melhor ou pior. Apenas diferente, e às vezes as coisas são assim. Diferentes e só. Basicamente minha rotina tem sido acordar às 5h30 para dar uma corridinha antes de começar. Tomar café da manhã e começar a trabalhar às 7h. É nessa hora que eu coloco o Ipod no ouvido e esqueço do mundo. Ontem limpei janelas e o porão. O porão em particular estava me angustiando, porque a casa estava bem sujinha no geral. Imagina o porão!!! Eu estou querendo pegar aquele porão e dar uma geral desde semana passada, mas sempre me pediam para fazer alguma outra coisa. Ontem fiz o porão inteiro. Ouvindo a trilha sonora de Juno. Duas vezes. Continua com cara de porão, mas pelo menos não tem mais jeito de abandonado. Depois voltei para Jewel, todo o repertório. Mais duas vezes. Eu sou mesmo repetitiva. Eu gosto. Às 10h a gente faz uma pausa. Os meninos sobem com Steve da plantação e senta todo mundo na cozinha para tomar um segundo café da manhã. Eu tomo um café e como umas torradas, mas o povo aqui leva a sério esse negócio de comer. Rola linguiça, ovos mexidos com leite, torradas, feijão cozido. Essa é a minha definição de enjôo matinal! Então a gente conversa um pouco, faz umas piadas. E eu volto para o Ipod até às 13h, quando todo mundo senta na cozinha para o almoço. Às vezes nem tenho muita fome, mas rola uma coisa de “refeição em família” e seria extremamente deselegante não sentar à mesa. Então eu como uma salada, belisco uns pedaços de frios e fico ouvindo as conversas e esperando o povo terminar para eu poder levantar. Só depois disso tudo que eu consigo sentar e ter um tempo para mim. Entre às 14h e às 16h é o único horário de privacidade que tenho. Fico sozinha na casa e tenho de aproveitar para telefonar para o Brasil, para meus amigos, fazer sessão de terapia pelo skype, escrever post, escrever livro, planejar viagem. Tudo. Porque às 16h todo mundo começa a voltar para a casa e, mesmo que eu tente ficar na minha no meu computador, é humanamente impossível com tanta gente falando, andando, fazendo pergunta. Por volta das 19h a gente janta. Mesmo esquema do almoço. Sorrir, aguardar na mesa, até poder levantar. Depois do jantar as pessoas ficam meio espalhadas pelas áreas comuns. Eu tomo um banho, leio um pouco. E se eu precisar de privacidade para falar com alguém, só depois das 22h, quando todo mundo já foi dormir. A questão da privacidade é um pouco mais complicada porque a internet só pega nas áreas comuns. Nas salas e na cozinha. Como eu comprei esse computador em Portugal no começo da jornada, fiquei sem dicionário. Meu word também está sem corretor. Então preciso fazer todas minhas consultas online. Já tentei escrever desconectada mas é bem improdutivo. Hoje quebramos um pouco a rotina. Steve e Justin (o canadense) queriam ir pescar na praia. Sasha está aqui (aliás, protagonizando algumas cenas de birra infantil que faria qualquer pessoa ser a favor do aborto em cinco segundos!), então depois do almoço eles foram para a praia. Eu fui com Penny depois que ela fechou a winery. Se a Inglaterra não é famosa pelos seus vinhos, muito menos pelas suas praias. Praia de pedra, mas nada perto da Riviera Francesa. Um vento de lascar. Eu tremendo e batendo os dentes, levantei o capuz do moleton e fiquei tentando inutilmente me esconder no meio das pedras. O espanhol ainda mergulhou, saiu nadando. Louco! Tem feito a mesma temperatura do que São Paulo aqui. Com a diferença de que aqui é verão. (Definitivamente, eu não posso morar no Reino Unido. Não com esse clima.) Então eu peguei meu livrinho e fui para o carro fugir do vento e me manter aquecida. Eu e Penny ainda levamos Sasha em um parquinho de diversões no final da tarde. Fui no trem fantasma e no carrinho de bate-bate com ela. Uma criança mal-criada, mas ainda uma criança. A gente comeu fish & chips e voltamos para casa. Eu não vou entrar em detalhes, porque essa história não é minha. Mas, embora tenha soado como um dia gostoso e divertido, foi um dia triste. Muito triste. É muito triste o que a falta de amor na vida de uma pessoa pode fazer. Eu voltei a me encher de ternura. Voltei a me encher de compaixão. Às vezes não existe nada no mundo mais triste do que uma criança rindo e girando sozinha em um carrossel. Me senti um pouco culpada de ter passado os últimos dias de saco cheio. É um bando de gente carente lá fora. É como uma praia cinza de pedras, em um verão sem calor nem Sol.

KEEP CALM


Nesse final de semana, passeando por East London, topei umas duzentas vezes com esse cartaz. Não apenas com o cartaz, mas com camiseta, chaveiro, quadro. Parecia que para onde eu virava o universo repetia para mim "Keep Calm and Carry On". Claro que eu entrei em uma lojinha e comprei um quadro desses. Vai comigo na bagagem, e o dia que eu tiver uma casa novamente, vai ficar na parede, no meio da sala. Para não esquecer.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

TRILHA SONORA DO DIA


Good Day

JEWEL | MySpace Music Videos

Eu gosto de Jewel. É música mulherzinha e eu adoro. Música de sitcom americano.
Essa foi a música que eu acordei na cabeça hoje. E que eu fiquei ouvindo a manhã inteira. E vou ficar cantando até à noite.
Só porque ela tem razão. Vai ficar tudo bem.

RESILIENTE

Estou de volta. Não, não fui para lugar nenhum. Mas voltei a minha forma. A minha percepção de mim mesma. Nas últimas semanas eu ouvi de algumas amigas conselhos que eu costumava dar a elas. Então bateu o sininho. Tem algo errado. Quando foi que eu deixei de ser a pessoa que acreditava nesse discurso e me tornei aquele que precisa ouvir? Não sei. (ou talvez eu saiba até demais). De qualquer forma não interessa. Interessa que eu enfiei o braço até o ombro. Até alcançar um pouco de mim mesma. E me puxei para cima. Me trouxe à tona. Respirei, tomei fôlego. A gente sabe que tem algo errado quando existem coisas demais tapando a visão de nós. Eu sou a personagem principal da minha vida. Não garanto que nunca mais eu vá me esquecer disso, mas eu tenho certeza que se isso acontecer novamente, eu sei como me resgatar. Como voltar ao meu estado original. Eu sempre volto ao meu estado original. É por isso que eu sou feliz, iluminada. É por isso que, mesmo quando bate uma tristeza, existe muito amor na minha vida. Porque eu sou feita de amor. Foram semanas muito difíceis. Muito doloridas. Cheguei a pesquisar passagens para voltar para casa. Até preenchi as informações do cartão de crédito. Desisti antes de clicar em “confirmar”. Y me falou uma coisa valiosa. “Você não vai voltar não senhora. Porque você ainda não encontrou o que foi buscar. Não vai voltar enquanto não encontrar.” É verdade! Ainda não encontrei o que eu vim buscar. Então, de volta à estrada. De volta a reservar passagens. De volta a preparar a mochila. De volta a me apaixonar. Dessa vez por mim antes de tudo. Eu vou viver uma grande história de amor. Isso não tenho dúvidas. Mas antes vou viver uma grande história de amor comigo mesma. Voltei!

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

SECRET CINEMA

Final de semana em Londres. Nada mais revigorante do que se jogar em uma das cidades mais fascinantes do mundo. Ainda mais com as saudades de casa que eu tenho sentido. Preciso cavar motivos todos os dias para continuar. Mas enfim, final de semana em London. Encontrei Flo, aproveitamos que o dia deu uma esquentada e passamos a tarde fuçando nos antiquários cheios de bugigangas de Brick Lane e região. Tiramos fotos divertidas. Depois encontramos uma amiga dela e fomos as três no Secret Cinema. Esse é um projeto que rola uma vez por mês em várias cidades da Europa. As pessoas se inscrevem no site, compram um ingresso e recebem instruções do dia e local onde será a sessão e o que devem levar. Por exemplo, nós fomos para um lugar meio gueto, beeemmm East London e tínhamos de levar um flor. Chegamos lá e era um teatro antigo, mega kitsch. Na porta já tinha uma fila, todo mundo com flores na mão. Alguns atores fazendo performances muito estranhas. Dentro, parecia um salão arrumado para formatura de faculdade. Com várias mesas redondas. No bar a gente comprou uma garrafa de vinho branco, comemos alguns sanduiches. A decoração era a coisa mais estranha. Sabe aqueles bailes de formatura americanos de interior? Então. No palco (que parecia uma reprodução do fundo do mar em lamê) subiu um mestre de cerimônia monocórdico e politicamente incorreto. Então um “multi-instrumentalista” que se contorcia e tocava alguns instrumentos que ele mesmo tinha inventado. Eu tinha certeza que um cavalo branco ia passar galopando pelo meio da gente a qualquer momento. Todo esse clima era para assistir “Veludo Azul” de David Lynch. Tem gente que não entende, mas para mim nada melhor do que uma festa, com sessão de cinema, reproduzindo a atmosfera dos filmes de David Lynch. As flores eram em homenagem à Dennis Hopper, que tinha seu altar devidamente cheio de faixas, bilhetes, velas e (óbvio) flores. Depois do filme, ainda rolava uma pista com DJ. Eu não conhecia o projeto, mas a única coisa que eu pensava era “Como é que ninguém fez isso em São Paulo ainda?”. Parece que no mês passado foi “Blade Runner”. Imagina? Com barraquinhas de comida chinesa e tudo. Único problema é estar cansada como uma mula. Acordando às 5h30 todos os dias e trabalhando pra caramba. Mesmo assim, com os olhinhos fechando e bocejando enquanto Isabella Rossellini tremia na tela. Foi divertido demais! Diversão que eu já estava até esquecendo o quanto gostava.

Esse é o link do site da organização:
http://www.secretcinema.org/

E para vocês entenderem melhor do que eu estou falando, essa é uma matéria feita sobre a edição de "Blade Runner" no mês passado.