segunda-feira, 1 de março de 2010

POR MARES NUNCA DANTES NAVEGADOS

As armas e os barões assinalados
Que da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;

Acho que todo mundo lembra quando leu esses versos pela primeira vez. Eu tive uma professora de literatura incrível. Embora eu a tenha amaldiçoado secretamente por ter me obrigado a ler “Os Lusíadas”, hoje sou muito grata por ela me ter introduzido a grandiosidade dos poetas portugueses. Lembro de estar de férias, na praia, com aquele livro no colo que parecia uma bíblia. Eu lia e relia os versos sem entender nada, até que a poesia se revelou para mim. E eu tive certeza de que jamais escreveria com essa grandeza. Que aquilo era uma obra única no mundo. Engraçado que nossa educação possui muitos elementos da cultura portuguesa, mas a Portugal que eu conhecia como brasileira tem se mostrado um engodo perto da Portugal que estou entrando em contato. Cheguei já no fim de tarde no Porto. O avião patinava no ar para pousar. Uma chinesa na minha frente até vomitou (eu achei hilário! Sabem que sou terrível...). Fui parada pela alfândega. O cara olhou minha quantidade de malas e deve ter tido certeza de que eu era uma mega-sacoleira. Fiz minha cara de “já fui loira” e expliquei como são as mulheres quando fazem as malas. O cara riu, e me poupou da humilhação de expor minhas calcinhas no balcão. Carol e Viriato me aguardavam na saída. Carol linda, de cabelão e nada diferente da adolescente que eu vi pela última vez há 16 anos. Quando fiquei parada em Madrid imaginei que alguma coisa estava acontecendo, porque todos os vôos de e para Santiago do Chile apareciam como cancelados nos painéis, então Carol me contou sobre o terremoto e me disse que eu estava chegando bem no alerta vermelho de tempestade que eles haviam acabado de receber no continente. A mesma tempestade que havia atingido a Ilha da Madeira há alguns dias. Chegava nesse final de semana, sem a mesma força óbvio, mas fazia o carro balançar. Fizemos um city tour embaixo de muita água e eles me levaram para conhecer o Teatro da Vilarinha, um espaço de amigos deles. Fui apresentada para cerca de uma dúzia de “Ruis” (e eu que achava que Portugal era cheio de “Manuels” e “Joaquins”). O Teatro da Vilarinha é uma graça. Todo estruturado, bem arrumadinho. Faz a gente ter vergonha das espeluncas em que enfiamos o público em São Paulo. O Porto é uma cidade extremamente charmosa. As ruas de paralelepípedos, repletas de prédios antigos e bem conservados. Lojinhas graciosas, cafés com mesinhas na calçada. Um ar muito nostálgico. A casa de Carol e Viriato é incrível. Um duplex térreo, com quintal, muito espaço. No andar de baixo fica a sala, a cozinha bem espaçosa, a sala de jantar, o escritório e uma “casa de banho” que é a que eu estou usando. Em cima o quarto e o banheiro deles, um quarto de vestir e o quarto que estou usando. E Carol é uma fofa em tudo. A casa toda é cheia de detalhezinhos de decoração, quadros, luminárias, bonequinhos fofos, almofadas. Me fizeram sentir em casa em dois minutos. Eles tem um boxer albino, o Babus. E ele está completamente apaixonado por mim. Ele fica me olhando, e senta ao meu lado, e se contorce todo quando falo com ele. Eu aprendi os comandos e fico me divertindo mandando ele sentar e deitar quando ele me segue pela casa. A gente tagarelou praticamente desde que saímos do aeroporto. Fomos jantar em um restaurante perto. Eu já estou eufórica de tão baratos e bons que são os vinhos! Ricardo (a puta portuguesa) apareceu para dar um “oi” e nós voltamos para casa e tagarelamos até às 7h. Dormimos ontem até às 17h e tagarelamos sem parar o resto do domingo. Carol e Viriato são anfitriões incríveis. Eles gostam de receber pessoas e fazem de tudo para me deixar confortável e à vontade e me sentindo em casa. São muito pacientes em me contar histórias e me explicar sobre a cidade, o país e a cultura. Engolimos baldes de café, e chocolates. Falamos de vida, de teatro, do arrebatamento do fado. Hoje o dia amanheceu seco. Um sol gelado, igual aqueles dias de inverno em São Paulo. Carol foi trabalhar. Combinamos de fazer compras no final da tarde. Viriato ainda dorme, mas vai me levar conhecer seu teatro depois. Quero me localizar, me entender na cidade hoje. O Porto é uma cidade pequena. São 250mil habitantes. Fácil de andar para todos os lados. Vou falar mais da Portugal que estou descobrindo. Mas depois. Depois que estiver mais localizada por aqui.

2 comentários:

MH disse...

Delícia, cherie!
Porto deve ser mesmo incrível. E falando sério, nada se compara ao "velho mundo", a Europa toda é demais!
curta muito. Beijos! E um beijo na Carol que nem me conhece e é tão fofa comigo!

Unknown disse...

Gostei da sua narrativa, muito boa mesmo. Fez-me presente com você, pude imaginar a chuva, o teatro, as luminarias e objetos decorativos com que Carol adorna sua casa. Só percebi um 'pecado' que comumente nós brasileiros cometemos por influência dos imigrantes espanhóis; jamais se começa uma frase com pronomes oblíquos e os mesmos devem estar ligados a um verbo por um hífen; todavia é comum no português do Brasil. Você pode não escrever como Camões, mas certamente encanta do leitor com seu estilo; lembra-me José de Alencar, com sua riqueza de detalhes consegue transportar o leitor para dentro do contexto a que se refere. Parabéns!