segunda-feira, 26 de abril de 2010

SALDO

Dois meses. Foram sessentas dias que passaram assim, ó. Eu nem me dei conta. Eu estava com uma sensação enorme de tudo ser o mesmo. Mas agora, parando para olhar, foi um monte de coisas. No saldo geral contabilizo 3 países. 13 cidades. 5 aeroportos. 3 escovas de dentes. 2 potes grandes de shampoo. Uma porção de amigos novos. Outro tanto de amigos antigos que estavam ficando empoeirados no meu coração mas foram devidamente curtidos, abraçados, beijados e amados no tempo que foi possível. E devidamente devolvidos ao meu coração, de onde nunca vão sair. As saudades batendo de casa (casa?), do amigos que ficaram, dos poucos que só falo por MSN agora, e daqueles que nunca dá tempo de falar. De mim, uma bagunça fenomenal. Me sinto desconstruída, mas ainda não completamente. Algumas paredes ainda para serem implodidas. Estou descobrindo restos de civilizações dentro de mim mesma. Como uma auto-arqueologia de quem eu sou. Entendo o que estou fazendo. Sei exatamente porque a vida me colocou nesse caminho. Porque o astral me trouxe até as pessoas que tenho encontrado. São minhas ferramentas de demolição. Estão me ajudando entender de onde sai, por onde passei e como cheguei até aqui. Tudo sendo desconstruído aos poucos. Para que eu possa decidir para onde ir. Era exatamente isso que eu queria. Não posso construir um castelo em cima de areia, e eu sou uma princesinha. Preciso de um castelo. É muito reconfortante me encontrar no caminho certo. Só não sei ainda para onde ele está me levando, e nesse sentido dois meses é muito pouco. Só o comecinho do caminho, não dá para ter ideia do que eu vou encontrar no final. Mas não se julga o destino. Alcança-se. O importante é o caminho. Amanhã embarco para Madrid. Quinze dias de Espanha e depois uma pequena loucura. (Conto depois.) Língua nova. Comida nova. Pessoas novas. Estou bem empolgada. Mais ainda agradecida. Me sinto a pessoa mais sortuda do mundo. Tenho tudo do jeito que eu quero, faço exatamente o que eu quero. E, sim. Como eu havia decidido. Esse está sendo o melhor ano da minha vida. Hoje, empacotando mochila, malas, e deixando bagagem armazenada na casa da Kika, fui me dando conta de como algumas coisas que eram bem importantes para mim mudaram. Não compro mais cosméticos pelas marcas. Agora só olho o tamanho das embalagens. Todas com menos de 100ml. Não subi em uma balança todos esses dias, e parece que isso me emagreceu. As calças estão largas (largas de verdade! Muito mesmo!!!), embora eu coma uma quantidade indecente de açúcar, gordura, e todo tipo de maravilha proibitiva em uma vida saudável. Estou experimentando dormir até tarde sem me sentir culpada (tive uma criação tão traumatizante pelo meu pai, que não consigo acordar tarde sem me sentir o pior ser humano do mundo). Também estou aprendendo a deixar as coisas se acertarem pelo destino, e constatar que (por mais que eu queira controlar tudo) nossa visão de nossas próprias vidas é tão limitada que não podemos mesmo saber o que é o melhor para a gente. Descobri que um dia é muito tempo para se jogar fora. E que dinheiro é algo completamente virtual. Que pacotes de lenços de papel podem salvar sua vida (literalmente!). E que nem sempre meu Ipod vai me oferecer uma trilha sonora melhor do que o som da vida a minha volta. Pelo mesmo motivo quase não peguei em um livro desde que saí do Brasil (isso é um peso extra que sempre me questiono quando empacoto). Descobri que a vida é sábia e na maioria das vezes nós ignoramos portas que estão escancaradas a nossa volta para ficar forçando a fechadura de outras que só nos vão tornar infelizes. Que felicidade é algo contagiante e funciona como um imã. A gente acaba atraindo pessoas e situações que só se somam infinitamente. Aprendi que amor é um exercício. Essencial como hábitos de higiene, tem que ser praticado várias vezes ao dia. E que uma pessoa incapaz de amor não consegue ficar ao seu lado muito tempo se a sua vibração estiver alta. Nem que seja por um final de semana a mais. E essa talvez seja a condição mais triste do ser humano. A incapacidade de aceitar amor na vida. O meu saldo é positivo. Azul marinho. Arrisquei tudo. Mas apliquei no mais rentável fundo de investimento possível.

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