Demorei para contar essa história aqui, porque eu estava precisando processar direitinho o que aconteceu. Martin finalmente veio para São Paulo e eu estava muito empolgada em receber aquele que tinha sido meu amigão na Guatemala. Apesar da semi-escravidão em que tenho trabalhado recentemente falei para ele ficar a vontade em casa, o tempo que precisasse e que eu ia tirar um dia da semana para passar com ele, levá-lo para fazer um tour. Parece que Martin tinha se machucado no Peru. Chegou agressivo, mal-humorado, arrastando a perna. Pensei que ele estivesse com dor, cansado. Apresentei minhas melhores amigas. Todas se esforçando bastante para serem simpáticas, legais e recebê-lo bem. Martin respondia com agressividade para todo lado. Não sei se estava tentando ser engraçado (e a brincadeira não estava funcionando), não sei se não gostou do meus amigos. De qualquer forma, assim foi a chegada dele, e a estadia de 5 dias foi ladeira abaixo desde então. Na ordem dos acontecimentos, tentou me agarrar (o que foi bem constrangedor, ainda mais depois de eu ter acabado de dizer que estava me envolvendo com outra pessoa). Encheu a cara, do tipo, ficou bem bem bêbado mesmo. Capotou na sala ignorando a cama arrumadinha com lençóis limpinhos que eu tinha preparado no escritório. No dia seguinte acordei e o sofá e o carpete estavam todos vomitados. Uma nojeira na sala! Arrumei tudo, limpei, coloquei tudo para lavar. Então ele virou um babaca. Ignorava qualquer tentativa minha de quebrar o gelo da situação. Fingia que não ouvia quando eu falava com ele, respondia com monossílabos, ficava com cara de tédio no meio das pessoas. Na terça-feira desapareceu. Não falou para onde ia, não deixou bilhete, não deixou recado. Saiu para andar na cidade e voltou só à 1h da manhã. Eu já pensando que teria de acordar e ir ao consulado e à polícia. No dia que eu tinha reservado para fazer um tour com ele, acordou ao meio dia, disse que eu podia ir ao Museu do Futebol sozinha, que ele já tinha visto toda a cidade e que iria à rodoviária comprar uma passagem para Buenos Aires. Apesar de chocada, ainda me ofereci para levá-lo até a rodoviária, mas ele insistiu que iria sozinho. À pé (!!!). Foi quando eu me cansei e perguntei o que estava acontecendo. Que apesar de todos meus esforços para ser uma boa anfitriã, para deixá-lo à vontade. Toda minha generosidade de abrir minha casa, oferecer minha comida, apresentar meus amigos, oferecer ajuda; ele vinha se comportando de uma maneira incompreensível e aquilo estava me fazendo sentir uma idiota. Bom, o resultado foi que Martin deu uma desculpa esfarrapada. Disse que não queria me atrapalhar, pegou a mochila dele e foi embora sem se despedir, ou agradecer, ou nada. Em cima da mesa da sala deixou a cópia da chave que estava com ele e... R$120! Acho que nunca me senti tão ofendida na vida. Eu sintetizei esse episódio aqui. Mas na verdade, mesmo que eu revisse e repassasse cada palavra, casa olhar , cada segundo do que aconteceu, a questão é que eu não faço idéia do que aconteceu. Não sei se ele tinha algum tipo de expectativa comigo e quando se frustrou acabou reagindo de forma imatura. Não sei se algo mais grave aconteceu no meio dessa jornada dele e ele está descontando de alguma forma. Não sei se no fundo esse é ele, e ele é um cara deselegante e mal educado. Não sei o que se passa no lado de lá. Só sei que eu fiz o possível para ser uma boa amiga, uma ótima anfitriã. Para que ele se sentisse confortável, pudesse descansar e recarregar as energias. A gente nunca sabe o que se passa na cabeça das pessoas. E muitas vezes algumas experiências pertencem ao lugar em que elas aconteceram. Nós tivemos uma amizade muito feliz na Guatemala. Voluntariando em uma comunidade indígena. Mas aqui em São Paulo é minha vida real. Talvez ele tenha se decepcionado com a pessoa que eu sou na vida real. Eu fiquei mesmo muito arrasada com esse episódio e já me conformei que nunca vou saber de verdade o que aconteceu. Eu não posso mudar o que aconteceu. Eu não posso resolver a cabeça dele. Isso está além do que sou capaz. Mas eu sou sim capaz de pegar os R$120 que ele deixou jogado em cima da minha mesa e fazer um churrasco. Porque isso eu tenho controle. Isso está sob meu poder. Foi exatamente o que fiz. Chamei meia dúzia de amigos queridos que estavam perdidos nas cidade durante o feriado. Comprei carne, carvão, sorvete, cerveja, frutas para caipirinha. E ontem a gente celebrou aquelas amizades que se entendem, e que são reais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário