quarta-feira, 12 de novembro de 2014

TRÊS TAXISTAS


Taxista #1

Ele era todo sorrisos. Disputava os turistas na saída do desembarque no aeroporto. De empresa credenciada. Crachá no pescoço. Terno e gravata. Carro executivo, em excelente estado. Me alertou dos roubos nos faróis e guardou toda minha bagagem no bagageiro. Bancos de couro, mas nada de ar condicionado. Logo puxou conversa, simpático. Qual era meu nome. O que me trazia à Lima. De onde eu era. “AH, Brasil!”. Acha que os brasileiros e os peruanos são parecidos. São povos alegres. Me perguntou do calor e do carnaval. “É uma festa muito erótica, muito sexual, não é mesmo?”. Respondi que não sabia. “Não gosta de carnaval?”. Não. “Mas achei que toda brasileira se fantasiasse, soubesse dançar o samba”. Não. Não sei. Fechei a cara, abri meu livro e encerrei o papo.

Taxista #2

Parei o carro, negociei o preço. Em Lima os taxis não tem taxímetros. O motorista era um homem grade. A barriga protuberante batia no volante, embaixo de uma camisa azul clara manchada, de tecido ralo. Os cabelos brancos despenteados combinavam com o bigode cinza. Logo reconheceu, pelo meu sotaque, que eu era do Brasil. “De onde? Blumenau? Florianópolis? Curitiba? Porto Alegre? Goiânia?”. Me surpreendeu que ele não tivesse tentado nenhum dos centros óbvios para estrangeiros: São Paulo, Rio e Salvador. “Você votou em Dilma ou Aécio?”. Assim, na lata. Conhecia toda o contexto político brasileiro. Me perguntou de Lula, do Fome Zero, de Brizolla, de Jânio. Depois falamos de corrupção. Do impeachment de Collor, do mensalão, da Petrobrás. Ele me deu uma aula sobre a corrupção endêmica da América Latina, falando do histórico de governos desde o México até a Argentina. Quando eu achava que ele já sabia demais, passou a analisar a corrupção nos BRICS, falando dos governos da Rússia, China e Africa do Sul. Parou em um posto de gasolina para ir ao banheiro e abastecer. Pediu o pagamento da corrida adiantado para pagar pelo tanque. O carro tinha a porta amassada, e partes da pintura enferrujada. Me deixou em frente ao Museu Larco desejando “Boa sorte!”. Deixei sua gorjeta dobrada.

Taxista #3


O carro caía aos pedaços. Negociamos um preço baixo e sentei no banco torto. Durante a viagem toda ele não emitiu uma palavra. Lia um tablóide enquanto o carro parava no congestionamento, e ouvia uma seleção pop dos anos 80. Information Society, Depeche Mode, New Order, The B52’s, Eurythmics. O fim de tarde deixava o céu com uma concretude assustadora. Pensei como Lima é uma cidade literária. Cheia de histórias para contar. Em “Bizarre Love Triangle”, assobiamos juntos. 

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