Mais um dia de funcionária pública. Pegue seu cartão de ponto e vamos para a primeira parte da maratona. "Passeio Fluvial". Como eu estava com uma baita dor de cabeça ontem, fui dormir cedo e acabei acordando às 2h da manhã. Nem Jesus me fazia dormir depois disso. Fiquei fritando na cama, pescando até a vontade acabar e compensando todas as noites mal dormidas das últimas semanas. Hoje na praia a gente teve uma surpresa. Um filhote de coruja branca (LINDO! LINDO! LINDO!) tinha caído do ninho e estava com cara de perdido na areia. Se eu não tivesse tanto medo do barulho que ele fazia com o bico (Juro que aquilo pode arrancar um dedo), eu levava para casa. Embrulhava e escondia na mochila. Tomei um café reforçado e entrei na van super-mega-arcondicionada feliz da vida. Fomos até o porto de Salvaterra e pegamos um barquinho de pescador adaptado para levar turistas. O pessoal do grupo chamava o barco de "Pópópó". Referência direta ao som do motor (que parecia de geladeira) do barco que penava para atravessar o rio. Entramos no Igarapé do Garrote. Eu já fiz passeios semelhantes, mas dá uma certa emoção pensar que aqui já é mata amazônica. Esse é um tipo de passeio completamente diferente, se a pessoa vem para Marajó esperando o hedonismo das praias nordestinas. Eu gosto mais, mas eu sou eu e não sou referência nenhuma a não ser de mim mesma. Logo na entrada do igarapé um bando de garças e guarás. Show para brincar de Araquém Alcântara. Saíram algumas fotos legais, embora na maior parte do tempo eu ficasse brigando com o fotômetro e com o "pópópó" do barco. Subi para o teto e me lambuzei com a tele e as paisagens cruas, verdes. As raízes aéreas, a água escura e sem fundo. Essa coisa de fotografar é totalmente viciante. Talvez o melhor vício que tive até agora (depois da corrida!). Eu não consigo parar de ver fotos, pensar enquadramentos. Agora tudo o que eu faço, meu primeiro instinto é tirar a tampa da objetiva e apontar. Pode ser um pouco alienante mas eu vi o passeio todo pelo visor da câmera. E adorei. Ganhei algumas marcas da alça da camiseta nos ombros (um dia eu vou aprender que com a cor da minha pele eu PRECISO usar protetor solar além do rosto) e uma mancha vermelha na nuca, mas quem está reclamando? Fiz fotos ótimas. Um cartão inteiro de 2Gb. Voltamos para a pousada e eu lagartixei na piscina com meu livro por uma hora. Beberiquei água de côco e arrisquei umas braçadas na água, tomei um banho e almocei rapidinho para estar pontualmente às 13h na recepção e encarar os passeios da tarde. Um novo grupo da CVC chegou hoje e se juntaram para o mesmo passeio. Mais senhoras, casais de meia idade e quarentonas descoladas. Em vez da van, um microônibus. Pensei, agora sim dá para rolar uma musiquinha "Motorista! Motorista! Olha a pista. Olha a pista." Mentira. Não tive coragem. Eu já não sei mais o que fazer para ficar invisível, até parece que vou me meter a cantar no ônibus. Meio difícil não despertar a curiosidade do grupo inteiro. Geralmente só por ser uma mulher viajando sozinha já desperta a curiosidade de muita gente. As pessoas não entendem muito porque eu não tenho namorado, ou não tenho marido, ou não estou com um grupo enorme de gente, ou mesmo com uma amiga à tira colo. Pior ainda é que eu não sou obesa, nem feia, nem limitada intelectualmente. Então eu viro um gigantesco ponto de interrogação. Para ajudar agora eu tenho uma câmera bacanuda pendurada no pescoço. Já estava até rolando um bolão de que eu era alguma jornalista camuflada. Às vezes sinto como se eu fosse uma atração de circo. Ando me limitando a sorrir e evitar contato visual. Sei que existem técnicas mais eficientes, mas ando chata e preguiçosa. O roteiro da tarde foi em Soure, considerada a capital do Marajó. Uma cidadezinha toda planejada, cheia de ruas e travessas que não tem nomes, só números. Como New York. Lá fomos até uma praia lindíssima, que se chega depois de atravessar uma ponte de 300m no meio do mangue. A praia, uma faixa sem fim de areia branca, com árvores perdidas aqui e ali. Raízes aéreas encontrando o solo, a maré baixa formando ilhas de terra até cair no mar. Choupanas de palha para a gente sentar embaixo e respirar a paz de um lugar que parece estar quase intocado, puro. (Vinte minutos para "explorar" a praia. Humpf!). Depois corremos até uma olaria indígena e loja de artesanato em cerâmica. Visitamos um Batalhão de Polícia Militar que usa búfalos na guarda montada. Fomos até uma fazenda de búfalos, tomamos café com bolinhos de tapioca, manteiga de búfala e suco de manga fresquinho do pé. Seguimos para um curtume e loja de artesanato de couro (tinha umas bolsas maravilhosas de couro de búfalo, mas achei cara e com um acabamento fraquinho). Tudo isso para voltar a tempo de pegar a balsa para Salvaterra às 18h. Com direito a Pôr do Sol lindo refletindo na água do rio. Agora à noite, enquanto eu mastigava um filé de búfalo com mussarela e arroz de jambu (vi tanto dos bichinhos hoje... eu precisava comer um deles à noite, não!?), um grupo folclórico da região apresentava coreografias de carimbó no salão do restaurante. Mais fotos lindas. Lua cheia toda enevoada também. (mas essa foto não ficou linda). Saí à francesa agora e me tranquei no quarto. Fiquei pensando no dia que tive. Me diverti com muitas coisas. Fiz coisas que certamente não teria a oportunidade se não me enfiasse em um grupo. Mas em alguns momentos do dia, eu olhava pela janela do ônibus, toda refrescada pelo ar condicionado, e me batia uma pontinha de tristeza. Uma vontade de me jogar no bafo quente, de ir para aquelas ruas andar sem rumo, bater papo com os moradores. Sentar em um boteco e ver a vida passar, sem pensar que eu tenho 20 minutos para fazer qualquer coisa. Sentei na minha cama e pensei "Então é assim que vivem os gafanhotos?". Não quero soar metida, ou ser mal agradecida com a oportunidade de conhecer esse lugar paradisíaco, de fazer essa viagem. A vida é sem dúvida generosa demais da conta comigo. Então eu vou parar de pensar e só agradecer. Agradecer a chance de ser gafanhoto por uns dias. Porque isso também reforça minha alma mochileira, que cada dia mais, tenho certeza que, mochileira sempre será.
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