Festa de Ano Novo ontem foi aqui ao lado do Erratic Rock, no Base Camp. É um bar e loja de aluguel de equipamentos do mesmo dono, o Bill. É também onde rolam as palestras sobre os circuitos de Torres Del Paine gratuitamente todos os dias às 15h. Nós estouramos champagne, cantamos, dançamos. Todos sentindo que nem parecia Ano Novo. Eu e umas cariocas, porque estava frio demais. Os europeus, porque estava calor. De qualquer forma, todo mundo muito longe de casa. Mas foi legal. Formou-se uma irmandade, uma união. Na expectativa de boas notícias, na distância e estranhamento da própria casa, na vontade de colocar a mochila nas costas e continuar. Principalmente na frustração de termos chegado tão perto sem ter visto as belas torres. Eu fui dormir cedo. Porque não queria me embriagar, estava cansada e acordava cedo hoje para um passeio de barco que tinha reservado. Existe essa empresa chamada Agunsa que organiza uma excursão de lancha de um dia inteiro pelos fiordes e pelos glaciares aqui de Puerto Natales. Tirei algumas fotos legais, fiz uma trilha tranquila até o Glacial Serrano. Dormi bastante nos trechos de navegação. Depois nos levaram até uma Estância onde foi servido o almoço. Churrasco para variar. Um prato de legumes picados e refogados para mim. Sentei ao lado de um casal venezuelano que está morando no Rio há um ano e meio. Adoro esses encontros ao acaso que as viagens propiciam. São ótimos para conhecer pessoas, conhecer mais sobre seus países, e distanciar a visão que eu tenho do meu próprio. Um passeio agradável, e foi bom poder explorar um pouco da paisagem e das atrações desse lado da Patagônia. Que não é só o parque. Sobre o incêndio, está finalmente sob controle. Agora combate-se o fogo subterrâneo que ainda queima a terra e as raízes. Acredita-se que até que tudo seja resfriado e apagado ainda demore um mês. Um mês, por causa de um descuido de algums minutos. Sabe-se lá quantas décadas até que a natureza se reencontre e apague as cicatrizes. Foram 11.000 hectares queimados. Todo o W. E essa é a última coisa que eu falo dessa tragédia. Hoje à noite deixei Puerto Natales e os queridos amigos que fiz lá. Durmo em Calafate para amanhã cedinho pegar o primeiro ônibus para El Chaltén. O plano é acampar por 3 dias em volta do Fitz Roy. Segundo o guia “Trekking na Patagônia” do Lonely Planet, Torres Del Paine e Fitz Roy são os dois highlights da Patagônia. Como não foi possível ver um, vou correndo de encontro ao outro. Estou ansiosa mesmo para desligar completamente pelos três dias. (Mas nem tanto pela expectativa de banho zero no mesmo período!) Quase perdi o ônibus para Calafate. Desembarquei do passeio e fui correndo buscar a mochila no hostel. Correndo é força de expressão. O vento voltou e é IMPOSSÍVEL correr contra esse vento. É uma coisa assustadora, não estou exagerando não. Você precisa pisar firme e inclinar o corpo para frente para conseguir se locomover. Minhas coxas até doeram com a força da resistência. Então foi basicamente isso: peguei a mochila voando, mal dei tchau para as pessoas e fui a última, no último minuto, a entrar no ônibus. Cansada, bufando. Sentei no meu lugar, o ônibus deu partida e saiu. Ufa! Uma viagem de cerca de 5 horas de Punta Arenas à Calafate. De novo aquela paisagem linda e desértica. Eu coloquei The Lucksmiths no Ipod e encostei a cabeça no vidro do ônibus. Desenrolavam-se centenas de kilometros na minha frente de uma paisagem seca e linda. O campo que se perdia até um altiplano no horizonte. A estrada dura, reta, vazia que seguia impiedosa. Ovelhas pastando. Pássaros enormes pousados em rochas assistindo o pôr do Sol. Sim. Às 21h30 começou o pôr do Sol mais espetacular que eu já vi. Ele caia atrás do meu ombro direito. Eu via refletido o contorno do ônibus no asfalto, enquanto a luz alaranjada devorava toda a paisagem até fazer as nuvens do céu criarem vida e tornarem-se sólidas. Paralelo à estrada um bando de cavalos corriam livres sem destino, desviando de pequenas lagoas, com o vento balançando suas crinas, me fazendo puxar o ar em angústia de ver tanta liberdade assim, explícita. Três raios grossos e vermelhos saíam do horizonte e cortavam o azul implacável, e nesse momento eu não agüentei e chorei. Chorei porque meus olhos não agüentaram tanta beleza. Chorei porque a maneira como a vida acontece aqui faz com que eu tenha vontade de abraçá-la mesmo sabendo que eu vou sucumbir no segundo seguinte. Chorei porque, se eu estou começando o ano desse jeito é porque eu sou muito abençoada. Chorei porque é isso o que a gente faz quando presencia um milagre. Do outro lado do ônibus o Sol executava um espetáculo de despedida de seu primeiro dia. Ele ardia, quase cantava, e suas chamas se agigantavam pelo céu e o horizonte até que não pudesse enxergar. Fez o dia vermelho, de vida; e me deu de presente as fotos laranjas que eu tanto procurava. Como uma pintura, pinceladas de Van Gogh na minha frente. O céu da Patagônia.
"...estou procurando, estou procurando. Tentando dar a alguém o que vivi e não sei a quem, mas não quero ficar com o que vivi." (Clarice Lispector - Paixão Segundo GH)
segunda-feira, 2 de janeiro de 2012
PARTINDO DE PUERTO NATALES
Festa de Ano Novo ontem foi aqui ao lado do Erratic Rock, no Base Camp. É um bar e loja de aluguel de equipamentos do mesmo dono, o Bill. É também onde rolam as palestras sobre os circuitos de Torres Del Paine gratuitamente todos os dias às 15h. Nós estouramos champagne, cantamos, dançamos. Todos sentindo que nem parecia Ano Novo. Eu e umas cariocas, porque estava frio demais. Os europeus, porque estava calor. De qualquer forma, todo mundo muito longe de casa. Mas foi legal. Formou-se uma irmandade, uma união. Na expectativa de boas notícias, na distância e estranhamento da própria casa, na vontade de colocar a mochila nas costas e continuar. Principalmente na frustração de termos chegado tão perto sem ter visto as belas torres. Eu fui dormir cedo. Porque não queria me embriagar, estava cansada e acordava cedo hoje para um passeio de barco que tinha reservado. Existe essa empresa chamada Agunsa que organiza uma excursão de lancha de um dia inteiro pelos fiordes e pelos glaciares aqui de Puerto Natales. Tirei algumas fotos legais, fiz uma trilha tranquila até o Glacial Serrano. Dormi bastante nos trechos de navegação. Depois nos levaram até uma Estância onde foi servido o almoço. Churrasco para variar. Um prato de legumes picados e refogados para mim. Sentei ao lado de um casal venezuelano que está morando no Rio há um ano e meio. Adoro esses encontros ao acaso que as viagens propiciam. São ótimos para conhecer pessoas, conhecer mais sobre seus países, e distanciar a visão que eu tenho do meu próprio. Um passeio agradável, e foi bom poder explorar um pouco da paisagem e das atrações desse lado da Patagônia. Que não é só o parque. Sobre o incêndio, está finalmente sob controle. Agora combate-se o fogo subterrâneo que ainda queima a terra e as raízes. Acredita-se que até que tudo seja resfriado e apagado ainda demore um mês. Um mês, por causa de um descuido de algums minutos. Sabe-se lá quantas décadas até que a natureza se reencontre e apague as cicatrizes. Foram 11.000 hectares queimados. Todo o W. E essa é a última coisa que eu falo dessa tragédia. Hoje à noite deixei Puerto Natales e os queridos amigos que fiz lá. Durmo em Calafate para amanhã cedinho pegar o primeiro ônibus para El Chaltén. O plano é acampar por 3 dias em volta do Fitz Roy. Segundo o guia “Trekking na Patagônia” do Lonely Planet, Torres Del Paine e Fitz Roy são os dois highlights da Patagônia. Como não foi possível ver um, vou correndo de encontro ao outro. Estou ansiosa mesmo para desligar completamente pelos três dias. (Mas nem tanto pela expectativa de banho zero no mesmo período!) Quase perdi o ônibus para Calafate. Desembarquei do passeio e fui correndo buscar a mochila no hostel. Correndo é força de expressão. O vento voltou e é IMPOSSÍVEL correr contra esse vento. É uma coisa assustadora, não estou exagerando não. Você precisa pisar firme e inclinar o corpo para frente para conseguir se locomover. Minhas coxas até doeram com a força da resistência. Então foi basicamente isso: peguei a mochila voando, mal dei tchau para as pessoas e fui a última, no último minuto, a entrar no ônibus. Cansada, bufando. Sentei no meu lugar, o ônibus deu partida e saiu. Ufa! Uma viagem de cerca de 5 horas de Punta Arenas à Calafate. De novo aquela paisagem linda e desértica. Eu coloquei The Lucksmiths no Ipod e encostei a cabeça no vidro do ônibus. Desenrolavam-se centenas de kilometros na minha frente de uma paisagem seca e linda. O campo que se perdia até um altiplano no horizonte. A estrada dura, reta, vazia que seguia impiedosa. Ovelhas pastando. Pássaros enormes pousados em rochas assistindo o pôr do Sol. Sim. Às 21h30 começou o pôr do Sol mais espetacular que eu já vi. Ele caia atrás do meu ombro direito. Eu via refletido o contorno do ônibus no asfalto, enquanto a luz alaranjada devorava toda a paisagem até fazer as nuvens do céu criarem vida e tornarem-se sólidas. Paralelo à estrada um bando de cavalos corriam livres sem destino, desviando de pequenas lagoas, com o vento balançando suas crinas, me fazendo puxar o ar em angústia de ver tanta liberdade assim, explícita. Três raios grossos e vermelhos saíam do horizonte e cortavam o azul implacável, e nesse momento eu não agüentei e chorei. Chorei porque meus olhos não agüentaram tanta beleza. Chorei porque a maneira como a vida acontece aqui faz com que eu tenha vontade de abraçá-la mesmo sabendo que eu vou sucumbir no segundo seguinte. Chorei porque, se eu estou começando o ano desse jeito é porque eu sou muito abençoada. Chorei porque é isso o que a gente faz quando presencia um milagre. Do outro lado do ônibus o Sol executava um espetáculo de despedida de seu primeiro dia. Ele ardia, quase cantava, e suas chamas se agigantavam pelo céu e o horizonte até que não pudesse enxergar. Fez o dia vermelho, de vida; e me deu de presente as fotos laranjas que eu tanto procurava. Como uma pintura, pinceladas de Van Gogh na minha frente. O céu da Patagônia.
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Um comentário:
Maravilhosa descrição...emoção linda!! To indo em fevereiro...
Obrigada!!!
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