Se me perguntarem porque eu resolvi ir para Viseu, eu só tenho uma resposta. Li em algum lugar que era uma ótima cidade para comer. Então fui a Viseu para comer. A cidade em si é um charme também, e essa coisa de conhecer cidades charmosas já está ficando entediante. Eu fico um pouco irritada comigo mesma quando me pego ansiosa, desesperada para ver tudo “o que deve ser visto” como a maioria dos turistas. Não sou uma turista. Acho que não nasci com o gene. Realmente me aborrece a estrutura contemporânea de turismo, de ver tudo pela janela, ouvir os guias, tirar fotos, comprar souvenirs. O que me motiva são coisas diferentes. Vou deixar de ver e fazer muitas coisas “obrigatórias”, porque meu olhar busca outro tipo de coisa. O que me encanta muitas vezes é a fragilidade de um velho passeando com seu cão. É a massa da população esperando um trem na plataforma. O comerciante abrindo a porta da sua loja. O cotidiano, o comum, o banal. Então eu fechei o Lonely Planet, sentei na praça do Rossio e fiquei muito tempo olhando a vida passar. Toda cercada de esqueletos de árvores que vão florecer (mais algumas semanas só, e vai estar tudo verde), tranquilizada pelo som da água na fonte ao lado. Ouvindo as conversas, assistindo duas mulheres do leste europeu mendigarem. Crianças caçando pombas, e para sorte das pombas as perninhas delas ainda são muito curtas para isso. Não consegui nem abrir um livro. A vida que me rodeava já era interessante demais. Tenho pensado no sentido de ler e escrever tantas histórias, quando existem tantas acontecendo ao vivo. E pensando nisso também me dei conta que já faz mais de um mês que não escrevo uma linha. Fui consumida pelo carnaval, a mudança, a viagem, a chegada, a virose, a estrada, e quando dei por mim muitas semanas já se passavam sem que eu escrevesse uma linha. E eu tenho um livro que falta isso para ser terminado. Ele é minha única pendência agora. Preciso voar. Terminar. Porque um novo já se aponta. Depois fui ao Museu Grão Vasco, considerado o maior pintor português da história. A sensação de ficar sentada em frente ao seu quadro “São Pedro” me valeu o ingresso, a viagem até Viseu e toda o dia. Uma daquelas obras que realmente te tiram as palavras. Pena que qualquer reprodução em livro não consegue causar o mesmo impacto de ver a obra ao vivo. Mas em Viseu eu comi. Alguns doces (e esses doces portugueses, vou te falar!) na melhor “pastelaria” da cidade, que depois fui descobrir era de um carioca da Ilha do Governador. Viriato brincou depois que todos os padeiros em Portugal são brasileiros. E desbravei uma ruelinha toda minúscula, cheia de opções de restaurantes e bares. Fiz uni, duni, te e entrei no “O Cortiço”. Bem tradicional, com pernas de presunto penduradas no teto. Vinho de primeira (da região do Dão que rodeia a cidade) servido em jarra de madeira. Morcela, linguiça, Parma e queijo de aperitivo. Pedi uma sopa de legumes de entrada. Um coelho cozido em vinho com batatas como prato. Então o coelho veio acompanhado de uma verdura maravilhosa que eu não conseguia distinguir pelo sabor. Verde escura, pouco folhosa. Na aparência me lembrava um brócolis picado com os talos, mas o sabor não era tão doce. Finalizava um certo amargo de chicória, só que bem mais saborosa. Perguntei para o garçom o nome da verdura. “Ah! Estás a comer grelos.” Corei! Quase me matei para segurar a gargalhada e dei um belo gole de vinho para conseguir repetir o tal nome. Acho o máximo essas peculiaridades da língua, que podem transformar algo tão vulgar em uma verdura saborosa e excelente para acompanhar um coelho cozido. Depois de tanta comida, não cabia mais nada de sobremesa, mas não dispensei o licor. Sai rolando pelas ruas de pedras até o albergue, onde (bem embaixo da minha janela) Joelma me aguardava com os maiores sucessos da Banda Calipso.
Agora estou em Londres. Cheguei ontem à noite, chovendo. Uma jornada para vir de Gatwick até a Old Street Station. Mais uma jornada para conseguir um táxi. Eu e Isa só fizemos uma pizza e tomamos uma cerveja, para desmaiar em seguida. Em Londres quero dar um tempo. Nada de maratona para ver tudo. Pode ser que eu saia daqui sem ter visto a Abadia de Westminster, sem ter passeado pelo Hyde Park. Sem nem uma foto do Big Ben. Não importa. É minha Londres, minha jornada. Vou fazer só o que realmente tiver vontade de fazer.
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