Eu vim para a Guatemala sem uma imagem pré-concebida. Vim porque vim, nem pensei muito. Não fiquei estudando sobre o país e a cultura até virar PHD como sempre faço. Eu não tinha a mínima idéia nem de qual era a moeda local. Continuo sem fazer, sei que começa com Q e de resto não faço a mínima idéia do que é caro ou barato. O trecho do vôo até o Panamá foi dolorido. Saí de GRU às 4h30 da manhã. Seguindo direto de um jantar divino de Reveillon, com um taxista tagarela até o setor de embarque da Copa Airlines, uma fila chata e demorada de check in, para enfim sentar no assento 18C (detesto corredor) e enfim capotar antes mesmo do avião levantar vôo. Dormi praticamente todas as 7 horas até o Panamá. Mas foi um sono leve, sem comprometimento. Com o corpo dolorido e incomodado. Já as duas horas do Panamá até a Guatemala foram muito mais confortáveis. O vôo estava vazio, sentei sozinha na fileira e ainda pude escolher o lugar. Sentei em frente à passagem de emergência da porta em cima da asa. Dava tanto para esticar as pernas que minhas juntas até estalavam. Enfim, Guatemala. Vou confessar que me bateu um medinho quando vi policiais com cachorros andando em cima das esteiras de bagagem, cheirando minha mala. Depois ainda escanearam e checaram meu passaporte umas 3 vezes mesmo depois de ter passado pela imigração. Falaram que era procedimento padrão. Eu tive um flash daquela cena de “Bridget Jones” quando ela vai para a Tailândia, mas mandei a imagem embora rapidinho. Só para não atrair. Uma representante do projeto estava me espeando na saída. Phoebe é uma australiana linda de 21 anos, muito inteligente e um poço de simpatia. Fomos conversando pelo caminho até Antigua, que fica cerca de 45 minutos de Guatemala City e é onde será nossa base. Deixamos minhas coisas na casa da minha host family e ela me levou para um tour prático pela cidade. Onde fica a lavanderia, onde fica caixa eletrônico, onde fica o supermercado, a farmácia, papelaria, internet café, correios, e a loja com o melhor espresso da cidade. Guatemala é uma grande produtora de café. Tenho uma certa expectativa em degustar muitos grãos diferentes nas próximas semanas. Depois sentamos para ela me fazer uma apresentação geral do projeto. A GVI é uma ong que atua em dezenas de países de Terceiro Mundo com projetos que agreguem melhorias urbanas, sociais ou ambientais. Esse projetos são financiados por doações e por voluntários que se dispõe a participar de um dos projetos pelo período mínimo de 2 semanas. Eles possuem escritórios na Austrália, UK, Irlanda e EUA, logo a grande maioria dos voluntários são desses países. O projeto que eu vou participar é uma escola em San Andrés Itzapa, um povoado indígena nas montanhas a 40 minutos de Antigua. O projeto todo é muito interessante, mas vou falar um outro dia dele aqui para não me alongar muito. Depois da explanação geral sobre o projeto, Phoebe me orientou sobre todos os riscos e perigos que podem acontecer durante minha estada. Desde intoxicação alimentar, até procedimentos de segurança em caso de terremotos. (A Guatemala teve um grande terremoto em 1976. Ele costuma acontecer a cada 30 anos, logo já estamos na prorrogação...) Depois ela ainda me mostrou onde eu terei aulas de espanhol e me apresentou para outros voluntários do projeto. Todos novinhos, mas transmitindo a mesma maturidade que ela. Tomei um suco de laranja com eles, mas fui para a cama às 20h30 da noite, com meu corpo mal aguentando escovar os dentes. Acordei hoje bem cedo, tomei café com minha host family. Angela e Duilio são dois aposentados adoráveis, que me receberam com tanto carinho e atenção que eu morderia a bochecha dos dois se esse tipo de manifestação de carinho fosse aceita por aqui. Dentro das diárias contratadas, eles não fornecem alimentação aos domingos, mas Angela me convidou pra tomar o café da manhã com eles antes de irem à missa. A casa é simples e pobre, mas muito bem cuidada e limpa. As paredes estão bem pintadas, e tem flores na janela. Os móveis estão sempre brilhando como se tivessem acabado de passar lustra móveis. Os dois são católicos, e inteligentes. Ficamos um tempão na mesa do café falando sobre algumas semelhanças e diferenças culturais. Eles pareceram tão acessíveis para me contar sobre a vida deles, algumas histórias do país. Antigua fica no meio de um vale entre dois vulcões. O Agua e o Fuego. Agua está inativo há muito tempo. Fuego vira e mexe cospe suas fumacinhas. Mas nenhum risco de uma erupção hollywoodiana. Agora é o que eles chamam de “inverno altiplano”, um período de seca, calor de dia e frio à noite. De manhã o Sol batia de leve esquentando o ar. Sai para explorar as poucas ruelas de paralelepípedo da cidade. É como uma Parati. Toda tombada, só que com casinhas coloridas. Cheias de lojas lindas de artesanato e cafés charmosérrimos. No centro há uma praça com um chafariz, rodeada pro dois prédios públicos com bandeiras em cima e galerias na frente, e uma igreja linda em frente. Gostoso se perder pelas ruas também para ir descobrindo ruínas, museus, igrejas para todos os lados. Barracas indígenas vendendo de tudo. Antigua é um festival de clichês da América Central. Tudo o que você sempre quis de um país de terceiro mundo. Para fotografar então. É como dar doce para criança. De deixar louco e com água na boca. As pessoas são lindas, as cores muitas e vibrantes. Tudo se contrasta com tanta harmonia. A vida cotidiana é tão interessante. Se você resolver ficar parado por cinco minutos em uma esquina qualquer, vai sair de lá com pelo menos uns 5 shots diferentes com jeitão de National Geographic. Parece que a cidade inteira estava acontecendo para minha lente hoje. Tirei mais de 300 fotos. Os indígenas olham um pouco desconfiados, mas no geral são um povo simples, do bem. Eles sorriem o tempo todo. Todo mundo te cumprimenta na rua, “Bueno Año”, “Buena Tarde”. Mesmo depois das 11h, quando as ruas são invadidas por turistas em busca de um brunch de domingo, ainda assim a cidade não se descaracteriza. Não perde seu charme. A vida é. De um jeito despretencioso, descompromissado com tudo o mais que exista fora no mundo. Como viver em um quadro mágico de Frida Khalo. Não sei se é Antigua, ou toda a Guatemala, mas as pessoas aqui parecem que sabem de algum segredo. Algo que lhes confere uma leveza, uma plenitude que se conserva acima da pobreza, das limitações sociais, dos preconceitos, dos conflitos etnicos internos. Talvez seja coisa de quem está protegido e rodeado por tantos vulcões. Talvez não seja nada, mas eles querem nos fazer pensar que eles sabem de algo que não sabemos. Só sei que, assim de cara, Guatemala me parece um refúgio perfeito. Um universo paralelo de tudo o que eu achava que era mundo. Talvez seja algo que eles coloquem na água, vai saber... Também não quero pensar. Não quero concluir nada. Tudo é tão colorido, que eu vou apenas sorrir e cumprimentar as pessoas na rua.
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