Vou confessar que não estou mais contando os dias. Nada mais de contar dias por aqui. Apenas vivendo a rotina. Estou tão integrada que parece que eu vivo essa vida desde sempre. Acordo de manhãzinha, tomo café com minha host family. Vou caminhando até o café que é nosso ponto de encontro. Dou aulas a manhã toda. Já conheço todos aqueles rostinhos, nomes. Suas personalidades. Almoço com o resto do grupo, bate papo na mesa. Aula a tarde. Volto para Antigua trabalhando na van para aproveitar o tempo. Tenho um melhor amigo (Martin). Faço planos para o final de semana. Tudo muito confortável dentro do desconforto. O chuveiro nunca fica quente. Posso tomar banho de uma hora e o espelho nunca fica embaçado. Descobri um padrão no café da manhã que minha host mother serve. (Terça é o dia das panquecas. Adoro panquecas! ...isso quer dizer que amanhã tem pasta de feijão denovo...) Eu sinto mesmo que estou vivendo essa vida há muito tempo. Por isso foi bem natural estender por mais uma semana minha estada por aqui. Minha garganta só que foi para o saco. Ontem eu até chorei de desespero na hora do almoço. Terminei o período da manhã COMPLETAMENTE afônica. Zero. Nada. Necas de pitibiriba. Nunca me senti tão inútil na vida. Eu tentava falar, fazia um esforço tremendo, e nada de sair voz. Aquele bando de criança com seus olhinhos curiosos olhando para minha cara: “o que essa estrangeira maluca está querendo dizer???”. Fazia mímica, apontava, batia palmas. Um desastre. Me senti um pouco abandonada também. Estamos com poucos voluntários (já que os novos voluntários só começam no projeto semana que vem), eu até entendo. Mas sempre falaram que estariam ali para me ajudar e etc. E no final o que rolou foi que duas vezes as internas entraram na sala, falaram dois minutos com as crianças para explicar um exercício e foram embora. Juro. Mesmo sem emitir um som, eu tive que dar conta da sala sozinha. Desesperador. Por um lado foi legal porque me ajudou a inverter o placar. As crianças estavam tão assustadas de ver “la maestra enferma”, que se comportaram como anjos iluminados. Parecia que tinham tomado ritalina. Extremamente comportatos, atentos. Super quietos. E ainda se policiavam entre si. “Shhhh! Cala-te! Mira la maestra!”. São lindinhos!!! Hoje que minha voz estava melhorzinha enchi todos de beijos e falei o quanto estava orgulhosa deles. (Eu disse melhorzinha! Eu ainda estou soando como uma criatura de ficção científica quando eu falo.). Coisas curiosas que a gente descobre somente quando perde a voz na Guatemala. Aqui as famácias também parecema casa da Mãe Joana. Você fala apenas “Porfavor” com a voz rouca e a balconista já vem com um antibiótico e um antiinflamatório. Nada de receita. Daí quando você explica que quer apenas uma pastilha ou um spray, elas ficam super decepcionadas. Outra coisa que a gente descobre, sabe aquele chazinho-receitinha-caseira-da-vó? Aqui é chá de camomila com? Com? Com? ... Chocolate! Te juro! E ainda vem mais alguma coisa muito sinistra misturada. Dona Helena (nossa cozinheira e líder comunitária) me mandou ontem uma xícara gigante quando viu meu estado no almoço. Tampa o nariz e engole (como qualquer outro remédio caseiro de vó). À noite fiz um mega chá de limão atolado no mel. Hoje também. Receita caseira por receita caseira, vou na que é mais gostosinha. Agora à noite começou uma tosse chatérrima. Sinal de que está curando. Acho bom. Amanhã é dia de cerveja e poperô em espanhol. Acha que eu vou perder uma coisa dessas? No way. Dentro da minha rotina, dessa vida que eu nunca tive mas sempre tive, qualquer tempinho vale para pegar fôlego. Toda Friday é Funday.
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