"...estou procurando, estou procurando. Tentando dar a alguém o que vivi e não sei a quem, mas não quero ficar com o que vivi." (Clarice Lispector - Paixão Segundo GH)
sábado, 11 de setembro de 2010
BRUSSELS!!!
Fala rapidinho tudo o que te vem na cabeça quando você pensa na Bélgica. Chocolate: Guylian, Godiva, Neuhaus. Cerveja (HUMMM!!!). Waffles. Quadrinhos: Tintin, Asterix, Smurfs. Magritte. Bruegel (mas dizem que ele nasceu na Holanda). Jean-Claude Van Damme. Pronto. Era isso o que me vinha na cabeça e acabou. Além de que eles também falam francês e fumam muito. Isso porque o primeiro belga que eu conheci na minha vida foi meu professor de francês na Aliança Francesa e eu ainda estava nas fraldas dos 20 anos. Não gostava nada dele. Chato e arrogante. A Bélgica estava na lista dos países que eu me propus a conhecer antes de sair do Brasil. Mas nos últimos meses eu fiquei me questionando inúmeras vezes se valia mesmo a pena vir para cá. Se não era melhor priorizar Alemanha e Holanda agora que o tempo está cada vez mais curto e a passagem de volta para o Brasil já foi comprada. Mas como eu sou teimosa, bati o pé e falei “Já estava decidido. Vai para a Bélgica e pronto.” Então eu peguei um avião mais para cumprir protocolo do que “super ansiosa” pelo o que quer que eu fosse encontrar. Quando eu estava vendo estadia em Bruxelas escolhi ficar em um Bed & Breakfast. Dentro da minha pesquisa a opção ia me dar condições de ter um conforto mais “lá em casa” e eu ando mesmo de saco cheio da molecada de hostel. Quem me recebeu hoje não foi Karel, o dono da casa, mas Cesar, o mega- incrível cão SRD que me fez sentir em casa em dois segundos. Larguei minha mochila no sofá e então Karel (o dono) me recebeu com uma xícara quente de café e ficamos treinando meu francês e tomando café da manhã que nem estava incluso na minha reserva. O B&B fica fora do grande centro de Bruxelas. Eu queria uma experiência que me inserisse mais no contexto real da vida das pessoas e eu já acho que saí na frente logo na primeira hora. Karel é uma pessoa incrível. Um belga inteligente, gentil, educado. Fumante (Ahá!). Apaixonado pelo próprio país, mas como todo belga não leva isso muito à sério. Abriu o mapa de Bruxelas e me mostrou tudo o que é, o que não é, e o que fazem os belgas e onde. Mesmo tendo (quase) dormido no aeroporto de Geneva ontem e sentir o corpo beirando a exaustão, eu resolvi nem esquentar a cadeira e botar minhas pernocas na rua para sentir a cidade. Primeiro choque, ainda mais tendo saído da asséptica Suíça, foi pegar o bonde e ir da periferia até o centro junto com uma infinidade de etnias diferentes, pessoas com cara de gente de verdade, mulheres mulçumanas com seus véus na cabeça, cheiro de suor dos homens embaixo do Sol e uma tropa de carrinhos de bebês. Os belgas procriam. E muito. Desci na borda do centro de Bruxelas e saí andando para um primeiro reconhecimento. Não demorou muito para o mapa que eu carregava na mão com todas as sugestões de Karel ir parar no lixo, e para eu descobrir que Bruxelas é, talvez, a cidade mais interessante da Europa hoje. Uma Babel surrealista. É a melhor definição que consigo encontrar. As ruas fervem de pessoas aproveitando o sábado ensolarado. Milhões de fotografias implorando para serem tiradas. Lojas maravilhosas de quadrinhos em cada esquina, (que fariam alguns dos meus amigos de casa considerarem muito bem paga uma passagem aérea). Uma arquitetura fragmentada, que não faz muito sentido, mas que faz todo, mesclando prédios em decomposição com relíquias art-nouveau. Bares, cafés, bares. Por todos os lados. Por onde se vira. Por onde se anda. Música ao ar livre em cada esquina. Pessoas se manifestando, se expressando, ou só deixando do jeito que está. Uma cacofonia humana que eu nunca vi igual. São mais de 100 etnias diferentes só em Bruxelas. Bandeiras do Brasil. Outras tantas da Comunidade Européia. E eles falam francês, mas falam mais o holandês. Falam também uma porção de dialetos... na verdade dizem que falam, mas ninguém entende para poder dizer se falam ou não falam. Então eu cruzo a rua e um grupo fantasiado de marionetes passa cantando e gritando, jogando laranjas para as pessoas na praça. Me lambuzo toda de waffle de morango e nutella enquanto um adolescente se abaixa na minha frente e escreve com giz no meio da rua em francês “O Amor é o único mecanismo de sobrevivência”. Resolvo experimentar cervejas, e vou sentando de bar em bar, pedindo uma diferente em cada lugar. Em um desses, um grupo de adolescentes senta em alvoroço na mesa ao lado. O “líder”, usando uma camiseta escrito em francês “Aluga-se belo espécime de 20 anos. Capaz de fazer festa e amor todas as noites. Uma verdadeira fera do sexo. Satisfação garantida ou o seu dinheiro de volta. Tratar aqui. (Dispenso intermediários)”. Ele vira para a descolada hype de 40 anos na outra mesa (que usa os raybans que melhor caem bem em uma pessoa que eu já vi) e solta em inglês "Posso te fazer uma pergunta? Porque você é bonita? Porque?”. Umas três mesas a volta caem na risada e voltam às suas conversas compenetradas e despretensiosas em seguida. As combinações fashions mais esdrúxulas do planeta desfilam para todos os lados. Uma sex shop ao lado de uma loja de roupas de maternidade (uma coisa leva a outra, não é?). Museus. Inclusive o do Magritte. Trânsito louco. Painéis de parede inteira com Tintin escalando montanhas. Bicicletas que deslizam como se estivessem nas nuvens. Pessoas deitadas em espreguiçadeiras no meio das calçadas. Ainda, no meio de tudo, Bruxelas não é um desbunde. Não tem o encanto de tantas outras capitais. Não é nada. E talvez por isso seja tudo. As pessoas todas possuem caras de “normais”. A cidade se perde um ruas e esquinas que podiam ser “mais um”, para te surpreender em seguida com vida e efervescência. Você nunca sabe o que vai encontrar virando uma rua. Ainda assim, é um ótimo país para se viver. Alta carga tributária (mas a gente que é brasileiro pode até dar risada disso). Um excelente sistema de transporte público. Sistema de saúde eficiente. Vida cultural diversa e ativa. Uma das melhores qualidades de vida do mundo. Equilíbrio social. Zero pobreza na rua. Mas zero riqueza também. Um lugar onde se pode comprar de tudo. Onde se come bem com qualquer orçamento. Onde a cerveja é mais barata do que água. E onde a maior atração turística é um menininho de 50cm fazendo xixi. Bruxelas corre por fora entre as capitais européias. Era o último lugar que eu “queria muito” vir, mas talvez devesse ter sido o primeiro. Quando meu corpo físico venceu o emocional (talvez levado em muito pelas cervejas ao longo da tarde), voltei para casa, tomei um banho longo. Pedi uma pizza e uma garrafa de vinho delivery. De uma pizzaria napolitana. Porque é isso que eu gosto de fazer sábados à noite quando eu estou em casa. Comi pizza de funghi com Karel e um casal de eslovenos que também está hospedado aqui. Para viver como vivem os belgas, fumei dois cigarros na janela. Agora estou sentada no sofá ao lado de um boneco de pelúcia gigante do Marsupilami. Todos aqueles meus esteriótipos da Bélgica começam a se trimensionalizar. É aquilo. Também. Bem mais. Antes que alguém me pergunte “Mas e o Jean-Claude Van Damme?”. Vou te dizer! Até ele faz sentido no delírio que é essa cidade.
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Um comentário:
Lindo demais seu retrato de Bruxelas! Você escreve bem pra caramba. Estou acompanhando sua viagem, e como não tive o prazer da sua convivência, gostaria até que ela não acabasse. Desde que você não deixe de escrever!
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