"...estou procurando, estou procurando. Tentando dar a alguém o que vivi e não sei a quem, mas não quero ficar com o que vivi." (Clarice Lispector - Paixão Segundo GH)
domingo, 19 de setembro de 2010
NO OSSO
Por mais que eu jogue bagagem fora da minha mochila, ainda parece que eu nem consigo carregar o peso. Tanta coisa, tanta coisa que eu passei, que eu vi, que eu conheci, que eu senti. Eu não estou sabendo mais como carregar tudo. Resultado que nos últimos três dias eu comecei a ter crises de choro espontâneas no meio do dia. Do nada. Olhava alguma cena na rua e desandava a chorar. No meio de alguma conversa, lá estavam as lágrimas denovo. E isso é o tipo de coisa que a gente se sente mal de sair falando por aí. Não apenas porque é constrangedor ficar exibindo emoção em público, mas também porque ninguém quer aquelas caras de piedade olhando para você e querendo entender o que está acontecendo. Muito menos quando nem eu mesma sei o que está acontecendo. As pessoas franzem a testa, sobem a sobrancelha e dizem “Vai passar, vai passar”, esfregando a mão na sua perna e isso é bem humilhante. Depois é meio esnobe dizer que estava no meio da Charles Bridge em Praga e teve uma crise de choro. Quer ter crise de choro, vai ter em Guaianazes. Vai ter no cruzamento da Rebouças com a Brasil às 18h. As pessoas ficam com raiva. Neguinho tá viajando pela Europa desde o começo do ano, tá vendo e vivendo as coisas mais incríveis que 10 entre 10 pessoas gostariam de fazer e fica chorando. Dá vontade de dar uma na orelha. Eu sei. Então eu andava disfarçando. Descobri que é muito fácil disfarçar quando você está triste. Quando você está chorando. Muda de assunto. Usa os óculos escuros e chora por baixo. Posta um vídeo legal no blog. Deixa um recado animado no facebook. E todo mundo fica feliz. Reação dentro das expectativas. Então ontem, depois de um dia exaustivo de andanças por uma das cidades mais absurdas de lindas que já estive na vida, eu larguei o casal de pseudo-novos-hippies-artistas-alternativos-catalães-pós-adolescentes (Ui! Quanta coisa!) que eu conheci no hostel e estavam comigo, me enfiei no quarto e chorei. Chorei muito. Chorei demais. Chorei até meu diafragma doer. Então eu comecei a ficar apavorada, porque eu chorava e não conseguia parar. Eu queria me obrigar a parar de chorar, mas era impossível. Meus pacotinhos de lenços se desfaziam como água. Eu fiz uma bagunça danada no chão do quarto tentando achar pacotinhos de lenços dentro da mochila (eu aprendi logo no primeiro mês de viagem. Lenços de papel podem literalmente salvar sua vida e eu nunca ando sem.). Então eu liguei para a MH, que é uma santa e não merece uma amiga como eu. Que está grávida e deve ter largado o maridão com a pizza do sábado à noite esfriando em cima da mesa para ficar uma hora conversando com a maluca que está do outro lado do mundo e não para de chorar. Depois de mais um pacotinho de lenços eu finalmente consegui parar de chorar e dormi exausta. Chorar cansa. Às vezes eu queria ser uma pessoa simples. Sem nada de complexidade. Quando o vulcão explode é cinza para todo o lado. Às vezes fica muito difícil de se carregar. Mas é isso. Só sobrou o osso. Eu tirei tudo. Tirei tanto da mochila (Quando digo que tirei, tirei de verdade. Hoje passei o dia andando de pijama por Praga com um casacão por cima porque minhas poucas roupas estavam lavando e molhadas.), que só sobrou eu. No osso. E do que sobrou não tem mais nada que dá para tirar. Agora tem de carregar. Tem de terminar a viagem com o que tem. E, pior. Tem de voltar. Só que se eu olhar hoje na minha bagagem, a única coisa que veio comigo do Brasil é minha mochila. O que vai voltar não tem mais nada do que saiu. Só o osso. Talvez por isso que dói.
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2 comentários:
Querida, não te recrimines assim por chorares :) Faz parte da tua jornada. Muita coisa mudou dentro de ti. O "saco do conhecimento" expandiu exponencialmente. Tens vivido de ti e para ti este tempo todo e é normal que o "ego" dê o berro de vez em quando. Não é necessariamente tristeza... são emoções e misturas de sensações que tanto podem provocar o riso como o choro.
Também tens que esvaziar a "mochila" de emoções/sensações para caber mais lá dentro... faz parte do processo!! Pode parecer, para quem ouve ou sabe, que esta tua viagem é tudo MARAVILHOSO, mas só quem a vive pode realmente saber de todas as pequenas e grandes emoções que passas!!
Chore e ria muito, o crescimento e a apreensão do conhecimento também passa por isso!!
Love u
oi adriana, hj lembrei de vc e entrei no seu, e vi seu poste! quase chorei com voce. Como ja faz alguns dias espero que vc estaje melhor!!! tenho certeza que suas lagrimas foi uma forma de realmente se renovar, e deixar o que nao presta mais para tras. Admiro muito voce e a coragem que vc tem para fazer esse mergulho em si mesma. Tenho certeza que voce voltara fortalecida e pronta para reencontrar sua vida!!!
ps - praga é realmente enigmática!!! eu fiquei dois dias na cidade e a unica coisa que realmente me impressionou foi uma biblioteca mega antiga, do sec XII, eu acho , e eque encontramos sem querer numa caminhada ate o castelo.bjs e boa viagem!
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