terça-feira, 18 de maio de 2010

MULHERES

Para finalizar o capítulo Marrocos, não posso deixar de colocar um post só sobre as mulheres. Claro que o que eu falo aqui (não só nesse post, mas como em todo blog) não tem nenhuma intenção de oferecer dados jornalísticos, reproduzir a realidade ou levantar teses sobre o assunto. É apenas minha opinão. Simples e pura. Formada pela minha experiência pessoal, umbiguista, totalmente particular e parcial. E muitas vezes eu sou dúbia, tendenciosa, antagônica. Mas é assim e pronto. E eu gosto de ser assim. Então é lógico que devam existir milhares de histórias que não condizem em nada com o que eu vou falar, mas para mim é assim que as mulheres vivem no Marrocos hoje.

Sempre que pensamos em um país mulçumano... bom, pelo menos eu (já que sou apaixonada pelo Jack Bauer e assisti todas as temporadas de 24H), penso na situação em que as mulheres são submetidas. Burcas. Prisão domiciliar. Comércio de noivas. Crianças escravas. Apedrejamento de mulheres adulteras. Coisas assim, que a gente sabe que acontecem sim em um monte de lugar por aí. A castração feminina ainda é praticada em muitos vilarejos (e não vai ter Cristo no mundo que me convença, sob o argumento que seja de proteção cultural ou o diabo, de que isso não seja uma barbárie e as pessoas que fazem isso não mereçam uma morte lenta e dolorosa sem seus testículos). A gente sabe, que existem lugares no mundo em que ser mulher é bem complicado (não que não seja também complicado em São Paulo, mas digo complicado de uma maneira muito mais explícita). Uma das minhas maiores preocupações em visitar o Marrocos era exatamente essa: uma mulher viajando sozinha. É um choque cultural, e é bom ter cuidado com isso. Conversei com muita gente. Li muito antes de ir. Mas nada como a experiência prática para colocar por terra alguns tabus e temores. Primeiro, senhoras e senhores, Marrocos não é o Afeganistão. Nada de burcas pelas ruas, muito pelo contrário. As mulheres se vestem de maneira bem ocidentalizada. Dependendo da idade e classe social. Entre as mais velhas ainda via uma ou outra que cobria o rosto com o véu, mas no geral todas com seus belos rostos à mostra. Indo para os bairro mais ricos então, nem o véu se via. Longos cabelos negros e grossos brilhando sob o Sol. Adolescentes passeando sorridentes de jeans e salto alto. Mulheres indo trabalhar usando raybans ou óculos enormes à la Jackie O. Elas se vestem com decoro, isso é verdade. Mas vi uma garota toda estilosa andando com o namorado, com véu na cabeça, uma camiseta meio punk com o ombro caído, revelando a alça do soutien preto. Bem sexy! Muitas ainda usam os trajes tradicionais. É bem comum vê-las pelas ruas de kaftã, babuche e véu. São muito vaidosas. Sempre combinam lindamente o véu com o kaftã, ou a roupa que estiverem usando. Usam muita maquiagem nos olhos. Olhos pretos, com kilometros de delineador. Gostam de usar rosa. Em todas as idades. Das crianças às idosas. Todas adoram rosa. E combinações de dourado com marrom e verde. Muito brilho também. Andam pelas ruas sempre brilhando, mesmo embaixo do Sol. Mas o mais importante aqui é esse detalhe da frase acima "Andam pelas ruas". As mulheres marroquinas andam muito pelas ruas. Todas as horas do dia e da noite. Na medina de Marrakech elas disputam buzinadas em vespas e lambretas no meio do trânsito caótico. Trabalham, estudam. Pegam transportes públicos sozinhas. Embora os empregos nas souks ainda sejam de uma grande maioria masculina, você às vê atrás dos balcões de algumas lojas. Barganham também. Carregam os filhos para “obrigar” as turistas a fazerem tatuagens de henna na mão (foi mais ou menos assim que consegui a minha e perdi Dh30). Cozinham em restaurantes, servem mesas. E nos bancos e correios, são unanimidade. Todas as caixas são mulheres. Elas tingem os cabelos. Adoram o ruivo. E adoram Vichy. (Eu também!!!). Estampas do logotipo da Louis Vuitton em malas e babuches, e a estampa da Burbery em absolutamente tudo são praticamente uma febre. Elas amam! Muitas mudanças forma conquistadas dentro da legislação marroquina em favor das mulheres na última década. Antes, um marido que se cansasse da esposa simplesmente a abandonava. Ela (invariavelmente rejeitada pela própria família), não tinha outra opção além de acabar como pedinte na rua, sem direito de ver os próprios filhos. Hoje a legislação marroquina garante direito de propriedade sobre a casa da família, guarda dos filhos, pensão alimentícia. É bem enternecedor ver as mães com os filhos pelas ruas. Existe muito amor e muita manifestação de carinho. Existem marcas nos rostos das mais velhas que eu nem tento imaginar pelo que passaram, mas a nova geração transborda vida. Andam aos bandos pelas noites das medinas. Trocam olhares de paquera entre a fumaça e as barracas da Dejemaa el-Fna. Recusam pretendentes (Ah! Pobres garotos! Só mesmo no antigo regime eles tinham alguma chance!!!). Quando cruzam por mim sorriem solidárias. Me davam dicas de quanto pagar pelo taxi, e me tranquilizaram o coração nas situações em que eu não entendia a ordem do caos. Depois, quando nos despedíamos, um tanto de “mercis” e “shukrans” daqui e de lá. Sorrisos sinceros em ambos os lábios. E nos olhos delas eu via cumplicidade. Elas sabem que ainda não dispõe da liberdade que eu possuo, mas era como se me dissessem que iriam chegar lá.

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