"...estou procurando, estou procurando. Tentando dar a alguém o que vivi e não sei a quem, mas não quero ficar com o que vivi." (Clarice Lispector - Paixão Segundo GH)
domingo, 30 de maio de 2010
ROMAN HOLIDAY
Eu amo todos, de todos os filmes da Audrey Hepburn. Isso não é novidade nenhuma. Aqui em Roma fica difícil não lembrar o tempo todo de um dos meus favoritos deles. “Roman Holiday”, que no Brasil tem o título de “A Princesa e o Plebeu” e perdeu todo o charme dessa cidade. Audrey é a princesa que não aguenta mais os sapatos apertando os dedos do pé, em um ato de rebeldia foge anônima por Roma, anda para todos os lados, se empanturra de sorvete, super corta o cabelo, se acaba dirigindo uma vespa e se apaixona por Gregory Peck (que era um papparazzi disfarçado, mas também se apaixona por ela e se arrepende, como as coisas devem ser) Você anda pelas lojinhas e tem cartazes do filme espalhados por todos os lados. A sorveteria em que os dois tomam gellatti fica atrás do Panteão e é lotada dia e noite. Eu tenho me segurado para também não sentar em algum salão de beleza e cortar curtinho meu cabelo. No melhor estilo “mudei total”. Mas se o cabelo não tem se provado uma boa idéia no momento, soltar a franga pela cidade e se jogar na vida me parece uma idéia totalmente válida. Foi exatamente o que eu fiz nesse final de semana. No sábado, eu e Erna abraçamos Roma de corpo e alma. Erna é a holandesa da minha sala. Linda, alta e magra com porte de modelão. Divertida, totalmente destrambelhada e tagarela como eu; e nós duas morremos de rir, e falamos alto, e nos empolgamos com qualquer coisa e estamos completamente apaixonadas uma pela outra. Nossas frases de ordem todos os dias são “La vita é bella” e “L´amore!!!!!!!!!” (assim mesmo, seguido de milhões de pontos de exclamação). Então no sábado nós nos encontramos para andar sem destino pela cidade e tirar fotos. Eu só estou usando uma câmera digital basicona mesmo. A Sony mais barata que achei no Free Shop de Cumbica. Erna tem uma Canon EOS poderosa. E ela é muito melhor fotógrafa do que eu. Mas mesmo assim nós compartilhamos o mesmo gosto por tirar fotos de cotidiano, e de estranhos na rua em poses espontâneas, e de detalhes de casas e bobeirinhas que só a gente acha graça. Parávamos em alguma piazza e ficávamos um tempão nos contorcendo para tentar pegar algum ângulo legal. Depois andávamos mais, entrávamos em lojas, tomávamos sorvete, puxávamos papo do nada em italiano com as pessoas e fazíamos amigos. Fizemos isso por tudo quanto é lado de Monti, ficamos fazendo hora pela feira de Campo di Fiori e fomos andando até Trastevere. Em Trastevere (que eu prefiro muito mais durante o dia do que à noite) sentamos em um terraço super charmoso, com flores penduradas na parede perfumando nossa mesa. Comemos bruscchettas e enxugamos uma garrafa de vinho rosè. Nessa altura (e já realmente deveras “altas” as duas) fomos encontrar Rachna e Roberto (um amigo italiano de Erna) em um restaurante maravilhoso perto da Piazza del Popolo. Lá foi mais uma garrafa de prosseco, prosciutto crudo com melão, lulas grelhadas e limoncello de sobremesa. Juro que estava morrendo de sono, mas Erna usou o melhor dos argumentos para me convencer a tomar mais um drink em um bar ao lado do Palazzo di Adriano: “Hoje é Sábado e você está em Roma. La vita é bella!”. A gente não discute com determinados argumentos. Eu fui, e fui acordar hoje cedo com uma baita dor de cabeça. Mas como hoje foi domingo em Roma, e fez um dia lindo lá fora, com Sol, céu azul, pássarinhos cantando na janela. Eu tomei uma Neosaldina e fui encontrar a fofa denovo. Dessa vez fomos eu, ela, Karin e Francesca (Karin é um suíça adorável e linda, e Francesca é nossa mascote. Tem 17 anos só, a coitada! Mas ela é super madura, e a gente finge que ela tem 22.), alugamos bicicletas e nos jogamos pela città. Pedalando sem pressa, como quem tem todo o tempo do mundo mesmo. Acho que pedalar por essa cidade é uma coisa que todas as pessoas deviam fazer pelo menos uma vez na vida. Deixar se perder, sentir a respiração balançar com os pneus tremendo pelo calçamento das ruas. Eu gostava tanto de andar de bicicleta quando eu era pequena. Carol e eu nos enfiávamos pelas estradinhas da fábrica a tarde inteira. Todas minhas lembranças de férias de infância incluem uma bicicleta. Eu só resgatei esse prazer no ano passado, quando comprei me arrisquei um pouco por São Paulo. Em Dublin eles têm esse sistema de bicicletas públicas que é super comum aqui pela Europa. Vários pontos espalhados na cidade em que os cidadãos cadastrados podem pegar e deixar as bicicletas de uso coletivo. Bem saudável e ecológico. Eu não pedalei por lá porque estava aquele frio danado e chovia o tempo todo. Em Sevilla passei um domingo lindo pedalando com a Paulinha e com o David. Tipo de experiência que te faz realmente aproveitar o dia e a cidade. Hoje pedalando com as meninas, pensei em como eu deveria incluir mais bicicletas nos meus dias e nas minhas viagens. Pedalar sempre me traz a sensação de que as coisas são simples e inteiras. Nós quatro ainda fechamos o dia fazendo um picnic ao lado do lago na Villa Borghese. Nada de vinho hoje. Morangos, uvas, muitos queijos e salame. Final de tarde com o Sol se escondendo entre as folhas das árvores. A grama pinicando nossas coxas. Pés imundos, mas feliz pra burro. Tomando banho depois em casa, olhava a água suja escorrendo pelo ralo. Quando eu era criança sempre tinha água suja escorrendo pelo ralo. Fiz um chá. Voltei para o computador para trabalhar. Eu estou tendo a sorte de estar em Roma, de tirar os sapatos apertados e me perder por esse desbunde de cidade. Mas acho que dá para um “Roman Holiday” em qualquer lugar. Se jogar na vida sem compromisso, sem pretensão. Só se jogar. Tirar férias de todas as poses, de todas as expectativas sociais. Deixar que o tempo passe sem planejar cada minuto o que se espera dele. Encher um final de semana inteiro com coisas simples que realmente te dão prazer. Fazer todas aquelas coisas que a gente fazia quando era criança. Acho importante lembrar de tempos em tempos que tipo de pessoa você era quando era criança. Não é à toa que temos lembraças tão boas de nossas infâncias.
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