terça-feira, 25 de maio de 2010

O DIA QUE EU DESISTI DE VER RUÍNAS

Como parte do plano, ficar em Roma era uma tentativa de criar um pouco de rotina e colocar em ordem a bagunça toda que estou carregando até agora. Lavei o tênis, levei o casaco na lavanderia. As aulas começaram ontem. E à tarde fui explorar Roma conforme programado. Começando pela parte antiga (porque Roma tem a parte antiga que data dos 2000 anos, e a parte “moderna” que data do século XVIII.........). Fui ao Coliseu, tirei muitas fotos para os meus sobrinhos lindos. Então fui ao Foro Romano, as ruínas todas dos mercados. E ruínas. Mais ruínas. Umas pedras milenares jogadas no chão e cercadas por grades também. E ruínas. Hoje minha programação era, aula mais uma vez e mais ruínas à tarde. Queria ir à Appia Antica ver as catacumbas, e mais ruínas. Pego meu mapinha do Roma Pass, meu ticket do metro e vou cantarolando. Desço na estação e... não faço a mínima idéia de para que lado ir. Pergunto ao taxista com meu italiano Tarzan (Me Tarzan, You Jane!), e ele me responde em inglês. Humpf! “Straight down this street, after the park.”. Então eu desço a rua e entro no parque. Só que não é um parque, parque. É bem uma parte “rural” de Roma. Um monte de mato, com trilhas. Pessoas correndo e andando de bicicleta. Eu achei o clima super astral e resolvi sair andando pelas trilhas para achar o outro lado do parque. Afinal, não podia ser um parque tão grande. Depois de alguns minutos caminhando, resolvo perguntar para um “signore” onde ficava a Àppia Antica. “Ahhhh! É muito longe, garota! Uns 4-5Km por essa direção”. Hummm! Estou inspirada, vamos andar. Mega Sol, mas vambora! E o parque é totalmente bucólico, vou confessar que foi uma surpresa e eu já nem fazia questão de chegar tão rápido às catacumbas. Campos que se estendiam ao lado da trilha, passaros carregando galhos para seus ninhos (Primavera em Roma, né!). Vira e mexe eu me assutava com o barulho de algum esquilinho. Comecei a me sentir a própria Branca de Neve, perdida na floresta, fugindo da madrasta malvada e conversando com os animais. Depois de um bom tempo de caminhada começou a me fazer muito bem estar no meio daquele mato todo. Às vezes passava por alguma casinha. Pareciam chácaras. Tinham criação de ovelhas, e o barulho da água caindo de alguma fonte. Em alguns pontos a trilha se fechava um pouco, com árvores não muito altas. Então eu noto que as árvore são amoreiras, e estão apinhadas das maiores e mais pretas amoras que eu já vi na vida. Olha que eu cresci subindo em amoreira quando criança. Pegávamos um saco cheio de frutas para fazer vitamina. Obviamente as amoras mais baixas foram todas colhidas, então eu subo na árvore e me empanturro de amoras super doces. E pego um punhado para ir comendo no caminho. Fico com as mãos e a boca todas tingidas de roxo. A trilha começa a entrar em um campo mais aberto, onde flores silvestres rastejam por todo lado dando uma sensação de um tapete colorido que me dá vontade de sair correndo, saltitando e cantando “The Sound of Music”. Conforme eu vou passando, uma revoada de passarinhos vai levantando do meio do campo. Tudo é tão cinematográfico e bonito, e me faz sentir viva. Tenho realmente a sensação iminente de vida, e penso que estou nessa jornada para dias exatamente como esses. Para descobrir a grandeza dessas coisas simples. Meus joelhos tremeram quando eu virei a esquina e vi o Coliseu no fundo da rua. Realmente tremeram. Tipo de coisa difícil de processar, pelo tamanho, pela importância. Mas meu tipo de viagem, ainda é muito mais saltitar por um campo florido comendo amoras. Completamente deserto. Perdida para variar. Sem saber como sair ou como voltar. São esses os dias que me salvam. Que me fazem ter certeza de que tudo está valendo a pena. A solidão, a saudades doída de casa. A falta de conforto. A dor de carregar tanta bagagem nos ombros, e os kilos que se esvaem. Vou lembrar dos meus joelhos tremerem em frente ao Coliseu, à Sagrada Família, à cúpula de St. Pauls. Mas são dias como esse que vão fazer da minha jornada inesquecível. Eu fico saltitando pelo campo. Feliz que quase explodo. Pensando em como eu sou uma pessoa passional, sim! E eu sou irresponsável com os meus sentimentos, eu me jogo, faço tudo no máximo. Não sei ser cautelosa, ou comedida. Eu sinto tudo à décima potência. E amo, odeio. Surto, angustio. Sofro, dou risada. E é assim, o que eu posso fazer? Só páro quando vejo sangue. Eu gosto de ser assim. É quem eu sou. Imperfeita. Complicada. Hipervalente. Estou completamente em êxtase com a aceitação de todos meus defeitos, e com o gosto da amora, e com as margaridas que fico fazendo “Bem me quer”, até que a trilha termina... em uma auto-estrada. Uma grande e barulhenta auto-estrada. Eu andei por mais de uma hora naquele parque. Mudei de trilha, me perdi. Não há a menor chance de voltar. Engraçado encontrar seu caminho terminando em uma auto-estrada... Eu não sou o tipo de mulher de voltar. Então boto meus pézinhos no asfalto e sigo pela auto-estrada até encontrar um ponto de ônibus. E como nenhum ônibus aparece, sigo pela auto-estrada até ela parar em uma avenida mais urbana. Lá sim encontro outro ponto de ônibus. Só que o ônibus que eu pego não passa nunca em uma estação de metrô, e eu só descubro que estou no sentido contrário quando ele pára no ponto final. Fui até o ponto final. O motorista vira para mim e diz “Não se preocupe. Daqui 5 minutos, eu volto pelo mesmo caminho.” Eu não sou mulher de voltar, mas me deu um certo alívio em saber que chegando ao ponto final podemos sempre voltar pelo mesmo caminho. Sempre vou encontrar o caminho de casa. Só para registro: nunca vi as catacumbas, nem cheguei à Àppia Antica. O “Roma Pass” vai acabar virando um investimento perdido. De ruínas, já chegam as minhas.

2 comentários:

MH disse...

Lindo.
Já deu bode de igreja? Depois de Roma, fiquei com o maior bode. Acho que o excesso de exposição me deixou dessensibilizada. Existe essa palavra?
Ai, Roma. ♥

Fê Catani disse...

chapéuzinho vermelho!!